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"O Dr. Rui Rio foi beneficiado quiçá pelas sondagens pré-eleitorais, portanto nem tem de se queixar delas, tem de agradecer", diz ao Observador António Salvador, presidente da Intercampus
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"O Dr. Rui Rio foi beneficiado quiçá pelas sondagens pré-eleitorais, portanto nem tem de se queixar delas, tem de agradecer", diz ao Observador António Salvador, presidente da Intercampus

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

"O Dr. Rui Rio foi beneficiado quiçá pelas sondagens pré-eleitorais, portanto nem tem de se queixar delas, tem de agradecer", diz ao Observador António Salvador, presidente da Intercampus

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

As sondagens não falharam, só não servem para prever resultados. "Se não fosse assim para que é que havia campanha eleitoral?"

Responsáveis de centros e empresas falam em "iliteracia" no que diz respeito às sondagens, garantem que vitória inesperada de Moedas não prova falhanço e dizem que Rio devia estar agradecido.

Nem uma. Entre 16 de abril e a passada quinta-feira, dia 23 de setembro, não houve uma única sondagem pré-eleitoral a dar a vitória de Carlos Moedas na corrida à Câmara Municipal de Lisboa.

Essa primeira consulta, feita pela Intercampus para o semanário Novo, dava a vitória (e uma maioria absoluta) a Fernando Medina  —  com 46,6% das intenções de voto contra 25,7% para Carlos Moedas. Depois disso, a 22 de julho, uma sondagem ICS/ISCTE, feita para a SIC e para o Expresso, encurtou a distância entre os candidatos — mas o então presidente da câmara de Lisboa continuava bem à frente, com 42% das intenções de voto, e o candidato da coligação da PSD/CDS-PP/MPT/PPM/Aliança só tinha 31%. Depois, a 28 de agosto, na sondagem feita pela Aximage para DN, JN e TSF, o candidato socialista passou a estar mais distante ainda do adversário direto — 51% para Medina, 27% para Moedas. Com a proximidade das eleições, os candidatos voltaram a estar mais próximos, mas o cenário não se alterou: na passada quarta-feira, 22 de setembro, de acordo com o levantamento feito pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa (CESOP), uma notícia do Público dava 37% das intenções de votos a Medina, enquanto Carlos Moedas não ia além dos 28% . Um dia depois, uma sondagem da Pitagórica, para a TVI, dava 40,6% a Medina e 33,1% a Moedas — 7,6% de diferença. Esta segunda-feira de madrugada as contas fecharam como se sabe: Carlos Moedas, com  34,3% dos votos, é o novo presidente da autarquia lisboeta. Medina, com 33,3%, falhou a reeleição.

“Conseguimos tudo isto contra as sondagens e contra muitos comentadores que deveriam ter algum respeito por si próprios e andaram durante largos meses a dizer que o PSD ganharia uma ou duas câmaras e não mais do que isso, suportados em sondagens”, disse Rui Rio ainda durante a madrugada, voltando a repetir as invetivas que dias antes já tinha disparado, num almoço no Parque Mayer, com Moedas e Francisco Rodrigues dos Santos — “vigarice” foi a palavra-chave, que fez questão de empregar nas duas intervenções. “Era tempo de acabar com isso. Ou acabamos com as sondagens ou fazemos sondagens decentes e tecnicamente habilitadas.”

"As sondagens pré-eleitorais são fotografias do momento, são um instrumento de gestão fundamental para mobilizar os indecisos e para gerir as dinâmicas de campanha. Não são um outlook final para aquilo que vão ser os resultados, porque isso seriam previsões"
António Salvador, presidente da Intercampus

Mas, será que as sondagens que, ao longo de meses, nem por uma vez deram a vitória a Carlos Moedas, falharam? Cientistas e responsáveis pelas empresas que as realizam, por encomenda de meios de comunicação ou partidos, garantem que não. O que estará a falhar será o desconhecimento que os portugueses em geral — e Rui Rio em particular — terão relativamente ao tema. Irina Saur Amaral , responsável pelo CIMAD, o Centro de Investigação em Marketing e Análise de Dados da Universidade de Aveiro — que não conduziu qualquer sondagem relativa às eleições autárquicas em Lisboa e por isso nem sequer é parte interessada no assunto — diz que “há falta de literacia” na forma como, de modo geral, são lidos os resultados das sondagens em Portugal.

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Já António Salvador, presidente da Intercampus, assinala um outro problema, provavelmente maior e anterior a isso: as chamadas sondagens pré-eleitorais não servem, nem nunca serviram, para prever resultados eleitorais.

“As sondagens pré-eleitorais são fotografias do momento, são um instrumento de gestão fundamental para mobilizar os indecisos e para gerir as dinâmicas de campanha. Não são um outlook final para aquilo que vão ser os resultados, porque isso seriam previsões”, explica ao Observador. “As sondagens de boca de urna são as únicas em que há previsão eleitoral porque são as únicas em que a amostra corresponde ao universo; são as únicas em que se entrevistam votantes para um universo de votantes, enquanto nas pré-eleitorais entrevistamos putativos eleitores.”

"Se assumir que a opinião das pessoas numa semana não muda, então, sim, o que aconteceu neste domingo não era o que nós tínhamos registado na semana anterior. Mas se assumir isso para que é que há campanha eleitoral? Há mudanças de comportamento e essas mudanças decorrem da mobilização do eleitorado"
Ricardo Ferreira Reis, diretor do CESOP

Ricardo Ferreira Reis, professor auxiliar da Universidade Católica Portuguesa e diretor do CESOP, assina por baixo: “Se assumir que a opinião das pessoas numa semana não muda, então, sim, o que aconteceu neste domingo não era o que nós tínhamos registado na semana anterior. Mas se assumir isso para que é que há campanha eleitoral? Há mudanças de comportamento e essas mudanças decorrem da mobilização do eleitorado”.

Outra coisa em que ambos estão de acordo? No que diz respeito às sondagens feitas este domingo junto às assembleias de voto, os resultados dificilmente poderiam ter sido melhores. “Houve quatro empresas e quatro órgãos de comunicação a divulgar aquilo que seria o resultado, a fazer boca de urna, a dizer que seria um empate técnico. Portanto as quatro acertaram na mouche, tiveram um resultado fantástico”, congratula-se António Salvador. “No caso particular da Intercampus, fizemos sondagens em seis municípios, sete previsões em cada um deles, portanto 42 previsões no total, e acertámos em todos os intervalos, não tivemos qualquer erro, foi um sucesso tremendo. E isto sem conhecer muito bem o comportamento eleitoral dos portugueses porque infelizmente não há estudos pós-eleitorais, o ideal era eu hoje estar preocupado a tentar perceber o que é que o senhor José Manuel pensava fazer e fez realmente.”

O exemplo de João Soares e Pedro Santana Lopes e o problema dos indecisos

Assumidamente “indignado” com o ataque de Rui Rio — que paradoxalmente acusa de ser, ele próprio, “um grande consumidor de sondagens” —, o presidente da Intercampus diz que a diabolização das empresas de sondagens por parte dos atores políticos pode ter consequências nefastas — e não apenas para quem faz este tipo de consultas e que necessariamente vai passar a deparar-se com (ainda) mais resistência do lado de lá do telefone. “Acho pouco inteligente que algum dirigente partidário demonize as sondagens, porque pode estar a criar ele próprio um efeito no resultado das mesmas indevidamente”, alerta.

No fundo, a partir do momento em que o eleitor de um partido percebe que o seu líder político não está de acordo com a realização de sondagens, pode deixar de querer tomar parte nelas. No limite, se isso acontecesse com todos os eleitores, o partido perderia um instrumento eleitoral fundamental. “As campanhas eleitorais servem para isso, por isso é que se fazem sondagens, para ver quais são os pontos fortes e fracos, para perceber para onde  é que se deve ir”, diz António Salvador.

"Tenho visto muitas vezes pessoas com convicções absolutamente tontas, do género 'Se eu vou à frente, estou em vantagem' e eu acho que não. O efeito mais frequente das sondagens é a abstenção por certeza de vitória, que é o que pode ter acontecido exatamente com Fernando Medina"
António Salvador, presidente da Intercampus

Depois, acrescenta Ricardo Ferreira Reis, da CESOP, há ainda outra questão: a própria sondagem pode ter efeitos mobilizadores ou desmobilizadores. “Imagine que eu sou eleitor de determinado candidato, sai uma sondagem a dizer que ele vai ganhar com 50% dos votos, se calhar até tinha dito que ia votar mas assim fico em casa a ver o Grande Prémio. São pessoas. E as decisões são voláteis.”

É por isso que, como diz António Salvador, nada mais errado do que assumir que sondagens pré-eleitorais favoráveis são sinónimo de vitória nas urnas. “Tenho visto muitas vezes pessoas com convicções absolutamente tontas, do género ‘Se eu vou à frente, estou em vantagem’ e eu acho que não. O efeito mais frequente das sondagens é a abstenção por certeza de vitória, que é o que pode ter acontecido exatamente com Fernando Medina”, defende o presidente da Intercampus, recorrendo a outro exemplo do passado, justamente na Câmara Municipal de Lisboa, que Pedro Santana Lopes venceu em 2001 sem que nenhuma sondagem pré-eleitoral tivesse dado conta disso.

“Pedro Santana Lopes só ganhou a câmara municipal pelo seu protagonismo e pela sua capacidade de mobilização; porque quem ganhou a assembleia municipal, que é aquela coisa em que votamos consoante a nossa simpatia partidária, foi a coligação PS/PC. Houve uma sondagem prévia que dava uma vantagem significativa a João Soares, isso pode ter levado as pessoas a não ir votar, porque não era necessário”, diz António Salvador. “No final, Carlos Moedas teve uma atitude muito distinta do início, acabou em maré alta. Fernando Medina, provavelmente convencido de que a sua vitória não estava em dúvida foi menos interveniente, menos galvanizador. E por isso terá tido o resultado que teve”, argumenta, para depois concluir em tom mais jocoso. “O Dr. Rui Rio foi beneficiado quiçá pelas sondagens pré-eleitorais, portanto nem tem de se queixar delas, tem de agradecer.”

"Sempre houve uma percentagem bastante grande de indecisos, mas a nossa sensação é que essa percentagem tem aumentado nos últimos tempos — se é por causa da pandemia, ou se é porque as pessoas não querem dizer, não tenho qualquer tipo de suporte científico para dizer. O que tenho notado é um aumento ligeiro, que ao longo deste ano foi maior do que é habitual, de pessoas que não nos dizem ou que não sabem em quem vão votar"
Irina Maur Amaral, diretora do CIMAD

Se é verdade que o objetivo das sondagens pré-eleitorais é dotar os candidatos de ferramentas para tentar conquistar o eleitorado, não é menos verdade que o número crescente de indecisos tem vindo a assumir-se como um problema, que quem faz este tipo de consultas não consegue resolver.

“Sempre houve uma percentagem bastante grande de indecisos, mas a nossa sensação é que essa percentagem tem aumentado nos últimos tempos — se é por causa da pandemia, ou se é porque as pessoas não querem dizer, não tenho qualquer tipo de suporte científico para dizer. O que tenho notado é um aumento ligeiro, que ao longo deste ano foi maior do que é habitual, de pessoas que não nos dizem ou que não sabem em quem vão votar”, diz Irina Maur Amaral. Necessariamente, explica a cientista, quanto mais elevado for o número de indecisos, maior será a diferença entre o resultado da sondagem e a realidade.

“Há uma variabilidade a nível do resultado muito maior, e que vai para lá da variabilidade natural da amostra, que é a margem de erro. Aveiro tem X eleitores, vou escolher uma amostra de Y, para tentar prever essa população. Se os escolher de forma aleatória ou ponderada, vou ter uma margem de erro, que é natural. Mas se dentro desse Y uma grande percentagem de pessoas não responder vou ter sempre uma incógnita muito maior”, diz. Aquilo que as empresas de sondagem fazem normalmente (ao contrário do CIMAD, que opta por não fazer distribuição de indecisos), continua, é repartir essa percentagem de forma proporcional pelos vários candidatos. O que não significa que, na realidade, seja isso que acontece:  “Olhamos para aqueles indecisos e assumimos, como cientistas, que é muito pouco provável que todos os votos vão para o mesmo sítio, vão-se distribuindo. Agora, estatisticamente e tecnicamente falando, pode acontecer. Os indecisos foram mais para Carlos Moedas do que para Fernando Medina. Ou então já sabiam que iam votar Carlos Moedas e não quiseram declarar”.

"Fiquei surpreendido com Lisboa, era uma diferença grande para ser recuperada. Não sei até que ponto é que não terá havido fenómenos específicos, ligados à cidade de Lisboa, como por exemplo aqueles vídeos que circularam nas redes sociais da presidente da junta de Arroios e coisas do género, que terão desmobilizado ainda mais algum eleitorado e desmobilizado outro em favor do PSD"
Ricardo Ferreira Reis, diretor do CESOP

Ricardo Ferreira Reis, que diz que, numa das sondagens feitas este ano, no Porto, o CESOP registou uma percentagem de indecisos de 15%, apenas entre o eleitorado de Rui Moreira nas autárquicas de 2017, concorda. “Porventura terá sido o que aconteceu com a candidatura de Carlos Moedas, que foi bastante mobilizadora na última semana, em contraponto com a candidatura do Fernando Medina. A distância foi-se afunilando e foi-se invertendo”, analisa o diretor do CESOP, que ainda assim concede que uma diferença de 9 pontos percentuais entre os dois candidatos na última sondagem feita pela Universidade Católica parecia uma distância à partida impossível de bater.

“Fiquei surpreendido com Lisboa, era uma diferença grande para ser recuperada. Não sei até que ponto é que não terá havido fenómenos específicos, ligados à cidade de Lisboa, como por exemplo aqueles vídeos que circularam nas redes sociais da presidente da junta de Arroios e coisas do género, que terão desmobilizado ainda mais algum eleitorado e desmobilizado outro em favor do PSD”, conjetura Ricardo Ferreira Reis, trazendo mais um imponderável para a mesa.

No final, a conclusão será mesmo essa: o comportamento das pessoas é impossível de prever e a palavra, por muito que no momento em que é dada seja verdadeira, pode não corresponder a um papel dobrado em quatro nas urnas dias depois. “Por isso é que nas sondagens de boca de urna vamos todos acertando; as pessoas não mudaram de opinião desde que puseram a cruz até chegarem cá fora, enquanto com o desfasamento de uma semana, em relação a um ato de que as pessoas não estão profundamente conscientes, que é o que acontece quando as apanhamos em casa, há alterações de comportamento”, diz o diretor do CESOP. “Olhem para as sondagens, não como uma previsão dos resultados que vão acontecer uma semana depois, mas como um indicador. Olhem para várias, olhem para elas em articulação — porque elas dão sinais, não dão resultados.”

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