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Em público e em privado: os cinco homens que querem ganhar em Espanha

Em público e em privado, são muitas as semelhanças entre os 5 candidatos: percursos políticos, currículos "inchados", filhos prematuros, casas milionárias. Só um apareceu nu num cartaz de campanha.

É difícil dizer qual dos cinco principais candidatos a presidente do Governo espanhol tem mais a perder nas eleições de domingo. Todos, menos um: para Santiago Abascal, líder do Vox — que, há um ano, não descolava dos 0% e, agora, pode tornar-se a terceira força política em Espanha —, talvez possa dizer-se que tudo o que vier é lucro. Para os outros, porém, o momento é, pelo menos, de definição quanto ao futuro político — deles próprios ou dos partidos que dirigem.

Será uma das coisas que têm em comum, além de outras mais evidentes: Pedro Sánchez (PSOE), Pablo Casado (PP), Albert Rivera (Ciudadanos), Pablo Iglesias (Podemos) e Santiago Abascal são jovens — Sánchez é o mais velho, com 47 anos, mas os seus adversários andam todos entre os 38 e os 43 anos; são todos pais — Abascal tem quatro filhos, de dois casamentos; dois candidatos são militantes dos seus partidos desde quando tinham cerca de 20 anos, os outros três fundaram os partidos que agora lideram; para quase todos, é a terceira vez que concorrem à Presidência do Governo — apenas para Pablo Casado, eleito líder do PP em 2018, esta será a primeira vez; e quase todos foram criticados, a dada altura, pela sua juventude ou inexperiência política, pela disponibilidade de chegar a acordos com adversários ou por mudar de posição sobre o mesmo tema.

Claro que todos eles também são notícia por tudo, ou quase tudo, o que fazem ou que dizem — ou o que já disseram e fizeram — mesmo que num plano mais privado que político. Sánchez e Casado viram os seus currículos universitários questionados. Rivera e Abascal, defensores acérrimos da família, foram notícia por causa das suas relações amorosas; Iglesias ainda não recompôs a sua imagem da polémica com o chalé milionário que comprou com a mulher, também dirigente do partido. Como exemplo único, que se saiba, talvez apenas o do candidato que apareceu completamente nu num cartaz de campanha.

Pedro Sánchez, PSOE

Em público

Foi da crise na Catalunha, às portas do referendo pela independência, que nasceu este aperto de mão. Em setembro de 2017, Pedro Sánchez era já o líder do principal partido da oposição ao PP de Mariano Rajoy — e seria a mão dele a apontar o caminho da rua a Rajoy, nove meses depois.

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Pedro Sánchez Pérez-Castejón, 47 anos, estava a tentar chegar à Presidência do Governo desde julho de 2014, altura em que assumiu a liderança do Partido Socialista Obrero Español. Nas primeiras eleições gerais a que concorreu, porém, não só ficou muito longe do objetivo — com 22,01% dos votos e 90 deputados — como fixou um novo mínimo para o partido (menos 20 deputados que na legislatura anterior), desde o fim da ditadura. A vitória do PP seria, ainda assim, curta. Sem capacidade para formar Governo, Espanha voltou às urnas seis meses depois e, para Sánchez, foi ainda pior: conseguiu 22,63% dos votos, mas isso só se traduziu em 85 deputados — cinco a menos que seis meses antes, o pior resultado do PSOE, até agora, em democracia.

Foi o fim político do líder dos socialistas, que apresentou a demissão? Nem por isso. Pedro Sánchez procurou um programa mais colado à esquerda, candidatou-se às primárias do partido — de que é militante desde os 21 anos — e ganhou, com 50% dos votos, ficando legitimado para tentar outra vez. O ataque à Presidência do Governo, porém, acabou por ser feito quando o mandato de Rajoy ainda ia a meio, e sem passar por eleições. Juntou aliados no Congresso dos Deputados — sobretudo o Unidos Podemos (coligação que elegeu Pablo Iglesias) e os independentistas da Esquerda Republicana da Catalunha — e fez cair o Governo do Partido Popular, com uma moção de censura: 180 votos a favor, 169 contra e uma abstenção.

Mariano Rajoy perde moção de censura e Pedro Sánchez é o novo Presidente de Governo de Espanha

Tomou posse no dia seguinte, 2 de junho de 2018. Visto à distância, percebe-se agora que, no dia em que jurou ser Presidente do Governo, o relógio para a sua própria queda já estava a contar. Naquela altura, já os partidos que o apoiaram na moção de censura tinham feito saber que não iam aprovar o Orçamento do Estado que Rajoy tinha preparado — e que Sánchez prometeu cumprir, “em nome da estabilidade”. Não seria um problema para as contas daquele ano, com o voto garantido do próprio PP, mas revelou-se um muro intransponível no Orçamento de 2019, mesmo que já feito pelas mãos do líder do socialista. Sem o mesmo apoio que teve para chegar ao poder, Pedro Sánchez estava limitado aos 84 deputados do PSOE no parlamento.

A 28 de abril, com o Orçamento chumbado, convocou eleições: as terceiras em três anos e meio; as primeiras que podem valer uma vitória do PSOE nas urnas nos últimos 11 anos.

Sánchez convoca eleições para 28 de abril. “Há derrotas parlamentares que são vitórias sociais”

A vitória no próximo domingo é quase certa — Sánchez é o favorito em todas as sondagens e não há grandes dúvidas de que o PSOE receberá o maior número de votos. O problema é que, a ter em conta as mesmas sondagem, dificilmente os resultados lhe vão permitir, sozinho, avançar para o Governo. Não terá maioria no Congresso dos Deputados e só a coligação Unidas Podemos (que já deixou claro que, para o apoiar, terá de fazer parte do executivo) não chega — precisará também (e de novo) dos independentistas para evitar aquilo que seria uma espécie de geringonça, mas à direita, com a união de PP, Ciudadanos e Vox. A poucas horas da votação, não é certo que o consiga. Basta pensar que, sendo pouco claro quando à questão da Catalunha, Pedro Sánchez já disse que defende o diálogo, mas que não tolerará aspirações de independência. E é também por isto que a sua vida política volta a estar em jogo.

Em privado

Trezentas páginas, encadernadas em capa dura, preta, escrita em letras brilhantes. É essa a descrição feita pelos jornais espanhóis que lançaram suspeitas sobre a tese de doutoramento de Pedro Sánchez. As notícias começaram a surgir já era ele substituto de Mariano Rajoy e Presidente do Governo. Plágio? Sánchez garantiu que não e prometeu processos judiciais a quem o dissesse; a universidade disse que não e encontrou apenas 15% de referências a outras obras; mas o ABC leu o trabalho (só disponível para consulta na própria universidade) e diz que sim.

O jornal garante que o socialista “copiou outros autores”, “usou informações do governo de Zapatero” e “repetiu artigos seus já publicados” na sua tese de doutoramento. A suspeita acabou por tornar-se tema de debate político, com a oposição a exigir explicações de Sánchez e a disponibilização pública da tese — o que acabou por acontecer, mas não em formato digital, “por desejo do autor”, explicou a universidade.

Foi, provavelmente, a polémica “não-política” que, até agora, mais o afetou.

Casado, pai de duas filhas, o madrileno de 47 anos é doutorado em Economia e, antes de chegar à liderança de Espanha, era professor universitário. Os amigos da infância e juventude, citados pelo jornal El Español, descrevem-no como bom rapaz, sociável e popular na escola, sempre com boas notas, talento para a música e para o desporto — foi, aliás, basquetebolista, uma das suas grandes paixões. A escola a que se referem é uma das mais conceituadas de Madrid: o Instituto Ramiro de Maeztu, berço de outros políticos, escritores e gestores de destaque. Ali, Pedro Sánchez fez o seu percurso até à universidade. O Ramiro de Maetzu é, aliás, conhecido por ter alguns dos melhores resultados de acesso ao ensino superior.

No currículo do Presidente do Governo, porém, não costuma constar, antes deste, o nome da escola primária que frequentou — e o jornal El Español diz que isso não é por acaso. Até aos 10 anos, o socialista estudou no colégio Santa Cristina de Chamartín, conhecido com El Santa: uma escola privada que já não existe e que, segundo antigos alunos, custava, na altura, 25 mil pesetas por mês. “Era um colégio chique, para pessoas com dinheiro”, acessível apenas para a elite, diz uma dessas ex-estudantes.

Pablo Casado, PP

Em público

A história pública recente de Pablo Casado está ligada à mesma figura que Pedro Sánchez. Militante desde 2003, dirigente da Juventude Popular durante vários anos, Casado tornou-se, em 2018, o líder mais jovem da história do Partido Popular. Antigo vice-secretário geral de Comunicação de Mariano Rajoy, aos 39 anos coube-lhe a tarefa de recuperar o terreno perdido não só com a moção de censura que fez cair o antecessor, mas, sobretudo, com os escândalos de corrupção ligados ao PP e ao caso Gürtel.

A vitória na corrida à liderança do partido, dizem os analistas, terá ficado a dever-se ao discurso mais colado à direita — e menos ao centro que o de Soraya Sáenz de Santamaría, delfim de Mariano Rajoy, apontada como favorita, e que, na primeira votação das internas, tinha mesmo ficado em primeiro lugar.

“Um café mais forte, outro mais suave”. O que aproxima e separa os dois candidatos a líderes do PP

Combativo e com uma visão mais dura, Pablo Casado foi sempre muito influenciado por José María Aznar (antigo líder do partido e primeiro-ministro). Defensor da família e contra a despenalização do aborto, tem sido muito crítico de várias associações feministas, falando em “ideologia de género” como algo que “o centro direita deve combater”. É extremo também na visão sobre a questão da Catalunha. Defensor da monarquia e da unidade de Espanha, chegou a sugerir que a circulação na União Europeia fosse limitada, depois de um tribunal alemão ter recusado autorizar a extradição de Carles Puigdemont.

Em privado

Nascido numa família conservadora e religiosa de Palencia, Pablo Casado dá muita importância pública à família que ele próprio construiu. É casado há 10 anos com Isabel Torres Orts, uma psicóloga herdeira dos proprietários do grupo hoteleiro Huerto del Cura, com quem teve dois filhos. O nascimento de um deles tornou-se particularmente referido: Pablo, o mais novo, nasceu com apenas 25 semanas de gestação e esteve hospitalizado durante os primeiros quatro meses da sua vida. A experiência acabaria por levar o líder do PP a, publicamente, mandar uma mensagem de apoio ao adversário Pablo Iglesias, do Podemos, quando nasceram os seus filhos gémeos, também prematuros.

Há também um elemento que o liga a outro adversário: desta vez, Pedro Sánchez do PSOE. Acabado de chegar à liderança do PP, Pablo Casado também teve de lidar com suspeitas relacionadas com o seu currículo. O seu caso, porém, poderia ser bastante mais grave — sobretudo porque subiu ao Supremo Tribunal para ser julgado.

Pablo Casado começou “ontem”, mas a polémica do mestrado pode deixá-lo sem “amanhã”

Licenciado em Direito e em Administração de Empresas, a lista da formação académica superior de Casado é extensa. Além das duas licenciaturas, conta também com um mestrado em Direito Autonómico e Local da Universidade Juan Carlos I de Madrid, formações nas melhores escolas de negócio espanholas e passagens por três universidade norte-americanas, incluindo uma pós-graduação em Harvard. O problema, segundo o El País, é que a forma como as supostas formações estão descritas não coincide com a natureza dos cursos — bem mais curtos do que o aparentemente assinalado no CV.

A pós-graduação em Harvard seria apenas um curso daquela universidade norte-americana que foi lecionado em Madrid. Metade das 25 cadeiras do curso de direito na Universidade Complutense foi feita em apenas quatro meses. E, depois, o mestrado: matriculou-se em 2008 — era então um jovem deputado do PP na assembleia regional de Madrid —, fez apenas quatro dos 90 trabalhos exigidos e assistiu somente às aulas de quatro das 18 cadeiras previstas. Ainda assim, ficou com o título de mestre em Direito Autonómico e Local.

O caso chegou à justiça e uma juíza de instrução, que analisou o processo, foi tudo menos meiga — para Pablo Casado e para a própria universidade: escreveu que Casado apresentava “indícios de responsabilidade penal” e sublinhou como ficou “indiciariamente demonstrado” que o mestrado era utilizado como “prenda ou benefício”. Tudo para beneficiar alunos “com uma posição relevante no âmbito político, institucional ou que mantinham vínculos estreitos de amizade ou de caráter profissional” com o diretor do curso.

O Tribunal Supremo, que teria de decidir se julgava o caso, também chegou a algumas destas conclusões, mas acabou por ditar que, mesmo havendo indícios de que o líder do PP teve “um tratamento de favor” durante o mestrado, isso não constituiu um crime. “Fiz o que me foi pedido, não me pareceu estranho. Se houve algo que não foi feito de forma correta, desconheço-o”, disse o próprio, na primeira vez que falou sobre a polémica.

Pablo Iglesias, Podemos

Em público

Vai a eleições gerais pela terceira vez desde que fundou o Podemos, em 2014. Aos 40 anos, Pablo Iglesias Turrión tem assistido ao declínio acentuado do partido nas sondagens, mas também na união interna. Foi abandonado por muitos dos seus primeiros apoiantes — e até mesmo por alguns dos seus primeiros companheiros políticos — e enfrenta ainda uma crise dentro de portas. Em parte, como veremos, por causa de uma polémica relacionada com a sua vida privada, mas também pelo desânimo dos que o acusam de ter abandonado os ideais que sempre defendeu (ou, pelo menos, de os ter aligeirado).

O Podemos de Pablo Iglesias perdeu María e Jorge — e pode perder quase tudo nas eleições

A sua missão — assume-o — é impedir a vitória de um Governo de direita, com a coligação de PP, Ciudadanos e Vox, mas também a de impedir que Pedro Sánchez, o favorito, seja forçado a tentar uma aliança com o Ciudadanos. Para isso, porém, a votação do Unidas Podemos (a coligação entre o Podemos e a Esquerda Unida, pela qual se candidata) tem de ser suficientemente forte. E, nesta altura, nem as sondagens conseguem dizer qual será a terceira força política: se o Ciudadanos, o Vox ou a coligação de Iglesias.

Uma “ressurreição” do Podemos, como lhe chama o El País, terá sempre de ser conseguida entre os eleitores do PSOE. Ou, por outra, dos indecisos de esquerda que não querem apoiar o partido socialista. São eles, aliás, o principal alvo da campanha que tem feito, ainda que com esta ambiguidade: Pablo Iglesias quer enfraquecer Pedro Sánchez, mas não esconde que quer governar com ele.

Sobre isso já foi muito claro: apoiar o PSOE, permitindo-lhe formar Governo, só com divisão de cargos.

Professor universitário, formado em Ciência Política e Administração, dedicou a tese de doutoramento à desobediência civil do movimento anti-globalização do início do século XXI, em Espanha e em Itália. É mais forte nas redes sociais do que os outros candidatos. Ali escreve, sobretudo, sobre temas sociais, luta contra a corrupção, bancos e fundos financeiros. Quando o Governo de Sánchez caiu, em fevereiro, estava afastado do espaço mediático. Em janeiro, tinha tirado uma licença de paternidade de três meses, depois do nascimento dos seus filhos gémeos — uma decisão elogiada pela mulher, Irene Montero, também dirigente do partido: “Uma mensagem poderosa” sobre a igualdade, disse.

Em privado

O nascimento dos gémeos de Pablo e Irene não foi notícia, porém, apenas pela duração da licença tirada pelo pai. Leo e Manuel nasceram prematuros, aos seis meses de gestação. O casal recebeu, por isso, várias mensagens de apoio, mas uma delas foi, provavelmente, a menos esperada. Veio de Pablo Casado, líder do PP e adversário de Iglesias nas eleições deste domingo. Politicamente distantes, ambos têm, porém, este ponto em comum. E lembrando que ele próprio sofreu com o nascimento prematuro do seu filho — às 25 semanas e com apenas 700 gramas de peso —, Casado quis deixar-lhes uma palavra durante uma entrevista televisiva: “Estou com o Pablo e com a Irene. Estas experiências fazem-te melhor pessoa. Eles vão seguir em frente e, daqui a alguns meses, estará tudo fenomenal. Dou-lhes todo o ânimo do mundo”. Além disso, as crianças acabaram por ser tratadas pelo mesmo neonatologista.

O ponto em comum voltou a ser notícia já esta semana, depois do segundo e último debate da campanha. Depois dos minutos finais atribuídos a cada candidato, e já com o debate concluído, Casado e a mulher ficaram à conversa, durante alguns minutos, com Pablo Iglesias, enquanto o líder do Podemos ia mostrando fotografias dos bebés no telemóvel.

É claro que, no que diz respeito à vida privada do casal Iglesias/Moreno, nenhum outro tema foi tão mediático — e político? — como a compra da casa da família. Um chalé de luxo de 260 metros quadrados, num terreno com mais de 2 mil metros quadrados, em Galapagar, na serra de Madrid, com piscina e uma casa de hóspedes. A imobiliária que vendeu a propriedade diz que é “muito luminosa, com tetos altos e boas áreas, aquecimento por piso radiante, rega automática no jardim, uma horta grande e uma zona para animais. Em troca? 600 mil euros.

As críticas foram sem piedade. Pablo Iglesias foi acusado de, afinal, ter um discurso hipócrita, que destruía a sua credibilidade — e do partido. Logo se recordou que o líder do Podemos, que tem na habitação uma das suas principais causas, ainda em 2015 alertava os espanhóis para “o perigo dos políticos que vivem em chalés”, afastados da população e da classe trabalhadora, e que também tinha criticado, em 2012, políticos que compram casas de 600 mil euros. “Entregarias a política económica do país a quem gasta 600 mil euros num apartamento de luxo?”, perguntava Iglesias num tweet, referindo-se ao então ministro da Economia, Luís de Guindos. E apenas três anos antes da compra milionária, acabado de chegar à política partidária, Iglesias tinha deixado entrar a jornalista Ana Rosa Quintana na sua casa da altura: avaliada em 83 mil euros e recebida de herança da avó, modesta e com 60 metros quadrados. “Bien a gustito”, dizia o próprio.

Modesta, com 60 metros quadrados e “bien a gustito”. Assim era a casa de Iglesias antes do chalé de luxo

“O código de ética do Podemos não é uma formalidade. É um compromisso em viver como as pessoas de trabalho para que as possamos representar”, disse, na altura da polémica, José María González, presidente da câmara de Cádiz e um dos membros do Podemos revoltados com o comportamento de Pablo Iglesias e Irene Moreno. O coro de críticas acabou por levar o casal a submeter-se a um voto de confiança: “Se quiserem, nós demitimo-nos”.

Não foi preciso: 70% dos militantes votou para que ficassem exatamente onde estão. Talvez o dano seja maior entre os eleitores — saber-se-á já este domingo.

Albert Rivera, Ciudadanos

Em público

O resultado do Ciudadanos nas eleições da Andaluzia, em dezembro do ano passado — que permitiu ao PP, também com o Vox, formar governo — fez crescer em Albert Rivera a convicção de que, a nível nacional, essa palavra decisiva pode voltar a calhar-lhe, permitindo que uma coligação à direita roube o lugar àquele que, sozinho, será quase certamente o vencedor das eleições deste domingo — Pedro Sánchez.

A ambição não é de agora. Depois dos resultados nas eleições de 2015 e 2016 — que, com os resultados do Podemos, puseram fim ao bipartidarismo em Espanha — o Ciudadanos começou a acreditar que pode ultrapassar o PP e tornar-se no maior e mais importante partido da direita — senão do país. Foi esse o espírito que manteve quando, em 2017, roubou o protagonismo aos populares na gestão da crise da Catalunha, com Albert Rivera em Madrid e Inés Arrimadas a liderar o partido a partir de Barcelona.

Divorciado, pai de uma filha, Albert Rivera tornou-se o primeiro presidente do Ciudadanos em 2006, com apenas 26 anos. Foi deputado na Catalunha até 2015 e, dois anos depois, o partido (nascido de uma plataforma popular) ganhou as eleições na região. A motivação que traz para as eleições gerais de domingo vem também daí. Rivera procura no Congresso dos Deputados o mesmo sucesso que teve a nível regional, mas traçou linhas vermelhas para o fazer. Diz que não quer coligações e que governará “perto de Pablo Casado”, do PP, mas não com o Vox de Santiago Abascal — a quem estará, apenas, atento. Anda assim, os analistas lembram que Rivera é um político ágil, capaz de se adaptar rapidamente a qualquer contexto, levando todo o partido (com bases mais fracas) atrás da sua lideranças. Por outras palavras, essas linhas vermelhas podem sempre mudar de cor, se isso garantir a derrota de Pedro Sánchez e do PSOE.

Uma das suas bandeiras é, claro está, a luta anti-independência na Catalunha. “Ao percorrer Espanha, não vejo ‘vermelhos’ e ‘azuis’, não vejo jovens e velhos, vejo espanhóis. Não vejo crentes e agnósticos, vejo espanhóis. Vamos unir-nos para recuperar o orgulho de pertencer a esta grande nação”, disse, em campanha pelo país. O foco é claro: recuperar o orgulho patriótico dos que votavam PP e deixaram de se identificar com o partido, mas também de todos os outros indecisos (que, no total, serão cerca de 40%).

Em privado

Pode parecer-lhe estranho que este capítulo sobre a vida privada de Albert Rivera comece com a história de um cartaz político de 2006, era ele candidato a deputado no parlamento a Catalunha. Mas talvez seja justo dizer que aquele material de campanha eleitoral, naturalmente público, devia, provavelmente, ter ficado apenas na sua esfera privada.

O Ciudadanos era, na altura, um partido acabado de criar e Albert Rivera queria não só causar impacto como afirmar-se como alguém que não tinha nada a esconder. Por isso, ofereceu-se para protagonizar cartazes de design simples, com frases como “nasceu o teu partido” ou “só nos importam as pessoas”. O foco de quem os vê vai irremediavelmente para o candidato: Rivera aparece de pé, de frente para a câmara, completamente nu e com as mãos a tapar os genitais:

Imagem: Arquivo Eleitoral

Na altura, Albert Rivera era um jovem advogado de 27 anos. Não consta que tenha voltado a despir-se para ações de campanha. A sua vida privada, porém, muito para lá da política, tem sido notícia com grande frequência nos últimos meses — sobretudo na chamada imprensa cor-de-rosa.

Divorciado desde 2015 (de um casamento que gerou uma filha), namorava há quatro anos de Beatriz Tajuelo, uma antiga comissária de bordo da AirNostrum. Ao contrário do que acontecia com a ex-mulher, Rivera e a namorada apreciam várias vezes em público, em eventos ou nas redes sociais de ambos. Em outubro do ano passado, porém, isso deixou de acontecer. E em janeiro, o Ciudadanos confirmou, oficialmente, a separação. A “notícia” acabaria por, na verdade, ser apenas o embrião de um furacão mediático.

Nos dias seguintes, começaram os rumores sobre quem seria a nova namorada — e se era verdade que ela existia. Até se ter descoberto que era Malú, uma cantora espanhola, sobrinha de Paco de Lucía. “O casal do momento” fez capa em várias revistas, foi notícia em jornais como o El País e a internet explodiu em memes sobre a relação:

Depois de algum secretismo, Albert Rivera lá haveria de confirmar que sim, tem uma namorada — e orgulho num país “onde cada um pode estar com quem quiser”. A notícia passou, por isso, a ser outra: aparentemente, os dois quereriam “estar” juntos numa casa no luxuoso e exclusivo bairro de La Finca — onde morou Cristiano Ronaldo, por exemplo, na sua passagem pelo Real Madrid. Comparada com esta, a casa de Pablo Iglésias parecer-se-á mais com uma cabana no campo — sendo certo que, neste caso, não estaria em causa uma compra, mas um aluguer.

Um aluguer caro, porém: cerca de 5 mil euros mensais por mais de 2.500 metros quadrados de área edificada, com conforto, luxo, segurança e, sobretudo, muita privacidade. Durante dias (semanas?), a imprensa espanhola desfiou como seria a nova casa. Até agora, não consta que o casal tenha, de facto, feito qualquer negócio.

Santiago Abascal, Vox

Em público

Há um ano, o Vox aparecia nas sondagens nacionais quase sempre muito perto do mesmo valor redondo: 0%. Nas últimas sondagens tornadas públicas, ainda esta semana, alguns admitem que possa chegar aos 12%, fazendo uma entrada triunfal no Congresso dos Deputados e ocupando mais de 40 lugares.

A comparação mostra de forma clara o destaque que o Vox tem assumido no panorama político espanhol — ainda que as campainhas quanto ao partido de extrema-direita liderado por Santiago Abascal só tenham começado a soar, de forma audível, há cerca de cinco meses. Em dezembro, o Vox alcançou um resultado inédito nas eleições da Andaluzia — 11% e 12 deputados em 109 possíveis — e passou a ter na mão a chave do Governo regional — que aceitou entregar ao PP, com um pacto.

Vox. Até onde irá o partido dos netos de Franco e dos filhos rebeldes do PP?

Fundado em 2013, o Vox tem Abascal como presidente desde 2014. As histórias de um e de outro confundem-se. Nascido a 14 de abril de 1976, em Bilbao, Santiago Abascal Conde tornou-se militante do PP aos 18 anos. Neto de um franquista (o avô foi autarca em Amurrio, no País Basco, durante a ditadura), acabou por abandonar o partido, desiludido com a postura “branda” de Mariano Rajoy perante as aspirações independentistas da Catalunha. É, assim, um filho rebelde do PP, tal como muitos outros no partido que ajudou a fundar.

Não há meio termo no que defende: é contra o aborto e contra o casamento homossexual; defende a construção de um muro na fronteira com Ceuta e Melilla, para impedir a entrada de migrantes e requerentes de asilo; quer acabar com o apoio estatal a organismos que se assumam como feministas; defende o fim da lei da violência de género e promete “perseguição eficaz” às denúncias falsas de violência doméstica.

Não há grandes dúvidas de que, se o momento chegar, o Vox aceitará juntar-se ao PP e ao Ciudadanos. E, como já vimos, também não é líquido que o partido de Rivera recuse esse apoio, para fazer número — tal como não recusou na Andaluzia. Ali, o Vox foi claro: “Nunca seremos um obstáculo para que haja na Andaluzia uma alternativa à maioria socialista e à corrupção chavista”, falando do PSOE e do Podemos, respetivamente. No país, dificilmente será diferente.

Em privado

O que quebra a imagem dura, hostil e intransigente de Santiago Abascal? A mulher, Lidia Bedman. A dupla parece até improvável. O homem tradicional, com grande ligação à caça e ao campo, um discurso radical e ideias ultra-conservadoras, com uma jovem mulher, quase 10 anos mais nova, influencer conhecida nas redes sociais, sobretudo ligadas à maternidade — e que, em dezembro do ano passado, tinha o triplo dos seguidores de Abascal no Instagram (onde raramente mostra a cara ou identifica o marido).

Formada em Publicidade e Relações Públicas, com um mestrado em Gestão Comercial e Marketing, Lidia Bedman ainda integrou as listas do Vox à Assembleia de Madrid, em 2015, mas logo se afastou da política. “Ser mãe é o meu melhor projeto pessoal”, diz, admitindo que o casal ainda conta fazer a família crescer. Nesta altura, têm dois filhos em comum — um deles nasceu a 20 de dezembro de 2015, data de eleições gerais em Espanha, nas quais o Vox não conseguiu qualquer deputado —, que se somam a outros dois de Santiago Abascal de uma outra relação — um casamente de que fala muito pouco, que começou em 2002 e terminou em 2010.

Esse divórcio já foi, aliás, usado contra ele, pondo em causa a sua credibilidade entre o que diz e o que faz: como é que um defensor da família e dos seus valores pode ter-se separado da mulher e mãe dos seus filhos? “Toda a gente deseja que o seu projeto familiar não se estrague, mas, por vezes, não se tem sorte. Continuo a ser defensor da família. Se me criticam por isso, nem quero saber”, respondeu.

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