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Condenado a 20 anos de prisão no julgamento de Nuremberga, Albert Speer morreu em Londres em 1981. Tinha 76 anos
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Condenado a 20 anos de prisão no julgamento de Nuremberga, Albert Speer morreu em Londres em 1981. Tinha 76 anos

Condenado a 20 anos de prisão no julgamento de Nuremberga, Albert Speer morreu em Londres em 1981. Tinha 76 anos

"Aquele idoso trémulo voltou a estar à minha frente pela última vez": a tragédia e o colapso do regime nazi nas memórias de Albert Speer

Arquiteto e ministro do Armamento, foi uma das figuras mais destacadas da Alemanha de Hitler. Nas "Memórias" agora reeditadas, Speer vai do fascínio ao terror. O Observador publica um excerto.

É um testemunho detalhado e pessoal sobre o funcionamento interno do regime nazi. A construção e a vitória do partido, a criação e a amplificação de uma guerra total, a relação com o povo alemão e as memórias de uma das mais destacadas figuras da Alemanha de Hitler. “Por Dentro do Terceiro Reich”, livro originalmente publicado em 1969, está nas livrarias numa nova edição em português (com o carimbo da Crítica), com prefácio de Rui Ramos.

Albert Speer, o autor, ficou na história como “o arquiteto nazi”, o autor dos projetos e das construções de maior impacto da Alemanha dos anos 30 e 40, o homem responsável pela reconstrução de Berlim. Foi também ministro do Armamento, mas foi, sobretudo, amigo íntimo de Hitler, o mesmo que haveria de descrever como um “génio do mal”.

O Observador faz aqui a publicação de um excerto de “Por Dentro do Terceiro Reich”. Revelamos o capítulo em que Albert Speer descreve os últimos dias do regime, o pânico no bunker da capital, a aproximação do exército russo e a morte de Hitler. Speer haveria de ser condenado a 20 anos de prisão, no julgamento de Nuremberga. Morreu em Londres, em 1981. Tinha 76 anos

A capa de "Por Dentro do Terceiro Reich", de Albert Speer (Ed: Crítica)

A aniquilação

Pelo que me apercebi, durante as últimas semanas da sua vida, Hitler libertou-se da rigidez em que caíra nos anos anteriores. Voltava a mostrar -se acessível e, às vezes, até estava disposto a discutir as suas decisões. Mesmo no inverno de 1944, teria sido inconcebível que se dispusesse a falar comigo sobre as perspetivas da guerra. Então, também a sua intransigência quanto à ordem de «terra queimada» teria sido inimaginável, bem como a muda correção do meu discurso radiofónico. Voltava a estar aberto a uns argumentos que, há um ano, não teria estado disposto a ouvir. Porém, não se tratava de um relaxamento interno, mas dava a sensação de ser alguém cuja obra vital ficara destruída e que só se mantinha em movimento pela inércia dos anos anteriores, apesar de, na verdade, ter abandonado tudo e se ter resignado.

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Quase parecia ser insignificante, embora, talvez, nisto sempre tenha sido o mesmo. Em retrospetiva, às vezes pergunto-me se aquela intangibilidade, aquela insignificância, não era uma característica que o acompanhou desde a sua juventude até à sua violenta morte. Desta forma, as atitudes encolerizadas podiam apoderar-se dele com grande veemência, já que não eram neutralizadas por nenhuma emoção humana. Ninguém podia aproximar-se do seu ser precisamente porque estava morto e vazio.

Agora, tratava-se da insignificância de um idoso. Os membros tremiam-lhe e andava encurvado, a arrastar os pés; até a sua voz era insegura e perdera a sua antiga determinação. O seu vigor dera lugar a uma forma de falar hesitante e monótona. Quando se alterava, o que acontecia com frequência, como costuma ser habitual com os idosos, quase tinha voz de falsete. Continuava a ter ataques de teimosia, mas já não me faziam lembrar as birras de uma criança, mas as de um velho. Tinha a tez descolorida e a cara inchada; a sua farda, antes impecável, naqueles últimos dias da sua vida, costumava estar amarrotada e com nódoas da comida que ingerira com a mão a tremer.

Não há dúvida de que o seu estado comovia o círculo que o acompanhara nos momentos culminantes da sua vida. Eu também corria constantemente o risco de sucumbir àquele contraste, que era comovente em múltiplos aspetos.

Talvez por isso toda a gente o ouvisse em silêncio quando, naquela situação, que durante muito tempo foi desesperante, continuava a transferir divisões inexistentes ou mandava efetuar transportes com uns aviões que não poderiam descolar por falta de combustível. Talvez por isso também se aceitasse que se evadisse cada vez com mais frequência da realidade e que se perdesse no seu mundo de fantasia e se pusesse a falar do grande conflito que não poderia deixar de existir entre Oriente e Ocidente e que garantia ser inevitável. Embora o seu círculo devesse ter visto o quão quiméricas eram aquelas ideias, a sua contínua e sugestiva reiteração continuava a ter um efeito fascinante, como quando garantia que só ele, com a sua personalidade e a sua força e aliado com o Ocidente, estava na disposição de esmagar o bolchevismo; soava plausível quando garantia que todos os seus esforços já não se encaminhavam para outro fim, embora para si próprio desejasse que chegasse depressa a sua última hora. Precisamente aquela integridade com que via aproximar-se o fim inspirava piedade e aumentava a veneração daqueles que o rodeavam.

Além disso, voltava a mostrar-se afável e simples. Em muitos aspetos, fazia-me lembrar o Hitler que conhecera há doze anos, quando comecei a trabalhar para ele, mas agora parecia mais sombrio. A sua afabilidade limitava-se às poucas mulheres que, há anos, estavam com ele. Dedicava maior atenção à senhora Jung, a viúva do seu criado morto em combate, embora a sua cozinheira dietética vienense conquistasse a sua especial simpatia; as suas duas secretárias, a senhora Wolf e a senhora Christian, também faziam parte do círculo privado no qual Hitler passou as últimas semanas da sua vida. Há meses que, na prática, comia e tomava chá apenas com elas; os homens já quase não tinham acesso à sua intimidade. Eu também não participava nas suas refeições há muito tempo. De resto, a chegada de Eva Braun introduziu algumas alterações na rotina diária, sem que, por isso, a relação que tinha com as outras mulheres do seu meio, provavelmente inócua, terminasse.

"Göring sublinhou que só nos restava uma via de comunicação norte-sul, a que passava através da floresta da Baviera, e que, a qualquer momento, podíamos perder a última possibilidade de escapar para Berchtesgaden. Hitler ficou indignado perante a ideia de abandonar Berlim precisamente naquele momento."

Sem dúvida, agia impelido por um conceito elementar, ao qual, na desgraça, as mulheres pareciam responder melhor do que os homens do seu corpo administrativo, de quem parecia por vezes desconfiar. Só com

Bormann, Goebbels e Ley é que abria uma exceção, como se com eles se sentisse seguro.

À volta daquele Hitler espetral, o aparelho do governo continuava a funcionar mecanicamente, como se também tivesse acumulado a inércia necessária para se manter em movimento, apesar de o seu impulsionador ter deixado de lhe fornecer a energia original. Na minha opinião, este mesmo automatismo também impulsionava os generais a continuarem o caminho traçado até naquela última etapa, na qual a magnética vontade de Hitler começava a enfraquecer. Keitel, por exemplo, continuava a exigir que se destruíssem as pontes quando Hitler se resignara a deixá-las intactas.

Hitler precisava perceber de que a disciplina no seu círculo começara a relaxar. Antes, quando entrava numa divisão, todos os presentes se levantavam e só se sentavam após ele o ter feito. Agora, pelo contrário, as conversas prosseguiam e ninguém se levantava, os criados falavam com os convidados na sua presença e alguns colaboradores alcoolizados dormitavam nas poltronas enquanto outros discutiam sem inibições, aos gritos. Talvez ignorasse deliberadamente estas alterações. Para mim, aquelas cenas eram como um pesadelo. Nos últimos meses, as alterações que se foram produzindo na chancelaria pareciam estar de acordo com isso: retiraram os tapetes e os quadros, que, juntamente com as carpetes e os móveis valiosos tinham sido postos em segurança num bunker. Manchas claras no papel de parede, buracos no mobiliário, jornais atirados para qualquer lado, copos vazios, pratos sujos, um chapéu que alguém lançara de qualquer forma para uma cadeira, tudo isto dava a sensação de estarmos em plena mudança.

Há tempo que Hitler abandonara os aposentos superiores, alegando que os constantes bombardeamentos não o deixavam descansar e afetavam a sua capacidade de trabalho. Pelo menos no bunker podia dormir sem interrupções.

Assim, deixou que a sua vida continuasse a decorrer debaixo de terra. Aquela fuga para a sua futura abóbada sepulcral sempre me pareceu ter um grande simbolismo. O isolamento daquele bunker, totalmente afastado da vida e rodeado de betão e terra, selou definitivamente a separação de Hitler da tragédia que ocorria no exterior, a céu aberto. Já não tinha qualquer relação com isso. Quando falava do fim, referia-se ao seu, não ao do povo.

Chegara à última estação da sua fuga da realidade, uma realidade que nem sequer na sua juventude quis reconhecer. Naquela altura, eu chamava a este mundo irreal a «Ilha dos Bem-Aventurados».

Até nesta última época da sua vida, em abril de 1945, houve ocasiões em que Hitler e eu voltámos a debruçarmo-nos no bunker sobre os planos de Linz e contemplámos em silêncio os sonhos de outrora. O seu gabinete, situado debaixo de terra e coberto de betão, era, sem dúvida, o lugar mais seguro de Berlim. Quando explodia alguma bomba de grande calibre ali perto, a massa do bunker vibrava devido à transmissão da onda de choque pelo solo arenoso da cidade. Então, Hitler sobressaltava-se. Que transformação sofrera aquele intrépido cabo da Primeira Guerra Mundial! Não passava de uma ruína, de uma pilha de nervos que já não sabia ocultar as suas reações.

Na verdade, o último aniversário de Hitler não se chegou a celebrar.

Ao contrário de outros anos, nos quais, naquela data, chegavam numerosos automóveis, a guarda prestava honras e os dignatários do Reich e dos países estrangeiros apareciam para lhe dar os parabéns, desta vez reinava a calma.

É verdade que Hitler saiu do bunker e subiu à chancelaria, que no seu descuido parecia proporcionar um enquadramento muito adequado ao seu estado lastimável. No jardim, foi-lhe apresentada uma delegação das Juventudes Hitlerianas que se distinguira em combate; Hitler proferiu umas palavras e distribuiu uma ou outra palmadinha afetuosa. A sua voz era fraca.

Speer num tanque Sherman capturado ao exército americano

Pouco tempo depois, foi-se embora. Sem dúvida, compreendia que não podia fazer com que ninguém sentisse mais do que compaixão. A maioria evitou a embaraçosa felicitação formal aparecendo como sempre na reunião estratégica. Ninguém sabia muito bem o que dizer. De acordo com as circunstâncias, Hitler recebeu os parabéns com frieza, quase na defensiva.

Pouco tempo depois, estávamos reunidos, como em tantas outras vezes, em redor da mesa de mapas do pequeno gabinete do bunker. Göring sentara-se em frente de Hitler. Este, que sempre deu tanta importância à sua aparência, nos últimos dias modificara significativamente a sua farda. Com grande surpresa, vimos que substituíra o tecido cinzento pelo tecido castanho usado pelos norte-americanos, e que em vez dos chumaços dourados, de cinco centímetros de largura, tinha uns mais simples de tecido, nos quais, como adorno, estava presa uma insígnia do seu cargo, a águia de ouro de marechal do Reich.

– Tal como um general americano – sussurrou-me um dos presentes.

Porém, Hitler também não pareceu reparar naquela alteração.

Na reunião, foi abordado o iminente ataque ao núcleo urbano de Berlim. Hitler abandonou da noite para o dia a ideia de não defender a metrópole de se mudar para a fortaleza dos Alpes e decidiu que se lutaria pela cidade nas ruas de Berlim. Todos o instámos a revogar a sua decisão, já que não só era conveniente como também urgentíssimo transferir a sede do quartel-general para sul, para Obersalzberg. Göring sublinhou que só nos restava uma via de comunicação norte-sul, a que passava através da floresta da Baviera, e que, a qualquer momento, podíamos perder a última possibilidade de escapar para Berchtesgaden. Hitler ficou indignado perante a ideia de abandonar Berlim precisamente naquele momento.

– Como é que vou poder incentivar as tropas a travarem a batalha decisiva por Berlim se eu me puser a salvo?

Göring, com a sua farda nova, fitava-o com os olhos muito abertos, pálido e suado, enquanto Hitler prosseguia, cada vez mais exaltado:

– Vou deixar nas mãos do destino se tenho de morrer na capital ou se voarei para Obersalzberg no último momento!

Assim que a reunião terminou e os generais se despediram, Göring virou-se para Hitler, alterado: disse ter assuntos importantíssimos para resolver no sul e que tinha de sair de Berlim naquela mesma noite. Hitler olhou-o com uma expressão ausente. Pareceu-me que, naquele momento, ele próprio se sentia impressionado com a sua decisão de permanecer em Berlim e de pôr a sua vida em risco. Com umas palavras que expressavam a sua indiferença, apertou-lhe a mão e não deixou transparecer que compreendia perfeitamente os seus propósitos. Eu, que estava a pouco espaço dos dois, tive a sensação de presenciar um ato histórico: o governo do Reich fragmentava-se. Assim terminou a reunião do dia do aniversário.

Abandonei o gabinete com os outros assistentes, com a informalidade habitual, sem me despedir pessoalmente de Hitler. Ao contrário da nossa intenção inicial, o tenente-coronel Von Poser instou-me, naquela mesma noite, a que também eu me preparasse para partir. O exército soviético iniciara o ataque definitivo contra Berlim e era evidente que avançava com rapidez. Há já vários dias que estava tudo preparado para a fuga; a maior parte da bagagem já havia sido enviada para Hamburgo e, nas margens do lago Eutin, perto do quartel-general de Dönitz, situado em Plön, esperavam-nos duas carruagens-cama dos caminhos de ferro do Reich.

Em Hamburgo, visitei de novo o chefe regional Kaufmann. Tal como no meu caso, era para ele incompreensível que, naquelas circunstâncias, se continuasse a combater a qualquer preço. A sua atitude incentivou-me a dar-lhe para ler o texto do discurso que redigira há umas semanas, sentado num toco de árvore nas florestas de Schorfheide. Não sabia muito bem como é que ele o ia encarar.

– Devia proferir este discurso. Porque é que ainda não o fez?

Depois de lhe ter falado sobre as minhas dificuldades, disse-me:

– Quer falar através da nossa emissora de Hamburgo? Posso garantir-lhe o diretor técnico. Pelo menos, no nosso estúdio poderá gravar o seu discurso num disco.

Naquela mesma noite, Kaufmann conduziu-me ao bunker no qual estavam instalados os serviços técnicos da emissora de Hamburgo. Depois de atravessar várias salas vazias, chegámos a um pequeno estúdio de gravação, onde me apresentou dois técnicos que aparentemente já estavam informados das minhas intenções. Por um momento, passou-me pela cabeça que uns minutos depois estaria à mercê daqueles desconhecidos. Para me certificar da sua fiabilidade e, ao mesmo tempo, convertê-los em cúmplices, antes de começar a gravar, informei-os do conteúdo do discurso, para que, depois, pudessem decidir por si próprios se o aprovavam ou, pelo contrário, preferiam destruir a gravação. Então, sentei-me diante do microfone e li o discurso.

"Aquele poderosíssimo desejo de voltar a vê-lo evidenciava a ambivalência dos meus sentimentos, porque, racionalmente, estava convencido de que era indispensável e urgente que Hitler morresse, embora fosse demasiado tarde há algum tempo. Tudo o que fizera contra ele durante os meses anteriores tinha sido orientado pelo objetivo de impedir que arrastasse o povo na sua queda."

Os técnicos permaneceram mudos; talvez estivessem assustados ou talvez tivessem ficado convencidos com aquilo que acabavam de ouvir; a questão é que não levantaram objeções.

Kaufmann responsabilizou-se pelos discos. Expliquei-lhe em que condições podia transmitir aquele discurso sem necessidade de pedir antes a minha aprovação; enumerá-las revela os sentimentos que me dominavam naqueles dias: caso eu fosse assassinado por iniciativa de algum adversário político, entre os quais devia colocar Bormann em primeiro lugar; caso Hitler tivesse sido informado das minhas atividades e me condenasse à morte; caso Hitler morresse e o seu sucessor tentasse continuar a impor a sua desesperada política de destruição.

Como o capitão-general Heinrici não pretendia defender Berlim, era preciso ter em conta que, dentro de poucos dias, a cidade seria tomada e teria chegado o fim. Segundo o que me disseram o general Berger, das SS, e também Eva Braun – esta durante a minha última visita a Berlim –, Hitler quis suicidar-se a 22 de abril.2 Contudo, Heinrici foi substituído pelo tenente-geral de paraquedistas Student, que Hitler considerava um dos seus oficiais mais eficazes e que, naquelas circunstâncias, lhe inspirava confiança porque era um homem de horizontes curtos. Ao mesmo tempo, ordenou-se a Keitel e a Jodl que enviassem todas as divisões disponíveis para Berlim.

Eu já não tinha trabalho, pois não havia indústria de armamento. Contudo, uma acesa inquietação interior não me deixava parar nem um segundo. Sem qualquer motivo aparente, decidi que, naquela noite, ficaria na quinta Wilsnack, na qual passara tantos fins de semana com a minha família. Ali encontrei um colaborador do doutor Brandt, que me disse que o médico de Hitler se encontrava preso numa torre dos arredores, a oeste de Berlim.

Descreveu-me o lugar, deu-me o número de telefone e disse-me que os seus guardiães das SS eram pessoas razoáveis. Estivemos a discutir se, tendo em conta o caos que reinaria em Berlim naquele momento, me seria possível libertar Brandt; também queria ver mais uma vez Lüschen e convencê-lo a fugir dos russos e a refugiar-se no Ocidente.

Estes foram os motivos que me levaram a regressar, pela última vez, a Berlim. No entanto, o magnetismo de Hitler tinha um poder maior do que estes pretextos. Queria vê-lo pela última vez e despedir-me dele. Parecia-me que a minha partida dois dias antes fora uma fuga. Será que deviam terminar assim todos aqueles anos de trabalho em comum? Durante muitos dias, mês após mês, tínhamos discutido, quase como camaradas, os nossos projetos comuns. Durante anos, recebera-me a mim e à minha família, no Obersalzberg, mostrando-se um anfitrião amável e atencioso.

Aquele poderosíssimo desejo de voltar a vê-lo evidenciava a ambivalência dos meus sentimentos, porque, racionalmente, estava convencido de que era indispensável e urgente que Hitler morresse, embora fosse demasiado tarde há algum tempo. Tudo o que fizera contra ele durante os meses anteriores tinha sido orientado pelo objetivo de impedir que arrastasse o povo na sua queda. O que podia demonstrar a nossa posição com maior eloquência do que aquele discurso que eu gravei no dia anterior e o facto de esperar a sua morte com impaciência? Mas era precisamente nisto que se tornava palpável a minha ligação sentimental com Hitler: o meu desejo de não transmitir o discurso até depois da sua morte devia poupá-lo da constatação de que eu também me virara contra ele. A minha compaixão para com o vencido era cada vez mais forte. Naqueles dias, talvez muitos dos que formavam o seu séquito sentissem a mesma coisa do que eu. O sentido do dever, o juramento, a fidelidade, o agradecimento erguiam-se diante do sofrimento pessoal e da catástrofe nacional – tudo isso causado pela mesma pessoa: Hitler.

Ainda hoje fico contente por ter cumprido o meu objetivo de ver Hitler pela última vez. Apesar de todas as nossas diferenças, oferecer-lhe este gesto depois de doze anos de colaboração era o mais correto. É verdade que, naquele momento, ao sair de Wilsnack, agia movido por um impulso quase mecânico. Antes de partir, escrevi umas linhas à minha esposa para lhe transmitir ânimo e, ao mesmo tempo, fazer com que compreendesse que eu não pensava morrer com Hitler. A cerca de noventa quilómetros de Berlim, uma verdadeira avalancha de veículos que se dirigiam a Hamburgo obstruía a estrada: modelos muito antigos e automóveis de luxo, camiões e carrinhas, motas e até autobombas do Serviço de Bombeiros de Berlim. Para mim, era um mistério de onde podia ter saído de repente tanta gasolina. Provavelmente, guardavam-na há meses para esta ocasião.

Ao lado do líder nazi

Em Kyritz, encontrei o corpo administrativo de uma divisão; dali, liguei para a casa de Berlim, na qual supostamente estava preso o doutor Brandt à espera de que se executasse a sua sentença de morte, mas tinham-no transferido para um lugar seguro, a norte da Alemanha, por ordem expressa de Himmler. Também não consegui localizar Lüchen. Contudo, não alterei os meus planos e anunciei a um dos assistentes de Hitler que era possível que o fosse visitar naquela mesma tarde. Estando ainda com o corpo administrativo de Kyritz, soubemos que as forças soviéticas avançavam com rapidez, mas que não era de esperar que Berlim fosse logo cercada; previa-se que o aeroporto de Gatow, nas margens do Havel, ainda permanecesse durante algum tempo nas mãos das nossas tropas. Assim, dirigimo-nos ao grande aeroporto de treino de Rechlin, em Mecklemburgo, onde presenciara muitas demonstrações e era bem conhecido, pelo que podia confiar em que poriam um aparelho à minha disposição. Era dali que descolavam os caças que combatiam contra as tropas soviéticas situadas a sul de Potsdam. O comandante mostrou-se disposto a levar-me a Gatow num caça de treino. Ao mesmo tempo, reservaram-me dois «cegonhas» – monomotores de reconhecimento de baixa velocidade de aterragem – que me levariam a mim e ao meu oficial de ligação para o interior de Berlim e que, depois, poderíamos utilizar para o voo de regresso. Enquanto preparavam o aparelho para a descolagem, estive a estudar com o corpo administrativo as posições das forças russas indicadas nos mapas.

Escoltados por uma esquadrilha de caças, voamos a cerca de mil metros de altitude para sul; a visibilidade era boa e estávamos longe da zona de combate. Daquela altura, a batalha de Berlim parecia inofensiva; depois de quase cento e cinquenta anos, a cidade ia ser de novo conquistada pelas tropas inimigas. Tudo aquilo acontecia numa paisagem sinistramente tranquila, cujas estradas, aldeias e subúrbios percorrera tantas vezes. Só se avistavam os breves clarões da artilharia, apenas mais intensos do que a curta cintilação de um fósforo, e as quintas incendiadas que se consumiam lentamente.

É verdade que, na fronteira oriental de Berlim, se viam grandes colunas de fumo. O zumbido do motor abafava o longínquo ribombo da luta.

Quando aterrámos em Gatow, a esquadrilha de caças continuou a voar até aos seus alvos, situados a sul de Potsdam. O aeroporto estava quase deserto. O general Christian, que, na sua qualidade de colaborador de Jodl, pertencia ao Estado-Maior de Hitler, estava a preparar-se para partir. Trocámos umas frases triviais. Então, eu e os meus companheiros entrámos para os dois «cegonhas» que estavam à nossa espera, embora também tivéssemos podido ir de carro, e sobrevoámos, em voo rasante e a saborear a aventura com romantismo, a mesma pista que percorri com Hitler na véspera do seu quinquagésimo aniversário. Pouco antes da Porta de Brandemburgo, aterrámos em plena avenida, para surpresa dos escassos carros que circulavam, mandámos parar um transporte da Wehrmacht e pedimos que nos levassem à chancelaria. A tarde já ia a meio, pois tínhamos demorado cerca de dez horas a percorrer os cento e cinquenta quilómetros que separam Wilsnack de Berlim.

Não estava muito confiante da inexistência de qualquer risco ao ir ter com Hitler; não sabia se, naqueles dois dias, teria mudado de humor. No entanto, de certa forma, estava-me nas tintas para tudo. Embora esperasse que a aventura acabasse bem, também teria aceitado um final funesto.

A Chancelaria do Reich que eu construíra há sete anos estava debaixo do fogo da artilharia pesada soviética, mas, naquele momento, os impactos ainda eram escassos. O efeito dos projéteis era insignificante ao lado do monte de ruínas às quais os ataques diurnos norte-americanos haviam reduzido os meus edifícios nas últimas semanas. Passei por cima de um monte de vigas retorcidas e por baixo de tetos desmoronados e entrei na sala onde, durante vários anos, decorreram as nossas aborrecidas reuniões noturnas, a mesma sala onde Bismarck realizou os seus conselhos e na qual, agora, Schaub, assistente de Hitler, estava a beber conhaque com vários homens, a maior parte desconhecida para mim. Apesar da minha chamada telefónica, ninguém estava à minha espera e todos se mostraram surpreendidos ao verem que tinha voltado. Schaub cumprimentou-me cordialmente, o que me tranquilizou, e pensei que não tinham ficado a saber da gravação do meu discurso em Hamburgo. Depois, foi anunciar a minha chegada. Enquanto esperava, pedi ao tenente-coronel Von Poser que utilizasse a central telefónica da chancelaria para localizar Lüschen e fazer com que viesse.

O assistente de Hitler regressou:

– O Führer deseja falar consigo.

Quantas vezes, durante os últimos doze anos, Hitler me mandara chamar recorrendo a esta fórmula estereotipada?! Porém, não estava a pensar nisso enquanto descia os cinquenta degraus que conduziam às caves, mas em voltar a subir são e salvo. Ao chegar lá abaixo, a primeira pessoa que vi foi Bormann. A sua inusitada cortesia fez com que me sentisse completamente seguro, porque a atitude de Bormann ou de Schaub sempre fora um sinal inequívoco do humor de Hitler. Humildemente, disse-me:

– Se falar com o Führer… provavelmente perguntar-lhe-á se acha que devemos ficar em Berlim ou ir para Berchtesgaden; é urgente que assuma o comando no sul da Alemanha… Daqui a umas horas já não será possível chegar lá. Vai recomendar-lhe que parta, não vai?

"O mapa que estendeu diante de Hitler cobria apenas o setor de Berlim e Potsdam, e nem sequer ali os dados sobre o avanço soviético coincidiam com o que eu observara enquanto voava poucas horas antes. As tropas soviéticas estavam muito mais perto do que o que o mapa indicava. Surpreendido, vi que Hitler tentava mostrar-se mais uma vez otimista, apesar de acabar de me falar da sua morte e do que decidira que se fizesse com os seus restos mortais."

Era óbvio que, se alguém naquele bunker sentia apego pela vida, era Bormann, por muito que três semanas antes tivesse cominado os funcionários do partido a vencerem qualquer fraqueza e a lutarem até triunfarem ou morrerem.3 Respondi-lhe com uma resposta evasiva e tive uma tardia sensação de triunfo diante daquele homem que me olhava quase suplicante.

Então, fui conduzido ao gabinete de Hitler. Não me recebeu comovido como há umas semanas, quando lhe prometi fidelidade. Não mostrou a menor emoção. Mais uma vez, pareceu-me que estava vazio, acabado, sem vida. Adotou uma expressão profissional sob a qual podia ocultar qualquer coisa e perguntou-me o que é que eu pensava da forma de trabalhar de Dönitz. Compreendi claramente que o seu interesse não era por acaso, já que tinha a ver com a escolha do seu sucessor. Ainda hoje acredito firmemente que Dönitz liquidou a ingrata herança que caiu inesperadamente nas suas mãos com mais inteligência, dignidade e consideração do que Bormann ou Himmler teriam podido demonstrar. Eu manifestei que a minha impressão era francamente positiva e ilustrei as minhas palavras com alguns detalhes que sabia que o iam agradar. No entanto, tendo aprendido com a experiência, não tentei influenciá-lo para favorecer Dönitz de modo a não fomentar o seu espírito de contradição. Hitler perguntou-me de repente:

– O que é que lhe parece? Fico aqui ou vou para Berchtesgaden? O Jodl disse-me que amanhã o tempo já terá acabado.

A minha resposta espontânea foi que ficasse em Berlim. O que é que ia fazer no Obersalzberg? Se Berlim caísse, a luta teria terminado de qualquer forma.

– Acho que, se não houver mais remédio, será melhor que o Führer termine a sua vida aqui, na capital, do que na sua casa de férias.

Senti-me de novo emocionado. Naquele momento, pareceu-me um bom conselho, mas não era, já que, provavelmente, o facto de não ir para o Obersalzberg prolongou a batalha por Berlim durante mais uma semana.

Naquele dia, não voltou a falar da ocorrência de uma reviravolta decisiva nem de que ainda lhe restassem esperanças. Com uma certa apatia, com cansaço, como se fosse a coisa mais natural, começou a falar na sua morte.

– Eu também estou decidido a ficar. Só queria saber a sua opinião. – Sem a menor emoção, continuou: – Não vou lutar. O perigo de ficar ferido ou de cair vivo nas mãos dos russos é demasiado grande. Também não quero que os meus inimigos ultrajem o meu corpo. Já pedi para ser cremado. A menina Braun quer morrer comigo, e antes vou ter de matar o Blondi. Acredite em mim, Speer, é-me fácil pôr fim à minha vida. Um só instante e ficarei livre de tudo, desta dolorosa existência.

Pareceu-me estar a falar com um morto. A atmosfera era cada vez mais sinistra. A tragédia chegava ao fim.

Durante os últimos meses, houve momentos em que o odiava, em que combati contra ele, lhe menti e o enganei; mas, naquele instante, senti-me confuso e comovido.

Então, perdi o controlo de mim próprio e confessei-lhe, em voz baixa, para minha própria surpresa, que não levara a cabo qualquer destruição e que até a impedira. Por um momento, os seus olhos encheram-se de lágrimas.

Mas não reagiu. Aqueles assuntos, tão importantes há apenas umas semanas, já não o afetavam. Olhou-me fixa e inexpressivamente quando lhe propus hesitante ficar em Berlim. Não me respondeu. Talvez percebesse a minha falta de sinceridade. Desde então, perguntei-me muitas vezes se não teria sabido sempre, instintivamente, que, naqueles últimos meses, estivera a trabalhar contra ele, se não teria tirado as conclusões pertinentes dos meus relatórios; e também se, ao deixar-me agir contra as suas ordens, não dera mais uma prova da complexidade da sua enigmática natureza. Nunca vou sabê-lo.

Naquele momento, anunciaram-lhe a chegada do general Krebs, chefe do Estado-Maior do Exército de Terra, para lhe dar o seu relatório. Assim, nisso não mudara nada: o comandante-chefe da Wehrmacht continuava a receber os relatórios de todas as frentes. Porém, enquanto há três dias só cabiam no gabinete do bunker os altos oficiais e comandantes-chefes das unidades da Wehrmacht e das SS, agora já se tinham ido quase todos embora.

Além de Göring, Dönitz e Himmler, também Keitel e Jodl, Koller, chefe do Estado-Maior da Luftwaffe, e os mais importantes oficiais se encontravam fora de Berlim; já só restavam oficiais subalternos de ligação. O tipo de relatório também tinha mudado: do exterior só chegavam notícias muito vagas; o chefe do Estado-Maior só podia expor conjeturas. O mapa que estendeu diante de Hitler cobria apenas o setor de Berlim e Potsdam, e nem sequer ali os dados sobre o avanço soviético coincidiam com o que eu observara enquanto voava poucas horas antes. As tropas soviéticas estavam muito mais perto do que o que o mapa indicava. Surpreendido, vi que Hitler tentava mostrar-se mais uma vez otimista, apesar de acabar de me falar da sua morte e do que decidira que se fizesse com os seus restos mortais. Sem dúvida, perdera grande parte das suas antigas capacidades de persuasão. Krebs ouviu-o com paciência e cortesia. Antes, eu achava que Hitler se deixava levar pelas suas próprias e rígidas convicções quando, apesar da situação desesperada, garantia que, no final, tudo se resolveria. Mas, agora, tornava-se evidente que agia com duplicidade. Há quanto tempo nos estava a enganar?

Speer discursa num evento do partido nazi

Desde quando é que sabia que a guerra estava perdida? Desde o inverno da ofensiva sobre Moscovo? Desde Estalinegrado? Desde a invasão? Desde a fracassada ofensiva das Ardenas de dezembro de 1944? Até onde é que chegava a hipocrisia e onde começava o cálculo? Também pode ser que o que eu acabava de presenciar não passasse de uma das suas mudanças de humor bruscas e que, ao falar com o general Krebs, se estivesse a mostrar tão sincero como minutos antes comigo.

O relatório estratégico, que costumava durar horas, logo acabou e mostrava claramente o estado de agonia em que se encontrava aquele resto do que fora um quartel-general. Naquele dia, Hitler renunciou até a perder-se de novo no seu mundo de fantasia falando de um milagre da Providência.

Despediu-se de nós laconicamente e abandonámos aquela divisão que tinha sido cenário de um turvo capítulo de erros, extravios e crimes. Como se eu não tivesse voado para Berlim só por ele, Hitler tratou-me como se eu fosse um visitante habitual, sem me perguntar se pensava ficar ou se queria partir.

Separámo-nos sem um aperto de mão, na forma habitual, como se tivéssemos de voltar no dia seguinte. Lá fora, deparei-me com Goebbels:

– Ontem, o Führer tomou uma decisão capital. Uma decisão histórica.

Ordenou a suspensão da luta no Oeste para que os ocidentais possam entrar em Berlim sem problema.

De novo, passava um desses fantasmas que, naquela altura, elevavam fugazmente os ânimos e faziam conceber novas esperanças que eram rapidamente substituídas por outras. Goebbels disse-me que, agora, a sua esposa e os seus seis filhos eram hóspedes de Hitler no bunker, e que pensavam acabar com as suas vidas, como ele dizia, naquele cenário histórico. Ele, ao contrário de Hitler, controlava as suas emoções com a máxima precisão; ao vê-lo, ninguém teria dito que já se despedira da vida.

Já estávamos no fim da tarde; um médico das SS disse-me que a senhora Goebbels estava de cama, queixando-se de uma grande fraqueza, e que sofrera vários ataques cardíacos. Pedi-lhe que me recebesse. Teria preferido falar com ela a sós, mas Goebbels esperava-me na antecâmara e conduziu-me à pequena divisão onde ela se encontrava, encostada a uma simples cama. Estava pálida e limitou-se a dizer trivialidades em voz muito baixa, embora se notasse que sofria ao pensar que cada vez se aproximava mais a inevitável hora da morte violenta dos seus filhos. Goebbels permaneceu ao meu lado, pelo que a conversa se limitou ao estado da doente. Até ao fim, não referiu aquilo que na verdade a atormentava:

– Estou tão contente de que pelo menos o Harald – o filho do seu primeiro casamento – continue vivo.

Eu também me senti coibido e não sabia o que dizer. O que é que se pode transmitir num caso assim? Despedimo-nos emocionados e em silêncio. O seu marido não nos concedeu nem sequer uns minutos para nos despedirmos sozinhos.

No corredor havia uma grande agitação. Chegara um telegrama de Göring, e Bormann apressava-se a levá-lo a Hitler. Eu segui-o sem me preocupar com as aparências, impelido pela curiosidade. No telegrama, Göring limitava-se a perguntar se, de acordo com o decreto de sucessão, devia responsabilizar-se pelo governo do Reich caso Hitler ficasse na fortaleza de Berlim, mas Bormann achou que dera um autêntico golpe de Estado; talvez fosse a sua última tentativa de sugerir a Hitler, que recebeu a notícia com a mesma apatia que demonstrara durante todo o dia, de que fosse para Berchtesgaden para organizar as coisas a partir de lá. A pressa de Bormann tornou-se mais insistente quando lhe entregaram um novo comunicado de Göring. Eu guardei um rascunho que, no meio da confusão do momento, encontrei no chão do bunker: «Assunto de comando! Transmita-se apenas através de um oficial!

Radiograma n.º 1899. Emissora Robinson para Kurfürst, emitido a 23-iv, 17.59. Para o ministro do Reich Von Ribbentrop. Pedi ao Führer para me dar instruções antes das 22.00 do 23-iv. Caso nesta hora se tornasse patente que o Führer tinha perdido liberdade de ação para o governo do Reich, entraria em vigor o seu decreto de 29-vi-41, através do qual assumirei todas as suas funções na qualidade de seu representante. Se às 24.00 de 23-iv-45 não tiver recebido outra comunicação direta do Führer ou minha, peço-lhe que empreenda a viagem para cá sem demora, por via aérea. Assinado: Göring, marechal do Reich.» Com isto, Bormann acreditou ter um novo argumento:

– O Göring cometeu uma traição – disse, muito alterado. – Já está a mandar telegramas aos membros do governo e comunica ao senhor, em virtude dos seus poderes, que assumirá o seu cargo, mein Führer, hoje à meia-noite.

Se diante do primeiro telegrama Hitler se mostrara indiferente, agora Bormann vencera o jogo. Através de um radiograma redigido pelo próprio Bormann, foram retirados a Göring, o seu antigo rival, os direitos à sucessão, ao mesmo tempo que era acusado de traição a Hitler e ao nacional-socialismo.

Além disso, Hitler ordenou que lhe comunicassem que renunciaria a tomar outras medidas caso abandonasse todos os seus cargos alegando motivos de saúde. Desta forma, Bormann conseguiu, por fim, tirar Hitler da sua letargia. Seguiu-se um acesso de fúria descontrolada na qual se misturavam os sentimentos de amargura, autocompaixão, impotência e desespero.

"Já eram quase três da manhã. Hitler voltara a levantar-se. Pedi que lhe dissessem que me queria despedir. O dia afetara-me muito e receava não me conseguir dominar durante a despedida. Aquele idoso trémulo voltou a estar à minha frente pela última vez; aquele a quem decidi dedicar a minha vida durante doze anos. Eu estava emocionado e confuso ao mesmo tempo."

Com a cara corada e os olhos fixos, Hitler parecia ter-se esquecido da nossa presença:

– Há tempo que sei disso. Sei que o Göring é um preguiçoso. A Luftwaffe desmoronou-se por sua causa. Era um homem corrupto. O seu exemplo propagou a corrupção no nosso Estado. Além disso, há anos que é dependente da morfina. Sei disso há algum tempo.

Assim, Hitler estava informado de tudo isto; porém, não tinha feito nada. Então, numa mudança surpreendente, voltou a cair na sua apatia.

– Embora, se fosse por mim… Que se encarregue ele de negociar a capitulação.

De qualquer forma, se se perder a guerra já não interessa quem o faça. Havia nestas palavras um acentuado desprezo para com o povo alemão: de modo que, Göring ainda era suficientemente bom para isso. Então, Hitler chegou ao limite das suas forças e voltou a adotar o mesmo tom de cansaço característico naquele dia. Durante anos, não deixou de fazer um excesso de esforço; durante anos, afastou de si próprio e dos outros, utilizando a sua imensa vontade, a crescente certeza quanto ao final. Agora, já não lhe restava energia para disfarçar o seu estado. Dava-se por vencido.

Cerca de meia hora depois, Bormann trouxe o telegrama de resposta de Göring: devido a uma grave doença cardíaca, demitia-se de todos os seus cargos. Quantas vezes não recorrera Hitler ao pretexto de uma doença para se desfazer de um colaborador incómodo sem chegar a substituí-lo, para preservar a fé do povo alemão na unidade do seu governo? Até para lá do fim, Hitler continuava a ser fiel a esta consideração.

Neste sentido, Bormann conseguiu o seu objetivo no último momento. Göring estava descartado. É possível que Bormann também estivesse convencido da sua incapacidade; no entanto, se o tinha odiado e derrubado era porque concentrava demasiado poder. De certa forma, naquele momento, senti compaixão por Göring. Recordei a conversa na qual me declarou a sua lealdade para com Hitler.

Aquela breve tempestade encenada por Bormann tinha passado, extinguiram- se alguns acordes de O Crepúsculo dos Deuses, o suposto Hagen saíra de cena. Para minha surpresa, Hitler acolheu favoravelmente um pedido que, no início, só consegui formular-lhe a gaguejar. Alguns diretores checos das fábricas Skoda receavam, provavelmente sem razão, que os russos reservassem para eles um triste destino por terem colaborado connosco, embora as suas anteriores relações com a indústria norte-americana tivessem feito com que concebessem a esperança de voar para o quartel-general das forças dos Estados Unidos. Uns dias antes, Hitler negara categoricamente a aceitar um pedido semelhante, mas, agora, mostrou-se disposto a assinar a ordem pertinente para que todas as formalidades se resolvessem.

Enquanto abordava esta questão com Hitler, Bormann recordou-lhe que

Ribbentrop esperava que lhe concedesse uma hora para se reunirem. Aquele reagiu com nervosismo.

– Já lhe disse várias vezes que não quero falar com ele.

A ideia de se encontrar com Ribbentrop parecia preocupá-lo. Bormann insistiu:

– O Ribbentrop disse que não pensa mover-se. Vai esperar à porta como um cão de guarda até que o senhor o chame.

Esta comparação sensibilizou-o; mandou chamar Ribbentrop. Falaram a sós. Pelos vistos, Hitler falou-lhe da viagem dos diretores checos. Até naquela desesperada situação, o ministro dos Negócios Estrangeiros continuava a lutar para manter a sua autoridade. No corredor, deu-me um sermão:

– Este é um assunto do meu ministério. – E, com mais suavidade, acrescentou:

– Neste caso, não tenho nada que objetar à ordem, sempre que seja o senhor a acrescentar: «De acordo com a proposta do ministro dos Negócios Estrangeiros do Reich.»

Eu espalhei a ordem com esse acrescento, Ribbentrop mostrou-se satisfeito e Hitler assinou-a. Se não estou em erro, este foi o último assunto de governo que Hitler despachou com o seu ministro dos Negócios Estrangeiros.

Entretanto, Lüschen, o meu paternal conselheiro dos últimos anos, chegara à chancelaria. Todos os meus esforços para convencê-lo a abandonar Berlim foram em vão. Despedimo-nos; mais à frente, em Nuremberga, soube que se suicidara depois da tomada de Berlim.

Ao lado de Goring, que haveria de criticar profundamente nas suas memórias

Por volta da meia-noite, Eva Braun pediu-me, através de um ordenança das SS, que fosse vê-la à sua divisão do bunker, um pequeno gabinete que era quarto e sala de estar ao mesmo tempo. Estava muito bem arranjado.

Mandara trazer os sumptuosos móveis do andar superior que eu desenhara há anos para as duas divisões que ela ocupava na residência da chancelaria.

Nem as proporções nem a forma das peças escolhidas se adaptavam àquele lôbrego ambiente; num dos ornamentos de marchetaria da cómoda figuravam as suas iniciais em forma de trevo da sorte.

Conseguimos falar tranquilamente, pois Hitler retirara-se para descansar.

Na verdade, ela era a única dos notáveis condenados à morte daquele bunker que mostrava uma serenidade admirável e soberana. Enquanto os outros estavam heroicamente exaltados como Goebbels, ou decididos a salvarem-se como Bormann, ou apáticos como Hitler, ou debilitados como a senhora Goebbels, Eva Braun aparentava uma tranquilidade quase alegre.

– O que lhe parece uma garrafa de champanhe como despedida? E uns bolinhos. De certeza que não come há algum tempo.

O mero facto de ser a primeira a pensar que eu, depois de ter passado várias horas no bunker, pudesse estar esfomeado pareceu-me uma atenção comovente. O criado trouxe-nos uma garrafa de Moët & Chandon, bolinhos e bombons. Ficamos a sós.

– Sabe uma coisa? Ainda bem que veio mais uma vez. O Führer supunha que o senhor trabalhava contra ele, mas a sua visita demonstrou-lhe o contrário, não é verdade?

Não respondi.

– Já agora – continuou –, gostou do que o senhor lhe disse. Decidiu ficar aqui, e eu vou ficar com ele. O senhor já sabe o resto… Queria obrigar-me a voltar a Munique, mas neguei-me; vim aqui para terminar. – Foi a única pessoa do bunker que fez uma reflexão humana: – Porque é que ainda têm de morrer tantos homens? – perguntou. – Já é tudo inútil… Já agora, por pouco não nos encontra. Ontem, a situação era tão angustiante que pensámos que os russos ocupariam Berlim imediatamente. O Führer queria partir, mas Goebbels falou com ele e ainda estamos aqui.

Conversava comigo com naturalidade. Lançava uma ou outra ofensa contra Bormann, que continuava a criar intrigas; mas insistia, uma e outra vez, no quão contente estava por permanecer no bunker.

Já eram quase três da manhã. Hitler voltara a levantar-se. Pedi que lhe dissessem que me queria despedir. O dia afetara-me muito e receava não me conseguir dominar durante a despedida. Aquele idoso trémulo voltou a estar à minha frente pela última vez; aquele a quem decidi dedicar a minha vida durante doze anos. Eu estava emocionado e confuso ao mesmo tempo. Ele, pelo contrário, não se mostrou nada alterado quando nos encontrámos frente a frente. As suas palavras foram tão frias como a mão que me estendeu.

– Então, vai-se embora? Muito bem. Adeus.

Nem um cumprimento à minha família, nem boa sorte, nem obrigado, nada. Por um momento, perdi o controlo e disse-lhe que pensava voltar. Mas ele deve ter percebido que se tratava de uma mentira piedosa e virou-se para outro lado. Já se tinha despedido de mim.

Dez minutos depois, acompanhado pelo silêncio dos que ficavam, abandonei a casa da chancelaria. Pela última vez, quis percorrer o palácio da chancelaria contíguo, que eu construíra. Como a instalação elétrica estava avariada, conformei-me com uns minutos de despedida no Pátio de Honra, cujo contorno quase não se distinguia entre a negrura do céu e cuja arquitetura já não consegui avistar. Reinava um silêncio quase espetral, como aquele que só há à noite nas montanhas. O barulho da cidade que em anos anteriores chegava ali até àquelas horas da madrugada tinha emudecido.

Todas as tardes, ouvia as detonações das granadas russas: a minha última visita à Chancelaria do Reich. Construí-a há anos, cheio de projetos e ilusões para o futuro. Agora, abandonava as ruínas, não só da minha obra, como também dos melhores anos da minha vida.

– Como é que correu? – perguntou-me Poser.

– Graças a Deus, não vou ter de fazer de príncipe Max von Baden – respondi aliviado.

Interpretei acertadamente a frieza de Hitler durante a despedida, pois, seis dias depois, eliminou-me do seu testamento político e nomeou Saur em meu lugar, que se convertera no seu favorito há algum tempo.

A rua que ia da Porta de Brandemburgo à Coluna da Vitória fora convertida em pista de descolagem com a ajuda de algumas luzes vermelhas.

"Aquela ocultação de um documento oficial foi a última fase da cadeia de mentiras, traições, hipocrisias e intrigas criada durante as últimas semanas: Himmler, que, com as suas negociações, traíra o seu Führer; Bormann, que enganando Hitler, triunfara na sua última grande intriga contra Göring; Göring, que tentava chegar a um acordo com os Aliados."

Umas brigadas de operários tinham preenchido os buracos produzidos pelos últimos impactos das granadas. Descolámos sem dificuldades; uma sombra atravessou fugazmente à nossa direita: a Coluna da Vitória. Tínhamos o caminho livre. Em Berlim e nos arredores podíamos ver grandes incêndios, clarões de artilharia, bolas luminosas que pareciam pirilampos; porém, a cena não se podia comparar com a de qualquer um dos grandes bombardeamentos que Berlim sofrera. Dirigimo-nos para onde o aro do fogo ainda deixava um espaço de escuridão. Por volta das cinco, quando começava a amanhecer, chegámos ao campo de treino de Rechlin.

Pedi a um piloto de caças que entregasse a Karl Hermann Frank, governador de Hitler em Praga, a ordem assinada pelo Führer relativa aos diretores da Skoda, mas não sei se chegou ao seu destino. Como desejava evitar os aviões que sobrevoavam as estradas da zona de combate inglesa em voo rasante, ainda tinha tempo, até à noite, para retomar a minha viagem a Hamburgo. No campo de aviação, fiquei a saber que Himmler estava a apenas quarenta quilómetros dali, precisamente na mesma clínica que me acolhera há um ano em tão estranhas circunstâncias. Aterrámos com o «cegonha» num prado próximo. Himmler mostrou-se surpreendido ao ver-me. Recebeu-me no mesmo quarto que eu ocupara e, para que a situação ainda fosse mais grotesca, o professor Gebhardt também estava presente.

Como sempre, Himmler gabou-se daquele companheirismo profissional que impedia qualquer familiaridade. Interessou-se, sobretudo, pelo que tinha visto em Berlim. Ignorou a destituição de Göring decretada por Hitler, que já devia ter chegado aos seus ouvidos, e, quando, com certas reservas, lhe falei da renúncia daquele a todos os seus cargos, também agiu como se isso não significasse nada.

– Não, afinal o Göring será o sucessor. Há tempo que acordei com ele que serei o seu primeiro-ministro. Mesmo sem Hitler, posso fazer dele um chefe de Estado… O senhor já o conhece… – disse sem modéstia e com um sorriso de cumplicidade. – Naturalmente, a minha influência vai ser decisiva.

Já entrei em contacto com várias pessoas que penso incluir no meu gabinete.

A seguir, o Keitel vem falar comigo…

Talvez Himmler pensasse que tinha ido vê-lo para conseguir um novo cargo. O mundo em que se movia era delirante.

– Sem mim, a Europa também não poderá sobreviver no futuro – garantiu.

– Vai continuar a precisar de mim como chefe da polícia para manter a ordem. Uma hora com Eisenhower e será da mesma opinião! Dentro de pouco tempo, dar-se-ão conta de que não podem viver sem mim, se não querem que se instale a anarquia.

Falou-me das suas conversas com o conde Bernadotte para ceder os campos de concentração à Cruz Vermelha Internacional. Então, compreendi porque é que tinha visto, uns dias antes, numerosos carros da Cruz Vermelha em Sachsenwald, perto de Hamburgo. Embora sempre tivessem dito que, quando chegasse o fim, todos os presos políticos seriam liquidados, agora Himmler tentava resolver a situação por sua conta com os vencedores.

O próprio Hitler, como pude comprovar durante a nossa última conversa, já não se preocupava com essas coisas.

Por fim, Himmler acabou por deixar entrever uma longínqua possibilidade de que eu fosse ministro com ele. Eu, não sem ironia, ofereci-lhe o meu avião para que fizesse uma visita de despedida a Hitler. Recusou sem se alterar. Não tinha tempo.

– Agora, tenho de preparar o meu governo. E, além disso, sou demasiado importante para o futuro da Alemanha para correr o risco de apanhar um avião.

A chegada de Keitel interrompeu a nossa conversa. Então, testemunhei como o marechal, com a mesma firmeza na voz com que costumava fazer as suas patéticas declarações a Hitler, expressava o seu apoio incondicional a Himmler. Afirmou estar completamente à sua disposição.

À noite, estava de regresso a Hamburgo. O chefe regional propôs-me transmitir o meu discurso à população de imediato, ou seja, antes da morte de Hitler, mas ao pensar no drama que aqueles dias, naquelas horas, se devia estar a desenvolver no bunker de Berlim, o impulso que me levava à desobediência desvaneceu-se. Hitler conseguiu paralisar-me psiquicamente mais uma vez. Justifiquei perante mim próprio e talvez perante os outros a minha mudança de opinião, alegando que seria um erro e um disparate tentar continuar a intervir na tragédia.

Despedi-me de Kaufmann e dirigi-me a Schleswig-Holstein. Instalámo-nos nas nossas caravanas, nas margens do lago Eutin. De vez em quando, visitava Dönitz e outros conhecidos do Estado-Maior que esperavam, tão inativos como eu, a evolução dos acontecimentos. Assim, estava com Dönitz quando, a 1 de maio de 1945, lhe entregaram um radiograma através do qual se limitavam em grande parte os seus poderes como sucessor de Hitler. Aí, ditava-se ao novo presidente do Reich o governo que deveria formar: Goebbels como chanceler, Seyss-Inquart como ministro dos Negócios Estrangeiros e Bormann como ministro do partido. Ao mesmo tempo, Bormann anunciava a sua iminente chegada.

Speer com Jean Bichelonne, ministro francês do regime de Vichy

– Isto não pode ser! – exclamou Dönitz, consternado, diante de tal limitação dos seus poderes. – Mais alguém viu este radiograma?

O seu assistente Lüdde-Neurath constatou que tinha passado diretamente do operador para o almirante. Dönitz ordenou, então, que mandassem o radiotelegrafista jurar que guardaria o segredo, que se pusesse de imediato o radiograma a salvo e que ninguém o voltasse a ver.

– O que é que vamos fazer se, efetivamente, o Goebbels e o Bormann aparecerem aqui? – perguntou Dönitz, acrescentando com determinação:

– De forma alguma vou trabalhar com eles.

Naquela noite, ambos concordámos que tínhamos de encontrar um modo de nos protegermos de Bormann e de Goebbels. Assim, Hitler obrigou Dönitz a iniciar o seu mandato com um ato ilegal.

Aquela ocultação de um documento oficial foi a última fase da cadeia de mentiras, traições, hipocrisias e intrigas criada durante as últimas semanas: Himmler, que, com as suas negociações, traíra o seu Führer; Bormann, que enganando Hitler, triunfara na sua última grande intriga contra Göring; Göring, que tentava chegar a um acordo com os Aliados; Kaufmann, que iniciara negociações com os ingleses e punha a emissora de Hamburgo à minha disposição; Keitel, que, ainda em vida de Hitler, procurava cair nas graças de um novo chefe; e, por fim, eu próprio, que durante os últimos meses estivera a enganar o meu descobridor e mecenas e que, a dado momento, cheguei a querer liquidá-lo. Todos nos vimos obrigados a agir como tal pelo sistema que tínhamos representado e também por Hitler, que nos traiu a todos, bem como a si próprio e ao seu povo. Foi assim que terminou o Terceiro Reich.

Na noite daquele 1 de maio, em que se divulgou a notícia da morte de Hitler, eu estava a dormir num pequeno quarto do quartel-general de Dönitz. Ao abrir a mala, encontrei um estojo vermelho de pele, ainda fechado, que continha o retrato de Hitler. A minha secretária devia tê-lo posto ali. Estava muito nervoso. Quando coloquei o retrato em cima da mesa, tive uma crise de choro. Até esse momento, a minha relação com Hitler não tinha terminado.

Só então se quebrou o feitiço, se extinguiu a sua magia. O que sobrava eram as imagens dos campos cobertos de cadáveres, as cidades arrasadas, os milhões de seres aflitos, os campos de concentração. Naquele momento, não desfilaram à minha frente essas imagens e, no entanto, devo tê-las tido presentes. Caí num sono profundo.

Duas semanas depois, impressionado com a descoberta dos crimes cometidos nos campos de concentração, escrevi a Von Schwerin-Krosigk, presidente do gabinete ministerial: «Quem governou, até agora, o povo alemão carrega de forma geral com a culpa do destino que, neste momento, está reservado para este povo. Contudo, esta culpa geral tem de ser carregada de forma individual por cada um dos participantes no governo, de maneira que parte da culpa que, de outro modo, poderia recair sobretudo no povo alemão, se limite na maior medida possível a estes indivíduos.»

Assim, iniciava-se uma fase da minha vida que ainda hoje não terminou.

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