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Portugal tem o gasóleo mais caro do mundo?

A frase:

Pagamos o gasóleo mais caro do mundo?Portugal tem hoje o gasóleo mais caro do mundo. É uma conta certa que poucos conseguiriam atingir. Portugal está a pagar o gasóleo mais caro do mundo. Mesmo assim, não param de subir e bater recordes face aos parceiros da UE”.
André Ventura, líder do Chega

A ideia foi repetida duas vezes por André Ventura no arranque do debate sobre a moção de censura ao Governo que remeteu ainda para os preços que se pagam em Espanha (mais baratos). Quanto custa um português ir à bomba pôr gasolina e quanto custa a um espanhol.

Para verificar o fundamento da afirmação sobre o preço do gasóleo, o Observador foi consultar as estatísticas europeias do Oil Bulletin que comparam semanalmente o preço médio praticado em todos os países da União Europeia, final e antes de impostos. Estes dados são enviados pelos países e, no caso português, incorporam o preço médio pago depois de aplicados todos os descontos dados pelas petrolíferas. Ou seja, não consideram os preços fixados nos outdoors das bombas da gasolina. Os descontos são aplicados em cerca de dois terços dos combustíveis rodoviários vendidos.

Na última semana de junho, Portugal tinha um preço médio final do diesel de 2,066 euros por litro. Este valor era ultrapassado em 12 países da União Europeia — Suécia, Holanda, Letónia, Irlanda, Grécia, França, Finlândia, Dinamarca, Bélgica, Áustria e até Espanha. O preço médio da UE era de 2,036 euros por litro, ligeiramente acima do valor apontado para Portugal.

Na análise aos preços antes de impostos, o gasóleo português já compara pior com os parceiros europeus. O preço médio na última semana de junho era de 1,347 euros por litro. Há sete países com valores mais altos — Suécia, Holanda, Alemanha, Finlândia, Eslovénia, Dinamarca e novamente Espanha. Esta diferença entre o preço antes de impostos e o preço final indica que Portugal até está a usar a política fiscal para amortecer o preço final, tendo aliás descido o imposto neste combustível ao mínimo permitido pela União Europeia.

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É contudo necessário fazer uma ressalva, há países que optaram por apoiar os automobilistas com descontos financiados pelo Estado junto dos consumidores, em vez de baixar os impostos, como fez Portugal — foi o caso de Espanha. Não temos indicação se esses subsídios ao consumo estão contabilizados nos preços médios reportados no Oil Bulletin, mas estes são os dados oficiais e comparáveis que estão disponíveis. E de acordo com os mesmos, a afirmação de André Ventura está errada.

ERRADO

A carga fiscal dos combustíveis desceu 18 pontos percentuais? O que levou a isso?

A frase:

Em resultado das medidas que já adotamos, os portugueses pagam hoje num depósito de 50 litros menos 16 euros na gasolina e menos 14 euros no gasóleo do que pagariam se nada tivéssemos feito. Em novembro de 2021 criamos o autovoucher e em janeiro de 2022 suspendemos a atualização da taxa de carbono. Em março introduzimos o mecanismo que assegura a neutralidade fiscal do aumento dos preços e reforçamos o apoio por via do autovoucher. Em abril (maio) avançamos com a redução do ISP em montante equivalente à descida de 10 pontos na taxa de IVA. Em Portugal, entre outubro e junho, a carga fiscal sobre os combustíveis já baixou 18 pontos percentuais. Hoje sem o conjunto destas medidas, os portugueses pagariam mais 28 cêntimos por litro no gasóleo e mais 32 cêntimos por litro na gasolina.”

António Costa, primeiro-ministro

Na resposta a André Ventura, António Costa atirou uma série de números para o debate sobre o impacto das medidas do Governo no preço pago pelos portugueses nos combustíveis. E foram várias, algumas combinadas, outras adotadas em tempos diferentes, o que dificulta a verificação da sua correção.

O Observador centrou-se na descida da carga fiscal nos combustíveis que o primeiro-ministro quantifica em 18 pontos percentuais entre outubro e junho. E foi comparar a carga fiscal por cada litro de combustível na segunda semana de outubro de 2021, antes de ser decidida a primeira descida do imposto, e o peso que os mesmos impostos (IVA e ISP) tinham no preço final na última semana de junho.

A carga fiscal da gasolina caiu de 58% para 40% e a do gasóleo baixou de 53% para 35%. As contas que Costa referiu estão corretas. Mas há um senão. Ainda que o primeiro-ministro não tenha atribuído este efeito às decisões tomadas pelo Governo para conter os preços, essa a interpretação é provável face ao contexto do discurso que elencava todas as medidas adotadas desde outubro e os seus impactos nos preços.

É verdade que para a descida da carga fiscal contribui a redução do imposto petrolífero e o congelamento da atualização da taxa de carbono que foi suspensa em janeiro. Mas o fator que mais efeito teve foi a subida do preço antes de impostos que, entre outubro de 2021 e junho de 2022, foi de 60 cêntimos no gasóleo e de 50 cêntimos na gasolina. Segundo contas das Finanças também citadas pelo primeiro-ministro, graças às medidas do Executivo os portugueses estão a pagar menos 28 cêntimos de impostos por litro de gasóleo e 32 na gasolina do que estariam se nada fosse tivesse sido feito. Uma poupança que considera o efeito da suspensão este ano da atualização da taxa de carbono (seis cêntimos por litro).

O Governo sempre admitiu que as medidas de contenção nunca poderiam anular todo o impacto da crise energética e da guerra da Ucrânia no preço dos combustíveis. E quanto maior o preço antes de impostos, menor o peso dos impostos no preço final.

Logo a afirmação, apesar de correta, é esticada por não explicitar que a carga fiscal também cai por efeito da subida dos preços.

ESTICADO

Lisboa tem o pior aeroporto do mundo?

A frase:

O Aeroporto de Lisboa foi considerado o pior do mundo em todo o lado (…) Quero que quem está em casa ouça bem: o pior do mundo, segundo os rankings internacionais”
André Ventura, líder do Chega

Na intervenção de abertura do debate sobre a moção de censura ao Governo, André Ventura disse que o Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, foi classificado como “o pior do mundo”. Na mesma intervenção, o líder do Chega concretizou essa ideia dizendo que essa avaliação constava dos “rankings internacionais”. O argumento é abusivo e enganador.

A classificação de “pior aeroporto do mundo” foi atribuída, de facto, ao aeroporto de Lisboa já este ano. Essa avaliação é resultado de uma avaliação divulgada pelo site Airhelp, que se apresenta como um organismo dedicado à defesa dos direitos dos passageiros aéreos.

Aeroporto de Lisboa é o pior do mundo? Há um ranking que diz que sim

O ranking foi tornado público em maio e Lisboa surgia no 132º lugar da lista — no fundo da tabela dos aeroportos considerados naquela avaliação, portanto. A hierarquia era definida em função das classificações atribuídas a critérios como a assiduidade dos voos registada nos diferentes aeroportos, a qualidade dos serviços prestados (como o apoio ao cliente, as filas e a limpeza) e, ainda, as opções de alimentação e lojas disponíveis.

Indo ao argumento de André Ventura, ele tem dois problemas centrais. O primeiro decorre da própria informação disponibilizada pelo site que colocou Lisboa como pior aeroporto do mundo: é que a própria Airhelp reconhece que escolhe “aeroportos com base com mais nos conhecidos e mais utilizados aeroportos”, mas acrescenta que “exclui aeroportos em relação aos quais não é possível obter informações”.

Mas o segundo problema é mais relevante para a verificação do argumento. O líder do Chega defende que a classificação é possível de constatar “em todo o lado” e decorre dos “rankings internacionais”. Não é verdade. Apenas um ranking classifica o Aeroporto de Humberto Delgado como sendo o pior do mundo no ano de 2022 (com avaliação que se baseia em dados de 2021), o da Airhelp.

Noutros rankings, a avaliação é, na verdade, distinta. Por exemplo, o World Airport Survey 2022 coloca Lisboa no 90º lugar de uma lista de 100. Noutro ranking, da Airports Council International, publicado pelo jornal britânico The Guardian, Lisboa está em 98º lugar de 100 possíveis mas, mais uma vez, a lista só se refere a um conjunto de 100 infraestruturas avaliadas, menos ainda que o universo considerado no ranking em que André Ventura parece basear-se para fundamentar o seu argumento.

ENGANADOR

Número de profissionais no setor da Saúde aumentou face a 2015?

A frase:

Dispomos hoje de mais 24.674 profissionais [no setor da Saúde, face a 2015]”
António Costa, primeiro-ministro

Em resposta ao líder do Chega, que lançou críticas sobre o atual estado da Saúde, António Costa disse que Portugal tem hoje “mais 24.674” profissionais nesse setor, entre médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapêutica e outros grupos profissionais. Nessa apresentação de números, o primeiro-ministro fazia uma comparação “entre 2015 e 2022”, sem especificar um período mais específico. Nas várias formas de analisar esta realidade, os números não batem certo com os dados oficiais públicos — mas os dados oficiais mostram que a diferença face ao que foi dito pelo primeiro-ministro é sempre benéfica para o argumento verificado.

O primeiro Executivo liderado por António Costa tomou posse em novembro de 2015. Tomemos, por isso, como ponto de partida para esta análise os números do universo de profissionais de saúde no ativo no final desse ano.

Em dezembro de 2015, segundo dados do Portal da Transparência do Serviço Nacional de Saúde (SNS), havia 119.998 profissionais no ativo no setor da Saúde. Em maio deste ano, esse universo tinha crescido para os 151.379 profissionais. Este critério engloba médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapêutica e, recorrendo à formulação do próprio António Costa, “demais grupos profissionais” — farmacêuticos, técnicos superiores de saúde, informáticos, assistentes operacionais e outros.

Considerando este intervalo temporal, a diferença entre o final de 2015 e maio de 2022 é de um saldo positivo de 31.381 profissionais no setor — ou seja, mais 6.707 profissionais que o número referido por António Costa.

Encurtemos o período analisado e fiquemo-nos pelo período que foi do final de 2015 ao final de 2021 (Costa, recorde-se, falou em dados “entre 2015 e 2022”). Sabendo já o universo de profissionais no ativo no final de 2015 (119.998), e considerando que havia 148.452 profissionais no final de dezembro do ano passado, então a diferença é de 28.454 a mais — uma diferença, por excesso, de 3780 profissionais no setor da Saúde.

De qualquer forma, há um ponto claro na verificação desta afirmação: independentemente do intervalo temporal considerado (uma vez que a formulação de António Costa não é totalmente específica), havia mais profissionais ativos no setor da Saúde em 2022 (seja no início, seja já no final de maio), quando comparado com o momento imediatamente posterior à tomada de posse do primeiro Governo de António Costa. A afirmação é, por isso, verdadeira.

CERTO

Portugal tem a sexta eletricidade mais cara e é dos mais caros em gás natural?

As frases:

Portugal tem a sexta eletricidade mais cara da União Europeia. (…) Portugal é dos países da União Europeia que mais paga na energia. (…) Em 2021, só as famílias suecas na Europa toda pagavam mais por gás natural. Explique lá isto às pessoas. Só a Suécia paga mais do que nós no gás natural…. Alguma coisa não está bem.”

André Ventura, líder do Chega

André Ventura, na moção de censura que apresentou ao Governo, formulou várias afirmações sobre o custo da energia em Portugal. E referiu que Portugal tem a sexta eletricidade mais cara da Europa e que a Suécia é o único país europeu a pagar mais pelo gás natural.

Nenhum dos últimos dados do Eurostat confirma essa indicação do deputado do Chega.

No que respeita à eletricidade, nos segundo semestre de 2021 — os últimos dados do Eurostat — Portugal estava no 10.º lugar nos preços da eletricidade da União Europeia, considerando preços com impostos. Retirando estes impostos, Portugal fica bem mais cá para baixo: está em 20.º. Nos consumidores não domésticos, Portugal encontra-se na 17.ª posição na União Europeia no preço pago pela indústria.

Fonte: Eurostat

No caso do gás natural, também de acordo com os dados do Eurostat, a Suécia é de facto o país onde as famílias pagam mais, mas à frente de Portugal ainda estão mais outros oito países. Ou seja, Portugal está na 9.ª posição nos preços do gás natural das famílias.

Fonte: Eurostat

Assim, nenhum dos dados confirma a afirmação de André Ventura, nem no que respeita aos preços da eletricidade nem do gás natural.

ERRADO

Governo ainda não pagou “nem um tostão” dos 500 milhões prometidos aos agricultores?

A frase:

Prometeram aos agricultores 500 milhões em apoios. Nem um tostão chegou aos agricultores, milhares por todo o país”.
André Ventura, líder do Chega.

Na intervenção inicial do debate, André Ventura repescou uma denúncia feita por associações de agricultores, que davam conta de atrasos no pagamento do Pedido Único (PU) face ao prometido pelo Executivo. Segundo o líder do Chega, “nem um tostão” dos 500 milhões chegou ainda aos agricultores.

Na semana passada, a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) acusou a ministra da Agricultura de “faltar à palavra” por, até final de junho, ainda não ter sido pago aos agricultores a antecipação do Pedido Único, que o Governo prometeu até final de maio. “À data de hoje [30 de junho], voltou a verificar-se um incumprimento da palavra dada pela Ministra da Agricultura no que respeita ao pagamento antecipado de 500 milhões de euros relativamente ao Pedido Único”, refere o comunicado.

Também a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) denunciou a falha: “Esta falta de cumprimento por parte do Ministério da Agricultura é inaceitável num período em que se somam dificuldades sobre dificuldades para os agricultores, aflitos com a seca e com os enormes custos de produção”.

Confederação Nacional de Agricultura considera inaceitável Governo ter voltado a faltar ao pagamento aos agricultores

De facto, no final de abril, a ministra Maria do Céu Antunes garantiu que os agricultores iriam receber até maio os 500 milhões de euros de adiantamento dos pagamento do PU para “atenuar os constrangimentos de tesouraria” perante o aumento dos custos da energia e das matérias-primas. “Estamos a fazer um adiantamento dos pagamentos do PU”, ou seja, do “valor que os agricultores só iriam receber em outubro e que vão receber até maio”, disse, na altura.

Contactado pelo Observador, o Ministério da Agricultura remeteu para um comunicado divulgado na semana passada, onde prevê iniciar os pagamentos “a partir da semana de 4 de julho”. Ou seja, reconheceu que a meta de maio não foi cumprida.

Porquê? O Ministério explica que o período para apresentação de candidaturas esteve aberto inicialmente até 31 de maio de 2022, mas foi alargado até 9 de junho “a pedido das confederações de Agricultores”. E acrescenta que o despacho da medida prevê que os pagamentos possam ser feitos “até ao último dia do mês seguinte ao da submissão da candidatura”, ou seja, até final de julho. Dos 500 milhões de euros disponíveis, a tutela adianta que as 36.153 candidaturas apresentadas pelos agricultores correspondem a 241 milhões de euros.

Pagamentos de apoio excecional a agricultores devem começar na próxima semana

O Ministério não respondeu ao Observador sobre a razão pela qual a verba não ficou disponível em maio. Nem disse se efetivamente já começaram esta semana a ser efetuados os pagamentos, como garantia no comunicado da semana passada.

Assim, é verdade que o Governo prometeu 500 milhões de euros em apoios aos agricultores e que pelo menos até à semana passada ainda nada tinha chegado aos agricultores. O Executivo prevê iniciar os pagamentos “a partir da semana de 4 de julho” — portanto, na semana em que Ventura profere as declarações —, mas não refere se esse prazo está ou não a ser cumprido.

PRATICAMENTE CERTO