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ANA MARTINGO/OBSERVADOR

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BE. Os equilíbrios internos, a geração geringonça e as saídas de peso

Geração que vem da troika e geração da geringonça continuam a ocupar linha da frente no Parlamento, mas listas do Bloco também trazem renovação. E saídas importantes para tentar enraizar mais o BE.

[Este artigo faz parte da série de nove trabalhos “Os candidatos vistos à lupa” que o Observador irá publicar até ao dia das eleições]

Um mix de equilíbrios internos, representação de causas, apresentação de caras novas – e saídas necessárias para ajudar a enraizar o partido no terreno, fora dos holofotes do Parlamento e dos jornais. É esta a receita que o Bloco usa em 2022, vinte e três anos depois da fundação – e uns quantos depois da diluição das correntes originais do partido – para construir as listas e escolher os nomes que têm mais hipóteses de chegar ao Parlamento.

Quando o Bloco foi fundado, com base nos três partidos que os fundadores representavam (UDP, PSR e Política XXI) a organização era diferente e se há resposta que se ouça no partido é que este é um tempo pós-correntes, ou não fosse a própria Catarina Martins uma líder que se filiou originalmente no Bloco, já sem associação a qualquer um dos partidos de base.

Mas essa divisão, mesmo que menos evidente, ainda existe: grande parte dos nomes mais conhecidos associados à UDP de Luís Fazenda encontram-se agora na tendência Esquerda Alternativa, com grande peso no grupo parlamentar (Pedro Filipe Soares, Joana Mortágua, Isabel Pires, Moisés Ferreira ou a semi-estreante Leonor Rosas são exemplos). Do lado do grupo da Rede Anticapitalista, associada sobretudo a Jorge Costa (que está de saída e dedicado aos deveres da “construção partidária) juntam-se mais alguns nomes, de Bruno Maia a Ricardo Vicente.

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Fora deste equilíbrio fica, no entanto, a tendência que representa a maior parte da oposição interna no Bloco: a Convergência. Numa lista que traz poucas novidades entre os nomes considerados elegíveis face a 2019, não há qualquer espaço para os opositores da linha da direção atual. É, aliás, daí que surge a maior polémica do processo das listas, centrada nas escolhas de Santarém, onde a Mesa Nacional preferiu, tanto em 2019 como agora, impor o nome de Fabíola Cardoso a Ana Sofia Ligeiro, votada pela distrital e associada à Convergência. Sem Ligeiro, a participação dos opositores de Catarina Martins nas listas, que já vinha sendo apagada, fica reduzida a zero.

Entre as poucas novidades que a lista traz, há um sinal de renovação – a promoção de Leonor Rosas, jovem deputada municipal, a lugar elegível em Lisboa – e dois destaques dados a nomes a que valerá a pena dar atenção no futuro: os de Bruno Maia, número três por Lisboa, e o já bem conhecido José Gusmão, cabeça de lista por Faro.

As (poucas) novidades de uma lista de continuidade

Com apenas 21 anos, Leonor Rosas habilita-se a tornar-se uma das deputadas mais jovens do Parlamento e a mais jovem da bancada do Bloco. Não é uma novidade absoluta, já que em 2019 tinha sido candidata por Lisboa, mas num longínquo 14.º lugar; desta vez passa diretamente ao quinto. A ascensão meteórica não acontece apenas nas listas de deputados: no último ano, a filha do fundador Fernando Rosas passou a fazer parte da Mesa Nacional do partido, da Comissão Política – um dos órgãos mais restritos de decisão – e foi ainda eleita deputada municipal em Lisboa.

A tirar mestrado em Antropologia e dedicada ao tema do colonialismo e memória histórica – uma das bandeiras em que o Bloco tem apostado – tem uma vantagem relevante para o partido: o envolvimento na organização dos Jovens do Bloco. Os bloquistas querem continuar a apresentar caras novas, manter a ligação ao braço jovem do partido e a esse eleitorado, e é também assim que justificam a subida de Rosas nas listas.

Debate para as Eleições Legislativas com os cabeças de lista de cada partido para Lisboa. Bruno Maia, Bloco de Esquerda (BE) Universidade Nova, Lisboa 13 de Janeiro de 2021 TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Bruno Maia vem das listas do Porto diretamente para o terceiro lugar em Lisboa

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Bruno Maia também entra na lista de Lisboa, num lugar mais seguro – o terceiro, fazendo a vereadora Beatriz Gomes Dias descer um em relação a 2019 – e vindo diretamente de Gondomar, onde foi candidato autárquico em outubro, e das listas do Porto, onde estava em quinto lugar em 2019. A promoção às listas do círculo da capital, e logo em terceiro lugar, é uma novidade para fora, embora não para quem está no Bloco, uma vez que o médico é um dos nomes mais conhecidos dentro do partido e no ativismo na sua área, em defesa do SNS – uma bandeira crucial do BE em que fará companhia ao já deputado Moisés Ferreira (mas também tem ligação a outras causas, tendo sido organizador da 1ª marcha do Orgulho LBTI+ do Porto, em 2006).

Em 2019 apresentava-se no Twitter como “neurologista, esquerdalho, nadador, gay, ateu, portista”, agora atualiza a biografia para “médico neurologista e intensivista em exclusividade voluntária no SNS”, uma experiência que certamente evocará na bancada – e que será um dos pontos principais em que o Bloco tentará centrar um acordo com o PS, se tiver essa hipótese. A visibilidade não será por acaso: nos corredores comenta-se que é uma das caras em que a direção quererá apostar no futuro.

A outra novidade não é bem uma novidade: José Gusmão, economista e irmão do ex-bloquista Daniel Oliveira, já tinha sido deputado (2009) e salta do palco do Parlamento Europeu, para onde foi eleito em 2019 e onde já trabalhava como assessor para Miguel Portas e Marisa Matias, para a política nacional, assumindo um protagonismo maior com esta candidatura a encabeçar a lista de Faro.

Depois de acumular experiência no Parlamento Europeu, Gusmão quer voltar à Assembleia

LUSA

Se for eleito e tudo seguir a ordem natural, o tétris bloquista pode mexer-se em várias frentes: com Gusmão a sair de Bruxelas, o lugar passaria para o candidato seguinte, que é Sérgio Aires, atual vereador na Câmara do Porto. Ora se Aires assumisse o lugar em Bruxelas, o seu lugar na vereação do Porto passaria para a segunda candidata – a deputada Maria Manuel Rola, que ‘saltou’ das listas – e o Bloco teria um problema resolvido (ou vários).

A geração troika e a geração geringonça

Em 2009, a bancada do Bloco parecia outra. Estávamos no segundo Governo de José Sócrates, a sombra da crise começava a pairar e no Parlamento entravam nomes que conviveriam, ainda, com os fundadores Francisco Louçã e Luís Fazenda na bancada, mas que poucos anos depois assumiriam os comandos do futuro do Bloco – era o caso de Catarina Martins e Pedro Filipe Soares e, mais discretamente, Jorge Costa, além de José Manuel Pureza, que assumiria entretanto o cargo de vice-presidente da Assembleia da República. Passaram os PEC, passou o pico da crise e a traumática eleição de 2011, em que a bancada perdeu metade dos assentos.

Foi então que chegou a eleição de 2015, e com ela a oportunidade de voltar a renovar a bancada. Nascia assim a geração geringonça: uma série de jovens quadros que eram trazidos para a linha da frente do partido e do Parlamento com a responsabilidade (completamente nova para o partido) de assumirem dossiês em que o Bloco tinha capacidade para influenciar a governação.

Nomes que negociaram geringonça continuam à frente do partido. Na foto, Pedro Filipe Soares, Mariana Mortágua, Catarina Martins e Jorge Costa

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O leque é conhecido: é nesse ano que entram Joana Mortágua (que chegou a ser presidente da UDP, já enquanto associação e não partido, e se especializou nas questões da Educação, sendo também uma das poucas vereadoras do partido, em Almada); Isabel Pires (era operadora de call center, uma experiência valiosa para trazer à pasta da precariedade, e foi subindo no partido, encabeçando este ano a lista para a Assembleia Municipal de Lisboa) ou Moisés Ferreira (cabeça de lista em Aveiro, dirigente e responsável pela crucial pasta da Saúde, tendo ajudado a negociar a Lei de Bases da Saúde).

Joana tinha então 29 anos, Isabel 25, Moisés 30. José Soeiro já tinha entrado há muitos anos, em 2005, quando tinha apenas 23; mas assumia renovado protagonismo negociando as pastas do Trabalho e da Segurança Social, em que se deram muitos dos nós nas negociações com o Governo.

É também nesta leva que Mariana Mortágua é pela primeira vez eleita de forma direta: já tinha entrado para a bancada em 2013 em substituição de Ana Drago, provocando a insatisfação de alguns militantes – cem juntaram-se para escrever uma carta à direção depois de esta ter decidido ‘saltar’ nove lugares para dar o assento a Mortágua. O critério (o facto de a estreante ser economista) era “tecnocrata”, alegavam; a área estava a ser descurada desde a saída de Louçã, respondia a direção.

Mariana Mortágua e Jorge Costa, sempre presentes nas negociações com o Governo

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Nos anos seguintes afirmar-se-ia no Parlamento, em grande parte dada a prestação na Comissão Parlamentar de Inquérito ao BES, e no partido, onde pertence aos órgãos mais restritos. Há, aliás, um grupo muito reduzido de deputados com assentos tanto na Comissão Política como no Secretariado do partido: são eles Catarina Martins, Joana Mortágua, Mariana Mortágua e Pedro Filipe Soares.

Na fase da geringonça, foram os quadros mais destacados: Mariana Mortágua, Jorge Costa, a própria Catarina Martins, Pedro Filipe Soares – que chegou a desafiar a liderança em 2014, quando Catarina acabou por assumir a coordenação do Bloco, dado o fracasso do modelo bicéfalo com João Semedo –, Moisés Ferreira ou José Gusmão estiveram envolvidos nas primeiras negociações. E Orçamento após Orçamento, Mortágua, Pedro Filipe e Jorge Costa mantiveram sempre as conversações com o Governo.

Os distritos (des)alinhados

Se as duas correntes dominantes – as que se pacificaram depois do embate de 2014 entre Catarina e Pedro Filipe – se organizaram e se mostram alinhadas, o mesmo não se pode dizer da tendência Convergência, a mais conhecida corrente de oposição no partido. Ora esta não aparece nas listas, e não é por não ter tentado: em vários distritos estes militantes apresentaram listas próprias e num dos casos em que o Bloco costuma conseguir eleger representação – o de Santarém – até ganharam na distrital.

Se a história tivesse ficado por aqui, Ana Sofia Ligeiro, a responsável por apresentar a moção E, da convergência, na última convenção, seria hoje candidata a deputada. Mas a Mesa Nacional não confirmou a escolha e, tal como tinha acontecido em 2019 (dessa vez contra Carlos Matias, outro crítico, escolhido pela distrital) impôs o nome de Fabíola Cardoso.

Alinhada com a direção, a deputada é atacada pelos críticos internos (que fizeram queixa do processo) mas defendida pela cúpula, mais uma vez com o argumento da representação dos ativismos do Bloco. Neste caso, a professora é apresentada como uma referência do movimento LGBT e até uma “militante histórica da causa”, sendo de notar a sua luta contra as chamadas terapias de conversão.

Braga era o outro distrito que costumava ser representado por um crítico interno, o ex-deputado Pedro Soares, que saiu em 2019, já depois de se ter visto envolvido em mais um caso de suspeitas de moradas falsas (entretanto arquivado). Hoje, Soares é um crítico vocal da direção e de um posicionamento do Bloco que considera demasiado subordinado ao PS; mas só a partir de fora do Parlamento, sobretudo nas plataformas da Convergência. O cabeça de lista pelo distrito passou a ser José Maria Cardoso, militante desde a fundação, professor e dirigente do Sindicato dos Professores do Norte – mais uma vez, uma ligação que interessa ao Bloco manter – e presidente da Comissão do Ambiente no Parlamento.

As saídas “construtivas”

Já não constam das listas, mas a sua saída é, só por si, notícia: os dois casos mais notórios são Jorge Costa, muito associado a Francisco Louçã, e Fabian Figueiredo, da corrente liderada por Pedro Filipe Soares, que costumavam fazer parte da lista de Lisboa (o primeiro está no Parlamento desde 2009, o segundo esteve pouco tempo, para substituir Pedro Filipe Soares durante a sua licença de paternidade). Ambos fazem muito trabalho de bastidores e é mesmo essa a ideia de se retirarem das listas: é preciso dedicarem-se à “construção partidária”, como justificou Jorge Costa.

Traduzindo: com uma direção muito concentrada na Assembleia da República, como se vê pelo número de dirigentes incluídos nas listas (16 dos elegíveis fazem parte da Mesa Nacional, oito da Comissão Política e quatro do Secretariado), foi preciso alocar forças à intervenção do partido fora do Parlamento e dentro dos movimentos sociais, do mundo do trabalho e até do próprio debate interno.

São as dimensões que poderão ter ficado especialmente descuradas nos anos da geringonça, em que o Parlamento era central, e de que o partido quer agora cuidar, meses depois de ter sofrido um grande rombo nas autárquicas e mostrado que continua a sofrer de um problema crónico de implantação pelo país.

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