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MELISSA VIEIRA/OBSERVADOR

MELISSA VIEIRA/OBSERVADOR

Como a vida de Billie Eilish mudou da noite para o dia por causa de uma canção

Na semana em que Billie Eilish iria atuar no festival NOS Alive, o Observador faz a pré-publicação de "De E-Girl a It Girl", a biografia de Billie Eilish publicada agora em Portugal.

Adrian Besley é o autor da biografia não oficial de Billie Eilish que esta semana é editada em Portugal. É o retrato de uma das maiores estrelas da música pop da atualidade, a mesma que tinha concerto agendado para esta semana no NOS Alive, festival que entretanto adiou a edição deste ano para 2021. A infância, as primeiras canções, o sucesso e as digressões fazem parte do livro que procura descrever a vida de um fenómeno inesperado, de uma cantora de 17 anos que esgota arenas em todo o mundo, a artista mais jovem de sempre a sair vencedora dos Grammys, já este ano.

O Observador faz a pré-publicação de “De E-Girl a It Girl”, com um excerto que recorda como uma canção em particular mudou para sempre a vida daquela que até então era conhecida como Billie O’Connell (e do seu irmão, Finneas).

A capa de "De E-Girl a It Girl", de Adrian Besley (nas livrarias esta terça-feira, 7 de julho, pela Nuvem de Tinta)

É um conto de fadas sobre uma rapariga de 13 anos que certa noite foi dormir sem ninguém saber quem ela era e no dia seguinte acordou famosa. Embora isto pareça o argumento de um filme da Disney, não está muito longe da verdade. Billie Eilish era uma adolescente normal que por acaso publicou uma canção online, e a própria admite que, quando esse tema se tornou viral, tudo mudou tão depressa que ela teve dificuldade em adaptar-se. Deixou-se simplesmente levar, adorando cada momento.

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No outono de 2015, se havia membro da família O’Connell que parecia destinado ao estrelato era o irmão de Billie, Finneas, com 18 anos, cuja carreira de ator começava a levantar voo. Depois de entrar no filme Professora Baldas, fez trabalhos para a televisão, incluindo um papel importante na temporada final de Glee, transmitida no início de 2015. Ao mesmo tempo, a sua banda, os Slightlys, vinha conquistando fãs e elogios em Los Angeles. Tocaram para dez mil pessoas na série de concertos do Santa Monica Pier Twilight Concert, e um artigo no Los Angeles Weekly de outubro de 2014 lançou a ideia de que a banda podia ser “a próxima revelação”.

Então com 13 anos, Billie dava-se por satisfeita à sombra do sucesso do irmão. Depois de uma audição desastrosa que a desanimou, desistira da ideia de seguir os pais e o irmão na carreira da representação e dirigia nessa altura toda a sua energia criativa para a dança. O entusiasmo inicial de Billie pelo sapateado estendeu-se a todos os tipos de dança — e mesmo agora, quando fala nisso, percebe-se que adora a liberdade que a dança lhe dá de se expressar. Aos 13 anos estava inscrita no Revolution Dance Center (RDC) em Los Angeles, onde passava cerca de 11 horas por semana num estúdio de dança, concentrando-se na aprendizagem dos estilos contemporâneo, lírico e hip-hop e apresentando-se regularmente em competições. Billie parecia destinada a tornar-se bailarina.

Numa aula de escrita de canções, a mãe pediu-lhe que visse um filme ou programa na televisão e registasse quaisquer títulos, nomes ou diálogos que lhe parecessem ficar bem numa canção. Billie foi ver o seu programa favorito, "The Walking Dead".

No entanto, continuava a adorar cantar. Aliás, numa casa tão musical, era impossível não cantar. Billie cantava as músicas que os pais lhes tocavam, músicas de que ela própria gostava e temas que ela ou Finneas compunham. Escutava Finneas a compor e a gravar música na Logic Pro, do outro lado da parede do quarto, e sabia as canções dele quase tão bem como ele próprio. Billie também se juntava a ele, às vezes, acrescentando a sua voz suave e melodiosa às composições do irmão, harmonizando ou mesmo tentando as suas próprias canções.

A 1 de agosto de 2015 (um dia depois de Finneas completar 18 anos), os irmãos carregaram uma das suas colaborações na SoundCloud, a plataforma online para partilhar e descobrir músicas originais. O tema chamava-se “sHE’S brOKen” [Ela está destroçada], com “HE’S OK” [Ele está bem] destacado a maiús- culas, contrastando com o sentimento do título. Billie provavelmente conhecia o meme “sHE beLIEveD” [Ela acreditou] (com “HE LIED” [Ele mentiu] destacado a maiúsculas), popular na web desde 2012, mas ainda assim foi uma variação inteligente do tema. A letra descrevia sem pruridos o fim de uma relação, com um acompanhamento simples (embelezado por uns truques de produção feitos por Finneas) e a voz doce e melodiosa de Billie. Consegue-se perceber que é Billie, embora não haja nesta canção o lado etéreo ou os sussurros melosos dos seus êxitos posteriores.

[“sHE’S brOKen”:]

A 14 de setembro foi carregada mais uma canção na SoundCloud. Billie diz que “Fingers Crossed” foi o primeiro tema que escreveu e que, na altura, nem gostou muito, mas teve vontade de o partilhar. Numa aula de escrita de canções, a mãe pediu-lhe que visse um filme ou programa na televisão e registasse quaisquer títulos, nomes ou diálogos que lhe parecessem ficar bem numa canção. Billie foi ver o seu programa favorito, “The Walking Dead”, e a série sobre zombies forneceu letras como “Everybody makes it ‘til they don’t” e “Too far gone”, título de um dos episódios. Billie explicou mais tarde que tencionara escrever sobre o apocalipse zombie, mas que acabou por lhe sair uma canção de amor cheia de angústia.

“Fingers Crossed” era diferente da primeira canção que ela tinha carregado. Billie canta sobre melancolia e desespero por cima de um acompanhamento portentoso, pontuado por uma batida lenta, pouca instrumentação e acordes prolongados. Havia agora pungência e intimidade na voz, com aquela sensação de que Billie estava incrivelmente próxima e, ao mesmo tempo, tão distante. Um estilo vocálico que se tornaria familiar nos dois anos seguintes, e muitos fãs ainda atribuem ótima classificação a esta faixa.

[“Fingers Crossed”:]

Como seria de esperar, estas canções tiveram pouco impacto na altura, e não foram muito ouvidas na SoundCloud. Tal como milhares de jovens (e adultos), Billie e Finneas carregaram-nas para se divertirem e queriam apenas partilhá-las com amigos. Nunca sonharam que seriam ouvidas milhões de vezes. Além disso, Billie estava demasiado ocupada a dançar, a trabalhar nos seus projetos de ensino em casa e a divertir-se. Nesse outono, assistiu mesmo ao seu primeiro grande concerto — ela e Finneas foram ao Shrine, um auditório cavernoso em Los Angeles, ver The Neighbourhood, a banda norte-americana de rock inspirada no hip hop. Em 2019, Billie regressaria aqui para dar dois concertos esgotados.

O que aconteceu a seguir mudou para sempre a vida de Billie O’Connell. Um dos seus professores de dança na RDC era Fred Diaz, bailarino e coreógrafo que tinha trabalhado com vários artistas de topo, incluindo Rihanna, Mariah Carey e Jennifer Lopez. Ele estava a par do empenho de Billie e Finneas na escrita de canções e sugeriu coreografar uma dança para uma das composições deles. Quando Billie lhe perguntou que tipo de música tinha em mente, ele mencionou “Station”, da cantora britânica Låpsley, uma canção que tinham dançado recentemente, e referiu ainda uma melodia que a tinha ouvido trautear na aula. Ela soube imediatamente qual era o tema. Era do seu irmão, e tinha-o ouvido através da parede do quarto e cantado — andava-lhe às voltas na cabeça nas últimas semanas. Chamava-se “ocean eyes” e Finneas escrevera-a originalmente para os Slightlys.

Billie adotou os seus dois primeiros nomes como nome artístico. Logo, mesmo tendo sido Billie O’Connell quem carregou a faixa, à medida que "ocean eyes" registava cada vez mais reproduções, foi Billie Eilish quem ganhou rapidamente reconhecimento.

A banda já tinha interpretado “ocean eyes”, mas Finneas acreditava que a canção poderia ser perfeita para Billie. Ela tinha passado um mau bocado por causa de um rapaz com quem andara obcecada e Finneas achava que ela talvez se identificasse com aquela música. Tinha razão. Billie sentiu que ele tinha olhado para o seu coração quando escreveu a letra — como se a tivesse escrito para ela. Quando a cantou, encaixou-se perfeitamente. Billie deu-lhe uma profundidade de sentimento que aquela canção nunca tinha tido.

Ao mesmo tempo, Billie pensava no tema como uma música de dança, imaginando de que modo poderia adequar-se a uma coreografia de dança contemporânea. Os irmãos trabalharam juntos nesta canção no estúdio minúsculo do quarto de Finneas — Billie sentada de pernas cruzadas na cama e Finneas ao computador. Trabalharam no tempo e nos arranjos (Finneas lembra-se de que concordaram em tudo acerca da canção — o que nem sempre acontecia) e, ao terminarem a gravação, ouviram-na de novo e perceberam que tinham criado algo de que se podiam orgulhar. Carregaram a música na SoundCloud com um botão especial, para que Fred Diaz a pudesse descarregar gratuitamente. Era o dia 18 de novembro de 2015 e, embora ela ainda não o soubesse, a carreira de Billie como pop star acabara de começar.

[“ocean eyes”:]

No dia seguinte, Billie estava no Starbucks, a abrigar-se do frio no intervalo das aulas de dança, quando recebeu um telefonema de Finneas (Billie admite que pode ter sido uns dias mais tarde, mas a história assim é muito mais impressionante!). Ele disse-lhe que a canção tinha chegado às mil reproduções na SoundCloud. Ficaram os dois estupefactos. Claro que os amigos os tinham apoiado e divulgaram a música, mas não podiam conhecer tanta gente! Billie lembra-se de que aquele telefonema absurdamente excitado durou tanto tempo que ela teve de ir a correr para a aula seguinte, com um grande sorriso na cara.

Billie adotou os seus dois primeiros nomes como nome artístico. Logo, mesmo tendo sido Billie O’Connell quem carregou a faixa, à medida que “ocean eyes” registava cada vez mais reproduções, foi Billie Eilish quem ganhou rapidamente reconhecimento. Se alguma vez carregaram uma canção, imagem ou vídeo online, sabem como é difícil obter reações fora do círculo de amigos. Por isso, conseguem provavelmente imaginar a incredulidade e a alegria que Billie e Finneas sentiram com o sucesso da canção — e sem qualquer marketing ou publicidade. Era uma canção bem feita, excelentemente produzida e impecavelmente cantada. Tornou-se viral porque era envolvente e contagiante.

Billie Eilish ao vivo em Portugal, quando atuou na Altice Arena, em setembro do ano passado

MELISSA VIEIRA/OBSERVADOR

Os três minutos e meio de “ocean eyes” são uma balada sonhadora, com um acompanhamento mínimo de percussaónica. A letra fala de um amor intenso e usa metáforas que vão da cegueira a cidades a arder para transmitir emoções desde a calma profunda à agitação imensa. A chave do seu poder de atração está, na verdade, no modo como Billie canta. A voz dela soa já mais madura do que nas canções anteriores e consegue-se identificar a influência de Lana Del Rey, Aurora e Låpsley.

A voz é forte e límpida, mas, no seu tom soprano e fraseado intenso, existe uma fragilidade e uma sensibilidade que transmitem uma emoção poderosa. Tudo isto é enfatizado pela sobreposição da voz, que dá a toda a canção uma tonalidade dilacerante, triste e devastadora.

Para uma artista desconhecida e sem o apoio de uma discográfica, “ocean eyes” foi uma publicação extraordinária. Mas as probabilidades de se destacar entre os milhões de músicas na SoundCloud eram ínfimas. No entanto, contra todas essas probabilidades, o tema continuou a dar nas vistas. Uma semana mais tarde, o blogue musical Free Bike Valet, sediado em Los Angeles, que já seguia os Slightlys, comentou-a, descrevendo-a como “Um êxito hipnótico de trip-pop construído sobre batidas digitais delicadas, efeitos surreais de sintetizador e a voz angelicalmente suave de Eilish”, ao mesmo tempo que os Blah Blah Blah Science, criadores de tendências musicais da Califórnia, se referiam à “voz harmoniosa, muito graciosa, angélica e onírica de Billie”. Começou também a ser difundida na KCRW, uma estação pública de rádio da vizinha Santa Mónica, onde foi descoberta pelo DJ residente Jason Kramer.

[Billie] Estava numa aula de hip hop com um grupo mais velho quando fez uma rutura na placa epifisária da anca. A dança não acabou para ela, mas teria de a esquecer durante os próximos tempos.

O ponto de viragem aconteceu graças a um homem chamado Chad Hillard, que afirma ter reparado na canção quando ainda tinha apenas cerca de uma centena de reproduções. Chad gere o Hillydilly, um website respeitado e influente dedicado à busca de nova música e que “descobriu” Lorde e Låpsley. Com uma recomendação e um artigo a elogiar tanto “ocean eyes” como “Fingers Crossed” no Hillydilly, Billie estava lançada. Seis meses mais tarde, ela reconheceria a importância deste apoio, ao escrever no Facebook: “Foi o Hillydilly.com que começou isto tudo. Obrigada por tudo, Michael Enright [que escreveu o artigo] e Chad Hillard. Adoro-vos.”

Em 15 dias, começaram a aparecer remixes da canção na SoundCloud. O promissor produtor Cautious Clay e o co-autor de “Boyfriend”, de Justin Bieber, carregaram versões, mas a que se destacou e se tornou mais popular foi a do compositor e produtor inglês Arron Davey, que trabalha com o nome Astronomyy. O remix dele apareceu no final de novembro de 2015 e surpreendeu a própria Billie.

[a remistura de Astronomyy:]

Ele enviou-lhe uma mensagem através do Instagram a pedir a letra. Ela deu-lha e a seguir viu o remix aparecer no site. Astronomyy diz que ouviu a canção numa noite e passou as seis horas seguintes a trabalhar nela. A versão dele duplica a percussão atormentada e a voz penetrante, e acrescenta uma sensação subaquática que reforça a qualidade da atmosfera já de si arrepiante da canção. Para muitos, foi a melhor produção do tema até então e, ao ser criado por um artista cujas próprias músicas alcançavam milhões de reproduções, apresentou “ocean eyes” a milhares de ouvintes novos.

Billie ficou naturalmente espantada com a reação à música, para a qual não estava preparada. Felizmente, graças aos Slightlys, Finneas tornara-se amigo de Danny Rukasin, um agente conhecedor do meio das bandas de Los Angeles.

Rukasin captou imediatamente o que estava a acontecer com “ocean eyes” e percebeu que uma rapariga tão nova como Billie — na verdade, qualquer pessoa — estaria a ter dificuldade em lidar com o sucesso. No dia a seguir à canção se tornar viral, ofereceu-se para ajudar e foi a casa deles, para se encontrar não apenas com Billie, mas também com Finneas e os pais. Queria saber se Billie desejava ser cantora ou se estava apenas feliz com a atenção que a canção estava a atrair. Não demorou muito a perceber que ela já pensara em tudo e tinha uma ideia clara de como se queria apresentar ao mundo.

Quando Billie fez 14 anos, a 18 de dezembro de 2015, deve ter sido difícil gerir tudo o que estava a acontecer. O tema "ocean eyes" registava agora mais de 150 mil reproduções, Billie figurava regularmente em artigos online sobre nova música e começou a receber todo o tipo de ofertas.

A dança era uma parte importante da visão de Billie. Considerava-se uma bailarina tanto ou mais que uma cantora. Como prometido, Fred fez uma coreografia para “ocean eyes”, mas Billie só trabalhou dois dias. Estava numa aula de hip hop com um grupo mais velho quando fez uma rutura na placa epifisária da anca. A dança não acabou para ela, mas teria de a esquecer durante os próximos tempos. Felizmente, ela tinha outra paixão para alimentar, e esta estava a andar a todo o vapor.

Quando Billie fez 14 anos, a 18 de dezembro de 2015, deve ter sido difícil gerir tudo o que estava a acontecer. O tema “ocean eyes” registava agora mais de 150 mil reproduções, Billie figurava regularmente em artigos online sobre nova música e começou a receber todo o tipo de ofertas. O contributo dos pais, conhecedores da indústria musical, um irmão que estava, também ele, a dar os primeiros passos no meio musical de Los Angeles e a amizade de um agente local foram todos preciosos, mas se Billie queria aproveitar aquele sucesso — e fazê-lo à sua maneira — iria precisar de mais ajuda rapidamente.

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