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Carlos César com António Costa, nos tempos da JS, em 1978
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Carlos César com António Costa, nos tempos da JS, em 1978

Carlos César com António Costa, nos tempos da JS, em 1978

Carlos César: "Não estou na política por conta de António Costa"

Carlos César faz 60 anos este domingo. O líder da bancada do PS é um dos mais próximos de Costa, seu amigo há 40 anos. O antigo presidente do Governo açoriano abre o livro nesta entrevista de vida.

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Carlos César senta-se para a conversa com o Observador na Casa dos Açores, em Lisboa, e começamos: este domingo chega a uma data redonda, 60 anos. O socialista encolhe-se e faz um esgar: “Que horror!”. Convive mal com a idade? “Este ano passo, para o ano faço 61”. A entrevista realizou-se esta sexta-feira, numa manhã sem trabalhos parlamentares e horas antes de embarcar para mais um fim de semana nos Açores, a sua terra, onde as coisas são “mais lentas e mais sentidas”. Está engripado, mas lá vai desfiando memórias, durante a conversa de mais de hora e meia. Conta como já aos 11 anos participava nas tertúlias anti-regime, nos Açores, com Jaime Gama, Medeiros Ferreira e o seu irmão Horácio. Provocava a PIDE, que o admoestava: “Olha que eu vou contar ao teu pai”. Também foi guarda-redes de futebol, federado, mas sem grande sucesso.

Fala da mulher, Luísa, com quem casou dois meses depois de se conhecerem. Rápido? E ainda tiveram de esperar por Carlos fazer os 21 e ser maior de idade. E claro, dos tempos do Governo Regional (e das polémicas sobre os empregos da mulher na administração regional) e dos tempos mais recentes, ao lado do seu amigo de 40 anos, com quem diz nunca se ter zangado, António Costa. Está em Lisboa “forçado” e sempre que pode corre para os seus Açores.

“Gosto de fazer compras, de conversar com as pessoas, de parar. Aqui em Lisboa se uma pessoa para, o carro atrás apita”

Nos últimos 20 anos da política nacional sempre que se falou do seu nome falou-se de Açores. Agora tem estado mais tempo por Lisboa. Já se habituou ao continente?
Vivi durante alguns anos em Lisboa, mas em boa verdade esta permanência desregula aquilo que tem sido a minha vida nos últimos anos. Em todo o caso, pelas funções que desempenhei durante todo o tempo em que me envolvi na atividade política, que é praticamente todo o meu tempo ativo, nunca estive propriamente num único lugar. E estar nos Açores é estar algures numa das nove ilhas. Portanto a minha movimentação pessoal foi sempre feita com base nessa mobilidade constante. Nunca estive em casa mais do que dois ou três dias consecutivos quando fui presidente do Governo.

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Mas é diferente de estar em Lisboa…
É bastante diferente e gosto muito mais de estar na minha região do que estar em Lisboa. É indiscutível.

Com que frequência vai lá agora?
Em regra vou às sextas-feiras e regresso às segundas-feiras. Se posso regressar à terça, regresso à terça. Se não posso ir no fim de semana, tenho de me conformar com essa ideia.

Nas sextas é comum vê-lo no Parlamento a sair…
Com a mala maior!

Sim, mas com ar contente, tem essa pressa de ir?
Sim, sinto-me muito bem nos Açores, acho que recupero muito bem desta pressão ao longo da semana aqui em Lisboa, no Parlamento. Além disso, hoje consegue-se fazer a partir dos Açores aquilo que faço cá e não exige presença física.

Do que tem sentido mais falta?
Das minhas coisas e do meu ambiente próprio. Lisboa tem um ritmo diferente. As coisas nos Açores são mais lentas, mais sentidas. É possível fruir cada um dos nosso atos. Eu gosto de ir fazer compras, de conversar com as pessoas, de parar. Aqui se uma pessoa para, o carro de trás apita. Lá se uma pessoa para, o carro de trás aguarda.

Um carro ou uma vaca…
Também! No nosso caso, não tendo a sacralização que tem noutros lugares, é um animal muito respeitável [Risos]

Falou em ir às compras. Cozinha?
Não, faço as compras de casa e isso permite-me conversar com as pessoas. Quando vou com a minha mulher às compras no hipermercado, normalmente, levamos duas horas, duas horas e tal, porque aquilo é também uma espécie de ato social. Paramos aqui, paramos ali, as pessoas conversam. Perguntam sempre: então está cá? Ou levantam questões sobre a sua vida pessoal ou profissional e nós tomamos nota. Vou sempre com uma esferográfica que não se destina apenas a riscar o que já comprei, invariavelmente é para tomar notas de coisas que tenho de fazer.

Cá é assim? Reconhecem-no?
Sim, hoje sim. Não acontecia isso há um ano, com essa frequência.

Enquanto foi presidente do Governo Regional, não acontecia?
Havia, mas claramente menor. Agora parece-me um pouco generalizado.

O que lhe dizem?
Bem, vou omitir as partes com encómios… Umas pessoas estimulam-me na minha atividade, mas também oiço piropos negativos, que são próprios destas funções. Vivo com elas, sei que é assim. Ao longo da minha vida política atravessei momentos mais e menos agradáveis e nada do que hoje acontece é pior ou melhor do que já aconteceu.

"Em 1980, o Dr. Mário Soares chamou-me ao gabinete e comunicou-me, no seu tom muito próprio, que a partir de outubro eu iria para os Açores"

As suas passagens por Lisboa foram sempre muito breves. Veio estudar, mas ficou pouco tempo. Por que é que isso foi sendo assim?
Vim para a Faculdade de Direito em 75/76 e, em 1980, o dr. Mário Soares chamou-me ao seu gabinete e comunicou-me, no seu tom muito próprio, que eu a partir do mês de outubro seguinte iria para os Açores. Disse-me que era importante, porque o PS-Açores tinha uma situação de grande fragilidade à época, que eram precisas pessoas com experiência e a formação que eu entretanto tinha adquirido. Disse que já tinha conversado com aqueles rapazes dos Açores e, portanto, eu ia fazer parte da lista de candidatos à Assembleia Legislativa Regional. Ainda invoquei que tinha casado há um ano e que tinha outras ocupações e que estava a concluir o curso. Mas ele disse: “Ah isso trata-se depois, vamos tratar da transferência da sua mulher, mas tem de ir porque estamos em situação de dificuldade nos Açores e precisamos de si”.

Nessa altura, quando cá esteve para estudar, tinha a ideia de ficar em definitivo?
Tinha inserção local e trabalhava já com algumas pessoas e tinha até perspetivas de integrar uma lista de candidatos, aqui por Lisboa, à Assembleia da República. Já tinha aliás sido convidado para isso. Mas achei que era um bom desafio, feito por Mário Soares nessas circunstâncias. O Jaime Gama também insistiu comigo. Essa é a história do meu regresso antecipado aos Açores. O certo é que nunca defini para a minha vida viver no continente e em Lisboa em particular. Gosto dos Açores, pertenço aos Açores, faço parte dos Açores.

Em 1978, a discursar no Congresso da JS

Então foi quase uma salvação aquele desafio.
Foi uma antecipação e até um pouco precipitada, mas fi-lo com sentido de militância muito próprio da época. Abandonar um curso, desenvolver mais atividade política no meio universitário do que propriamente estudar é uma coisa muito compreendida à luz dos anos 60. Essas decisões hoje não teriam o mesmo significado. E até pode ser confundido com ociosidade, quando na época era militância.

Foi aí que se aproximou mais do PS?
Sou membro do PS desde 1974. Tive uma curta passagem, antes do 25 de abril, pelo PCP-ML (Marxista Leninista). Tínhamos um pequeno grupo nos Açores que fazia reflexões no laboratório de Química do meu Liceu, com a cumplicidade do contínuo que lá trabalhava. Fazíamos reuniões em que estudávamos marxismo-leninismo e os princípios fundamentais de filosofia do Georges Politzer. Trabalhávamos ao longo do tempo dessa forma, até que um dia fomos descobertos e tivemos de acabar com isso. Até que, a seguir ao 25 de abril, também por influência de Jaime Gama e do meu irmão — que já estavam integrados no PS — e também do Mário Mesquita e do Nuno Godinho de Matos, acabaram por me convencer a aderir ao PS. E então formei a JS nos Açores e iniciei nessa altura uma atividade política nacional, já que era simultaneamente dirigente nacional.

“Tenho [com Costa] uma amizade de quase 40 anos. Não é algo que se possa deixar de lado em nenhuma circunstância”

Veio estudar para Lisboa, mas era também funcionário da JS.
Sim, vim para cá. Um anos depois acabei por ter uma atividade que era remunerada na JS, a tempo parcial. Como assumi responsabilidades de coordenação na JS em todas as instituições de ensino no país, isso começou a implicar um envolvimento muito forte e durante todo o tempo, com prejuízo da minha formação académica. Aliás, na época, conhecia muito pouco as instituições do ensino secundário, que devia também coordenar no plano da nossa intervenção política. Foi-me sugerido por Arons de Carvalho que havia um rapaz, um jovem, que podia ajudar.

Que era António Costa.
Era o António Costa, que passou a trabalhar comigo também, veio para o secretariado nacional, ficou como secretário nacional para o Ensino Secundário e eu para as questões do Ensino Superior. Aliás, foi a partir daí que nos conhecemos e ficámos a trabalhar juntos.

Deram-se logo bem?
Sim, tivemos em alguns congressos em listas diferentes, mas do ponto de vista pessoal demo-nos sempre bem. Temos uma amizade de quase 40 anos, o que não é propriamente algo que as pessoas possam deixar de lado em nenhuma circunstância, mesmo que tivéssemos divergências.

Em algum momento sonharam 40 anos depois estarem como estão: número um e número dois do PS?
Creio que não, não pensei. Estava mais concentrado no plano político, na hipótese que também me parecia muito remota, de os Açores deixar de ser uma região governada pelo PSD e poder ser governada pelo PS. Confesso que nessa dimensão não excluí a hipótese de ser eu próprio a conseguir fazê-lo e, nessa medida, essa ambição concretizou-se.

"Sou necessariamente explosivo"

Tem um traço comum com António Costa que é o feitio. Há até uma descrição feita pelo seu irmão, num perfil antigo sobre si, em que ele diz que é “desnecessariamente explosivo”. Ainda é assim?
Eu diria que sou necessariamente explosivo. Reajo de acordo com as circunstâncias e na medida das circunstâncias e há ocasiões onde se tem de ter maior firmeza e também há ocasiões, ora no plano retórico, ora nos outros planos, é necessário fazer uma acentuação das coisas e dos factos. Pode parecer uma maior irascibilidade no momento, uma rudeza noutro…

O que o faz explodir?
Pouco.

Para o seu irmão o descrever assim não deve ser pouco.
Não, as coisas têm de ter a resposta que devem ter. Se são explosivos comigo, eu sou explosivo com eles.

Então deve ter sido animado, com António Costa, nestes 40 anos…
Por acaso, tenho de lhe confessar que não tenho memória de nos termos zangado uma única vez. Por exemplo, ainda há pouco ele me telefonou de Madrid sobre alguns acontecimentos destes últimos dois, três dias, e não… temos uma relação de grande normalidade, mesmo quando há coisas que não correm bem.

Como nestes últimos dias…
Sabe, tenho uma relação com as pessoas que é esta: com António Costa, agora como primeiro-ministro e líder do PS, a minha intervenção é dar a minha opinião e não tenho a preocupação de apoiar a opinião de outros, pelo menos no plano interno, não tenho de o fazer e muito menos junto dele. Ele sabe que aquilo que lhe digo é aquilo que penso e não me faço especialmente cerimonioso nisso. Fico muito satisfeito por ele seguir, na maior parte das vezes, aquilo que eu lhe digo quando se confronta com uma opinião diferente.

“O ministro das Finanças teve um problema comunicacional” na questão da CGD

Ele ficou incomodado com a sua opinião pessoal sobre as declarações de património dos administradores da Caixa?
Nesse caso preciso não, porque ele teve a mesma opinião, quase em simultâneo.

Já estavam concertados quando falou na quarta-feira?
Teve a mesma opinião.

E desconcertados com o ministro das Finanças.
Creio que o ministro das Finanças, nesta circunstância em especial, teve inicialmente um problema comunicacional que não creio que tenha sido relevante. O país não vive de divergências sobre a declaração de rendimentos de um determinado funcionário público. Não são as questões importantes do país. Quando olho para o caso da Caixa Geral de Depósitos, a minha preocupação é se o plano de recapitalização será um plano bem-sucedido, se as negociações com Bruxelas e todos os agentes envolvidos permitirão sucesso e sustentabilidade no banco público. Isso é que é verdadeiramente importante. Agora quanto é que os senhor ganha e se a declaração de rendimentos é entregue ou não, tem uma relevância no plano ético e da confiança em geral dos portugueses nas instituições e nas pessoas, mas não é o cerne da questão.

É tão importante que referiu essa lei, que está feita por alguma razão, porque é necessária essa transparência dos gestores públicos.
Porque é boa essa transparência.

E necessária?
Como é boa é sempre necessária.

Ao lado de Mário Soares, numa reunião do Conselho de Estado

Voltemos ao momento em que é convidado por Mário Soares para ir orientar o PS-Açores.
Isso, aliás, não correu muito bem… Fui em 1980 para os Açores, tinha 24 anos, foi a minha primeira eleição como deputado e não fui imediatamente eleito. Fui em quinto lugar da lista, o PS tinha eleito cinco deputados na anterior legislatura, mas nessa ocasião elegeu só três e foi justamente o Daniel de Sá, um escritor açoriano conhecido, que me telefonou e disse-me para não regressar a Lisboa — eu já estava a preparar o meu regresso — porque me daria o seu lugar. Ele depois escreveu que eu tinha futuro, que era essencial ao PS e chegava lá. Assim foi, acabei por ficar. O percurso até 84 foi vivido pelo PS um pouco como o PSD-Açores tem vivido nestes últimos 20 anos: com lideranças muito frágeis, com uma conflitualidade muito impressiva. Nesse período, em 1984, houve também ali uma situação de quase vazio de poder e de liderança no PS e eu assumi a coordenação do partido nessa altura, nesse ano em que se realizaram a eleições. Não fui propriamente candidato à presidência do Governo, sobretudo porque o PS também tinha noção da sua dimensão eleitoral. Era basicamente um partido que se apresentava com a aspiração de ter mais votos. Tinha 27 anos quando tomei esse encargo.

Não o desmotivou? Em 1980 não foi eleito diretamente, em 1984 tem uma pesada derrota, 56% para Mota Amaral e 24% o PS representado por si.
Vinguei-me disso mais tarde.

"Foi uma pena Mota Amaral ter feito algumas sondagens antes de sair... Foi uma pena. Isso [vencê-lo em eleições] ficou por cumprir". 

Não com Mota Amaral como adversário direto.
Enquanto fui líder do PS apanhei todos os líderes que o PSD Açores teve até hoje, inclusive o atual.

Mas a Mota Amaral não venceu.
Sim, foi uma pena Mota Amaral ter feito algumas sondagens antes de sair… Foi uma pena. Isso ficou por cumprir. Mas devo dizer que tive uma belíssima relação com o dr. Mota Amaral que, aliás, tive também ao longo da oposição. Tenho esta minha relação geométrica com a minha situação perante a política açoriana. Estive 16 anos na oposição e 16 no Governo Regional. Mas ao longo desse tempo, apesar de ter uma confrontação política muito forte com Mota Amaral, não deixei de ter uma relação pessoal agradável. Fizemos muitas viagens pelo mundo juntos, no âmbito de algumas atividades institucionais e tenho, ainda hoje, uma excelente relação pessoal.

O que lhe perguntava era se os resultados que foi tendo não o desmotivavam. Tinha interrompido até os estudos para estar ali.
Nunca interpretei que esses resultados tivessem alguma relação com a minha presença ou a forma como me pontuava no PS-Açores. De resto, também não querendo ser imodesto, assumi a responsabilidade efetiva do PS a partir de 1994 e daí por diante nunca perdeu.

Portanto só faz a leitura da história pela parte vitoriosa.
Neste caso, em concreto, faço a leitura a partir do momento em que tenho responsabilidades. Sim, sou parte do insucesso do PS, enquanto membro do PS, mas só assumi responsabilidades a partir de 1994 e essas responsabilidades de liderança é que podem ser contabilizáveis a meu favor ou desfavor.

Em 1980, quando é o pela primeira vez eleito deputado da Assembleia Legislativa dos Açores (o segundo, em pé, a contar da esquerda)

Qual era a sua rivalidade e relação com Martins Goulart, líder depois dessa sucessão de derrotas.
Já tinha sido antes. Entrou e saiu várias vezes. Tive uma relação, em algumas épocas, difícil, noutras de boa colaboração. Em todo o caso o engenheiro Martins Goulart era um homem muito talentoso e com muitas qualidades, mas uma deles não era certamente a da liderança do PS-Açores.

Não era? O que lhe faltava?
Não sei, não é uma coisa de que me recorde. Tivemos melhores e piores resultados ao longo da nossa história eleitoral.

Os vossos interesses sobrepunham-se, Martins Goulart estava no lugar para onde queria ir.
Não creio que as coisas possam ser postas assim. Fui vice-presidente do PS Açores, substitui-o nas suas ausências e quando surgiam problemas, com sentido de preservação do PS-Açores e de capacitação o PS para prosseguir, já que a liderança tinha alguns problemas de estabilidade. Mas isso não é uma coisa que tenha interesse em rever. O meu trabalho foi ao longo do tempo fazer com que o PS Açores fizesse o melhor possível. E quando fui chamado a essa responsabilidade, em 1994, assumi-a por inteiro. O que o PS-Açores foi a partir de 1994 é da minha exclusiva responsabilidade, para o melhor e para o pior.

Para um académico conceituado como Martins Goulart era um problema que não tivesse terminado a licenciatura e a sua vida fosse apenas a atividade política. Nunca pensou em concluir os estudos superiores?
Sim, tive uma ocasião que até posso relacionar com Francisco Louçã. Tem a minha idade e também interrompeu o curso mais ou menos pela mesma altura e depois, quando tive notícias que ele havia recomeçado a sua formação académica, pensei fazê-lo, mas as minhas circunstâncias não me permitiam essa disponibilidade. Foi um tempo que passou, a minha formação foi feita de outra forma, muito intensa.

“Em Portugal há a ideia de que um não licenciado não tem licença para determinadas funções”

O canudo é sobrevalorizado hoje em dia?
No meu caso não é nada que seja nem valorizado nem desvalorizado. Mas há muito essa ideia em Portugal de que um não licenciado não tem licença para determinadas funções, mas não me parece que essa seja uma regra aplicável sem uma observação adequada do que cada pessoa vale.

No meio político ainda existe.
Como sabe Portugal tem esta característica especial em que as pessoas se tratam umas às outras por dr., sr. engenheiro. É uma coisa que não se vê em lado nenhum.

Tratam-no assim?
Sim, durante muito tempo tive esse problema diziam-me muito: “Sôtor como está?” E eu lá ia dizendo: “Não é sôtor, diga senhor deputado ou senhor presidente, qualquer coisa”. E as pessoas respondiam: “Ah sim, senhor dr.”. Bom, deixei de me preocupar com isso. Toda a gente sabia que eu usava da maior franqueza sobre isso, como não podia deixar de ser, de resto.

"Fui presidente do PS porque António Costa insistiu muito"

Não se lhe conhece outra atividade profissional que não a política. Sente que isso é um problema tendo em conta o estigma que existe sobre os políticos de carreira?
Não. Para já, nessa fase inicial em Lisboa, também desempenhei funções numa cooperativa, mas não foi especialmente relevante para mim. E depois quando cessei funções no Governo dos Açores, iniciei uma atividade profissional numa empresa canadiana, que interrompi em função do pedido que me foi feito por António Costa para o ajudar nesta fase. Atualmente, as funções que desempenho, já não estavam no meu horizonte pessoal. Estava satisfeito com a minha atividade profissional.

Mas o que fazia concretamente?
Era conselheiro numa empresa de tecnologias de informação e desempenhava essa função com muito gosto, que me permitia comunicar com pessoas e com um mundo novo e com uma excelência empresarial que desconhecia em parte. Este regresso foi um pouco forçado, mas do ponto de vista pessoal fi-lo e não estou arrependido por isso.

Foi forçado? Não trabalhou para isso durante esse tempo de pousio na política, entre 2012 e 2014? Não houve momentos da liderança do PS de António José Seguro em que fez tudo para haver um líder socialista que não fosse aquele e fosse António Costa, com quem tinha uma ligação grande?
Sim, mas repare, fiz isso mesmo. Essa parte não teve a ver com o que eu iria fazer. A circunstância deu a entender que o PS beneficiava com uma alteração na sua liderança, não significava da minha parte um envolvimento com este nível de intensidade na atividade política.

Mas isso era incontornável. Sabia disso.
Não. Fui candidato a deputado a pedido do António Costa, fui presidente do PS porque ele insistiu muito. E sou presidente do grupo parlamentar porque foi a única função que aceitei. Tinha tomado a decisão de me manter na atividade política, porque a minha apetência para a atividade cívica não era alienável, mas isso não devia conflituar com a minha atividade profissional. Podia ser aceitável ser presidente do PS, ter funções mais ou menos honoríficas. Mas uma função com o grau de profissionalização e envolvimento como o que hoje tenho, não estava nos meus horizontes. E não a pretendia. Acabei por aceitar pela insistência do pedido.

Não há aí uma atração irresistível?
Porventura é essa a razão pela qual acabei por aceitar.

A política é irresistível para si?
Eu não tenho — para contrariar um dos entrevistados anteriores do Observador [Marques Mendes] — uma dependência da política, mas sou um cidadão de corpo inteiro, gosto de intervir no plano cívico. A política é uma componente instrumental dessa intervenção. Podia fazê-lo de outra forma, tenho-a feito assim ao longo da vida.

"Dei-me muito bem com esse período de redescoberta depois de sair do Governo, tive de renovar uma série de cartões, de reaprender uma série de coisas do dia-a-dia".

Quando chega aos 60 anos e o que fez foi isto, projeta outra coisa que não a política para o futuro?
Não tenho essa obsessão.

Qual, a da política?
Sim, desempenho estas funções, gosto delas, não me sinto numa posição de sacrifício e desempenho-as enquanto achar que sou necessário. No momento em que achar que não é necessária a minha presença volto a fazer o que estava a gostar de fazer.

No curto período em que esteve afastado chegou a sentir saudades?
Não. Tive sempre uma relação com as pessoas. É evidente que depois de ser 16 anos de presidente do Governo, o mês seguinte foi de descoberta de um mundo novo.

É deprimente?
Ah não! Tive uma grande alegria. Não digo como dizia Mário Soares que era como o passarinho que libertaram da gaiola. Mas, tinha sempre alguns tiques. Quando saía de casa de carro, a meio tinha de me lembrar que não devia ir para o Palácio de Santana e que tinha de ir por outra rua, mas o carro ia quase sozinho para lá. Mas dei-me muito bem com esse período de redescoberta, tive de renovar uma série de cartões, de reaprender uma série de coisas do dia-a-dia. O meu filho, com muita piada, quando me deu uma boleia num dos dias seguintes, passou por uma máquina de multibanco, parou e perguntou-me se eu sabia o que era aquilo [risos], depois de 16 anos como presidente do Governo. Nunca me desprendi da vida, não fazia a gestão da minha economia doméstica porque não tinha tempo para isso, a minha mulher sabia mais do que eu sobre isso. Nunca fazia as contas da minha casa, nunca vi os ordenados. Aliás tive sempre um problema muito grave, que ainda tenho, ao longo da minha vida que é quando me perguntam quanto ganho. Nunca sei responder e fico sempre com receio que as pessoas pensem que não digo porque não quero que saibam. Mas acho que fiz bem essa reintegração.

O que lhe custou mais, lembra-se?
Não me custou nada, achei que era um pouco como deixar de fumar. As pessoas às vezes têm dias que não lhes correm bem, mas tem o entusiasmo de ter mais um dia sem fumar.

“Telefonava o chefe da PIDE e dizia: “Eh pá os teus filhos estão outra vez nisto, vê lá se lhes dizes”

Vamos à origem desse vício. Inicia-se no ativismo político com algumas figuras importantes nos Açores, Jaime Gama, Medeiros Ferreira, Mário Mesquita e o seu irmão Horácio César. Era muito mais novo. O que via neles nesta fase?
Um grande fascínio e também uma grande vantagem. Normalmente os irmãos mais novos têm sempre muitas vantagens em relação aos mais velhos. Nessa altura, por exemplo, o meu irmão podia chegar a casa à meia-noite. Se estivesse com ele, também chegava. E então ficava com eles, com o Jaime Gama, o Mário Mesquita, e assisti àquelas tertúlias e, de alguma forma, participava.

Começou a assistir com que idade?
Ainda muito jovem, com 12 ou 11 anos, Ouvia-os muito fascinado e, depois, chegava ao liceu no dia seguinte e dizia parte daquelas conversas, às vezes ainda de forma um pouco desconexa, para desespero de alguns professores.

"O Jaime Gama era muito pedagogo e ensinava muito, era o que mais ensinava. E a mim ensinava muitas coisas. Estava sempre a chamar-me à atenção".

O que é o marcava nessas conversas? Já ideologicamente ou só a forma?
Primeiro era tudo muito apreciável. Era um grupo onde se discutiam coisas muito sérias, filosofia, política, literatura. Eram muito jovens também, tinham 17, 18 anos. Isso acontecia também depois numa fase quando eles passavam as férias nos Açores, que eram mesmo férias grandes. Nessas alturas, todos os dias à noite eu corria atrás deles.

E eles deixavam?
Sim. Aliás, o Jaime Gama era muito pedagogo e ensinava muito, era o que mais ensinava. E a mim ensinava muitas coisas. Estava sempre a chamar-me à atenção e desenvolvi uma relação de muita intimidade e afetividade.

Não era o miúdo chato?
Não, eles gostavam. Às vezes também diziam umas coisas… se passava, por exemplo, alguém da PIDE, diziam: “Diz ao gajo que ele é não sei o quê”. E eu dizia. Como era mais novo… o homem vinha e eu fugia.

Jaime Gama é uma figura tutelar para si?
Aprendi muito com ele, eram figuras de reverência. Numa primeira fase, sobretudo o Jaime Gama e o Mário Mesquita, porque tinham uma relação de amizade mais próxima com o meu irmão. Só mais tarde com o Medeiros Ferreira, que me ajudou muito e foi sempre muito próximo quando eu era já presidente do Governo. Mas Jaime Gama foi uma pessoa que me introduziu muito na atividade política em Lisboa e que me fez partilhar com muitas outras pessoas, de forma muito prematura, a reflexão política. Lembro-me que quando vim para Lisboa, ainda em 1975, ele ao longo daqueles primeiros meses apresentou-me ao Almeida Santos, ao Manuel Titto de Morais, ao Palma Inácio, ao Alegre. Isso foi, para mim, uma entrada em grande em Lisboa e prendeu-me muito ao PS e à atividade política.

Mantêm essa relação de proximidade?
Menos, por razões que têm a ver com as ocupações de cada um. Mas tenho por ele a estima que não posso deixar de ter por uma pessoa que teve a influência que teve na minha formação.

A confratenizar com amigos, em 72. À esquerda, em primeiro plano, Jaime Gama, e à sua esquerda está Carlos César. À direita, de t-shirt branca, o irmão Horácio.

Passou pela Comissão Democrática Eleitoral (CDE). Qual era a dimensão da oposição à ditadura em Ponta Delgada?
Tinha pouca dimensão, mas era um grupo muito interessante, sobretudo muito assente num conjunto de pessoas que funcionavam como pivôs e como alimentadores dessa ideia, a maior parte dos quais residia fora da região, ou outros estavam lá episodicamente, como o Borges Coutinho ou o Jaime Gama. Tinha uma componente muito importante de católicos progressistas. Em 1969 foi muito significativa, em 1973 também emergiu um pouco. Basicamente estavam associados, em São Miguel, à Cooperativa Cultural Sextante, que entretanto foi fechada pela PIDE, com a cumplicidade dos deputados da então ANP [Ação Nacional Popular, que nasceu de uma reorganização da União Nacional], mesmo os regionais. Tenho sempre a recordação de um dia em que estudava nessa cooperativa, ajudava a mantê-la aberta, e fiquei sozinho, com 13 ou 14 anos, quando entrou a PIDE à procura de uns livros. Tinha sempre uma justificação e nessa altura era o Fanny Owen que queriam confiscar e fecharam tudo, revolveram tudo, atiraram coisas para o chão intencionalmente. Eu barafustei imenso, tentei bater-lhes.

Com 13?
Sim, depois eles diziam: “Olha que eu faço queixa ao teu pai”. [Risos] Era uma coisa deste género, não era propriamente um ato revolucionário de grande dimensão. Mas lá levaram as coisas e eu fiquei ali a chorar porque não consegui defender aqueles livros todos.

O diretor da PIDE regional falava efetivamente com o seu pai, eram vizinhos não eram?
Sim, era pessoas amigas. Aliás, sou muito amigo de um dos seus filhos também. Não se pode dizer que fosse uma pessoa cruel. Enfim, tinha as funções que tinha. Não há qualquer perdão sobre essas coisas, apesar de a atividade da PIDE ser intimidatória e tivesse prejudicado muita gente nos Açores à época, não se pode dizer que fosse uma polícia que exercesse tortura, ou a prisão arbitrária. Algumas pessoas foram presas e, por exemplo, o Jaime Gama até foi.

Mas para os seus pais não devia ser visto dessa forma. Tinham filhos ativos politicamente e eram avisados pelo vizinho que era PIDE.
Era muito difícil, mas nesses meios as coisas eram mesmo assim. Telefonava o chefe da PIDE e dizia: “Eh pá os teus filhos estão outra vez nisto, vê lá se lhes dizes”. Era uma coisa muito mais doméstica do que seria num meio mais impessoal como Lisboa ou outros. Mas não deixava de ser uma coisa séria.

Como era gerido em casa, pelos seus pais?
Os meus pais não atribuam muita importância aos telefonemas que recebiam. Diziam para termos cuidado, mas estavam do nosso lado.

O seu irmão chegou a ter ficha. Sabe se também teve?
Eu era muito criança, no 25 de abril tinha 17 anos. O meu irmão era muito mais ativo do que eu.

No 25 de abril a sua mãe ficou aliviada mais por vocês e pelo fim desses avisos, não foi?
Sim, para ela foi bom. Embora ainda estivesse muito preocupada com o meu irmão, porque ele ainda estava em Angola e foi transferido nessa altura, como aconteceu com a maior parte das nossas forças militares, para Luanda. A instabilidade durante um certo período em Angola centrou-se muito lá e ele acabou por viver ali uma situação mais complexa.

Antes disso também já dava nas vistas na sala de aula. Conte lá a história com um professor do Liceu, que era da ANP e não gostou do autocolante que trazia da CDE.
Sim… era um professor de que gostava também, bastante. Eu tinha um autocolante da CDE e ele disse-me: “Ou tiras isso ou vais-te embora”. E eu fui-me embora. Tinha 13 anos.

Como é que um miúdo de 13 anos tinha essa atitude. Era pela política ou era uma afirmação própria da idade?
Eu racionalizava muita coisa: a liberdade a guerra, já tinha um conjunto de valores que fixava como conflituantes com a sociedade da época. Não era apenas o entusiasmo juvenil.

E é assim que justifica aquele impulso logo ali a seguir ao 25 de abril de fundar a associação estudantes do liceu? Como é que isso surgiu?
O 25 de abril foi “é agora!” Para mim era tudo “é agora”, devia acontecer no dia seguinte. Tinha na semana anterior estado num dos cafés que acolhia mais a tertúlia da oposição, em São Miguel, o café Gil, onde estava o Melo Antunes, o Vasco Lourenço, que estavam para lá meio proscritos. Na semana anterior até perguntávamos ao Melo Antunes: “Mas quando é que isto se resolve”. E ele dizia: “Um dia, um dia”. Bom, mas ele sabia qual era o dia! Nós é que ficámos sem saber. Esse grupo ainda lá estava imediatamente depois do 25 de abril e nós recebemos quase a interpretação autêntica do golpe, visto que estavam lá pessoas que conheciam a sua origem e a sua finalidade. Aquela sensação de indefinição e de dúvida que assaltou muito o país: quem está a fazer o golpe, de onde e para onde, era algo que em alguns meios em Ponta Delgada era um assunto esclarecido. Recebemos logo a primeira indicação deles: tens de ir fundar a associação e estudantes depressa, temos de organizar aí a manifestação paras as portas da cidade, para ver se os militares têm condições populares para depois irem à PIDE e a outros lugares. Deitámos mão à obra, foi divertidíssimo.

Foi uma época marcante…
Foi extraordinária: os anos 70 foram uma época extraordinária. Com muita gente na rua, a querer votar, a querer ser de um partido, uma situação que não marca o nosso tempo.

É saudosista?
Não sou saudosista no sentido de querer voltar a viver tudo aquilo, mas o que retenho é que esse era um tempo de vivências extraordinárias. Hoje são outras, todos os tempos têm obviamente entusiasmos e problemas.

“O meu pai chegou a dizer ‘não me vá este para padre’. Depois afastei-me da Igreja”

Mas a sua vida na adolescência era só política? Como é que se ocupava? Jogava à bola?
Fui sempre bom aluno no ensino secundário.

Era um crominho?
Não, fazia as coisas mínimas mas sempre com boa folga. Tinha muito boa relação com os professores, pessoal e afetiva. Dava-me bem em geral e com os meus colegas. Tinha um certo sentido de liderança, era socialmente movimentado. É evidente que senti uma pulsão, no sentido da política, muito prematura.

Cresceu mais depressa do que os seus amigos daquela idade? Jogava à bola ou ia ao cinema?
Sim, fazia tudo. Fiz tudo em todas as idades, não tenho nada a refazer. E joguei à bola, até fui desportista federado, guarda-redes. Tive todas as funções possíveis, não com muito sentido de permanência. Não fui propriamente, como agora se pode ver, um internacional desta área [risos].

Defendia bem?
Às vezes. Fui guarda-redes federado, até na altura do Santa Clara, embora fosse afeto do União Desportiva, que era a filial do Sporting e era o meu clube, que entretanto se esboroou e desapareceu. Mas entretanto fui observado uma vez num jogo do liceu e fiz umas grandes defesas e eles acharam que aquilo era um talento em perspetiva. Mas as balizas no liceu eram mais curtinhas, de modo que quando fui para o primeiro treino de futebol de 11, com uma baliza enorme, remataram e eu prudentemente calculei a trajetória e segui-a deixando-a passar. Entrou quase pelo meio. Percebi logo que o mundo era outro.

E que era melhor dedicar-se à política…
Achei aquilo muito chato, ter de fazer a reaprendizagem daquilo. Ou as balizas eram mais pequenas ou eu ia para outra atividade.

Era namoradeiro?
Um bocadito, um bocadito…

Estava a contar que se dava bem com os colegas. E com as raparigas?
Claro! [ri-se] Nunca me queixei de falta de sucesso nessas áreas.

Veio de uma espécie de redoma, onde tudo era mais controlado, para Lisboa. Como foi?
Os meus pais tinham muita preocupação comigo e com o meu bem-estar e arranjaram forma de eu ficar num colégio que tinha almoço e jantar, o Pio XII, e ali estive nos primeiros dois ou três primeiros anos, com algumas restrições que nunca segui.

Que tipo de restrições?
Tinha restrições de horas de chegada, mas havia um colega nosso que, no primeiro andar, tinha sempre a incumbência de ter a sua porta entreaberta. E como tínhamos uma escada escondida, era utilizada com muita frequência por muitas pessoas. Mas era um lugar muito simpático.

É agnóstico não é?
Digamos que não tenho uma… coloco-me no plano das pessoas normais.

O que são as pessoas normais?
São os que têm dúvidas. Eu tenho dúvidas. Já tivemos um que não tinha dúvidas [ri-se] mas eu tenho dúvidas.

Mas foi sempre assim? Vem de uma região com fortes tradições católicas.
Não, pelo contrário. Na minha infância fui acólito, fiz as comunhões, ajudava à missa, chefiei o grupo de acólitos da Igreja Matriz de Ponta Delgada, rezavam as missazinhas em casa, com alguma preocupação do meu pai que dizia à minha mãe: “Não me vá este para padre!”. Mas foi coisa que me passou ao longo do tempo. Depois afastei-me da Igreja.

Houve alguma razão?
Primeiro por razões de natureza política e pela posição da Igreja em relação aos costumes. Apesar de ter, ainda hoje, relações muito boas com muitos sacerdotes, alguns dos quais até muito relevantes para a minha eleição em 1996. Houve um grupo de padres amigos que colaboraram comigo e me impulsionaram muito nessa fase, mesmo contra a hierarquia da altura.

Mas quando foi para o Pio XII já estava afastado da Igreja. Porque é que os seus pais decidiram ir por ali?
Porque tinham conhecidos que tinham lá os filhos e o Pio XII tinha normalmente uma quota reservada a estudantes açorianos e outra a madeirenses, que tinham maiores dificuldades de deslocação e de alojamento. Eu era considerado uma espécie de ave rara nesse colégio, porque normalmente só acolhia estudantes da direita ou até da extrema-direita. E tenho uma história muito engraçada, quando se adensou a suspeita quanto ao colégio, em pleno PREC, houve alguns setores que temeram que fosse fechado pelo Estado. Um dia estava no meu quarto e o diretor chamou-me porque precisava que eu fosse lá abaixo. Eu lá desci, fui ao gabinete dele e estava lá o professor Adriano Moreira. E o diretor disse-me: “Diz lá ao professor Adriano Moreira o que é que tu és”. E eu disse: “Sou açoriano”. E o diretor disse: “Não, não é isso. O partido de que tu és”. “Bem, sou socialista”, disse eu. E ele: “Está a ver professor Adriano Moreira, ele é socialista, mas não é marxista!”. Presumi que a presença do professor Adriano Moreira era para adverti-lo de que também não podia ser tão ortodoxo nas admissões que fazia no colégio. E ele quis provar que havia alguma liberalidade e que até tinha um socialista não marxista.

“Ainda hoje a minha mulher telefona a dizer ‘mas que disparate foi aquele?’”

Foi nessa altura que conheceu a sua mulher, Luísa, em Lisboa?
Em Lisboa só a conhecia de vista. Ela foi aos Açores em 1977, algures no verão desse ano, integrada numa missão do PS que tinha como incumbência, entre outras, verificar o estado da arte no PS e ver se os socialistas açorianos eram gente fiável. Havia sempre estas missões internas nos partidos, nessa altura. Eu achei que a devia acompanhar devidamente nessa incumbência e olhe…nunca mais me libertei disso [Risos].

Casaram muito novos não foi?
Sim, eu conheci-a em agosto, quando ela lá foi, e depois casei em novembro. Mas tive um mês em que não a vi porque ela foi à Suécia.

Porque decidiram assim tão rápido?
Porque foi uma decisão em relação à qual não tive dúvidas [risos] Também há coisas sobre as quais não tenho dúvidas. Ainda esperámos que eu fizesse 21 anos, porque nessa altura a maioridade era aos 21. Eu fazia a 30 de outubro, portanto…

Vou citar outro socialista: qual era a pressa?
[Ri-se] Exatamente. O meu pai perguntava-me isso e minha mãe, de modo insistente, qual era a pressa. E eu tive que os descansar que não havia mesmo pressa nenhuma, queríamos casar. Claro que eles não acreditaram. Levaram alguns meses a perceberem que eu tinha razão, que não tinha de facto pressa e foi assim. Há 40 anos.

A sua mulher teve um papel muito importante no seu desempenho na política?
Uma das funções que ela desempenhou com maior sucesso foi conter o tal caráter explosivo. Moderou muito as minhas explosões, porque ela é muito moderada e calma E depois ajuda-me muito porque é uma pessoa muito culta e interessada pela história, pela política. Era alguém com quem pude ao longo do tempo partilhar decisões e perguntar a opinião e isso ajuda. Não só temos a nossa vida pessoal, como também temos a possibilidade de partilhar as nossas decisões no plano profissional.

"O que se deve fazer, deve-se fazer... desde que não tenha de pintar o cabelo"

Quando está a falar de opinião é no plano político e não sobre a cor da gravata, certo?
Normalmente não peço opinião sobre a cor da gravata, mas já fui várias vezes obrigado a voltar para trás.

Falava mesmo no plano político?
Sim, ainda hoje telefona-me a dizer: “Mas que disparate foi aquele do fulano ou teu?”.

Liga-lhe muitas vezes com reparos e opiniões?
Sim, quando estou cá falamos todos os dias ao telefone. Não está cá porque está a concluir o projeto de reinstalação do Museu da Autonomia.

A sua mulher foi uma presença muito constante na campanha de 1996. Havia necessidade de fazer esse contraponto com o anterior presidente, Mota Amaral, um celibatário?
Não havia necessidade mas foi um contraste notório.

Mas houve essa preocupação?
Os Açores precisavam de várias coisas e uma delas era uma abertura no plano cultural dos costumes e da própria economia. Os Açores eram uma terra muito fechada, o anterior presidente um celibatário, enfim tudo muito feito à moda de uma certa pequenez que no plano cultural inibia muito a Região. Aparecendo gente nova, uma família que era como outra qualquer, e que partilhava atividade política, teve o seu efeito muito positivo e representou uma vantagem.

Essa foi uma estratégia de campanha?
Aquela campanha de 1996 foi muito densa e muito trabalhada. Uma das pessoas que mais trabalhou essa campanha foi o Edson Athayde. Os aconselhamentos eram que a minha mulher devia aparecer muito e falar, que se devia replicar o modelo americano, que era aliás conhecido dos açorianos e ainda hoje é algo que nos Açores é conhecido. O papel de primeira-dama é um pouco replicado do que é a primeira-dama dos EUA. Depois eu tinha também o problema de ser demasiado jovem [tinha 40 anos] e ele fez-me uma sugestão que eu rejeitei, um decalque do que teria feito Felipe González, que eram uma madeixas brancas [ri-se]. Essa parte eu disse: “Peço desculpa, mas os meus vizinhos vão todos rir quando eu sair”. Lá consegui. Mas lá teve uma reunião com a minha mulher e decidiram que eu tinha de passar a vestir sempre de escuro para ver se envelhecia rapidamente. Tenho um sentido profissional dessas coisas: o que se deve fazer, deve-se fazer… desde que não tenha de pintar o cabelo.

O seu filho, Francisco, seguiu-lhe as pisadas. É deputado pelo PS na Assembleia Legislativa Regional. Tinha de ser assim?
É um pouco inevitável. Às vezes temos alguns remorsos porque o levámos com 15 dias de idade a um congresso, mas não tínhamos com quem o deixar, por isso foi connosco ao congresso aqui perto de Lisboa. Estava muito frio e houve um grupo grande que protegia o berço e lá conseguimos que regressasse são e salvo.

Sente-se responsável ou culpado por ele estar nesta vida?
É um cidadão livre, sempre fez o que quis e de um ponto de vista é sempre mais prejudicado do que beneficiado. Há sempre isto do ser filho de alguém de que também tem atividade política ser sempre mais prejudicado do que beneficiado. Mas como ele tem qualidade próprias, esse desempenho é muito autónomo e nem podia deixar de ser nestas circunstâncias.

Tem aberto mais portas do que fechado até agora ou não?
Não creio, não creio. Acho sempre que ele tem de fazer o dobro dos outros.

Com o filho, Francisco César, que é deputado na Assembleia Legislativa Regional

Foi um pai presente?
Fisicamente nem sempre, porque passei uma vida inteira e, ainda hoje, a viajar por via das minhas funções. Portanto estive muito tempo ausente, mas como sempre fomos um grupo muito unido, isso foi sempre superado.

Este envolvimento da família estendeu-se a outro nível. A sua mulher começou por ser coordenadora dos Palácios, no seu mandato, depois nasceu dela a proposta de criar um Museu da Autonomia, que apoiou, e foi escolhida pelo atual presidente, sem concurso público, para coordenar a estrutura de missão do Museu.
Conhece algum concurso público para uma estrutura de de missão? Não há isso na Administração Pública.

O que quero perguntar é se, e no seu caso até é literal…
Sim, se à mulher de César e tal e não sei quê.

Não basta ser, não é?
Mas é. Mas é.

Como presidente não devia ter evitado essa mistura?
Ela nunca desempenhou nenhuma função para a qual não tivesse habilitação adequada e específica. Além disso nunca auferiu nenhum remuneração ao longo da sua vida profissional que não fosse aquela que resulta da sua condição de funcionária pública. Mesmo hoje, sendo coordenadora de uma estrutura de missão, ela ganha o mesmo que ganharia se fosse funcionária pública na sua carreira normal. Quando foi, por exemplo, coordenadora dos Palácios da Presidência, teria direito a um suplemento salarial de 10%. Era a única coordenadora em toda a Região Autónoma que não recebia esse suplemento. Sempre tivemos todos os cuidados de forma a assegurar um tratamento, até nas circunstâncias, inferior a outras pessoas nas mesmas circunstâncias.

A questão é se não havia mais ninguém que pudesse fazer aquelas funções sem que deixasse essa dúvida sobre si?
Essa crítica que surgiu coincide com uma grande mudança que houve nos Açores e uma delas foi o presidente ser casado. E é uma crítica que sempre foi proveniente da oposição.

O Tribunal de Contas não é a oposição.
O Tribunal de Contas não questionou isso, mas os valores de passagens aéreas. Não ter utilizado um determinado trajeto e ter usado outro.

"A minha mulher nunca desempenhou nenhuma função para a qual não tivesse habilitação adequada e específica"

Não o prejudica mais essa mistura do que os benefícios que traz?
As funções que ela desempenhou foram da sua competência profissional e hoje as que desempenha também são, de uma pessoa que é historiadora é bibliotecária.

Podia exercer essa atividade no privado.
Ela é funcionária pública. E é como funcionária pública que desempenha estas funções e está a fazê-lo com sacrifício pessoal, porque está numa situação de aposentada e apenas ficou porque era desagradável sair por eu ter saído. Isso é algo que pode animar as páginas dos jornais.

É só isso? Guerra política? Não é ilegal, mas não é uma questão moral que justifique que seja falada?
Não, é mesmo uma guerra política. Basta ir pelos Açores todos e fazer a pergunta. Não conheço ninguém com dúvidas sobre esta matéria.

Por exemplo, se a mulher do primeiro-ministro fosse nomeada para uma estrutura de missão da Administração Pública acha que isso não era notícia e com razão?
Acho que não. Se tivesse apetência nessa área e desenvolvesse determinadas funções. Com o conjunto de obrigações sociais de ser mulher do presidente do Governo, das duas uma: ou teria que pedir licença sem vencimento para as cumprir ou ter um perfil de funções para permitir esse desempenho. Pode animar os jornais de ocasião que andam por aí, mas como viu ao longo do tempo, não constituiu motivo de censura social.

“Não estou na política por conta do António Costa nem por conta de ninguém”

Os 16 anos no Governo regional foram os melhores da sua vida?
Foi um período diferente da minha vida, muito realizador, estar à frente de um órgão executivo é diferente…

E que marca é que acha que deixou?
Os Açores mudaram muito. Em 1996, quando cheguei ao governo, os Açores eram uma região muito pobre e, pior ainda, a pobreza era muito desprotegida. Quem era pobre não tinha onde se socorrer, era uma região muito fechada no plano cultural, no plano económico, no plano social, no plano dos costumes, e penso que em 1996 os Açores ganharam asas… abriram-se ao mundo e o mundo entrou pelos Açores. Com as vantagens e desvantagens que esses processos têm.

Em 2013, a estrutura de coordenação dos fundos comunitários dizia que os Açores continuavam a ser uma das três regiões mais pobres da Europa.
Não, e os dados estão disponíveis. Entre 2000 e 2014 os Açores foram a região portuguesa que mais cresceu e mais convergiu com as médias europeias. Quando entrei para o Governo, os Açores eram a última região do país em PIB per capita. Quando eu saí do Governo já tinham deixado para trás a região centro, a região norte e a região do Alentejo. Os Açores eram também a última região do país no rendimento disponível bruto das famílias. Quando sai, já tinham deixado para trás essas três regiões. Quando eu cheguei, os Açores eram os últimos na taxa de analfabetismo, hoje estão acima da média nacional e só a região da Área Metropolitana de Lisboa tem melhor desempenho. Portanto, não faltam indicadores que podem ser invocados para mostrar a evolução dos Açores ao longo destes últimos anos, e até ao longo do mandato anterior do dr. Mota Amaral. No 25 de abril, os Açores eram uma desgraça, mas no período que reporto como presidente do Governo as alterações foram sensíveis, foram enormes.

"Acho que tenho uma linguagem mais moderada às vezes que o nosso primeiro-ministro António Costa. A língua portuguesa é para ser usada e gosto de exercícios retóricos"

Os Açores levam vinte anos seguidos de maiorias socialistas. Acha que há o risco de se tornarem uma espécie de Madeira, mas em rosa? A alternância política não é importante?
Sabe, uma coisa é verdade, os Açores sempre tiveram uma vida democrática mais robusta que na Madeira. Mesmo no tempo em que eram governados pelo PSD. Por exemplo, a mesa da Assembleia Regional da Madeira não tinha representação dos vários partidos, era uma coisa absurda, e nos Açores é evidente que tinha. Portanto, sempre houve uma diferença em termos de cultura democrática entre as duas regiões. Essa questão prende-se sobretudo com o peso das recandidaturas. Mas isso também é aplicável à Presidência da República, todos os recandidatos foram eleitos. Isso é uma regra muito dominante nas eleições autárquicas. A única coisa que permitiu que ao longo de últimos se tivesse mantido o mesmo titular era a circunstância de não haver limitação de mandatos, coisa que hoje nos Açores já existe, e por minha iniciativa. O que permite uma dinamização a esse nível que fará com que nada seja como dantes. Vasco Cordeiro acabou de ser eleito e só poderá sê-lo mais uma vez. Agora, os partidos não podem ser culpados de ser vencedores.

21-Carlos C+sar

Numa visita do Presidente Jorge Sampaio ao Açores, em junho de 2003

Nas sociedades mais pequenas, não é mais difícil desalojar quem está no poder?
Por definição a proximidade do poder gera mecanismos de maior dependência. Toda a gente percebe isso do ponto de vista teórico. Assim como é mais fácil percecionar do ponto de vista do poder político os problemas, as oportunidades, os casos de pobreza, também é mais fácil existir uma relação direta com os que desempenham o poder, e eventualmente mais dependente. É natural que nas regiões mais pequenas, sendo o exercício de poder mais próximo, se gere essa habituação. Mas a verdade é esta: se os Açores vivessem uma situação de caos social, económico ou uma degradação significativa, os eleitores teriam dado sinal disso. E o que acontece é o reconhecimento de um percurso que tem sido progressivo, positivo e por isso o PS teve a reedição de uma vitória.

Uma vitória já liberta da sua sombra?
Nunca fiz sombra a ninguém. Tenho na minha vida política duas coisas que sempre assegurei: nunca viver à sombra de ninguém nem ser a sombra de ninguém. Nessa matéria estou perfeitamente à vontade.

Nestas novas funções tem assumido uma função de pitbull de António Costa, que morde os críticos do Governo como o primeiro-ministro não pode…
Não creio. Até para dizer a verdade acho que tenho uma linguagem mais moderada às vezes que o nosso primeiro-ministro António Costa. A língua portuguesa é para ser usada e gosto de exercícios retóricos.

Mas há uma carga de agressividade que coloca no ataque aos adversários.
Não estou na política por conta do António Costa nem por conta de ninguém. Estou por conta das minhas ideias e do que penso sobre as coisas.

Nesta última campanha eleitoral não assumiu esse papel relativamente às forças de esquerda?
Temos uma orientação e achamos que cada um de nós faz uma coisa mais facilmente. Tudo o que eu disse é o que penso. Acho que nas últimas eleições o país tinha ganho mais em estabilidade e em unidade se o PS tivesse tido uma votação mais significativa e não dependesse de terceiros.

Num comício, em Almada, a dois dias das eleições, dizia que “votar no Jerónimo ou na Catarina é como votar no Pedro [Passos Coelho] e no Paulo [Portas]”.
É o que eles também dizem de nós.

Mas agora têm de estar sentados à mesma mesa.
Gere-se. Mas o Partido Socialista não é igual ao Partido Comunista e não é igual ao BE. As diferenças são muito grandes e muito significativas. Aquilo em que somos suficientemente parecidos é o que consta nos acordos que fizemos e o que fizemos em comum nesta experiência de Governo. Agora, que somos diferentes, somos.

27-Carlos C+sar

Com António Costa, Pedro Nuno Santos e Ana Catarina Mendes, em outubro de 2015, na formação da geringonça

Sente-se mas próximo do Bloco ou do PCP?
Eu sou próximo do PS, não tenho outras proximidades, numa determinada matéria posso estar mais de acordo com o PC, noutra com o Bloco e noutra até com o PSD.

Mas não ficou logo conquistado com a ideia de o PS aliar-se à esquerda…
Procuro as certezas, porque tenho dúvidas.

E teve dúvidas?
Claro. Foi preciso trabalhar muito, excluir hipóteses e confirmar orientações da parte de todas as forças para ter a certeza que não embarcávamos numa aventura com prejuízos para o PS e para o país. A decisão tomada foi assumida com responsabilidade. É verdade que foi um tempo difícil, partilhado por meia dúzia de pessoas, em que as decisões tiveram que ser tomadas, mas foi um tempo muito interessante.

E avançou mais conformado ou convencido?
Como diria o António Costa sobre mim, se eu estou de acordo com isso então toda a gente está. Quando eu me convenci, convenci-me. Disse pronto, ok.

Porque é que ele dizia isso de si?
Porque eu era entre o grupo sempre o menos… as pessoas eram muito impulsivas e ficavam muito satisfeitas com o impacto de uma frase ou de uma reunião, e eu tinha uma primeira reserva, até fazer um juízo posterior. E porque era o mais velho também.

“Nos tempos livres, agora leio o Orçamento, o que é uma coisa horrível. Um bocado deprimente”

À noite quando chega a casa, consegue ler?
Ainda um bocadinho.

O que anda a ler?
Não posso dizer porque não é muito da “geringonça”, é melhor não mencionar isso [ri-se e coça a testa, mas lá acaba por dizer] “O Último Soviético”… mas não interessa… é um romance histórico. Mas, sabe, um dos inconvenientes da minha atividade atual é justamente essa quase indisponibilidade. Uma pessoa acorda com o Orçamento e adormece com as iniciativas legislativas do dia seguinte. Com a gestão de um grupo onde há sempre pessoas com sensibilidades, aspirações e ambições diferentes, e portanto é uma atividade que rouba muito da da minha disponibilidade para ler e para descansar. Nos tempos livres, agora, leio o Orçamento do Estado [risos], que é uma coisa horrível. É muito deprimente. Espero que os resultados sejam menos, mas é horrível… e as tabelas…

Com o primeiro-ministro Guterres e o Presidente Sampaio, no Palácio de Santana, em 2001

É um período intenso no Parlamento, o que faz para se distrair? E quando vai aos Açores?
Gosto muito de conversar, conversar é uma delícia… tenho o meu grupo de amigos, conversamos, falamos, falamos…

De política?
Não, de tudo. Das pessoas, das nossas regiões, do mundo, de curiosidades enfim..

Tem viajado?
Não tenho viajado muito ultimamente. Mas já tenho 40 e tal países percorridos… Alguns em lazer. Agora vou ficar uns dias em Roma…

Ainda há muita gente a tratá-lo por Carlos Manuel?
Não, só umas velhinhas. E o meu irmão às vezes.

Foi ele quem escolheu o seu nome.
É verdade, tive muita sorte, sabe, porque havia uma estranha tendência na minha família para dar nomes terríveis às pessoas. Um dos meus bisavôs era Manuel Augusto César. Outro era Cesinando César Augusto, o meu avô era Aurélio Augusto César, o meu pai Aurélio Augusto César e não tiveram outro remédio senão acrescentar júnior. O meu irmão ainda foi Horácio. Eu fiquei em Carlos Manuel e libertei-me desta herança romana.

O Carlos Manuel ainda tem mais alguma coisa para fazer na política?
Sabe, perdi esse sentido de progressão na atividade. Repare, quando estava na oposição queria vencer as eleições nos Açores, quando era presidente queria ser reeleito. Quando disputei as ultimas eleições queria ganhá-las. Agora, o meu sentido de presença na atividade política é mais marcado pela utilidade que ela possa ter. O que digo ao António Costa, quando ele me faz alguns desafios, é que só estou nesta atividade enquanto achar que sou útil e necessário. Gostei muito da atividade profissional que tive no interregno de um ano… Há muitas formas de desenvolver a atividade política. Não tem de implicar ser deputado ou ser membro do governo, posso fazê-lo de outra forma, com maior distância.

"Nunca quis ser Presidente da República"

Este domingo faz sessenta anos. O que espera dos anos a seguir?
Desejo agora que esta minha atividade contribua para o sucesso de um projeto, no qual tenho responsabilidades, para o qual quero contribuir, e que o meu país seja beneficiário desta opção que fizemos.

Já não quer ser Presidente da República?
Nunca quis ser Presidente da República.

Durante muito tempo foi colocado como um dos socialistas que podia ser candidato…
Uma coisa que me pode honrar muito que as pessoas achem isso, outra coisa é eu ter alguma vez pensado ou referido essa possibilidade. Não penso nisso.

Não pensa mesmo?
Não. Outra pergunta.

Mas como pensa então acabar a sua atividade política?
Com o sentido de ter bem servido os cidadãos e que nesta fase esta experiência seja bem-sucedida. Eu não me condeno a mim próprio a abandonar a atividade política a tempo inteiro nem a ficar prisioneiro dela. O que for necessário fazer eu faço, desde que entenda que outro não tem as condições para o fazer.

Resposta politicamente correta.
Não, com o mínimo de racionalidade e sem grande atrevimento.

Bom, ficamos por aqui.
[Olha para o relógio e desabafa] Uffff!

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