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As contas passadas indicam derrotas sucessivas para Dilma
Começa esta quinta-feira, às 13h, o julgamento final de Dilma Rousseff no Senado, previsto para terminar na próxima terça. Antes da última votação, serão ouvidas as testemunhas de acusação e defesa, além de ser realizada uma sessão em que se espera que a Presidente afastada fale aos senadores e responda a perguntas sobre o processo. Para travar o impeachment, Dilma necessita de 28 votos dos 81 senadores. Atualmente, conta com 21 — em teoria. O seu retrocesso em votações passadas, no entanto, é desfavorável.
Já se passaram quatro meses desde que o processo de impeachment foi admitido na Câmara dos Deputados do Brasil, por 367 votos favoráveis e 137 contrários. Desde então, a longa e complexa destituição de Dilma Rousseff está nas mãos do Senado, que tem votado a favor do seu afastamento nas diferentes fases do processo, desde que se tornaram responsáveis pelo futuro político da Presidente afastada.
A primeira votação aconteceu a 11 de maio, quando os senadores votaram pela abertura do processo de impeachment por 55 votos favoráveis e 22 contrários. Eram necessários 54 votos, ou seja, dois terços da Câmara Alta do Congresso. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), não votou, alegando que gostava de manter a neutralidade, enquanto Jader Barbalho (PMDB) e Eduardo Braga (PMDB) ausentaram-se por razões de saúde. Em causa estava o relatório do senador Antônio Anastasia, favorável à admissibilidade do processo contra a petista, que já havia sido aprovado na comissão especial do Senado por 15 votos a favor e cinco contra. Foi apenas neste ponto que Dilma se afastou temporariamente das suas funções como Presidente do Brasil. O vice-presidente Michel Temer assumiu as funções de Presidente interino.
Na altura, o senador Lindbergh Farias (PT) caracterizou o afastamento de Dilma como um “absurdo” e disse acreditar na reversão do processo na sua fase intermediária. “Achamos um absurdo afastar uma Presidente sem crime de responsabilidade, é uma grande injustiça. Não há crime de responsabilidade. Está sendo afastada porque há maioria parlamentar contra ela […] Agora vamos entrar em nova etapa, uma mais técnica, e acredito ainda que na batalha final do julgamento temos chance, porque eles vão precisar de 54 votos e tiveram 55”, disse, citado pelo site G1.
E então veio a fase intermediária do processo, chamada de “pronúncia”. Nesta etapa, a comissão especial do Senado voltou a reunir-se para realizar diligências, produzir provas e ouvir testemunhas da acusação e da defesa. Antônio Anastasia foi o responsável por elaborar o relatório final das sessões e manteve a sua opinião ao recomendar o impeachment. O documento foi aprovado, a 2 de agosto, por 14 votos a 5.
O relatório foi a votos por todo o Senado brasileiro a 10 de agosto, numa sessão liderada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Ricardo Lewandowski. Esta era a segunda oportunidade no Senado para que a Presidente afastada pudesse travar o processo e voltar ao Palácio do Planalto. O resultado? Nova derrota por 59 votos a favor e 21 contrários. Com a aprovação do documento, Dilma Rousseff tornou-se ré no processo.
Durante a votação, o senador Cassio Cunha Lima, líder no Senado do PSDB (segundo maior partido de oposição ao governo de Dilma Rousseff), destacou que o impeachment já estava a ser “debatido, discutido e analisado há quatro meses” e que a maioria dos senadores já tinha manifestado a sua vontade de destituir a petista. “Não serão em cinco minutos que vamos mudar a posição de nenhum dos senadores, de nenhuma das senadoras. Todos já estão com suas convicções firmadas, e a maioria já manifestada, há poucos instantes conclui pela prática do crime de responsabilidade, porque, sim, a presidente Dilma Rousseff cometeu crime de responsabilidade”, afirmou.
Levando em consideração a última votação, Dilma Rousseff precisaria agora de arranjar sete votos a seu favor e estará a trabalhar em diferentes estratégias para vencer o processo. Como é que pretende fazer isso?
Como Dilma quer somar votos: plebiscito para novas eleições, falar no Senado e constranger ex-ministros
De acordo com o placar do jornal Folha de S. Paulo, 48 senadores já declararam que vão votar a favor do impeachment, enquanto 18 disseram que vão votar contra. Segundo a publicação, 10 senadores não declararam voto, há quatro indecisos e um não respondeu à pergunta do jornal.
Já de acordo com o levantamento do jornal Estado de S. Paulo, 43 senadores declararam que vão votar pelo afastamento definitivo de Dilma Rousseff, enquanto o número de parlamentares contrários ao processo são os mesmo 18 apontados pela Folha de S. Paulo. 16 senadores não quiseram responder ao jornal, enquanto quatro declararam-se indecisos.
De olho nos senadores indecisos, Dilma Rousseff lançou a sua maior cartada: consulta popular para a realização de novas eleições. Na semana passada, a Presidente afastada leu no Palácio da Alvorada, em Brasília, uma carta aos senadores e à população, na qual defende um plebiscito para a convocação de novas eleições.
A realização de novas eleições fora do ciclo político num sistema presidencialista, como o brasileiro, está prevista apenas em situações muito específicas e exige o apoio da Câmara dos Deputados e do Senado, algo que poderia ganhar força com a aprovação popular da ideia a partir de um plebiscito. A proposta enfrenta desafios constitucionais e jurídicos sobre o seu formato, mas é defendida por senadores que trocariam o seu voto contra o impeachment caso Dilma apoiasse a ideia.
É o caso do senador João Capiberibe (PSB), que se declara contrário à destituição de Dilma, mesmo fazendo parte de um partido favorável ao processo. “Há cerca de oito a 12 senadores em dúvida. O jogo não acabou”, afirmou ao jornal Hoje em Dia.
Já o senador Roberto Requião (PMDB), que em junho havia proposto em sessão parlamentar a realização do plebiscito, criticou esta quarta-feira, na sua conta no Twitter, os senadores que não querem aceitar a proposta de novas eleições.
Não posso acreditar que pelo menos trinta senadores não tenham a coragem de acabar com o impasse devolvendo o protagonismo ao povo.
— Roberto Requião (@requiaopmdb) August 23, 2016
A solução para o impasse politico brasileiro é derrubar o impeachment e ,em novas eleições, devolver o protagonismo ao povo brasileiro.
— Roberto Requião (@requiaopmdb) August 23, 2016
Outra estratégia de Dilma Rousseff para conseguir conquistar ou reverter votos é apresentar a sua defesa pessoalmente no Senado, na terça-feira, de acordo com o cronograma definido para o julgamento final. “É a grande chance de Dilma estar cara a cara com os senadores que a acusam”, disse a senadora Vanessa Grazziotin, em entrevista ao site UOL. Para a senadora, um impeachment “precisa ter forma e conteúdo, principalmente. Mas não tem conteúdo”.
Um dos senadores indecisos que já declarou que vai esperar pelo discurso de Dilma Rousseff é Acir Gurgacz (PDT-RO). Na votação da fase intermediária do processo, Gurgacz desobedeceu à orientação do seu partido e votou a favor do impeachment. “Julgar o mérito é uma questão muito pessoal. Nós estamos no Senado como juízes. Não é uma questão partidária […] Não tenho problema em não seguir a orientação do partido. Claro que sinto muito se isso acontecer, mas, se eu entender que o melhor para o Brasil é algo diferente do que o partido pensa, eu vou no meu pensamento”, explicou o senador ao site G1.
Segundo relata a Folha de S. Paulo, um dos objetivos da presença da Presidente afastada no Senado seria constranger seis ex-ministros do seu governo que estão no grupo de senadores que pertencem ao grupo que deve votar a favor do afastamento definitivo da petista. Caso tivesse o apoio deles, Dilma ficaria a um voto de travar a sua destituição.
Um exemplo é o senador Eduardo Braga, que foi ministro das Minas e Energia de Dilma até abril deste ano. Braga declarou à publicação que deve votar a favor do processo. “O que me colocou no Senado foi a representação do povo do Amazonas e ele tem-se manifestado claramente e majoritariamente em todas as pesquisas com relação ao afastamento. Isso não significa que eu não respeite e não tenha consideração pessoal pela Presidente”, afirmou.
Como Michel Temer quer subtrair votos de Dilma: reuniões, ouvir os “sinais” dos senadores e convites a eventos oficias
Segundo relata o jornal El País Brasil, Michel Temer tem intensificado, nos últimos dias, conversas com o grupo de senadores que se declaram indecisos ou que ainda não revelaram os seus votos. A publicação descreve que os encontros eram marcados à última hora, no Palácio do Planalto, e eram descritos oficialmente como reuniões para discutir assuntos de interesse do círculo eleitoral dos parlamentares. O Presidente interino não falava uma palavra sobre o impeachment. Ao fim da reunião, auxiliares de Temer seriam os responsáveis por negociar o voto favorável ao processo.
“O movimento é discreto. É um ato político. Você vai, trata de um tema de interesse do Estado e, depois, vem um ministro, um assessor, e te assusta sobre o impeachment. Já esperava que isso ocorreria”, disse um dos congressistas, sob anonimato, ao jornal.
Entre os senadores que se encontraram com Michel Temer estão os indecisos João Alberto Souza (PMDB) e Roberto Rocha (PSB), e os “elos fracos” Ciro Nogueira (PP) e Eduardo Amorim (PSC), que votaram a favor do impeachment em fases anteriores mas poderiam mudar de ideia por pressão dos seus eleitores, uma vez que foram eleitos por círculos eleitorais historicamente petistas.
Esta estratégia de reunir-se com senadores tem sido realizada desde que Michel Temer assumiu a Presidência interina do governo, sob articulação do ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que é o responsável por atualizar o “placar do impeachment” de Temer. Em conversas com senadores, Geddel defende que a destituição de Dilma Rousseff tem obedecido a todas as prerrogativas estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Constituição e, por isso, seria um processo legítimo e não um golpe. Além disso, tem argumentado que Temer está a demonstrar que sabe como reverter a recessão económica do Brasil.
Segundo o G1, este discurso tem sido utilizado por outros auxiliares do governo interino, que estarão a vender a ideia de que o impeachment “está consumado” e, politicamente, “definido”.
Outra estratégia adotada para aprovar a destituição de Dilma Rousseff é “seduzir” os senadores que, em alguma das etapas do processo do impeachment, votaram contra o processo, como Wellington Fagundes (PR), Antônio Carlos Valadares (PSB), Omar Aziz (PSD), Otto Alencar (PSD), Elmano Férrer (PTB) e Roberto Muniz (PP). Para isto, a equipa de Temer tem escutado os “sinais” que estes senadores estão a dar publicamente.
O site G1 cita como exemplo Roberto Muniz, que não faz comentários sobre o impeachment. Um dia após votar contra a continuidade do processo, Muniz afirmou, durante uma reunião da Comissão de Agricultura do Senado, que se sentia “incomodado” com a perda de estatuto de ministério da Secretaria de Desenvolvimento Agrário, durante o governo Temer.
De acordo com a publicação, o ministro interino da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou naquela mesma sessão, que a secretaria voltaria ao seu estatuto anterior se Dilma Rousseff fosse afastada definitivamente. “Esta é uma notícia que nos deixa muito felizes. É um ganho muito grande para o país. Um novo olhar sobre a importância da agricultura familiar. É um alento”, afirmou, naquele mesmo dia.
Outro senador que estaria a ser seduzido pela equipa de Temer seria Otto Alencar, que foi convidado para fazer um discurso no Palácio do Planalto, durante um evento que marcava o lançamento de uma série de iniciativas para a revitalização da bacia hidrográfica do Rio São Francisco. O rio é um dos principais motores da economia do estado da Bahia, círculo eleitoral do senador. Normalmente, os senadores não são convidados a discursar em eventos oficiais.
Com estas estratégias, os aliados de Michel Temer esperam conseguir entre 62 e 63 votos a favor do impeachment.
Como vai ser o “julgamento final” de Dilma Rousseff?
- A sessão começa esta quinta-feira, com horário de início previsto para as 13h (hora de Lisboa), sob o comando do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Ricardo Lewandowski.
- Após a apresentação das questões de ordem sobre o processo, serão ouvidas as duas testemunhas de acusação e as seis testemunhas de defesa, numa sessão que pode estender-se pelo fim de semana.
- Na segunda-feira, Dilma Rousseff vai ao Senado prestar um depoimento de 30 minutos. A Presidente afastada pode ser questionada pelo presidente do STF, por senadores, por representantes da acusação e da defesa. Não há horário previsto para o fim desta parte do julgamento.
- Após o depoimento de Dilma, acusação e defesa vão ter uma hora e meia para debater o processo. Depois deste debate, os senadores inscritos numa lista oficial também vão poder manifestar-se sobre o impeachment.
- Com o fim do debate entre os senadores, Lewandowski vai ler um resumo do processo com as fundamentações da acusação e da defesa e dois senadores favoráveis e contrários à destituição de Dilma vão declarar o seu sentido de voto.
- Finalmente, chega o momento da votação. Lewandowski vai perguntar aos senadores:
“Cometeu a acusada, a senhora Presidente da República, Dilma Vanna Rousseff, os crimes de responsabilidade correspondentes à tomada de empréstimos junto a instituição financeira controlada pela União e à abertura de créditos sem autorização do Congresso Nacional, que lhe são imputados e deve ser condenada à perda do seu cargo, ficando, em consequência, inabilitada para o exercício de qualquer função pública pelo prazo oito anos?”
- A votação é aberta e feita por painel eletrónico.
- Caso 54 dos 81 senadores votem “sim”, Dilma Rousseff é afastada definitivamente da Presidência do Brasil. Deverá deixar o Palácio da Alvorada (residência oficial dos Presidentes no Brasil) em 30 dias no máximo e torna-se inelegível para qualquer função pública por oito anos.
- Caso consiga travar o processo, Dilma Rousseff volta a ser automaticamente Presidente do Brasil. Michel Temer teria que regressar ao Palácio do Jaburu para voltar a exercer a sua função de vice-Presidente.