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Momento de largada para uma corrida, quando os tratadores (mudammers) saem da frente e camelos arrancam com toda a velocidade
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Momento de largada para uma corrida, quando os tratadores (mudammers) saem da frente e camelos arrancam com toda a velocidade

Getty Images for DAGOC

Momento de largada para uma corrida, quando os tratadores (mudammers) saem da frente e camelos arrancam com toda a velocidade

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Bancada de luxo, prémios milionários, jockeys robôs, o craque Soda e demasiado café árabe: um dia nas corridas de camelos no Qatar

O dia de corridas de camelos em Al Shahaniya teve os mais novos em ação, num mundo à parte onde a TV é que brilha, não há apostas, cada animal pode custar mais de 500 mil euros e os prémios compensam.

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Enviado especial do Observador em Doha, no Qatar

O camelo é tudo menos apenas um animal no Qatar e nos países do Golfo Pérsico. Aliás, como em quase tudo o que possa ter uma competição pelo meio, fica colocado num autêntico pedestal sempre com o pensamento de ser melhor do que os outros. Venerado enquanto aquilo que foi como meio de subsistência e ainda é como meio de transporte, tudo pode ser avaliado num camelo. Literalmente. Inclusivamente a sua beleza, entre as pernas finas e esguias, que a qualquer momento parece que se vão desmontar mas aguentam bem mais peso do que se poderia pensar, e a parte da boca que se transforma talvez na maior distinção entre todos. E foi assim que, num concurso de beleza, com a participação de concorrentes não só do Qatar mas também de outros países do Golfo Pérsico e não só, decorreu o Campeonato do Mundo de Mzayen.

No dia em que Portugal perdeu com a Coreia do Sul no Estádio Cidade da Educação, Nazaa’a terminava o que foi uma lição a todos os outros e saía deste particular Mundial com a glória de grande figura depois de ter vencido o principal prémio em discussão de camelo mais bonito em prova com um prémio de 200.000 reais, o equivalente a cerca de 50.000 euros. Os tratadores que tiveram também esse mérito de cuidarem do animal para o sucesso não foram referidos, mas o seu proprietário, Hamad Jaber Al Athba, líder do Qatar Camel Mzayen, foi nomeado nessa condição e mostrou-se muito orgulhoso por uma competição que é bem mais do que parece: depois do escândalo na Arábia Saudita no ano passado, com a desqualificação de quase 150 participantes (os camelos, entenda-se), por terem botox nos lábios e liftings faciais, tudo é analisado de forma minuciosa.

O que é então avaliado? Como em tudo o que envolve camelos aqui, depende da categoria, da idade e do sexo. Neste caso, e olhando para aquela que era a principal distinção deste Mundial paralelo, aquilo que é avaliado nos camelos Maghateer passa pela proporcionalidade do seu corpo, da cabeça (incluindo formato da boca) e a localização e forma das orelhas. São milhões de reais locais envolvidos neste tipo de concursos onde o dinheiro até acaba por ser o menos perante a questão de estatuto que anda sempre à frente de tudo. E como tudo acontece em Al Shahaniya (ou Ash-Shahaniyah), localidade que fazia parte de Al Rayyan mas que depois se tornou um município independente e que fica muito perto do hotel onde a equipa de Portugal está a estagiar.

A história das vacas nos palácios, o luxo da bancada e o “desfile” de centenas de camelos

Por norma costuma apontar-se para uma distância que se percorrem em cerca de 45 minutos a partir do centro de Doha até ao local que se tornou de culto pelos camelos. É menos, sendo que a distância do ponto de partida conta muito neste caso. Uma via rápida que por ser sábado perto da hora de almoço tem menos carros do que é habitual (em contrapartida, as mesquitas estão a abarrotar e há tantas ou mais pessoas ainda cá fora, onde ouvem a oração através de todos os altifalantes colocados), vários pontos de interesse pelos quais vamos passando, como o Qatar National Convention Centre (QNCC), onde está concentrado o centro de operações deste Mundial, e todos os 1.001 espaços e salas para meios de comunicação a organização, ou o Estádio Cidade de Educação, onde Portugal perdera na véspera com a Coreia do Sul. Depois, um outro cenário. Um cenário que mostra o ponto onde está hoje o país: muita construção, muitos prédios que estão terminados mas ou não têm ocupação ou precisam dos acabamentos, um ou outro palácio que vai aparecendo no horizonte.

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É famosa por aqui a história de como um empresário local, percebendo que o país tinha gás e petróleo com reservas para pelo menos 200 anos mas carecia de um bem essencial como o leite, comprou 4.000 vacas para criar um centro de produção. Há outra história, neste caso menos conhecida e contada de uma maneira informal por portugueses que privaram e privam com qataris (o que não é assim tão habitual), de um sheik que tinha na sua quinta gigante uma zona com vacas que iam chegando, mas estas eram para alimentar os leões que tinha na sua propriedade – e basta recordar que quando um qatari se casa, o governo concede-lhe um pedaço de terreno grande para construir um desses espaços que só conseguimos ver ao longe o quão grandes são. Chega “a” rotunda, aquele ponto que já vamos conhecendo com o tempo. Fazendo a curva para a direita apertada logo na primeira saída, chegamos ao Centro Treinos Al Shahania SC onde Portugal tem feito a sua preparação; saindo na segunda saída as imagens pequenas dos camelos desfazem qualquer dúvida.

Camelos vão atravessando estradas até chegarem à parte do circuito onde fazem a partida e carros param com mais assiduidade do que com peões

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Não há por ali vivalma por esta hora. Por causa dos treinos de Portugal, surgem sempre uns curiosos à porta, sempre com a esperança de que por um qualquer milagre o autocarro possa parar e Cristiano Ronaldo saia para satisfazer o desejo de jovens que são do Líbano, da Índia ou do Irão (pelo menos destes países já encontrámos) – sim, por ele porque até podem gostar da Seleção, mas é pelo número 7 que se dão ao trabalho de fazer aquelas esperas destinadas ao insucesso. Entramos pouco depois naquela estrada que qualquer Uber deixa de registar ou aparece como unknownroad, mas que no seu final tem um ponto de paragem óbvio: a receção do Camel Race Track Limited. Até lá, cruzamos com as bossas na estrada em forma de lomba para evitar grandes velocidades e passam os primeiros camelos com andar vagaroso na passadeira.

Se dúvidas ainda existissem, era mesmo ali. Mais vazio do que estava era complicado. E mais alguns camelos vão passando, com o tratador em cima dos mais velhos, mas levando sempre um ou dois mais novos de lado. Por aquela altura, ainda não há mordomias na entrada. Vai haver, uma hora depois. Para já apenas mais uma sala com ar condicionado em grande, tapetes vermelhos a dar um primeiro toque de luxo, o acesso à tribuna onde só entram, alguns mas onde neste dias podia entrar qualquer um ganhando pouco ou nada.

Uma vista da bancada que costuma receber os convidados da corrida de camelos e a ida dos animais até à zona de partida do circuito

“Por onde quer que comece então?”, pergunta Imam Hamed, que nos recebe no local para explicar o que se vai passar naquele que é o primeiro dia do campeonato de corridas de camelos (confissão: algumas das coisas só mais tarde, à segunda ou terceira explicação, percebemos a 100%). “Bom, aqui temos aquela que é a bancada onde se sentam as pessoas”, refere, apontando para uma zona com um chão em mármore onde cada pedra parece ter custado uma fortuna e onde ficam cerca de 60 cadeiras todas de veludo beje e rebordo a dourado, mas em que se torna complicado perceber a melhor forma de estar, tendo em conta que a zona para encostar as costas está mais longe do que é habitual. Mas bom, e o resto das pessoas? “Não há, é apenas aqui. É por isso que temos as televisões”, diz, apontando para três plasmas enormes que estão ali para acompanhar as corridas que terminam, naquela parte, mesmo ali à nossa frente.

“A altura das corridas é uma das mais aguardadas do ano e temos um canal que transmite apenas todas as corridas que vão passar ali naqueles ecrãs. Aquilo que está a ver agora são só os preparativos, como se faz no futebol”, prossegue. “Entre camelos e futebol? Camelos, claro. Já são muitos anos. Aqui temos uma grande ligação aos camelos, é um dos principais desportos, como as provas de falcões, de que já deve ter ouvido. E não é só aqui no Qatar, é em todos estes países do Golfo Pérsico. Estas provas que começam hoje têm proprietários de vários países desses”, vai contando enquanto nos chega o primeiro café árabe num copo muito pequeno, e as primeiras pessoas, com dois casais mexicanos e quatro japoneses. Para quê? Ainda nada. “Mas só começa às 13h, se quiser pode ir dar uma volta para conhecer isto e depois volta e falamos mais”.

"Entre camelos e futebol? Camelos, claro. Já são muitos anos. Aqui temos uma grande ligação aos camelos, é um dos principais desportos como as provas de falcões, de que já deve ter ouvido. E não é só aqui no Qatar, é em todos estes países do Golfo Pérsico. Estas provas que começam hoje [sábado] têm proprietários de vários países desses"
Amim Hamed, um dos responsáveis logísticos da Shahaniyah Camel Race Track Limited

A reação dos mudammer quando nos veem vai diferindo de um para o outro. Há os que tentam comunicar com gestos de agrado e fixes como quem dá as boas-vindas, há os que colocam a cara desconfiada número 4 e carregam no sobrolho como que a questionar o que estamos ali a fazer. Nessa primeira volta, aquilo que vamos percebendo é que todos os camelos estão a vir da zona onde estão e são treinados para perto do sítio onde começam as corridas. São dezenas. Muitas dezenas. Centenas. Uns de boca tapada com uma espécie de gorro, um ou outro pintados por uma questão religiosa, todos já equipados com cores diferentes na zona da bossa que mais tarde viríamos a saber que se referem à “equipa” do proprietário. Ponto curioso: nesse percurso têm de atravessar uma estrada “normal” e, ao contrário do que acontece com pessoas, os carros param e não buzinam, mesmo sabendo que aquele andar vagaroso não vai mudar.

Quanto mais nos aproximamos dessa zona onde ficam, mais se vai percebendo o cheiro. É impossível passar mais para lá com a caravana de animais que se prepara para ir a desfilar ao longo de 200/300 metros com os seus tratadores, que não só treinam para competição mas também tratam e cuidam dos animais a quem os contratar. São sempre pelo menos dois, um mais velho e um mais novo, podem chegar a ser cinco, vimos ainda um comboio com mais de dez, todos com o mesmo “equipamento”. Voltamos ao ponto de partida, tentamos encontrar outro sítio de chegada e agora vamos à boleia do comboio da primeira vaga de visitantes do dia para andar em cima da relva, atravessar a pista onde não havia sinais de corridas e ir para uma zona onde estão concentrados todos os que meia hora depois entrariam em competição. Pelo meio, duas baixas de mulheres que enterraram os pés numa zona de terra batida que tinha água e não passaram dali.

O making off de uma partida: os camelos são conduzidos até ao ponto de partida, ficam com tratadores, arrancam quando uma cancela abre e correm em circuitos de quatro, oito e 11 quilómetros

Paul Gilham

O prémio pequeno para os juniores, os milhões distribuídos e os jockeys robôs

Tudo é dividido por sexo e idade e este primeiro dia tem as grandes esperanças de quatro anos, aqueles que ambicionam apenas por agora serem melhores do que os outros para ganharem outro estatuto quando forem mais velhos. Mais um pouco de café árabe aceite apenas como sinal de respeito, mas que cada vez parece ter um sabor pior (isto dito por alguém que não é apreciador, o que não acontece com os qataris), a primeira corrida numa cadeira que faz jus ao aspeto em termos de conforto. É aqui que percebemos o primeiro “erro”: seis minutos depois a corrida inicial termina com o camelo 23 a ganhar (a vitória foi confirmada pelo photofinish, sendo que o segundo estava dez metros atrás) e sem uma única passagem por onde estamos.

– É impressão minha ou não passaram aqui?
– Não, estes não passam aqui. Só ali ao fundo.
– E é possível ver ali?
– Não é preciso, tem aqui três ecrãs grandes…
– Sim mas se não der para ver posso ligar só a TV e vejo…
– Percebo… Vou tentar tratar da situação.

Mais tarde veríamos que existe uma espécie de assistência às corridas na zona de chegada, com todos os mudammer (os tais tratadores) a largarem os camelos no local onde é feita a partida, com uma baia que levanta e assume o início da corrida, que neste caso tem quatro quilómetros, é feita num circuito interior de todo o complexo onde só se percebe, sem ver, a passagem pelo barulho e buzinas de carros em determinada parte do trajeto, e que demora entre 6.02 e 6.10 minutos, sendo que 30 segundos depois começa logo outra.

Os mudammers, tratadores que não só treinam os camelos como zelam pela sua saúde, foram os únicos a assistir à corrida fora da bancada "presidencial"

Paul Gilham

É nesta parte que convém explicar algo fácil de perceber: é um desporto do povo detido por ricos. Neste caso, por ser apenas o dia do campeonato para os mais novos que fazem quatro quilómetros de corrida, a vitória vale 10.000 reais (2.600 euros). É pouco perante os valores exorbitantes que são praticados, com uma média de prémios que ronda os quatro milhões de reais (pouco mais de um milhão de euros) entre aqueles que são os principais concursos de corrida de camelos, sendo que alguns distribuem também carros de luxo para os vencedores que rondam os 550 mil reais (143 mil euros). Agora o outro lado, dos custos. Até onde pode chegar? A base mínima para comprar um camelo de corrida que possa ser uma aposta de sucesso é volátil dentro do caro, mas começa nos cerca de 10.000 euros e para ficar com os campeões pode ir aos dois milhões de reais (520 mil euros). E quanto é o “pacote” treino, alimentação, saúde etc. por mês? À volta de 1.500 euros por mês, num total de 18.000 euros ao ano, mais deslocações se for caso disso.

E as corridas? Os mudammer, na sua maioria oriundos de países como Índia, Bangladesh ou Nepal, entre outros, acompanham os camelos apenas até à zona de partida e depois correm para o lado antes do sinal de arranque. Neste caso são quatro quilómetros de pista (podem ser oito ou 11) de terra com estacas brancas de um lado e de outro e duas pistas alcatroadas de lado para que os carros de apoio possam seguir de perto toda a corrida do seu camelo, entre buzinas, umas quantas travagens e também donos que se colocam com a cabeça fora do carro (uma 4×4 branca em quase todos os casos) quase a dar um último estímulo “humano”. Neste caso, esta parte faz sentido tendo em conta que os camelos têm como jockey um robô, naquela que foi uma das alterações feitas ao longo do tempo num desporto que se profissionalizou a partir de 1973.

Até aí, a parte dos tratadores era igual, mas a parte de corrida mudava, com crianças a funcionaram como os jockeys dos camelos. No entanto, houve dois problemas detetados não só no Qatar mas também em países como Arábia Saudita ou Omã: 1) as crianças ficavam muitas vezes privadas de comida para que não tivessem tanto peso e permitissem maior velocidade ao camelo; 2) as crianças era tratada quase como escravas, não só pela forma como chegavam a esses países, mas também pela maneira como eram trocadas entre os proprietários. Houve algumas mortes também que colocaram o problema mais exposto. Nos primeiros anos deste século, houve então a introdução dos robôs, que no início assustaram os camelos mas que hoje estão mais leves e menos estranhos, contando com uma espécie de vara no braço que é comandada através dos carros de forma remota. Os camelos, esses, podem atingir velocidades máximas superiores aos 60 quilómetros por hora, sendo que a média em corrida é entre 40 e 50 quilómetros hora.

A parte dos tratadores era igual mas a parte de corrida mudava, com crianças a funcionaram como os jockeys dos camelos. No entanto, houve dois problemas detetados: 1) as crianças ficavam muitas vezes privadas de comida para que não tivessem tanto peso e permitissem maior velocidade ao camelo; 2) as crianças funcionavam muitas vezes como escravas, não só pela forma como chegavam a esses países mas também pela maneira como eram trocadas entre os proprietários. Houve algumas mortes também que colocaram o problema mais exposto. Nos primeiros anos deste século, houve então a introdução dos jockeys robôs

É nesta altura que voltamos para as cadeiras/poltronas (esta descrição é melhor). Mais um café árabe em forma de shot que quando é bebido de um trago como que para esquecer tem como castigo levar com mais um copito logo a seguir para ficar como lição, mais umas corridas agora com o camelo 23 a ganhar. Imam senta-se agora ao nosso lado e podemos recuperar a conversa. “Isto agora é assim, quando termina uma vai logo a seguir começar a outra. Os camelos estão identificados por aqueles números que estão pintados na zona do pescoço para que se perceba quem são e as cores explicam quem são os proprietários. Por exemplo, o que estão a dizer é que o camelo X está na frente e se ganhar acrescentam que é do proprietário Y. Tratadores? Não, não são nomeados. E os jockeys são robôs, também não têm nome”, vai contando.

Pedimos para que nos explique agora uma corrida do início ao fim, quase que fazendo a tradução do que os narradores quase sem fôlego e de boca seca vão dizendo até irem trocando de quando em vez entre eles. “Por norma estes que vão logo à frente nunca ganham, os que ganham são os que vão ficando por ali e no último quilómetro aceleram. Há uns que se deixam ficar muito para trás mas depois já não chegam lá… Nesta, o melhor parece ser o 7, é o Soda pelo que estão a dizer. Se ganha nestas corridas, é sinal que daqui a uns seis anos vai estar nesta principal porque será um dos melhores. Como se chamam os Ronaldos e Messis? Há tantos, nos camelos há muitos…”, comenta. Acertou mesmo, ganhou o Soda. Tempo de 6.02,15.

Ficamos mais uma vez sozinhos depois de mais uma insistência de que assim não tem o mesmo impacto na tentativa de seguir uma corrida in loco e não pela TV e é nessa altura que nas cadeiras/poltronas/quase sofás (esta descrição é ainda melhor) fica apenas um qatari com a filha pequena. Ténis Dolce & Gabbana, vestido comprido, um senhor que a quer colocar perto de uma zona ajardinada com flores para fazer imensas fotografias. Sem falarmos, estamos em contacto pelo olhar. Percebemos tudo. Quando de repente o café árabe deve ter acabado (mas iria voltar), um empregado aparece com dois sumos de laranja e dois sumos de morango numa bandeja. Ao recusarmos numa primeira instância por já não dar para mais, o olhar do qatari se pudesse lançaria setas. Afinal aceitamos, um de morango. Depois vêm quatro garrafas de água que voltam para trás entre algumas frases de voz levantada. Voltam, de bandeja e não na mão. Era esse o problema.

Primeiro os jockeys eram crianças, que muitas vezes eram privadas de comer para ficarem mais leves ou traficadas; agora são robôs, com uma espécie de vareta a servir de braço

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Mais tarde, quando perguntamos ao nosso cicerone quem era, a resposta acaba por tornar-se quase óbvia: é o responsável de todo aquele local. E seria possível falar com ele? “Não, hoje não dá porque está ocupado, mas podemos marcar num outro dia até porque temos ali um carro à espera fora”, explica. O “ocupado” foi estar sentado a falar com as pessoas com tons de voz diferentes e a gesticular  muito com os braços (sempre a ir olhando para como estava o jornalista a seu lado de forma meio paternalista) antes de passar pela zona da entrada que vai recebendo agora mais visitantes já com sumos, tâmaras, muita fruta e doces locais. Um aceno com a cabeça, o mesmo do outro lado, um carro preparado para assistir a uma corrida ao vivo.

– Vamos aqui entrar neste carro. Não é de proprietários, mas faz o mesmo caminho.
– Isto é muito bom. Começa onde a pista?
– Ali mais à frente. Aqui é a zona proibida, não se pode passar aqui que é perigoso…

Uns segundos de silêncio para pensar que ainda há uma hora tínhamos andado ali e a tirar fotografias, olhar em frente para onde se aglomeram dezenas de tratadores ansiosos para perceber se o seu camelo será o primeiro a cortar a meta. Percebemos durante os tais seis minutos várias coisas que não se consegue ver na transmissão: o esforço dos camelos, com uns a terminarem cheios de espuma na zona da boca e outros como se nada fosse; o autêntico milagre que é não haver carros a baterem uns nos outros com tanto arranca-trava-acelera-espera-arranca-trava; o barulho daquele braço em forma de vareta do robô quase como se fosse um zumbido nos ouvidos nos períodos em que as buzinadelas e gritos permitem que se ouça. Um pequeno descanso, tratadores a agarrarem os seus camelos, a ida para “casa” quase como se fosse uma cadeia porque entretanto já começou a corrida seguinte e cada um faz apenas uma prova por dia (dado importante que percebemos apenas depois: como as apostas são proibidas, quem vê e segue é por gosto).

O facto de se partilhar a informação de que Portugal está a estagiar muito perto daquele local serve apenas para recordar algo que já tínhamos antes lido: Neymar visitou o complexo e assistiu a corridas que foram feitas em sua homenagem em 2019. Nesse dia estava muito mais cheio, no dia 14 também deverá estar com as provas dos melhores  dos melhores (até lá deverá haver todos os dias algo, sempre com transmissão no canal próprio de TV). Fica a promessa de que se a Seleção jogar as meias-finais, que serão nesse dia no Estádio Al Bayt às 22h locais, teremos margem para voltar e até falar com o responsável qatari se for possível. “Aí vale a pena, os prémios são maiores e a corrida acaba aqui”, refere. Estava feita a primeira visita ao município onde há dois camelos por cada habitante para ver o “desporto dos sheiks”. Esperemos que não seja a última.

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