787kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Landing station for Nord Stream 2
i

A suspensão pela Alemanha do gasoduto NordStream 2 foi o primeiro grande sinal de divórcio entre a Europa e o gás russo

dpa/picture alliance via Getty I

A suspensão pela Alemanha do gasoduto NordStream 2 foi o primeiro grande sinal de divórcio entre a Europa e o gás russo

dpa/picture alliance via Getty I

Como pode a Europa cortar dependência do gás russo? Solução inclui nuclear e até baixar temperatura em casa

Agência Internacional de Energia propõe à Europa plano para se livrar (de uma parte) do gás russo. Mais armazenagem, manter energia nuclear, apoiar os mais vulneráveis e baixar a temperatura em casa.

A Agência Internacional de Energia (AIE) elaborou um plano para reduzir a exposição da Europa ao gás russo, com medidas a tomar ainda este ano, que permitirá diminuir a dependência europeia em mais de um terço.

O plano prevê desde a procura de novos fornecedores até à aceleração de nova potência renovável para produzir eletricidade e sublinha a importância de manter a capacidade despachável (que pode ser ativada ligando um botão) que a energia nuclear permite. A AIE defende ainda a necessidade de reforçar a capacidade de armazenamento e aumentar as reservas sobretudo no inverno quando a procura é maior, mas os 10 pontos do plano não incluem o reforço da capacidade de interconexão, nomeadamente entre a Península Ibérica e França que é reivindicada por Portugal e Espanha.

Não fazer novos contratos para compra de gás russo

A Europa importou em 2021 cerca de 140 mil milhões de metros cúbicos (bcm) de gás russo através de gasodutos e mais 15 milhões de metros cúbicos através de GNL. A Rússia forneceu 45% das importações e 40% do consumo europeu.  A Gazprom é o principal fornecedor, mas há contratos no valor de 15 milhões de bcm que vão terminar no final de 2022, o que corresponde a 12% das vendas para a Europa. A totalidade dos contratos de venda à Europa deve terminar até ao final da década.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Este contexto representa uma janela de oportunidade para diversificar os fornecedores e fazer contratos de outras fontes, alavancando as opções de abastecimento através da infraestrutura já existente, seja por pipeline, seja por GNL. Só numa nota de rodapé é que a Agência reconhece que a interconexão limitada entre a Península Ibérica constitui um constrangimento no acesso ao gás que pode chegar a Espanha (e a Portugal) via os oito terminais de gás natural líquido (GNL) cuja capacidade é muito superior às necessidades de consumo na Ibéria.

Substituir fornecimentos russos por fontes alternativas de gás

Os peritos da Agência Internacional da Energia indicam que países europeus desvinculados dos gasodutos que ligam a Europa à Rússia, como a Noruega e o Azerbaijão, podem reforçar a sua produção face a 2021. Esta possibilidade assenta em alguns pressupostos: uma utilização mais elevada da capacidade de importação, menos operações de manutenção durante o verão e uma revisão em alta das quotas de produção. A União Europeia tem maior potencial a médio prazo de receber mais GNL, dado o acesso a unidades de regaseificação (como existem em Sines).

Terminal de GNL Sines DR

Terminal de Sines é atualmente a única porta de entrada de gás em Portugal

Adelino Oliveira

O GNL é mais flexível, sendo negociado mais em trading do que em contratos de longo prazo mais usados nos transportes por gasodutos. Mas há também mais concorrência na procura, nomeadamente vinda da Ásia. “Todos os importadores estão a pescar na mesma piscina de fornecedores, o que neste contexto irá significar mercados de GNL muito apertados e preços muito altos. Neste cenário, a AIE não contempla a possibilidade de parte de procura chinesa por GNL ser desviada para o gás russo, libertando disponibilidade desses produtores.

O plano da AIE admite um aumento de 20 milhões de metros cúbicos de importações na União Europeia de GNL no próximo ano, mas para tal é necessário controlar as fugas de metano ao longo da cadeia de abastecimento. Quanto à substituição do gás natural por biogás ou hidrogénio verde, os peritos consideram que no curto prazo o potencial destas alternativas é ainda muito limitado.

Introduzir obrigações de armazenagem de gás para aumentar a resiliência

A Agência Internacional de Energia diz que o armazenamento desempenha um papel fundamental na gestão de mudanças de procura sazonais e proporciona um seguro face a eventos inesperados (como a invasão da Ucrânia) que podem causar ruturas no fornecimento ou picos de preço. O valor desta segurança é ainda maior em tempos de tensão geopolítica. Mas o padrão sazonal de preços na Europa (altos no inverno e baixos no verão) não incentiva a que se armazene quantidades para o horizonte de 2022/23.

A AIE  sugere uma abordagem da UE para impor obrigações mínimas de armazenagem para operações comerciais, associada a mecanismos de mercado de contratação dessa capacidade. Os especialistas admitem que será necessário encher pelo menos 90% da capacidade de armazenamento até outubro para assegurar uma almofada adequada às necessidades europeias no inverno em que o gás é mais procurado para aquecimento.

Acelerar novos projetos de energia eólica e solar

A prevista entrada recorde de nova potência fotovoltaica e eólica e o regresso a condições climatéricas normais permitirão aumentar a produção da União Europeia de energia renovável em 15% face a 2021, reduzindo a dependência das centrais térmicas para gerar eletricidade. No caso de Portugal está prevista a ligação à rede de várias centrais solares e no corrente ano, mas a produção de origem renovável hídrica está a sofrer com a ausência de chuva.

Olhando para o quadro europeu, a AIE recomenda a clarificação e a agilização de processos de licenciamento e autorização de forma a evitar mais atrasos na instalação destes projetos. Ao mesmo tempo, um desenvolvimento mais rápido dos painéis solares nos telhados de residências particulares permitiria baixar a fatura para os clientes domésticos. A Agência propõe um programa de apoios financeiros à instalação destes painéis, como os que foram disponibilizados em Portugal com dinheiro do Fundo Ambiental.

Maximizar geração de fontes despacháveis e com baixas emissões: nuclear e bioenergia

A energia nuclear é a maior fonte de produção de eletricidade de baixas emissões de CO2 na Europa. No entanto, vários reatores foram desligados para operações de manutenção e controlos de segurança no ano passado. A retoma desses reatores em 2022, bem como o início de operações comerciais por parte da nova central nuclear finlandesa, elevaria a geração nuclear na 20 TWh (terawatts hora) na UE.

epa08652218 The nuclear power plant in Chooz, in the Ardennes department, France, 07 September 2020. This riverside power station has 2 reactors of 1450 MW each and is between the French city of Charleville-Mezieres and the Belgian municipality of Dinant.  EPA/JULIEN WARNAND

Vários reactores nucleares pararam em 2021 para manutenção. A AIE defende o regresso à operação

JULIEN WARNAND/EPA

Mas ao mesmo tempo está programada uma nova onda de encerramentos de reatores nucleares, o que irá comprometer esta retoma. Segundo a AIE, está prevista a desativação de quatro reatores nucleares em 2022 (não refere o país, mas a Alemanha tinha-se comprometido com o encerramento de três reatores este ano) e de um outro em 2023. O adiamento temporário destes encerramentos, desde que assegure a segurança das operações, poderia reduzir a procura de gás em quase 1 milhão de metros cúbicos por mês.

Outro setor com potencial por explorar é a produção de energia a partir da biomassa (resíduos florestais e outra matéria vegetal). A AIE estima que estas centrais foram operadas a cerca de 50% da sua capacidade em 2021 e que podem contribuir com mais 50 TWh de eletricidade este ano.

Aprovar medidas de exceção para proteger consumidores vulneráveis de preços altos

A AIE constata o impacto que a escalada do gás natural está a ter na subida recorde dos preços da eletricidade. Esses aumentos têm atingido empresas e famílias desde o ano passado, um efeito que é ainda mais ampliado pela guerra na Ucrânia. Ao mesmo tempo, tem implicações na acessibilidade à eletricidade quando o mundo está na rota da eletrificação.

A AIE estima que os estados da União Europeia teriam de desembolsar 55 mil milhões de euros para proteger os consumidores mais vulneráveis — famílias e empresas — do impacto da crise energética. (Portugal já anunciou medidas, mas ainda não as concretizou). Não obstante, reconhece também que a subida dos custos de eletricidade é inevitável por causa do gás e do CO2 caros.

Governo prepara medidas para atenuar subida dos preços da luz, gás e combustíveis

Os especialistas assinalam ainda que este quadro abre a porta a encaixe dos chamados lucros “caídos do céu” por parte de algumas elétricas (sobretudo as que produzem mais renováveis e que beneficiam de preços muito altos sem ter de suportar os custos elevados com combustível e CO2). As atuais condições de mercado podem resultar em lucros excessivos de 200 mil milhões de euros para produtores de gás, carvão, nuclear, hídricas e outras renováveis em 2022. E sugere que se pondere a criação de taxas temporárias sobre esses ganhos de forma a partilhá-los com os consumidores, dando como exemplo medida adotadas na Itália e na Roménia, mas sem referir o caso espanhol que muito deu que falar.

Incentivar a substituição de esquentadores por bombas de calor

As bombas de calor, que utilizam eletricidade para aquecer através de ar quente, são uma solução mais eficiente do ponto de vista dos custos/benefícios para aquecer as casas do que os dispositivos que funcionam a gás ou outros combustíveis. As bombas de calor são também aconselhadas para aquecer a água, mas também para o aquecimento centralizado e podem ser uma solução atrativa para algumas indústrias, embora o retorno do investimento demore mais tempo. A AIE estima que acelerar o ritmo de substituição possa custar 15 mil milhões de euros, mas permitiria reduzir o consumo de gás em 2 mil milhões de metros cúbicos no prazo de um ano.

Acelerar a eficiência energética em edifícios e indústrias

A eficiência energética (usar menos energia para ter o mesmo efeito) é um instrumento importante na transição energética, mas demora muito tempo a produzir resultados numa escala que faça a diferença. O plano propõe formas de aumentar a implementação deste tipo de soluções.

Energy Prices Rise Across Europe

Baixar o aquecimento central a gás é uma das propostas da Agência Internacional de Energia

Getty Images

Partindo da estimativa de que apenas 1% dos edifícios já construídos é renovado anualmente, o plano defende que aumentar essa percentagem em 0,7 pontos percentuais e focando a mudança para as construções menos eficientes (e mais gastadoras de energia), reforçando por exemplo o isolamento térmico, poderia poupar mais mil milhões de metros cúbicos de gás num ano. Portugal tem disponível o programa “edifícios mais sustentáveis” que dá apoios financeiros a estes investimentos feitos por particulares e agora também por serviços.

A instalação de equipamentos como termostatos inteligentes (controlos de temperatura) também ajuda a reduzir a fatura e o consumo.

Encorajar a redução temporária da temperatura nas casas aquecidas a gás

Muitos cidadãos europeus já reagiram à invasão russa com apoios financeiros à Ucrânia ou oferecendo assistência a refugiados. Mas a AIE sugere outra iniciativa temporária de represália: ajustar (para baixo) a temperatura nas casas aquecidas a gás, o que, ao mesmo tempo, permitiria baixar também a fatura. A temperatura média dos edifícios com aquecimento central a gás é superior a 22 graus. Ajustando os termostatos para baixo traria uma poupança no gasto de energia de 10 mil milhões de metros cúbicos por cada grau mais baixo.

Diversificar fontes de flexibilidade do sistema elétrico descarbonizado

Um dos maiores desafios da política energética da União Europeia é fortalecer mecanismos alternativos de flexibilidade para o sistema elétrico para responder a efeitos sazonais, mas também a oscilações na procura ou oferta cada vez mais dependente das renováveis cuja produção não é previsível, nem armazenável.  No atual momento, o gás natural é a almofada de segurança do setor elétrico, sobretudo após o fecho das centrais a carvão.

A transição energética vai aprofundar ainda mais a ligação entre a eletricidade e o gás natural que continua a ser indispensável como backup, ao mesmo tempo que enfrenta, no médio prazo, um cenário de queda de consumo. Os governos devem trabalhar em formas de gestão flexível que atuem do lado da procura e da oferta. E isso passa por ter disponível um mix alargado de opções que envolvem redes mais inteligentes, interligações com mais capacidade, mas também centros de produção despachável (que se possam ligar e desligar consoante as necessidades) e que permitam o armazenamento — a água armazenada nas barragens e as baterias de maior capacidade, são exemplos disso.

A flexibilidade passa também por mecanismos de redução do abastecimento a grandes clientes industriais para equilibrar a oferta e a procura em períodos de maior consumo (como o mecanismo da interruptibilidade que existiu em Portugal e que foi substituído por outro regime).

O desenvolvimento de gases de origem renovável, como o hidrogénio verde, que precisam apenas de recursos locais (neste caso fontes de eletricidade renovável para usar no processo de eletrólise), é outra fonte de flexibilidade apontada no documento da Agência Internacional de Energia.

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora