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De quantas balas se conseguirá desviar a economia portuguesa?

Os problemas na banca, a imprevisibilidade de Trump, a incerteza do Brexit e até onde chegará a extrema-direita em França e na Alemanha. 2017 ainda não começou, mas já dá dores de cabeça aos decisores

A política económica em Portugal sempre foi mais política orçamental do que qualquer outra coisa. Mas, com o défice finalmente abaixo dos 3% do produto interno bruto (PIB), 2017 será o ano em que o Governo poderá voltar a pensar na economia. Com todos os riscos, dentro e fora de portas, será essa estratégia o caminho para o crescimento sustentável ou mais um ano em que o Governo terá de gastar o tempo a tentar desviar-se das balas?

Ano novo, vida pouco diferente. O défice abaixo dos 3% deve retirar alguma pressão sobre a economia portuguesa, especialmente aplicada via Bruxelas, mas a economia não deve acelerar muito mais do que o previsto para 2016, e deve ficar abaixo dos níveis de 2015. Com a batata quente da banca por resolver em solo nacional, António Costa e Mário Centeno podem ter pela frente um mar de problemas, com os EUA de Trump em conflito com a China, o Reino Unido em conflito com a União Europeia, França e Alemanha com eleições complicadas dentro de portas.

Aqui fica um olhar sobre alguns dos principais riscos que a economia portuguesa pode enfrentar no próximo ano.

Banca. O que foi resolvido e o que falta resolver

Ainda não será em 2017 que vamos deixar de ouvir falar na crise da banca. O problema é português, mas também europeu, muito por via do risco de contágio que vem de uma das maiores economias da zona euro. E se no verão os olhos dos mercados estavam postos no gigante alemão — o Deutsche Bank chegou a ser apontado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) como o maior risco para a estabilidade financeira mundial — no final do ano as atenções voltaram-se para um país mais próximo de Portugal. E não estamos a falar só de geografia.

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Um resgate a um banco em Portugal é uma constipação no contexto europeu, um resgate a um banco italiano é uma gripe, com o risco de evoluir para uma pneumonia se alastrar a toda a banca italiana. O primeiro banco a cair é o Monte dei Paschi que já pediu ajuda do Estado, ao abrigo do plano de 20 mil milhões de euros aprovado pelas autoridades locais.

Para já, o Governo italiano garante a proteção dos investidores de retalho que têm obrigações, ao contrário do que preveem as regras europeias para resgates bancários com dinheiros públicos, que obrigam a um bail-in (assunção de perdas pelos credores). A solução ainda não está fechada e já há mais bancos em fila para entrar em resgate, como o Veneto Banca e a Banca Popolare di Vicenza.

Mas no que é que a queda de um banco italiano ameaça Portugal? As ondas de choque podem vir de dois lados. Por um lado, o país continua com uma dívida pública fora do controlo, dependente do financiamento externo o que o deixa especialmente vulnerável a choques nos mercados e na zona euro.

Por outro lado, e apesar de alguns progressos, subsistem problemas estruturais na banca e em alguns bancos que irão ganhar visibilidade internacional com uma crise na banca italiana. E a ligação entre a banca e as dívidas soberanas do euro, em particular nos chamados países periféricos, não foi quebrada. Isto quer dizer que os problemas dos bancos contaminam o financiamento dos Estados, como, em 2010, a crise das dívidas soberanas rapidamente alastrou à banca.

O ano de 2016 começou com o rescaldo da resolução do Banif, cuja parte boa foi vendida ao Santander Totta, enquanto os ativos de pior qualidade ficaram no Estado. O caso estava resolvido no início de 2016, mas a intensa discussão política e técnica que se seguiu permitiu ao país perceber as consequências da união bancária europeia e da perda de soberania nesta área.

Desde a resolução do Banco Espírito Santo, em 2014, que Portugal tem sido a cobaia das novas regras que pretendem envolver o sistema financeiro e os credores na fatura dos buracos bancários, até agora maioritariamente assumida pelos contribuintes. Números divulgados recentemente pelo Tribunal de Contas, apontam para uma conta de 14,3 mil milhões de euros até 2015.

O caso Banif, e a aparente impotência das autoridades portuguesas perante a burocracia de Bruxelas e de Frankfurt, mostraram o que poderia acontecer à Caixa Geral de Depósitos, o maior banco português, que enfrentava necessidades adicionais de capital depois de cinco anos de prejuízos e de um plano de reestruturação falhado.

A lição terá sido entendida em Lisboa, com o Governo de António Costa a inverter a postura mais passiva que o anterior Executivo manteve em relação à banca. O Executivo socialista avança com um plano ambicioso para salvar a Caixa Geral de Depósitos, quer na escolha da nova equipa de gestão e do modelo de governo, quer na dimensão do envelope financeiro destinado ao banco.

E no meio de uma série intensa de polémicas — que culminaram na demissão do novo presidente, António Domimgues — consegue em agosto aquilo que parecia mais difícil: o acordo da Comissão Europeia a uma recapitalização da Caixa até 5.160 milhões de euros, com 2.700 milhões de fundos públicos, um valor que muitos consideram excessivamente generoso. Bruxelas aceita que o Estado português assuma sozinho os encargos da recapitalização, como acionista, mas exige um teste de mercado ao plano de negócios da Caixa, o que implica levantar mil milhões de euros junto de investidores privados em instrumentos de dívida.

Terá sido esta operação, e a imposição de concretizar metade ao mesmo tempo que o dinheiro do Estado chega à Caixa, que levou o Governo a adiar a recapitalização para 2017. Mais um problema que fica por resolver na banca e que poderá ser dificultado se as condições do mercado bancário europeu se deteriorarem na Europa.

Para a equipa que será liderada por Paulo Macedo, fica ainda o desafio de executar uma reestruturação que envolve fecho de balcões e redução de mais de 2.000 trabalhadores, mas sem despedimentos, garante o Executivo.

Carlos Costa e António Costa têm uma relação tensa

Outro plano ambicioso dos Costas, neste caso António e Carlos estão alinhados, que ficou por realizar, foi uma solução para o crédito malparado em Portugal. A ideia defendida pelo governador do Banco de Portugal e pelo primeiro-ministro no início do ano passava pela criação de um veículo que ficaria com os ativos problemáticos dos bancos, com destaque para o crédito malparado e os imóveis desvalorizados. O objetivo era o de limpar os balanços de ativos desvalorizados que têm exigido provisões para perdas, arrastando alguns dos principais bancos nacionais para um ciclo de perdas e travando a concessão de crédito à economia.

São dois os principais obstáculos à materialização deste plano — a autorização da Comissão Europeia a uma solução que poderia falsear as regras da concorrência e envolver ajudas de Estado e o financiamento, provavelmente público ou com garantia pública, do veículo ou dos bancos para cobrir as perdas resultantes do destaque destes ativos. E as autoridades portuguesas reconhecem que um esquema para o malparado nacional terá poucas possibilidades de avançar, fora de um novo enquadramento europeu para o problema bancário. É mais um desafio que passa para 2017.

E o Novo Banco? Tudo indica que a venda voltará a ser adiada. Resta saber se será por umas semanas, para reunir as condições financeiras necessárias ao fecho do negócio, ou se o processo terá que ser relançado. O prazo renegociado com a Comissão Europeia termina em agosto de 2017 e dificilmente será permitido um novo adiamento. O próprio Governo já admitiu que, se a operação falhar esse prazo, o Novo Banco pode ser liquidado, um desfecho que ninguém leva a sério, para já, dados os custos muito elevados envolvidos.

O Banco de Portugal e a equipa negociadora liderada por Sérgio Monteiro apostaram tudo no processo em curso. Muito tempo — o procedimento foi lançado há quase um ano — condições flexíveis — os compradores podem escolher ativos — e um preço de saldos — já é um dado aceite que o negócio será feito muito abaixo da soma injetada no Novo Banco. Mas pode não ser suficiente. O objetivo é o de dar tempo ao candidato com a melhor oferta no papel, o fundo chinês China Minsheng, para apresentar as garantias financeiras de que consegue concretizar a oferta de 750 milhões de euros. No entanto, os outros concorrentes ameaçam abandonar a corrida no início de 2017.

Se a indefinição ainda marca o futuro dos bancos que estão na esfera do Estado, na banca privada foram dados passos decisivos no sentido da clarificação acionista e estratégica, ainda que nem sempre na direção que muitos defendiam.

Fernando Ulrich e Artur Santos Silva, os gestores históricos do BPI

RUI FARINHA/LUSA

O caso do BPI é o mais evidente, com a resolução do conflito entre os dois maiores acionistas, o CaixaBank e Isabel dos Santos, que permitiu ao banco concretizar a solução para resolver a exposição excessiva ao mercado angolano. Mas se o braço de ferro que durou dois anos ficou resolvido, o BPI que vai sair desta solução não será aquele que muitos, incluindo a gestão, ambicionariam. Conseguirá a dupla Santos Silva e Fernando Ulrich manter o BPI como um banco português? E quem irá assumir a gestão com a saída de cena dos gestores históricos do banco?

O banco vai passar para as mãos dos espanhóis do CaixaBank, por via da oferta pública de aquisição (OPA) que será concretizada em 2017. E deixa de poder contar com os resultados da unidade angolana, o Banco de Fomento Angola, cujo controlo passou para as mãos da filha do presidente angolano. O BPI deixou ainda passar, por desinteresse do futuro dono espanhol, a oportunidade de protagonizar uma consolidação na banca portuguesa, ficando fora da corrida pelo Novo Banco.

Também a situação do BCP conheceu desenvolvimentos positivos na frente acionista, ainda que continue debaixo de uma enorme pressão dos mercados financeiros.

A situação do banco liderado por Nuno Amado começou a ficar mais frágil em meados do ano, com o anúncio de aumentos de capital volumosos no espanhol Popular e na Caixa Geral de Depósitos, que dirigiram o foco para o maior banco privado português. Os investidores ficaram nervosos com a perspetiva de o banco ter de pedir mais dinheiro aos acionistas e as ações entraram numa espiral descendente, que nem o surgimento de um novo parceiro estratégico conseguiu travar.

Nuno Amado, do BCP

MIGUEL A. LOPES/LUSA

Em agosto, a Fosun, o grupo chinês dono da seguradora Fidelidade, anunciou interesse em investir no BCP para se tornar no maior acionista. A intenção foi bem recebida pelos outros acionistas e a entrada no banco, via aumento de capital, acabou por se concretizar em novembro. A Fosun passou a ter 16,7% do BCP, com a perspetiva de vir a reforçar a curto prazo. Também a angolana Sonangol conseguiu o aval do Banco Central Europeu para aumentar a sua posição no BCP, mas tudo isto não foi suficiente para acalmar os mercados, que voltaram e penalizar as ações do banco quando o Banco Sabadell anunciou a venda da totalidade da sua participação.

As mudanças acionistas e a fragilidade financeira, que ainda impede o BCP de reembolsar o que falta do apoio dado pelo Estado, via CoCos, acabaram por afastar mais um candidato nacional da compra do Novo Banco. O BCP ficou-se por uma manifestação de interesse.

Na passagem para 2017, há ainda nuvens negras no horizonte do BCP, precisa de mais capital e tem de voltar aos lucros — o duplo desafio que se coloca à generalidade dos bancos. A caixa económica Montepio Geral não é uma exceção.

Depois das mudanças no modelo de gestão e na administração em 2015, ainda falta ao Montepio conseguir concretizar o mais difícil: uma reestruturação que reduza os custos e traga um modelo de negócios que responda às novas exigências do setor, o saneamento das imparidades que ainda pesam no balanço, e o regresso aos resultados positivos.

E se no decurso deste processo surgirem mais necessidades de capital? A caixa económica fechou o ano com uma mudança de estatutos que a transforma em sociedade anónima, roupagem jurídica que em tese permite abrir o capital a novos acionistas. E ainda que essa intenção não seja assumida, para já, teria o Montepio trunfos para atrair investidores num quadro de grande aversão à banca?

Contas do orçamento dependem da banca

Costuma ser ao contrário. Tudo depende do Orçamento, tudo é Orçamento, e o que é Orçamento é défice. Resultado de anos de contração (diz a Direita) ou da exímia execução do atual orçamento apenas (diz a Esquerda), a verdade é que Portugal chega a 2017 numa posição nunca antes vista. Ou quase.

Nas previsões do Governo (e de quase todas as organizações internacionais), o défice vai ficar abaixo da fasquia dos 3% do PIB, cumprindo pela primeira vez os critérios a que o país aderiu quando se juntou ao euro e assinou o Tratado de Maastricht. Portugal já tinha, ainda durante o governo de José Sócrates, conseguido um resultado semelhante, em 2007, mas o Eurostat reviu as contas anos mais tarde, reavaliando o défice de 2,6% para 3% do PIB.

António Costa e Mário Centeno terão de dirigir a economia portuguesa num segundo ano pleno de riscos

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Agora, diz António Costa, Portugal deve terminar o ano com o défice mais baixo dos últimos 42 anos, o melhor resultado desde o 25 de abril. Este resultado permite sair da situação de défice excessivo, saindo da alçada disciplinar da Comissão Europeia e de eventuais multas se a Caixa Geral de Depósitos não estragar tudo. Porquê?

A operação de capitalização da CGD não foi feita em 2016, não afetando assim o défice deste ano, mas avançará em 2017 e a forma como essa capitalização vai ser feita pode implicar custos para o défice. O acordo de princípio com a Comissão é o de que a operação não seja considerada uma ajuda de Estado, não tendo impacto nas contas, mas mesmo essa decisão não está completamente fechada. Para já, prevê-se que o Estado injete, pelo menos, 2,7 mil milhões de euros no banco público.

Aos planos do Governo há que acrescentar ainda o potencial impacto do apoio aos lesados do BES, que ainda não é conhecido, e o formato da eventual solução, que há muito se arrasta (também a nível europeu) para o elevado volume de crédito malparado no balanço dos bancos portugueses, não falando de potenciais derrapagens nas administrações públicas, em especial na administração local e regional em ano de eleições.

Tudo isto pode não ser grande problema, considerando que o Orçamento do Estado para 2017 está construído para atingir um défice não superior a 1,6% do PIB, bem abaixo da meta dos 3%. No entanto, a meta deste ano já é conseguida em grande parte graças aos quase 445 milhões de euros de fundos dos orçamentos dos serviços que estavam congelados e que foram tornados em cortes permanentes pelo ministro das Finanças. Esse valor tem de ser compensado de alguma forma, num ambiente em que a economia não deve crescer muito mais do que em 2016.

Mau tempo à vista além fronteiras

Uma das boas notícias sobre a economia portuguesa é que o seu principal motor de crescimento são as exportações. Dito isto, também expõe a economia portuguesa a uma conjuntura especialmente complexa. Com reconhece o Banco de Portugal no mais recente boletim económico, publicado em dezembro, um dos principais riscos que a economia enfrenta é o “quadro de incerteza em torno das orientações de política económica e de relações comerciais de algumas economias avançadas”.

Este é um risco especialmente preocupante quando se considera o quadro político nos principais blocos comerciais do mundo: nos EUA, Donald Trump ameaça com um conflito com a China, o maior exportador do mundo, e tornar a sua economia mais fechada, levantando barreiras. A resposta ao protecionismo de uns costuma ser mais protecionismo de outros. Além disso, tanto os Estados Unidos como a China, estão entre os dez principais mercados para as exportações portuguesas.

Angela Merkel vai tentar ser eleita uma terceira vez, mas a direita mais conservadora está a ganhar força devido à crise dos refugiados e ao atentado Berlim

HANNIBAL HANSCHKE/AFP/Getty Images

A estes dois pesos pesados, juntam-se as incertezas em torno da saída da União Europeia do Reino Unido, a incerteza em torno do futuro em países como a Alemanha e a França (outros três países que estão entre os dez principais mercados para as exportações portuguesas), que vão a eleições no próximo ano e onde a extrema direita está a ganhar terreno, e da situação financeira de Itália, que continua o trabalho de resgatar os seus bancos em dificuldades, enquanto lida com o impacto da crise dos refugiados e dos violentos sismos ocorridos em território italiano.

A incerteza costuma trazer maior cautela entre os investidores, que significa dívida mais cara para os países com contas e economias menos sólidas (caso de Portugal). Os riscos sobre o sistema financeiro e os constrangimentos orçamentais podem, também, retirar rendimento a famílias, empresas e Estados para gastar nos produtos portugueses, algo que já pesou no crescimento português este ano – a previsão de crescimento de 1,8% baixou para 1,2% no final do ano -, por via da forte queda no investimento.

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