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Boris Johnson foi transferido para os cuidados intensivos na noite de segunda-feira
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Boris Johnson foi transferido para os cuidados intensivos na noite de segunda-feira

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Boris Johnson foi transferido para os cuidados intensivos na noite de segunda-feira

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Com Boris Johnson internado, britânicos tentam superar "o choque". Raab lidera o governo, mas a Rainha é o pilar

Mortes no país sobem e primeiro-ministro torna-se o primeiro político em estado grave devido à Covid-19. Mas maioria dos britânicos sentem mais empatia do que pânico: "Ele é um de nós".

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“Antes de Boris Johnson dar entrada nos cuidados intensivos, ainda podíamos todos acreditar que a situação dele era séria, mas não era perigosa. Creio que já não podemos manter essa ilusão.” É assim que Tim Bale, professor de Política na Universidade Queen Mary, inicia a conversa com o Observador, menos de 24 horas depois de o primeiro-ministro britânico ter dado entrada na unidade de cuidados intensivos do hospital St. Thomas, na noite de segunda-feira.

“Ao longo desta tarde, o estado de saúde do primeiro-ministro piorou e, seguindo os conselhos da equipa clínica, foi transferido para a unidade de cuidados intensivos do hospital”, confirmou à altura um porta-voz do governo, reforçando, contudo, que Boris Johnson estava “consciente” e que não tinha sido sujeito a ventilação. Terça-feira de manhã, novo comunicado em tom tranquilizador: “O primeiro-ministro passou a noite estável e está bem disposto. Está a receber tratamento de oxigénio normal e está a respirar sem qualquer ajuda”.

A gravidade do estado de saúde de Boris Johnson só ficou clara esta segunda-feira

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Downing Street tenta manter o tom calmo, mas não há dúvida de que, mesmo sendo por precaução, qualquer transferência de um paciente para os cuidados intensivos é delicada. “Uma das características da Covid-19 em todos os países é que parece afetar mais os homens do que as mulheres. Sabemos também que as pessoas com menos de 60 anos têm geralmente mais hipóteses de recuperar, mas não há dúvidas de que, tendo em conta a situação atual, Boris Johnson está extremamente doente”, resumiu à Sky News o professor de Medicina da University College of London, Derek Hill. Boris Johnson tem 55 anos, não fuma e não tem outras doenças conhecidas.

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O “choque” e a surpresa perante a gravidade da doença de Boris

As probabilidades estão a seu favor, mas o facto de ser o primeiro líder político a ser internado em estado grave devido ao novo coronavírus não deixa de provocar perturbação, até naqueles que estão confiantes na sua recuperação, como o seu antigo diretor no jornal The Daily Telegraph, Charles Moore: “Embora eu ache que isto não é tão grave como as pessoas pensam, é verdade que o sentimento ontem [segunda-feira] foi de choque”, admite ao Observador. “Quando soubemos que ele estava doente, é claro que ficámos preocupados, mas sabíamos que ele é um homem forte e que não é idoso. Com estas notícias, agora é que é a sério, porque não só significa que ele está bastante doente, como que tem estado a piorar e não a melhorar, como achávamos.”

“Embora eu ache que isto não é tão grave como as pessoas pensam, é verdade que o sentimento ontem [segunda-feira] foi de choque.”
Charles Moore, ex-editor de Boris Johnson no The Daily Telegraph

Até este domingo, Boris Johnson tinha estado a trabalhar isolado, a partir de casa, e não faltaram vídeos nas redes sociais do próprio a garantir que estava bem e que continuava a liderar a resposta do governo a esta crise da Covid-19. Foi internado no domingo e só esta segunda-feira, ao ser transferido para os cuidados intensivos, é que fez o telefonema formal a pedir ao ministro dos Negócios Estrangeiros, Dominic Raab, que o substitua temporariamente. Uma posição que a colunista da revista Spectator, Isabel Hardman, interpreta como natural: “É compreensível que Johnson tenha continuado a querer liderar o governo, mesmo que a partir da cama. Ele é bom a delegar e a confiar na sua equipa, mas esta é uma crise nacional, em que o país precisa de uma figura de liderança reconhecida e confiante.”

Mas, talvez por isso mesmo, aquilo que foi entendido como uma melhoria expectável do primeiro-ministro tornou-se, afinal, num agravamento da sua situação, sem que tal fosse tornado público. Algo que levou a críticas por parte de alguns, que acusam a equipa governamental de ter escondido o verdadeiro estado em que está Boris Johnson. “Ele não estaria nos cuidados intensivos a não ser que precisasse mesmo deles, sobretudo numa altura destas”, apontou à Sky News o microbiologista Simon Clarke. “É altura de a equipa de comunicação do Número 10 começar a ser honesta connosco sobre qual é a situação real do primeiro-ministro.”

Boris Johnson estava a trabalhar em isolamento há mais de uma semana

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Tim Bale coloca a questão de forma mais educada, dizendo que talvez a equipa de Boris tenha tido “uma visão demasiado otimista da progressão da doença” que aflige o primeiro-ministro. Charles Moore, por seu turno, considera que Downing Street fez exatamente o que tinha a fazer: “As questões clínicas são matérias privadas. Só devem ser tornadas públicas quando se tem absoluta certeza dos factos, portanto é natural que só tenham revelado que ele foi hospitalizado depois de ele entrar no hospital. Alguma imprensa tem sido impaciente, mas eu não creio que tenha havido qualquer tipo de engano.”

E agora, perante este cenário, o que podem os britânicos fazer perante a pouca informação disponível sobre o estado do paciente Boris Johnson? “A única coisa sensata a fazer é esperar”, vaticina Moore. “E apoiar Boris, porque ele continua a ser o nosso primeiro-ministro.”

Dominic Raab é o substituto. Estará à altura?

Formalmente, Boris Johnson é o primeiro-ministro. Mas, na prática, quem estará agora aos comandos será Dominic Raab. O ex-ministro para o Brexit de Theresa May, que bateu com a porta por discordar da estratégia da líder para a saída da União Europeia, foi também candidato à liderança do Partido Conservador e perdeu para Boris. Mas, devido às suas fortes credenciais pró-Brexit, acabou por ser convidado para ministro dos Negócios Estrangeiros no novo executivo. E a proximidade com Johnson é tanta que foi ele o escolhido como número 2 agora que o primeiro-ministro está hospitalizado.

A escolha provocou algum “sururu” na imprensa britânica, já que, num país sem Constituição escrita, não há uma regra pré-definida para o que deve acontecer num caso destes. E, perante um ministro de 46 anos e experiência política limitada, surgem dúvidas sobre a capacidade de Raab de estar à altura do cargo.

“Acho que as pessoas estão a exagerar bastante”, desvaloriza Charles Moore. “O sistema britânico tem regras muito informais. Aqui não há um vice-presidente como nos Estados Unidos, há soluções muito mais amplas. Mas vejamos, do ponto de vista constitucional, é o primeiro-ministro quem lidera a Câmara dos Comuns e o governo. Portanto, cabe-lhe a ele escolher quem o deve substituir”.

Dominic Raab, ministro dos Negócios Estrangeiros, foi o escolhido por Boris para o substituir no cargo de PM

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Quanto à capacidade de Raab, o próprio tem-se desdobrado em entrevistas e declarações nos últimos dois dias para garantir que tudo “está preparado”, que “o governo está a funcionar plenamente” e que os ministros “estão a par das preparações feitas pelo primeiro-ministro”. Contra si tem o facto de não poder exercer plenos poderes, já que não pode despedir nem nomear membros do governo e também não terá direito à audiência semanal com a Rainha. E o porta-voz de Downing Street relembrou que o próprio Raab tem um sucessor designado, caso ele próprio fique doente: o ministro das Finanças, Rishi Sunak.

“Se ele é capaz ou não de lidar bem com esta crise, mesmo sem ter todos os poderes totais de um primeiro-ministro, pode depender muito da duração do internamento de Boris Johnson. Se ele estiver incapacitado apenas umas poucas semanas, tudo bem. Se forem meses, então não está tudo bem”, prevê Tim Bale.

Dentro do conselho de ministros, a atmosfera agora é, provavelmente, “febril e inquieta”, calcula o académico, que ao longo dos anos tem estudado de perto o Partido Conservador e os seus membros. Raab garante que há “um incrível espírito de equipa a apoiar o primeiro-ministro” e que o governo se mantém unido. Será mesmo assim? “Raab não seria provavelmente a primeira escolha de alguns dos seus colegas para substituir Johnson, mesmo que temporariamente”, avisa Bale. “Contudo, suspeito que eles vão tentar fazer o melhor possível — pelo menos por enquanto — para que isto resulte.”

“Isto aconteceu três vezes durante a II Guerra Mundial, quando Churchill ficou doente. Duas dessas vezes foi de pneumonia e ele esteve afastado um mês! Não mudou nada. Na prática, uma ausência curta de Boris Johnson não fará qualquer diferença constitucional ou política.”
Charles Moore, ex-editor de Boris Johnson no The Daily Telegraph

Charles Moore volta a desdramatizar e recorre ao exemplo de um dos heróis favoritos do próprio primeiro-ministro: “Isto aconteceu três vezes durante a II Guerra Mundial, quando Churchill ficou doente. Duas dessas vezes, foi de pneumonia e ele esteve afastado um mês! Não mudou nada. Na prática, uma ausência curta de Boris Johnson não fará qualquer diferença constitucional ou política.”

O papel da Rainha e o ânimo dos britânicos

Foi também a uma comparação com a II Guerra Mundial que a própria Rainha, Isabel II, recorreu para falar da situação atual. “Devemos confortar-nos no facto de que, mesmo tendo ainda bastante para suportar, melhores dias virão”, declarou a monarca num anúncio à nação no passado domingo, dia em que Boris Johnson deu entrada no hospital. “Iremos estar de novo com os nossos amigos, iremos estar de novo com as nossas famílias. Voltaremos a encontrar-nos”, declarou, evocando uma canção popular do tempo da Guerra.

Uma comunicação da Rainha ao país é sempre um evento raro — com exceção da tradicional mensagem de Natal — e que geralmente acompanha eventos de grande importância nacional. De acordo com o que uma fonte do governo revelou ao The Guardian, o Palácio de Buckingham tinha equacionado transmitir a mensagem no domingo de Páscoa, mas decidiu antecipá-la: “Estamos a pedir ao país muitos sacrifícios e a vida está muito difícil para muita gente neste momento. Ouvir Sua Majestade a Rainha, neste momento, é uma forma importante de animar as pessoas”, acrescentou a mesma fonte.

A mensagem de Isabel II no passado domingo foi uma das poucas ao longo do seu reinado

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E o facto de um pilar da estabilidade como é Isabel II — à beira de fazer 94 anos e ocupante do trono desde 1952 — ter comparado a situação atual à da II Guerra Mundial trouxe outro peso à mensagem. A Rainha já era nascida quando o seu pai, Jorge VI, se dirigiu à nação em 1939 para pedir firmeza perante os tempos duros que se anunciavam. “Ela recordou às pessoas o estoicismo dos britânicos e lembrou-lhes que ela própria já ali estava há 80 anos. É incrível”, confessa Charles Moore. “Conheço pessoas que eram vivas há 80 anos e que se lembram dessa comunicação. E agora, este domingo, foi como se a ouvissem outra vez. E ali está a mesma pessoa, capaz de as confortar 80 anos depois.”

Por mais que a mensagem emocione e mobilize, o antigo editor do Telegraph não acredita, porém, que algo do género se venha a repetir, mesmo que Boris Johnson se mantenha hospitalizado por muito mais tempo. “No lugar dela, não se pode falar muitas vezes. Quanto menos vezes ela falar, mais valiosa é a mensagem de cada vez que ela fala. Se ela começasse a falar muito, isso iria preocupar as pessoas em vez de as acalmar.” Tim Bale concorda: “Duvido que vejamos muito mais vezes ‘a fachada da casa’. Mas, nos bastidores, certamente que os seus conselheiros estão a fazer planos para vários tipos de eventualidades. Incluindo a necessidade de se nomear um novo primeiro-ministro, mesmo que de forma temporária, caso a saúde de Johnson piore ou — Deus nos livre — se revele fatal.”

Na tarde desta terça-feira, Dominic Raab voltou a tranquilizar os britânicos sobre a capacidade de resposta do governo e também sobre o estado de saúde do primeiro-ministro: “Estou confiante de que ele irá sair desta, porque se há coisa que sei sobre este primeiro-ministro é que ele é um lutador.” O currículo assim o demonstra, ou não tivesse conquistado a liderança dos conservadores, alcançado um novo acordo de saída do Reino Unido da União Europeia e conseguido uma maioria absoluta esmagadora em meio ano.

Com um novo governo instalado em Downing Street desde meados de dezembro, Boris continua em estado de graça — reforçado pela situação atual, mesmo tendo sido tardia a resposta à Covid-19. Uma sondagem publicada pelo YouGov no final de março dava conta de que 72% dos britânicos consideram que o governo tem estado bem nesta crise, um aumento de mais de 12% face à semana anterior. A popularidade do próprio primeiro-ministro disparou, chegando a níveis positivos pela primeira vez desde 2016.

“Duvido que vejamos muito mais vezes ‘a fachada da casa’ [a Rainha a dar a cara]. Mas, nos bastidores, certamente que os seus conselheiros estão a fazer planos para vários tipos de eventualidades. Incluindo a necessidade de se nomear um novo primeiro-ministro, mesmo que de forma temporária, caso a saúde de Johnson piore ou — Deus nos livre — se revele fatal.”
Tim Bale, professor de Política na Universidade Queen Mary

Resta saber se esse apoio continuará firme, principalmente à medida que vão sendo conhecidos os novos números da pandemia no Reino Unido e se regista uma subida não apenas no número de casos, mas também no número de mortes. Só esta terça-feira, registaram-se 854 mortes em todo o país. E, a juntar-se a este clima de incerteza e de medo, há agora um líder internado em estado grave. Os especialistas, porém, creem que os britânicos não estão em pânico. E mais: em termos de popularidade política, consideram que a situação é mais positiva do que negativa para o primeiro-ministro.

“É claro que o facto de o líder estar doente afeta o moral das pessoas, mas também faz com que elas tenham mais empatia por ele”, afirma Charles Moore. “Toda esta crise é a propósito de uma doença horrível e ele tem-na. As pessoas agoram podem sentir que ele não está a olhar para elas de cima, com sobranceria. ‘Ele é um de nós’, pensam.” Tim Bale concorda e diz que é mais provável surgir mais a tal “empatia” do que o “pânico”. “E isto serve para nos lembrar que esta é uma doença da qual ninguém está imune e que tem de ser levada a sério”, acrescenta. “É o único ponto positivo que vejo nesta nuvem bem escura que temos por cima das nossas cabeças”.

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