Viseu estava em alerta laranja para Rangel antes da campanha. O líder distrital, Pedro Alves, tinha apoiado Rui Rio num primeiro momento, mas na batalha do impeachment fez parte do grupo dos cinco que tentaram pôr a destituição em marcha. Independentemente disso, o distrito é Pê-pê-dê. Assim, com as letras todas e por isso espera-se sempre apoio nas ruas.
O assunto pareceu ficar arrumado logo à hora de almoço no concelho onde nasceu Aquilino Ribeiro, em Sernancelhe, com mais de 500 pessoas a esperar Rangel (e o almoço, que era porco no espeto no pão). Independentemente do que motivou as pessoas nota-se que a distrital de Viseu mobilizou gente, com a ajuda do presidente da câmara, Carlos Santiago (que também é PPD). No discurso, Rangel foi curto, direto e voltou a visar Pedro Marques na perspetiva de tudo o que considera que fez mal e que afetou as pessoas do interior e os agricultores. Ou seja: precisamente a plateia que tinha pela frente.
O evento correu-lhe bem pela produção, mas também pela espontaneidade. Agostinho Costa, homem da concertina de 73 anos, fez questão de cantar uma quadras ao “amigo” Paulo Rangel. A visita ao hospital também foi útil para Rangel: conseguiu expor fragilidades no Serviço Nacional de Saúde, que são sempre imputadas ao Governo.
A arruada, o último evento do dia antes dos telejornais da noite, é que foi frouxa. Rangel não é um animal de rua, mas tem várias arruadas programadas. Já na sexta-feira de manhã volta a uma feira, apesar de toda a pancada que levou em peças jornalísticas pela falta de jeito a lidar com pessoas, a prolongar a conversa ou a criar empatia. Na verdade, Rangel só conseguiu um verdadeiro “Rangelistão” em Sernancelhe, mas o balão esvaziou-se pelas ruas de Viseu ao final da tarde. Foi o frio, diz o candidato. O partido mobiliza mais dentro de salas.
“Não se preocupe que nós ainda não saímos de Viseu. Aguardem para ver, não faria era perguntas antes do tempo”
Rangel disponibiliza-se sempre para falar aos jornalistas. A irritação do dia da Pampilhosa parece ter ficado definitivamente para trás. Antes de se ligarem as câmaras e os gravadores em Viseu, os jornalistas comentavam que iam só fazer algumas perguntas. Ao que Rangel retorquiu: “O problema são as respostas, que podem ser mal dispostas”. Depois, acabou por responder com fair play. Sobre a ausência de Fernando Ruas, respondeu de forma espirituosa, como quem diz: calma, que ele ainda vai aparecer. Ou seja: a presença estava prevista para o evento da noite.
Alto. A mobilização que o PSD conseguiu em Sernancelhe a uma quinta-feira ao almoço, com mais de 500 pessoas num dia de trabalho, mostra que a estrutura está empenhada em ajudar Paulo Rangel a ter um bom resultado. Isto tendo em conta que o distrito é Viseu, que é rotulado como anti-Rio (além de Pedro Alves, o homem que acompanhou Rangel pelas ruas de Viseu, Almeida Henriques, foi mandatário de Santana Lopes nas diretas). A distrital pode não estar com Rio, mas parece estar com Rangel (mesmo que a arruada na cidade de Viseu tenha sido fraca). À noite, voltou a encher a Aula Magna do Instituto Politécnico de Viseu.
Baixo. É certo que europeias nada têm a ver com legislativas (em que Passos tinha uma rua à pinha), mas também é certo que o sucesso desta arruada é inferior à de há cinco anos. Quando o PSD é governo, a mobilização é mais fácil, para além de que em 2014 havia CDS. Ainda assim, numa cidade que outrora era a sede de um cavaquistão que não virava a cara ao PSD, parece haver muita indiferença a uma eleições que são importantes para o partido. Rangel provou um doce na pastelaria Amaral, o Viriato, que nunca tinha provado, mas o próprio confessou que a arruada “soube a pouco”.
Agostinho Costa, tem 75 anos e toca concertina há 55. Faz “festas, casamentos e batizados”, mas foi a figura de destaque do almoço com militantes do PSD em Sernancelhe. Ao Observador confessou que não é militante do PSD, mas do CDS há muitos anos: “Ainda tenho um cartão de militante comigo, mas houve coisas que me deixaram chateado aqui no concelho“.
Agostinho perguntou a Paulo Rangel se ia a Sernancelhe para “trazer alguma coisa ou buscar” e comenta essa abordagem de forma enigmática: “Ele sabe a que me quero referir, porque farto de aldrabices andamos nós. Se não me dissesse nada a candidatura de Rangel, nem sequer viria.” Foi na quarta-feira à noite que o presidente do rancho folclórico de Sernancelhe lhe pediu “para dar um salto” ao evento do PSD e Agostinho “largou o que tinha para fazer” para ir. Como sempre vai.
O militante do CDS diz que gosta “muito do Nuno Melo” porque lidou “com ele muitos anos” e esteve com ele em vários comícios, mas também com “Lobo Xavier e outros assim.” Apesar de achar Melo um “bom sujeito”, explica que “Paulo Rangel tem outra motivação e outras condições”.
Sobre a União Europeia diz que “foi boa” porque ao contrário dele — que andou décadas a trabalhar entre França e Portugal — os filhos agora “não precisam de andar com a mesma dor de cabeça, de ter de passar fronteiras, de ir por estradas ruins e trocar escudos por pesetas e francos.”
Por outro lado, Agostinho vê como negativa a inflação provocada pelo euro: “50 escudos, passou a valer 50 cêntimos. 100 escudos, passou a valer um euro. Isto não se ajusta de maneira nenhum. Um euro vale duzentos paus, isto não é justo”.
No fim da pequena entrevista, Agostinho Costa fez uma quadra para o Observador:
A quadra de Agostinho Costa, o homem da concertina, para o Observador.#Europeias2019 #EE2019 pic.twitter.com/9FBeg3MQWM
— Observador (Eleições) (@OBSEleicoes) May 16, 2019
Sernancelhe foi uma espécie de “Rangelistão” com centenas de militantes a apoiarem o candidato do PSD. Rangel sentiu-se motivado e isso notou-se na forma como interagiu com as pessoas. O ambiente era descontraído e natural. Naquele pavilhão, tudo o que podia correr bem, correu bem.
O dia foi particularmente duro em distâncias. O primeiro esticão foi de Lisboa a Moimenta da Beira para a visita a uma cooperativa de vinho: 347 quilómetros, que correspondem a quase quatro horas (agravadas por trânsito lento à saída de Lisboa pela manhã). Depois disso foram mais 17 quilómetros até Sernancelhe. Seguiu-se Viseu (mais 53 quilómetros) onde foram o resto das ações do dia. O dia 4 teve assim mais 417 quilómetros, o que dá para ultrapassar a barreira dos mil quilómetros no total acumulado. Mais precisamente, 1004 quilómetros acumulados desde o início do período oficial de campanha.