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Disponíveis para acordo, hostis contra o voto útil. O dilema de Bloco e PCP numa campanha bipolar

PS tem maioria absoluta? É preciso lutar contra o voto útil. Afinal PS e PSD estão taco a taco? A luta fica ainda mais difícil. Os dias de campanha de BE e PCP, a pedir entendimentos a um PS isolado.

O xadrez desta campanha não é fácil e exige ginástica por parte dos partidos de esquerda. Costuma-se dizer que para dançar o tango são precisos dois – no caso da geringonça, eram três – e neste momento Bloco de Esquerda e PCP parecem ensaiar um bailado sem ter par, depois de António Costa ter passado todo o arranque da campanha a ‘malhar’ na esquerda.

A um problema junta-se outro: o facto de o PSD parecer estar cada vez mais perto de disputar seriamente as eleições é visto como um perigo para a esquerda como um todo, já que é um bloco que vai perdendo a dinâmica de vitória, e para os partidos mais pequenos em particular, já que a questão do voto útil se coloca com mais urgência do que nunca.

Durante uma semana em que o Observador acompanhou as caravanas bloquistas e comunistas de norte a sul do país, tornaram-se evidentes as táticas dos dois partidos para tentar contornar o que parece um dado incontornável desta campanha: o voto útil. Do lado de BE e PCP, ouviu-se uma disponibilidade constante para chegar a acordos com o PS — ao contrário do que ainda há três meses acontecia com o Orçamento do Estado chumbado.

E se as sondagens começaram a preocupar, a dualidade no discurso acentuou-se: a esquerda precisa cada vez mais de tentar tirar voto útil ao PS, enquanto faz o equilibrismo difícil de não hostilizar demasiado o ex-parceiro com quem jura querer voltar a conversar.

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Catarina, o convite a Costa e o papão de Sócrates

A primeira semana do Bloco de Esquerda foi feita de tentativa em tentativa de contornar os obstáculos que Costa ia deixando pelo caminho. Se o líder socialista dizia que a esquerda tinha tomado uma opção “imperdoável” ao deixar cair o Governo, Catarina reforçava que os “humores” dos partidos contam pouco para as negociações pós-eleições. Se Costa assegurava que é preciso uma maioria absoluta porque já não confia na geringonça que criou, Catarina pegava numa expressão do próprio – “não estou aqui para erguer os muros que derrubei”, dizia logo a seguir ao chumbo do OE – para responder: “O PS decidiu fazer uma campanha a erguer muros contra a esquerda, mas um voto no Bloco vai derrubar muros e abrir portas”.

A ideia foi, assim, passando por insistir na disponibilidade total, repetida por todos os dirigentes bloquistas nos comícios diários do partido, para encontrar soluções, para “abrir um novo ciclo”, para construir um “contrato para o país”. No final da semana, Catarina apontava um dado diferente para fazer um novo apelo ao voto.

Campanhas para as eleições legislativas de 2022: Ação de campanha de Catarina Martins, candidato pelo Bloco de Esquerda a primeiro-ministro. Comício no Pavilhão Carlos Lopes com Mariana Mortágua e Pedro Filipe Soares Lisboa, 23 de janeiro de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

“O que as sondagens têm demonstrado de diferente nestas eleições é um enorme número de indecisos e o que dizemos é que cada voto no Bloco impede uma maioria de direita. E cá estará para construir soluções para o país”, garantia. Estava na hora de tentar convencer os indecisos – incluindo os que ainda não conseguiram decidir se votar no Bloco terá alguma utilidade ou não a partir de 30 de janeiro. À medida que a semana avançava, e no maior comício da campanha, no domingo, carregava ao máximo na ideia da disponibilidade negocial: “O Bloco convida o doutor António Costa para uma reunião no dia 31 de janeiro”.

E este é o lado A da estratégia: o de falar pela positiva, com vontade de negociar e tentando aliciar o PS para uma renovação dos votos da defunta geringonça, agora com objetivos atualizados. O lado B, esse, é menos simpático e envolveu por estes dias agitar os papões das maiorias absolutas – sobretudo a única do PS, conquistada pelo nome que Costa não quer ver entrar na sua campanha: o de José Sócrates.

Foi, aliás, na sexta-feira, dia em que o próprio Sócrates foi à CNN e recordou precisamente os tempos da sua maioria absoluta, que o Bloco escolheu para intensificar a sério o discurso anti-maioria. Em Coimbra, o cabeça de lista e deputado José Manuel Pureza subia ao palco de mais um comício e abria o baú sem pudores, tirando de lá o fantasma do ex-ministro Manuel Pinho, acusado no caso EDP. “No momento de votar lembremo-nos de Pinho, ministro de um Governo de maioria absoluta. As maiorias absolutas são um porto de abrigo da grande corrupção. Também vamos decidir se é deste lado que estamos”.

Campanhas para as eleições legislativas de 2022: Ação de campanha de Catarina Martins, candidato pelo Bloco de Esquerda a primeiro-ministro. Comício no Pavilhão Carlos Lopes com Mariana Mortágua e Pedro Filipe Soares Lisboa, 23 de janeiro de 2022. FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Seria o ataque mais forte, mas nem por sombras o único. No primeiro debate da campanha, Catarina dizia que uma maioria absoluta do PS seria uma forma de deixar os problemas do país agudizarem-se; na primeira arruada da campanha, lembrava que o próprio Costa já tinha dito que os portugueses têm “má memória das maiorias absolutas, muito permeáveis aos grandes interesses económicos e negócios ruinosos.

A meio da semana, Catarina frisava que o PS (sem a esquerda a influenciá-lo) é “o campeão das privatizações” e que “governar à Guterres é ser isso mesmo”; e continuava, por aí fora, a garantir que com uma maioria absoluta “os CTT continuarão a ser destruídos”, “a EDP continuará a assaltar o país”, “a precariedade continuará a ser regra”, “os médicos vão preferir emigrar”.

Não é que nesta altura do campeonato alguém no Bloco acredite que a maioria absoluta é uma realidade alcançável – mas o medo da esquerda que acredita que o PSD tem hipóteses reais de formar um Governo da direita pode ser ainda mais perigoso para os partidos mais pequenos, esmagados pelo voto útil.

No Bloco, a convicção continua a ser que António Costa é um pragmático e que vai acabar por ser obrigado a negociar, quer queira, quer não (ou quer o admita ou não em tempos de campanha); mas as sondagens assustam e o discurso socialista também.

A palavra mágica no discurso dos comunistas que gradualmente vai sendo menos frequente

À saída para esta campanha e depois de António Costa ter dito num frente a frente com Jerónimo de Sousa que tinha “perdido a confiança” nos partidos que o apoiaram para formar governo em 2015 e permitiram conduzir o país à esquerda nos últimos anos, os comunistas empenharam-se a 200% a tentar chamar a atenção de Costa para o que poderá acontecer. Chamaram-lhe “convergência”, a resposta ainda não chegou de uma forma direta — embora Costa tenha dito que negoceia com todos, menos com o Chega — mas a CDU não desistiu.

Com Rio na liderança do PSD e a polarização em torno dos partidos do centrão, a CDU não quer estar totalmente fora de jogo caso se repita um fenómeno semelhante ao de Lisboa (que, nesse caso, favoreceu o PSD junto do bloco de direita).

Mas a tarefa não é fácil. Se por um lado tem que criticar as opções do Partido Socialista que não lhes serviram ao longo das últimas legislaturas, para capitalizar votos, por outro o discurso da CDU não pode ser dramático ao ponto de, no futuro, impedir uma solução semelhante à da geringonça.

O líder parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), João Oliveira, participa num desfile/ comício no âmbito da campanha eleitoral para as Eleições Legislativas, em Almada, 22 de janeiro de 2022. A 30 de janeiro mais de 10 milhões de eleitores residentes em Portugal e no estrangeiro constam dos cadernos eleitorais para a escolha dos 230 deputados à Assembleia da República. MÁRIO CRUZ/LUSA

MÁRIO CRUZ/LUSA

O discurso comunista tem oscilado ao longo dos dias. Se na passagem pelos distritos de Lisboa, Santarém e Leiria (os primeiros três dias) o discurso trazia várias referências à “tralha ideológica” e tentavam combater a ideia “de que as eleições são para eleger primeiros-ministros”, ao longo da semana a afinação foi sendo evidente. A CDU passou de colar o PS ao PSD e CDS em todos os discursos — que fazia para tentar conquistar votos ao PS — para as críticas à direita (para aumentar a votação da esquerda na matemática parlamentar).

E se em 2019 a CDU repetia que a geringonça não tinha sido um governo de esquerda de que tinham feito parte, mas sim um governo do PS que tinham apoiado — tendo forçado a barra em áreas importantes para os comunistas — pouco mais de dois anos depois esse discurso foi praticamente apagado. A CDU chama a si a divisa de ser “a verdadeira força de convergência para questões de esquerda.”

Reclamam os comunistas que os avanços conseguidos durante a geringonça são resultado de muitos anos de insistência do PCP e PEV na Assembleia da República e têm usado os trunfos dos manuais escolares e passes sociais sempre que possível. Lembram que são conquistas, algumas delas, “com mais de 20 anos de atraso”, mas que só foram possíveis graças à CDU.

E se esse discurso procura capturar votos à esquerda é certo que é incisivo naquilo que são os votos que os comunistas procuram. É que, embora unidos contra o voto útil no PS, CDU e BE são concorrentes entre o voto não-PS à esquerda. Com o objetivo de conquistar votos que possam estar balanceados entre CDU e Bloco, na passagem por Loures João Oliveira falou em concreto dos que durante muito tempo ficaram “de perna cruzada pouco se preocupando com a discussão que era preciso fazer”. Também nos primeiros dias, em mais do que um discurso comunista foi possível ouvir João Oliveira a colar o Bloco à direita, lembrando a viabilização do Orçamento de Estado Suplementar ao lado de PSD e PS no verão pandémico de 2020.

LUSA

A aposta comunista é claramente vender uma solução igual à de 2015, mas António Costa continua a excluir esse caminho como hipótese privilegiada (prefere a maioria). Ainda assim, esta segunda-feira no Fórum da TSF, João Oliveira lembrou que em 2015 o PS também começou por estar ausente do debate quando o PCP insistia na hipótese de formar governo um Governo com o apoio da esquerda e foi essa a solução que avançou mesmo. Se dúvidas existissem sobre a intenção da CDU, João Oliveira esclareceu.

A total disponibilidade da CDU para uma nova geringonça foi colocada em evidência por João Oliveira nos debates realizados com todos os partidos com assento parlamentar. Com António Costa a ignorar a pergunta direta sobre se o PS “recusa a convergência com a CDU que afaste a direita do poder”, João Oliveira sublinhou a ausência de resposta e pressionou mais uma vez diretamente António Costa, algo pouco comum no discurso dos comunistas. “A resposta ficou por dar, António Costa não quis esclarecer posição do PS em relação a essa questão”.

Para já, com as sondagens a mostrar um eventual crescimento da direita, pela primeira vez no domingo o alvo principal das críticas da CDU foram os partidos da direita e não o Partido Socialista.

Não só a CDU parece ter mudado a agulha como ampliou alta voz as críticas aos partidos que se sentam mais à direita do PSD e “seus sucedâneos” (CDS e IL). João Oliveira atirou aos que usam “discursos modernaços”, mas fogem de temas como a habitação ou querem destruir os serviços públicos. O facto de o discurso ter sido feito frente a centenas de jovens não terá sido um pormenor. Com a Iniciativa Liberal a conquistar eleitorado mais jovem, a CDU aposta em expor as falhas do partido que quase sempre evita nomear.

Poderá ter sido um discurso pontual dos comunistas, frente aos mais jovens, ou ter sido mesmo a transição para uma narrativa de maior hostilização da direita para voltar a concentrar os votos nos partidos da esquerda, considerando a tendência crescente que a direita vai somando nas sondagens.

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