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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Conselheiro de Rui Rio denuncia pagamentos no Orçamento Participativo da câmara de Salvador Malheiro

Queixa apresentada por Filipe Marques Gonçalves refere "eventuais ilícitos criminais" no pagamento de 50 mil euros a empreiteiro escolhido para realizar obra de requalificação. MP está a investigar.

A queixa apresentada no início do mês no Ministério Público tem vários pontos de contacto com o esquema usado em obras de mais de dois milhões de euros pagos pela Câmara Municipal de Ovar e que já estão a ser investigados pela Justiça. Sem concurso público, uma empresa é escolhida para realizar uma obra e a obra é-lhe adjudicada. Depois, a autarquia transfere as verbas para a instituição que beneficia das obras e é a essa instituição — e não à câmara municipal — que compete o pagamento final à empresa que realizou a obra. Mas há uma diferença: ao contrário do caso dos relvados da Safina, desta vez o processo esbarrou em Filipe Marques Gonçalves, conselheiro de Rui Rio para a área da Justiça, tesoureiro do Centro de Promoção Social do Furadouro e autor da queixa por suspeitas de “eventuais ilícitos criminais” que implica, como testemunha, o vice-presidente de Salvador Malheiro em Ovar.

A Câmara de Ovar afasta-se de eventuais irregularidades no processo e garante que “alertou e notificou o Centro de Promoção Social do Furadouro para o dever de observância das regras” do Código dos Contratos Públicos e das regras de contratação pública. A autarquia sublinha ainda, em resposta às questões do Observador, que não lhe compete “sindicar e verificar” a adjudicação da obra no centro social, mas sim à própria instituição.

O autor da queixa, Filipe Marques Gonçalves, refere a existência de documentos adulterados, orçamentos alternativos ao da empresa escolhida para a obra que só apareceram depois de intervenção ter terminado e até de uma sugestão para alterar datas e forjar a adjudicação da obra.

O Ministério Público, avançou o site OvarNews, instaurou um inquérito-crime para investigar a forma como os 50 mil euros do Orçamento Participativo da Câmara Municipal de Ovar foram entregues ao Grupo Victor Rocha & Filho, Lda. para a realização de obras de requalificação no Centro de Promoção Social do Furadouro (CPSF). Há “suspeitas de eventuais ilícitos criminais”, diz a queixa que o Observador consultou e que foi apresentada por Filipe Marques Gonçalves — ex-candidato pelo CDS à autarquia, nas últimas eleições, e que entretanto se tornou conselheiro de Rui Rio para a área da Justiça.

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A queixa refere que o CPSF foi “apenas a instituição beneficiária” das obras e que “não teve qualquer intervenção direta” na escolha da empresa. Depois de ser anunciado o projeto vencedor da edição deste ano do Orçamento Participativo da Câmara Municipal de Ovar, foi o próprio proponente, António Pinho Magina, quem, de acordo com a denúncia, “encetou os procedimentos” para a escolha da empresa de construção que realizou as obras no centro.

O conselheiro estratégico de Rui Rio fala em documentos adulterados, em orçamentos alternativos ao escolhido que só apareceram depois de as obras estarem concluídas e de uma sugestão para alterar datas e forjar a adjudicação da obra à empresa Pinturas Victor Rocha & Filho, Lda.

Documentos “adulterados” e uma sugestão para “contornar a questão legal”

O autor da denúncia lança suspeitas sobre o responsável pelo projeto vencedor: António Magina “tem colaboração com a Câmara de Ovar, o que privilegia os contactos” com a autarquia liderada pelo vice-presidente do PSD Salvador Malheiro. E também deixa claro que o Centro de Promoção Social do Furadouro ficou afastado de todo o processo — desde a avaliação de orçamentos à escolha da empresa.

A apresentação dos orçamentos foi um dos pontos mais críticos com que Filipe Marques Gonçalves diz ter sido confrontado neste processo. O conselheiro de Rui Rio refere na queixa que ficou “perplexo” com um e-mail que recebeu de António Magina em meados de setembro — já no final das obras de requalificação, e que o levaria a recusar ser ponto de passagem dos 50 mil euros entre a Câmara Municipal de Ovar e a Victor Rocha & Filho, Lda.

O autor da proposta vencedora no Orçamento Participativo de Ovar admite que a mulher "sacou" uma imagem do Centro de Promoção Social do Furadouro para pedir orçamentos em nome da instituição.

Nesse e-mail, o vencedor do Orçamento Participativo faz chegar ao tesoureiro do centro social “diversos orçamentos [elaborados] por empreiteiros, que não foram solicitados nem entregues ao CPSF“.

O pedido para a apresentação desses orçamentos foi “elaborado em nome do CPSF” mas “não foi efetuado pela instituição”, ressalva Marques Gonçalves. Para isso, foi “adulterada a respetiva folha timbrada”, onde consta a identificação do centro social. O próprio vencedor do Orçamento Participativo assume isso mesmo, quando diz que “a Elis [sua mulher] ‘sacando’ uma imagem da net do CPSF fez o documento para pedir orçamentos a empresas de construção”.

António Magina deixava ainda uma sugestão ao tesoureiro do centro social: “Acho que, agora, com estes documentos, numa reunião que façam, conseguem justificar a escolha da empresa que fez a obra, façam um contrato de adjudicação da obra com data anterior à mesma e [espero que] consigam rapidamente solucionar esta questão legal”, escreve o autor da proposta vencedora do Orçamento Participativo de Ovar.

O e-mail chegou à caixa de correio de Filipe Marques Gonçalves a 14 de setembro e, anexos à mensagem, António Magina enviou três orçamentos: o da empresa Victor Rocha e Filho, Lda (no valor exato de 50 mil euros), o da empresa Ideias Solenes (49.750 euros) e o da empresa do empreiteiro Armando Miguel Oliveira Dias (com um custo de 55.750 euros).

Diretor de campanha de Rio promoveu obras de 2,2 milhões que beneficiaram dirigente do PSD

António Magina garante que os orçamentos já tinham sido pedidos às empresas antes de a intervenção no berçário, campo de jogos, zona exterior e parques infantis do CPSF ter sido feita. “Perante os orçamentos obtidos, sendo o da empresa Victor Rocha o mais barato e o único que se enquadrava dentro da verba disponível, chamámos o Victor Rocha ao CPSF, que veio acompanhado da engenheira da empresa e do arquiteto”, diz o autor da proposta vencedora do Orçamento Participativo.

Centro social é dono da obra, mas autarquia só decidiu depois de trabalhos estarem concluídos

A grande objeção de Filipe Marques Gonçalves decorre de um pedido para que fosse o Centro de Promoção Social do Furadouro a pagar as obras na instituição com verbas que a autarquia entregava ao centro. De acordo com a queixa, o vice-presidente da Câmara Municipal de Ovar resolveu esse obstáculo: Domingos Silva, número dois de Salvador Malheiro na autarquia, determinou que era o CPSF o dono da obra. Mas a obra já tinha acabado.

O ofício tem data de 26 de setembro de 2018 e refere-se à “execução e realização de pagamentos” das obras no centro do Furadouro. Apesar de a realização das obras ser comunicada a 10 de julho ao departamento administrativo, jurídico e financeiro da autarquia, só dois meses mais tarde (a 18 de setembro) o vice-presidente assina um “despacho de concordância” com a atribuição da responsabilidade da requalificação ao CPSF.

A queixa foi apresentada no Ministério Público contra incertos. Além do vice-presidente da Câmara Municipal de Ovar, foram apontados como testemunhas os representantes das três empresas cujos orçamentos chegaram a Filipe Marques Gonçalves e um arquiteto que colaborou na obra a pedido de António Magina.

“Face à omissão regulamentar quanto à entidade que poderá assumir a qualidade de responsável pela execução do projeto ou, incasu, do dono da obra [..]), não existe óbice legal ou regulamentar a que o projeto vencedor em apreço seja executado ou concretizado pelo Centro de Promoção Social do Furadouro”, refere o ofício da câmara de Ovar.

Filipe Marques Gonçalves considera que a comunicação da decisão acontece num momento “extemporâneo”. O tesoureiro do centro social recusou receber a verba que devia transferir para a empresa que realizou a obra e remeteu toda a informação ao Ministério Público, que instaurou um inquérito-crime.

Além do vice-presidente da câmara de Ovar, foram nomeados como testemunhas os representantes das três empresas cujos orçamentos chegaram a Marques Gonçalves, o autor da proposta vencedora do Orçamento Participativo – de quem o Observador não conseguiu obter esclarecimentos até à hora de publicação do artigo – e ainda um arquiteto que colaborou com a obra a pedido de António Magina.

Câmara de Ovar empurra responsabilidades para direção do centro social

A Câmara Municipal de Ovar contesta as várias questões suscitadas na queixa de Filipe Marques Gonçalves. O município diz ao Observador que “não tem conhecimento” de qualquer processo judicial em curso, mas coloca as responsabilidades da obra do lado do centro social do Furadouro.

O tesoureiro do CPSF garante ter ficado à margem da escolha da empresa que requalificou o centro. A autarquia dá exatamente a mesma garantia, ao afirmar que “não teve qualquer intervenção nessa escolha”.

O autor da denúncia garante que o centro social recusou assumir responsabilidades pela obra. Câmara de Ovar diz o oposto: "Foi manifestada, por esta entidade, a vontade de assunção da qualidade de dono da obra"

Sobre a definição de quem era efetivamente o dono da obra e tinha responsabilidades na escolha da empresa e no pagamento desse serviço prestado, a câmara de Ovar garante que, a 10 de julho, numa reunião entre responsáveis da autarquia e do CPSF, os responsáveis do centro assumiram esse papel. “Foi manifestada, por esta entidade, a vontade de assunção da qualidade de dono da obra, tendo em vista a concretização do projeto de acordo com o trabalho interno já desenvolvido”, refere a autarquia.

Nesse mesmo dia, refere o gabinete jurídico ao Observador, o vice-presidente Domingos Silva “determinou a elaboração de informação destinada a apreciação em reunião da Câmara Municipal, para validação e aprovação formal da admissibilidade de execução dos trabalhos pelo Centro de Promoção Social do Furadouro”. Na tal reunião de câmara que se realizou dois meses mais tarde (a 20 de setembro), a câmara valida “por unanimidade” o princípio de que o centro era dono da obra — a resposta enviada ao Observador reconhece que esse princípio só ficou claro quando a intervenção estava concluída.

A autarquia também diz que o centro do Furadouro fez “a comunicação de obras isentas de controlo prévio”, em julho, e que “não consta do processo qualquer referência à entidade executante da obra” uma vez que se trata de “informação que não é exigida no caso de execução de obras isentas de controlo prévio administrativo”.

Também empurra para a instituição a responsabilidade de pagar pela obra de que beneficiou. “A transferência do respetivo valor apenas poderia ter sido efetuado a esta entidade, a quem compete, por si e no respeito pelas disposições legais a que está vinculada, cumprir as obrigações contratuais por si assumidas, no âmbito da realização da obra e do inerente pagamento do preço”, afirma a autarquia.

Dadas as semelhanças com o caso dos relvados da Safina — em que Pedro Coelho, presidente da concelhia do PSD, enviou orçamentos a pelo menos um dos dirigentes dos clubes onde viria a ser instalado um relvado da sua empresa —, o Observador quis saber que intervenção a CMO teve na escolha da Victor Rocha & Filho para fazer a requalificação do CPSF. “A Câmara Municipal de Ovar não teve qualquer intervenção na escolha da empresa”, garante o departamento jurídico da câmara.

Obras em centro social duplicam receitas com poder local de Ovar

Até setembro deste ano, a empresa Victor Rocha & Pinho, Lda (o nome é diferente, mas o número de identificação social é o mesmo do Grupo Victor Rocha & Filho, Lda) tinha assinado 10 contratos com juntas de freguesia do concelho de Ovar e com a própria câmara municipal. Ao todo, os contratos valeram-lhe quase 65 mil euros. O contrato da obra no Centro de Promoção Social do Furadouro ainda não foi publicado no Portal Base do Governo, mas o valor quase duplica as verbas recebidas em contratos com o poder local.

O primeiro contrato entre a Pinturas Victor Rocha & Pinho e a Câmara Municipal de Ovar é de março do ano passado: 1790 euros para a “aquisição de ferramentas, durante o ano de 2017”. No ano e meio que se seguiu, o autarquia liderada por Salvador Malheiro assinou outros seis contratos com a autarquia, a maioria dos quais já este ano.

Além da Câmara Municipal de Ovar, a empresa Pinturas Victor Rocha & Pinho, Lda. assinou outros contratos com a União das Freguesias de Ovar, São João, Arada e São Vicente de Pereira Jusã. Sete dos dez contratos foram adjudicados por ajuste direto.

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