Na VI Convenção da Iniciativa Liberal vão ser apresentadas várias propostas setoriais que se dividem entre temas desde a liberdade ao setor social, de críticas a desafios sobre o programa para os próximos anos. Entre os vários subscritores está o primeiro presidente da IL com uma crítica ao atual posicionamento do partido, mas também moções assinadas por membros da comissão executiva.
Um dos elementos da comissão executiva da IL assina uma das moções mais polémicas desta Convenção, em se admite que o partido está a “desiludir profundamente” os liberais em causa quando “se compactua sem protesto com limitações impostas pelo poder político à Liberdade Individual a pretexto de um qualquer pânico moral” que atribui a matérias como a “emergência climática”, o “discurso do ódio” e a pandemia.
“Quantas centenas ou milhares de Liberais já não se terão perdido?”, questiona-se.
Na moção é referido um conjunto de princípios, desde logo “o direito ao trabalho e ao sustento, impedindo-se que se encerrem empresas e se ponham em causa postos de trabalho, sem que quem impôs estas medidas sofra idêntico prejuízo”; mas também “o direito a recusar um ato médico (…) sem qualquer tipo de sanção ou discriminação” e a “capacidade de aceder e frequentar, livre de restrições, todos os espaços e transportes públicos e qualquer espaço comercial de natureza privada”.
No final da enumeração dos vários pontos, o próprio texto alerta: “Correndo o risco de sermos injuriados e [chamados de] egoístas, de não-anti-racistas, de negacionistas, de objectivistas, de conservadores, de tudo e de mais alguma coisa, é isto, em suma o que nós esperamos da Iniciativa Liberal: que defenda com unhas e dentes, contra tudo e contra todos, a vida, a liberdade e a busca pela felicidade de cada indivíduo.”
As críticas à gestão da pandemia
No mesmo sentido, uma das moções setoriais apresentadas à Convenção da Iniciativa Liberal lança um olhar para a forma como o Estado geriu a pandemia em comparação com o equilíbrio da ideia de liberdade. “A pretexto de uma doença temos assistido ao desrespeito continuado das liberdades e garantias do Estado de Direto — não só em Portugal mas também em muitas democracias”, escreve o subscritor.
O liberal não coloca em causa a doença, que diz ter uma “evidência científica clara”, mas sim aquilo a que chama “alarme social”, com medidas de contenção que considera “longe de ser racional ou cientificamente consensuais”. “As liberdades dos cidadãos são, por princípio, invioláveis.”
Nuno Santos Fernandes, membro número 4 da IL, considera “chocante” a corrida àquilo a que chama “forçar” a vacinação em massa, com um destaque especial para a vacinação infantil. E, em continuação, reitera que “restringir arbitrariamente liberdades e mentir aos cidadãos são práticas dos regimes totalitários”.
“Mais preocupante é a aceitação por parte de boa parte da população e pela comunicação social da narrativa oficial, e a radicalização das posições entre coveiros e negacionistas”, refere a moção, frisando que “tolerar medidas erráticas, irracionais e inúteis , quando não contraproducentes (…) é escancarar a porta ao autoritarismo”.
Na moção em causa defende-se que todos os membros da IL “assumam a defesa da Liberdade dos cidadãos e do Estado de Direito de forma consciente e declarada e usem de todos os recursos para fazer essa defesa”.
Há ainda uma moção sobre o conteúdo que a Iniciativa Liberdade deve incluir no programa eleitoral e os subscritores que a assinam falam na necessidade de defender uma legislação laboral que “não discrimine trabalhadores do sector privado relativamente ao público, nomeadamente quanto ao n. total de horas de trabalho semanal e condições de acesso à pré-reforma”.
“A IL deve fazer jus aos seus ideais liberais e ser uma voz ativa e respeitada no que concerne à defesa da Igualdade de tratamento entre trabalhadores, defendendo um quadro normativo que não discriminatório, em função, do sector a que pertençam, público ou privado”, pode ler-se na proposta.
As dores de crescimento e a necessidade de ser alternativa
Numa moção chamada “Manifanti”, Miguel Ferreira da Silva, o presidente fundador da Iniciativa Liberal, admite que o partido “conquistou espaço público com um discurso anti-socialista”, mas que essa agulha tem de mudar: “Nesta nova fase do partido, mais do que partido de protesto, devemos ser partido de governo. Mais do que sermos anti, devemos ser alternativa.”
“Este capital de protesto, popular mas populista, prejudica o crescimento da IL: por um lado porque é identificado com extremismos, gerando medo; por outro, porque nos afasta de soluções governativas”, critica o membro.
Num partido recente e em crescimento, há duas moções que se focam na vida interna do partido, nomeadamente na necessidade de “apostar na valorização dos membros como pilar de crescimento político do partido aumentando assim o capital humano”.
“Saber receber os novos membros, saber dar iguais oportunidades a todos, saber formar os nossos representantes políticos desenvolvendo o potencial humano que existe e se potencia com cada novo membro. Apostar na excelência e no mérito”, propõem os subscritores da primeira moção sobre este tema.
Enquanto a segunda refere que é necessário “apostar na partilha e gestão do conhecimento como estratégia fundamental para o desenvolvimento político e programático da Iniciativa Liberal”, sendo relevante a “participação de todos os membros”.
A dimensão social que uma das moções não quer perder
Na Iniciativa Liberal há membros que consideram haver a necessidade de apostar na dimensão social, com uma proposta que, na visão dos subscritores, deve ser “incluída já na campanha e programa para as próximas eleições”. O lema colocado em cima da mesa é “ajudar quem mais precisa, enquanto precisa”.
Na moção exemplifica-se com um pacote de medidas, desde um “programa de atribuição de médico de família a todos os portugueses no primeiro semestre de 2022, automatizando e ajustando o processo de atribuição, sem ser necessária qualquer ação por parte do cidadão, complementando as falhas na oferta existente do público com recurso à contratualização do privado e setor social”.
Por outro lado, os subscritores pretendem ainda que a IL tenha propostas para reduzir as listas de espera para consultas, cirurgias e outros atos médicos “para níveis acima da média da EU até final de 2023” e que seja capaz de canalizar os recursos do Estado na Habitação Social para quem efetivamente esta em situação mais vulnerável”.
A Saúde no Algarve é tema de uma das moções setoriais, onde se pede que se “reconheça a emergência que se verifica no serviço público” daquela região e que a IL incentiva, na Assembleia da República, a construção do Hospital Central do Algarve em “moldes economicamente eficientes”.
Os subscritores instam ainda a que o partido liderado por João Cotrim Figueiredo possa propor uma alteração do atual modelo de gestão do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA), para um modelo de “gestão moderno e flexível, que permita a facilitação da contratação de profissionais de saúde, possibilite a meritocracia e garanta um serviço público de qualidade”.
O ambiente que está em falta na moção estratégica
Ao contrário da moção estratégica global que só tem uma breve referência ao ambiente, uma das moções setoriais desconstrói as ideias daquilo que, na visão dos subscritores, devem ser as opções para combater a crise climática, como a “avaliação e formulação” de propostas que “procurem respostas liberais aos desafios das alterações climáticas, perda de biodiversidade, economia circular, redução de emissões de gases de efeito de estufa, mobilidade, urbanismo, produção agrícola, conservação da natureza, aprofundando o desenvolvimento económico e social e protegendo o ambiente”.
Os subscritores consideram que as propostas apresentadas “podem e devem ser políticas para comunicar de forma pública a sustentabilidade, o liberalismo e o papel do indivíduo com estes compromissos”.
O foco das moções na descentralização
Uma moção intitulada “Reforma do Estado: pela criação das autarquias locais regionais” é apresentada aos membros da IL e argumenta que há evidências e estudos que revelam que “os países com níveis de regionalização administrativa são potencialmente mais desenvolvidos economicamente”.
Tendo em conta a visão dos liberais que subscreveram a moção, é “mais do que tempo de alterar esse panorama de ineficiência e atraso” do país, sendo preciso apostar numa “administração local mais eficiente”. “As entidades regionais já existem, é preciso implementar o definido na nossa Constituição”, pode ler-se no documento em que se defende “a criação das Autarquias Locais Regionais Administrativas, seguindo o actual enquadramento e condicionamento constitucional”.
Para os subscritores da moção, essa criação “deve ser conduzida com neutralidade orçamental” nomeadamente “à custa da administração central”, através da eliminação de “serviços duplicados, transferindo recursos e optimizando-os”.
“As verbas necessárias ao funcionamento das autarquias locais regionais deverão ser concretizadas por percentagem das receitas nacionais, sejam impostos diretos ou indiretos, correspondentes às funções e recursos materiais e humanos transferidos”, argumenta a moção.
Numa outra moção sobre a descentralização, os subscritores entendem que “os serviços do Estado devem ser desconcentrados, num sinal inequívoco de valorização de todo o território nacional”, onde se pode ler também que “quando for indispensável a intervenção do Estado, seja enquanto decisor, financiador ou prestador, esta deve ser tomada no nível mais próximo do cidadão em que seja possível exercê-la de forma eficiente”.
Numa terceira moção sobre o tema, os subscritores alertam que esta questão pode ser um tópico importante na próxima legislatura e que a IL deverá ser motivada a tomar uma “posição racional e liberal sobre esta temática”.
Além da descentralização, uma das moções apresentadas pretende que seja feita uma proposta de Reforma do Estado até ao final de 2022 e que tenha como objetivo “reduzir a despesa do Estado a quatro anos”, com a apresentação de medidas concretas e poupanças, em que sejam identificadas “implicações, riscos e oportunidades”, mas também que seja identificado o potencial de crescimento económico de Portugal.
E há ainda a sugestão de que a IL se deve opor “ao investimento num hub aeroportuário de Lisboa sem que se demonstre a sua racionalidade económica e o seu enquadramento no ordenamento do território”. No mesmo sentido, os subscritores consideram que antes das decisões sobre o local do aeroporto deverá ser feita “uma análise mais fina sobre racionalidade económica e ordenamento de território”.