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Primeiro dia dos deputados da XV Legislatura na Assembleia da República. Leitura do Relatório da Comissão Eventual de Verificação de Poderes dos Deputados Eleitos e Eleição do presidente da Assembleia da República. Augusto Santos Silva, Presidente da Assembleia da República Lisboa, 29 de Março de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR
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FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

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Bandeiras na cara e avisos sobre os riscos do nacionalismo. O Parlamento voltou e está diferente

Santos Silva foi eleito presidente e arrancou aplausos à direita quando atacou (indiretamente) o Chega. Ventura trouxe os 11 de bandeira estampada e marcou o regresso parlamentar.

O regresso do Parlamento é um dia de novos deputados perdidos em corredores e a entrarem nas portas erradas. É feito de reencontros mais ou menos breves, como o de Fernando Medina (PS), que entrou esta terça-feira para sair amanhã como ministro das Finanças. E de um novo desenho das bancadas, o que suscita estranheza inicial e, neste caso concreto, muitos avisos e picardia no final.

Os deputados do Chega entraram no plenário ao mesmo tempo e todos com uma máscara de proteção individual com a bandeira de Portugal estampada. Um statement para o qual o novo presidente da Assembleia da República já vinha preparado para responder. A partir da intervenção de Augusto Santos Silva — por uma maioria que foi além do PS mas ainda assim mais curta do que a última que se juntou por Ferro Rodrigues — o debate prosseguiu centrado no partido de André Ventura.

Foi o Parlamento a reagir ao partido que mais cresceu nas legislativas (passou de um deputado apenas para 12) e os restantes partidos a tentarem definir os limites do que se vai passar daqui para a frente. Incluindo com avisos sobre a outra novidade que as eleições trouxeram: a maioria absoluta do PS, que pode trazer a tentação de “abusos” e por isso precisa de ser vigiada no Parlamento (palavras do PCP) e obriga o PS a fazer reformas a sério (PSD).

Serão mais de quatro anos de uma legislatura anormalmente longa (a organização das sessões legislativas atira o seu término para outubro de 2026, daqui a quatro anos e sete meses) e com a maior mudança a que o país já assistiu no tempo de democracia (surgiram dois novos grupos parlamentares). O dia um deu um sinal do que aí virá.

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Os recados do novo Presidente…

Saiu como ministro dos Negócios Estrangeiros a ser aplaudido pela direita nos últimos debates parlamentares (sobre a invasão da Ucrânia) e entrou como presidente da Assembleia da República nesse mesmo registo. Augusto Santos Silva foi eleito e subiu à Mesa da Assembleia da República para tomar o seu novo posto debaixo do aplauso da maioria socialista que foi decisiva para a sua eleição — teve 156 votos a favor, 63 brancos e 11 nulos, o que mostra que recolheu votos além do PS (que tem 120 deputados). Foram menos votos do que o seu antecessor no cargo, Eduardo Ferro Rodrigues conseguiu na última vez que foi eleito, em 2019, mas começa mais consensual com um discurso contra os nacionalismos e o populismo.

Primeiro dia dos deputados da XV Legislatura na Assembleia da República. Leitura do Relatório da Comissão Eventual de Verificação de Poderes dos Deputados Eleitos e Eleição do presidente da Assembleia da República. Augusto Santos Silva

Santos Silva a votar na eleição em que foi candidato único

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Todo dirigido ao Chega, mas sem nunca referir o partido de André Ventura. Augusto Santos Silva foi avançando no texto que trazia preparado e provocando na bancada do Chega várias cabeças a abanar em tom de reprovação e — Santos Silva terá reparado — todos com máscaras iguais com a bandeira nacional estampada. Começou a intervenção a prometer um mandato “imparcial, contido e aglutinador”, mas acabou a “malhar” (a expressão é inevitável) no Chega que tem 12 deputados nesta legislatura.

“A língua é o fator de construção de pátrias distintas mas o também o laço perene entre elas”, começou por dizer depois de falar das comunidades portuguesas, explicando logo por que razão falava da língua e da pátria: “É que o patriotismo só medra no combate ao nacionalismo”. E ainda detalhou mais ao explicar que “o patriota, porque ama a sua pátria, enaltece o amor dos outros pelas pátrias respetivas e percebe que é na pluralidade das pátrias que emerge a sua”. Quanto ao nacionalista, continuou, esse “odeia as pátrias dos outros, quer fechar a sua, promove o ostracismo”. Palavras que acertavam em cheio na bancada do Chega.

O PS aplaudia, mas também alguns deputados do PSD (incluindo José Silvano ou Adão Silva) e da Iniciativa Liberal (Carlos Guimarães Pinto, por exemplo), o Chega enfiava a carapuça, mostrando em gestos irritação com o que ouvia — e depois mostrando em palavras (ver em baixo). Mas Santos Silva não ficaria por ali. Pediu “cuidado com a língua em que a palavra se exprime” e disse que o sinal de pontuação de que a democracia mais precisa é a interrogação e não o de exclamação, que deve ser usado com parcimónia, avisou. “Deixemos as certezas para os néscios” — contra “o dogmatismo e a intolerância”.

“O único discurso sem lugar aqui será o discurso do ódio”, disse ainda em relação à Assembleia da República e foi já no final da intervenção que foi mais longe do que tinha ido até ali ao dizer que “a melhor maneira de combater o populismo é não lhe conceder mais relevância do que a que o povo português lhe deu”.

Terminou entre os aplausos já contados, mas sua eleição foi, no entanto, difícil. Não tão complicada como a de Ferro Rodrigues em 2015, mas nessa altura o PS não tinha o conforto da maioria absoluta e testava pela primeira vez a “geringonça”. Só que em legislatura enguiçada não se mexe e depois de uma repetição de votação num dos círculos eleitorais, quase que a votação do presidente da Assembleia da República seguiu o mesmo caminho.

A votação é em urna e a dita foi colocada no centro do plenário e os deputados chamados um a um para exercer o seu direito. Mas no final da votação, cerca de 40 minutos depois, a Mesa da Assembleia da República deu conta que não tinha a lista de deputados atualizada — e a verificação de mandatos tinha acabado de ser aprovada por unanimidade pela comissão eventual que tem essa função. Ora, com eleitos ainda no Governo cessante que pediram suspensão de mandato, a Mesa teve de voltar a confirmar que não havia sobreposição de votos. Voltou a chamar um a um e foi mais meia hora de verificação. No final, não teve de se repetir votação e foi feita a contagem. Alívio.

… e as respostas, sobretudo do Chega

Ora a intervenção de Augusto Santos Silva seria o rastilho para o tema central de muitas das intervenções: o Chega. Santos Silva conseguiu contagiar os deputados no conteúdo e na forma – Fernando Pessoa acabou por ser citado para provar todos os pontos possíveis (e contrários) – e a sessão passou a ser, em grande parte, sobre o Chega.

Isto mesmo apesar de o partido praticamente nunca ter sido referido pelo nome. Logo a seguir a Santos Silva, outro socialista – Eurico Brilhante Dias, que será o próximo líder parlamentar do PS – falou na mesma linha, puxando pelo PS “radicalmente democrata” que “combateu o fascismo” e pela fundação do partido na Alemanha, na reta final da ditadura portuguesa. Toque final: a referência ao diálogo que o PS promete manter com todos… da esquerda à “direita democrática”.

Primeiro dia dos deputados da XV Legislatura na Assembleia da República. Leitura do Relatório da Comissão Eventual de Verificação de Poderes dos Deputados Eleitos e Eleição do presidente da Assembleia da República. André Ventura com a bancada parlamentar do Chega Lisboa, 29 de Março de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

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Se André Ventura já abanava a cabeça em desacordo durante boa parte da intervenção de Santos Silva, fez o mesmo enquanto Brilhante Dias falou. Logo que pôde, disparou em todas as direções, mas especialmente contra o PS e o novo presidente da Assembleia da República, defendendo o seu “nacionalismo positivo”, garantindo que no Chega ninguém tem medo de assumir que “ama a sua pátria” e atacando genericamente o Parlamento, que diz ter “falhado” aos portugueses. No final, a tal referência à Mensagem, de Fernando Pessoa: “Queremos cumprir Portugal”. Enquanto falava, aplausos da bancada do Chega — é a primeira vez que Ventura, antes deputado único, tem palmas a acompanhá-lo e tanto tempo de intervenção disponível — e patadas nas bancadas da esquerda, em vários momentos.

Se o Chega já tinha sido central neste primeiro debate, Ventura não descansou e voltou à carga: quando Santos Silva decidiu dar a palavra aos deputados únicos (agora são os do PAN e do Livre, Inês Sousa Real e Rui Tavares) sem que ninguém se opusesse, Ventura reclamou – “é uma vergonha” – por não ter tido a mesma oportunidade quando era o único representante do Chega, em 2019. Embora o argumento fosse que o PAN e o Livre podem agora falar porque “não fazem mossa”, em rigor na legislatura anterior também a Iniciativa Liberal tinha um deputado único, além do Livre, e não pôde intervir.

No Bloco de Esquerda, mais uma referência aos assuntos que Santos Silva usou para atacar o Chega, embora através do tema da guerra na Ucrânia, que não quis deixar passar. “O imperialismo vem de mão dada com nacionalismo”, avisou o líder parlamentar repetente, Pedro Filipe Soares. Já Rui Tavares aproveitou o tempo cedido por Santos Silva para dois objetivos semelhantes: por um lado, para atacar as “zero propostas que Ventura tem para oferecer aos portugueses do presente”, citando desta vez Fernando Pessoa para falar da representação individual do Livre (“Somos do tamanho que vemos”); por outro, para defender a Ucrânia e uma Europa “capaz de combater qualquer imperialismo, venha de onde venha.

O PCP ainda começou o discurso, dirigindo-se a Santos Silva, lembrando também os comunistas e democratas que lutaram contra a ditadura. Mas a nova líder parlamentar, Paula Santos, preferiu depois concentrar-se em tecer avisos sobre “as habituais tendências de abuso das maiorias absolutas”, dirigindo-se a Santos Silva – que foi ministro de José Sócrates no tempo da primeira maioria absoluta do PS. De resto, os comunistas refeririam as dificuldades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida e os baixos salários – tudo assuntos que fazem parte do primeiro lote de propostas que o PCP, preocupado em manter a sua influência ao lado de um PS absoluto, já apresentou, passado apenas umas horas da tomada de posse.

Também no sentido da vigilância à maioria absoluta falariam a Iniciativa Liberal – que prometeu “escrutínio máximo e oposição construtiva” pela voz do novo líder parlamentar, Rodrigo Saraiva – e o PSD: com maioria absoluta, insistiu o líder cessante, Adão Silva, “não há desculpas para não se fazerem reformas estruturais”. A exigência viria, no entanto, em tom cordial – o próprio Adão Silva frisou que já conhece bem Santos Silva e até sente por ele “estima” – e com desejos de bom mandato.

Os primeiros projetos a entrar

O Livre entregou logo no primeiro dia as duas primeiras propostas da nova legislatura: uma para declarar “Vladimir Putin responsável por crimes de guerra” e outra a “combater a pobreza energética e o desconforto térmico no país”. A guerra na Ucrânia vai, assim, ser tema no plenário já no arranque da legislatura.

Primeiro dia dos deputados da XV Legislatura na Assembleia da República. Constituição de Mesa Provisória e Apresentação e votação do Projeto de Resolução Rui Tavares do Livre Lisboa, 29 de Março de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Rui Tavares conseguiu finalmente a eleição, depois de o Livre ter ficado sem representação devido às polémicas com Joacine Katar Moreira

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A esquerda, preocupada com a perda de influência que pode sofrer numa legislatura de PS absoluto, fez por marcar o dia e não perdeu tempo a apresentar as suas primeiras propostas. No caso do Bloco de Esquerda, foi só o tempo de sair do plenário logo de manhã: nos Passos Perdidos, o líder parlamentar repetente, Pedro Filipe Soares, anunciou as primeiras prioridades do partido.

Duas são assuntos tradicionais do Bloco, mas que ganham atualidade: por um lado, a revogação do sistema de vistos Gold, que o partido tem recuperado no contexto da guerra na Ucrânia, para castigar os oligarcas russos; por outro, a despenalização da eutanásia, que ficou pendurada no Parlamento depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter voltado a devolver o diploma sem o promulgar. A terceira passava por regressar ao modelo dos debates quinzenais.

O PCP esperou mais umas horas e depois do almoço fez o mesmo: convocou uma conferência de imprensa com a líder parlamentar Paula Santos e a deputada Alma Rivera e voltou à carga com uma série de propostas sobre Trabalho e salários – muitas das mesmas que levaram à rutura com o PS na última legislatura. Entre estas, o aumento do salário mínimo para 850 euros, ao mesmo ritmo que o aumento dos salários na administração pública; o reforço dos direitos dos trabalhadores noturnos e por turnos; e o fim da caducidade da contratação coletiva. No entanto, com o PS com 120 de 230 deputados na Assembleia da República, é improvável que essa agenda avance – ainda menos ao ritmo que o PCP pretende.

Outro tema que terá abordagem certa nesta legislatura é o regresso dos debates quinzenais com o primeiro-ministro. Já há projetos entregues, da Iniciativa Liberal e do Bloco de Esquerda, por exemplo, e o PS admite estar disponível para “revisitar o tema”. O futuro líder parlamentar do PS, Eurico Brilhante Dias, disse haver espaço para “aperfeiçoar” o modelo de debates quinzenais, ao qual aponta como debilidade o “grau de confrontação”.

No texto do projeto que entregou no Parlamento, a IL considera que o fim destes debates — aprovado na legislatura passada num acordo PS/PSD — fez “retroceder mais de 20 anos no que toca ao escrutínio parlamentar do Governo”. Já Pedro Filipe Soares do BE diz que o regresso dos quinzenais “já era importante e necessário na legislatura anterior, mas torna-se imprescindível” até para o Governo provar a sua própria “disponibilidade para o diálogo”.

O que ficou adiado (por agora)

Muita coisa. A eleição dos vice-presidentes ficou apenas para esta quinta-feira apenas, confirmou a primeira reunião da conferência de líderes, com a principal razão evocada a ser a necessidade de ter o quadro parlamentar estabilizado, depois das saídas do anterior Governo e entradas no novo que tenham implicações na bancada parlamentar do PS. Assim, só depois da tomada de posse, agendada para esta quarta-feira, é que o quadro ficará mais certo, com figuras como Ana Catarina Mendes a sair para assumir a pasta dos Assuntos Parlamentares no Executivo e, em sentido inverso, Tiago Brandão Rodrigues a deixar a Educação para assumir o mandato de deputado, bem como Alexandra Leitão, que deixa (a contragosto) o Governo onde era ministra da Modernização do Estado e Administração Pública.

Primeiro dia dos deputados da XV Legislatura na Assembleia da República. Leitura do Relatório da Comissão Eventual de Verificação de Poderes dos Deputados Eleitos e Eleição do presidente da Assembleia da República. Paulo Mota Pinto e Rui Rio Lisboa, 29 de Março de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Rui Rio só chegou da parte da tarde

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A eleição dos vices é um momento que se aguarda algo tenso, tendo em conta as candidaturas que serão apresentadas pelos grupos parlamentares do Chega e da Iniciativa Liberal. Os novos vices precisam de maioria para serem eleitos, com a Constituição a definir que as quatro maiores forças políticas têm o direito a propor um nome para o cargo. A votação é de voto secreto em urna e a maioria de esquerda não deverá deixar passar os candidatos, nomeadamente o do Chega, que já se sabe que será Diogo Pacheco Amorim. Mas esse é um capítulo que fica para o próximo plenário, adiando a primeira grande polémica da legislatura por uns dias.

Já o programa de Governo dará entrada no Parlamento dia 1 de Abril (próxima sexta-feira) e será discutido na semana seguinte (nos dias 7 e 8).

E se o vice do Chega for chumbado? A lei, a prática e como o Parlamento está imune a um impasse

As reuniões das bancadas parlamentares do PS e PSD também só se realizam mais adiante. No caso socialista, o entendimento é o mesmo: aguarda-se a estabilização do grupo parlamentar (entenda-se: acabem as entradas e saídas do Governo) para avançar com esta votação que, assim, não acontecerá antes da tomada de posse do Governo.

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