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Allan Lichtman é historiador e criou um modelo de previsão com a ajuda de um geofísico soviético nos anos 80
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Allan Lichtman é historiador e criou um modelo de previsão com a ajuda de um geofísico soviético nos anos 80

AFP via Getty Images

Allan Lichtman é historiador e criou um modelo de previsão com a ajuda de um geofísico soviético nos anos 80

AFP via Getty Images

Entrevista. Em 2016, Allan Lichtman foi dos poucos a prever a vitória de Trump. Agora diz que Biden vai ganhar

Entrevista. Desde 1984 que Allan Lichtman acerta na tendência de voto dos americanos. Em 2016, em contracorrente com as sondagens, previu a vitória de Trump. Este ano, aponta Biden como vencedor.

Em 2016, o historiador norte-americano Allan Lichtman foi um dos poucos a prever a vitória de Donald Trump. Lichtman, que até é um democrata, foi criticado pela sua previsão, já que todas as sondagens apontavam para a eleição de Hillary Clinton, mas não cedeu e manteve-a até ao fim. Acabaria por ser dos poucos a acertar — e Trump mandou-lhe uma carta: uma fotocópia da notícia do The Washington Post com a sua previsão, autografada pelo Presidente.

Através de um método inovador que desenvolveu nos anos 80 com um geofísico soviético (baseado na previsão de terramotos), Lichtman tem previsto com exatidão todas as eleições presidenciais norte-americanas desde 1984. Só em 2000 é que houve um percalço: Lichtman previu, corretamente, que Al Gore seria o candidato que receberia mais votos, mas, pela primeira vez em várias décadas, o vencedor do voto popular não ganhou no Colégio Eleitoral (foi George W. Bush quem venceu), o que obrigou o historiador a introduzir esse fator na sua previsão — permitindo-lhe acertar na vitória de Trump em 2016.

O método de Lichtman é diferente da maioria das previsões. Em vez de olhar para as sondagens e para a campanha, o historiador analisa as dinâmicas sociais e o comportamento da Presidência e tenta concluir se estão reunidas as condições para a manutenção do poder ou para uma troca de partidos na Casa Branca — e fá-lo através de 13 perguntas de verdadeiro ou falso. Se seis ou mais tiverem “falso” como resposta, o partido no poder perde; caso contrário, esse partido mantém-se na Casa Branca.

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Em entrevista ao Observador a partir de Washington, DC, Allan Lichtman explica como criou o modelo e aplica-o às eleições de 2020. E não tem dúvidas: Joe Biden vai ser o próximo Presidente dos EUA. Mas esta derrota de Trump não era evidente há um ano. Foi 2020, com a pandemia da Covid-19 e a agitação social provocada pelas tensões raciais nos EUA, que deram a volta à previsão. A incapacidade de Trump de responder a estas crises, adotando uma postura de candidato da oposição em vez de uma atitude presidencial, custará ao magnata a reeleição, garante Lichtman.

[Veja aqui a entrevista de Allan Lichtman ao Observador.]

Com base no método que criou, percebemos que olha para as eleições e para as previsões de uma forma diferente da maioria das pessoas. O que é que influencia os eleitores numa eleição presidencial?
O meu método de previsão é o das “13 Chaves para a Casa Branca”, que tem previsto as eleições corretamente desde que previ a reeleição de Ronald Reagan, em abril de 1982, dois anos e meio antes da eleição e durante aquilo que, na altura, era a pior recessão desde a Grande Depressão. O meu método ignora as sondagens e os comentadores, não olha para os eventos diários da campanha. Em vez disso, examina as dinâmicas fundamentais que guiam as eleições presidenciais. As eleições presidenciais são, essencialmente, votos a favor ou contra relativamente ao partido que detém a Casa Branca. Por isso, as chaves examinam a força e o desempenho do partido que está na Casa Branca. São 13 chaves. Se seis ou mais forem contra o partido da Casa Branca, prevê-se que esse partido perca. Imagine o seguinte: de acordo com as chaves, que têm estado certas há quase quarenta anos, é a governação, e não a campanha, que conta nas eleições presidenciais americanas.

Acredita, então, que as sondagens são inúteis?
Não acho que as sondagens sejam inúteis. Sou amigo de muitos dos que fazem sondagens e eles fazem um bom trabalho. O problema é que as sondagens não são preditores. Abusamos delas ao considerá-las como preditores. As sondagens são retratos instantâneos e esses retratos mudam. Como sabemos que eles mudam? Fazemos outra sondagem, e por aí em diante, até chegarmos finalmente ao dia das eleições. Os jornalistas dependem das sondagens porque têm de cobrir a eleição dia após dia. Não podem simplesmente dizer “aqui está a previsão do Lichtman, vemo-nos daqui a cinco meses”. O outro problema é que o erro é muito maior do que eles dizem. Eles dizem que a margem de erro é, por exemplo, mais ou menos 3%. Isso é puramente um erro de amostragem estatística. É a margem de erro que teríamos se retirássemos uma amostra de bolas verdes de um enorme jarro com bolas verdes e amarelas. Não tem em consideração o erro que deriva do erro da resposta daqueles que são contactados nem o erro de estimativa dos potenciais eleitores, que nunca será completamente preciso. Por isso, as sondagens têm margens de erro muito maiores do que acreditamos.

"É a governação, e não a campanha, que conta nas eleições presidenciais americanas"

Através das suas 13 perguntas — e gostava que me dissesse como chegou a elas —, tenta perceber a forma como os eleitores avaliam o trabalho do atual governo, é isso?
É isso. Adorava dizer-lhe que cheguei às chaves após uma longa e brilhante contemplação, mas se lhe dissesse isso, para citar o falecido e não tão grande Presidente Richard Nixon, isso seria errado. Eu cruzei-me com as chaves completamente por acaso, quando era um académico convidado no Instituto de Tecnologia da Califórnia, em Pasadena. Lá, conheci a maior autoridade mundial em previsão de terramotos, Vladimir Keilis-Borok, de Moscovo. Um dos poucos académicos que eram membros das Academias Nacionais de Ciências tanto dos EUA como da União Soviética. Foi dele a ideia de usar os métodos de previsão de terramotos, de reconhecimento de padrões, para prever as eleições presidenciais americanas. Reconceptualizámos as eleições — era 1981 —, não como Ronald Reagan vs. Jimmy Carter, não como Republicano vs. Democrata, não como liberal vs. conservador, mas como estabilidade (o partido que detém a Casa Branca mantém a Casa Branca) vs. terramoto (o partido que detém a Casa Branca perde). Com essa ideia, olhámos para todas as eleições presidenciais americanas desde 1860, a eleição de Abe Lincoln, no tempo das carruagens puxadas por cavalos, até 1980, a eleição de Ronald Reagan, na era moderna. Usámos o reconhecimento de padrões para perceber que padrões estavam associados com a estabilidade e com o terramoto. Esse estudo levou-nos às 13 chaves para a Casa Branca e à nossa regra de decisão: se o partido da Casa Branca perde seis ou mais chaves, prevemos que sofra um terramoto político. Este foi o resultado dessa estranha colaboração entre o historiador americano e o geofísico soviético.

E as perguntas são, essencialmente, referentes ao estado da economia e à existência de tumultos na sociedade. Tentam perceber como é que, num dado momento, a sociedade se relaciona com o seu governo?
Precisamente. Olhámos para um espectro alargado de indicadores, como os resultados das eleições intercalares — uma espécie de referendo intermédio à Presidência —, à existência de agitação dentro do partido da Casa Branca que leve a uma grande competição para a nomeação do candidato, se há um terceiro candidato, a economia a curto e a longo prazo, a agitação social, as mudanças de políticas, os escândalos e os sucessos e falhanços na política externa. Só duas chaves têm alguma coisa a ver com o candidato e perguntam se o incumbente e o candidato da oposição são um daqueles candidatos que ocorrem uma vez numa geração, muito inspiradores, que levam muitos novos eleitores a votar, como Franklin Roosevelt nos Democratas ou Ronald Reagan nos Republicanos.

Esteve sempre certo, incluindo em 2016, quando previu a vitória de Donald Trump. Foi um dos poucos que previram a vitória de Trump. Chamaram-lhe louco, na altura, por assumir que Trump ia ganhar?
Absolutamente! E decerto imagina que prever, em 2016, que Trump ia ganhar não me tornou muito popular em 90% de Washington, DC, onde dou aulas na American University. Os meus amigos e colegas diziam-me todos: “Ó meu Deus, Lichtman, tens de estar errado, as sondagens mostram que Hillary Clinton vai vencer”. E eu mantive a minha posição sob todas essas críticas. Mas recebi esta nota, numa cópia da notícia do The Washington Post sobre a minha previsão da vitória de Trump, e diz “Professor, parabéns, bom palpite” e, em grandes letras, “Donald J. Trump” [neste momento da entrevista, Lichtman mostra a fotocópia da notícia assinada pelo Presidente dos EUA que Trump lhe enviou]. A beleza das chaves é que elas são totalmente apartidárias. São previsões, não apoios. Até este ano, previ a vitória de quatro republicanos e cinco democratas. É o mais matematicamente equilibrado que podemos pedir.

TO GO WITH AFP STORY BY MICHAEL MATHESA

Allan Lichtman diz-se certo de uma vitória de Joe Biden nas eleições de 2020

AFP via Getty Images

Vamos, então, ver o que dizem as suas chaves para 2020.
Certo. E lembre-se: seis falsos e estamos a prever uma derrota de Donald Trump.

Primeira pergunta. Depois das eleições intercalares, o partido incumbente tem mais lugares na Câmara dos Representantes do que tinha depois das eleições intercalares anteriores.
Claramente falso. Os republicanos tiveram uma grande derrota em 2018. Uma falsa.

Segunda. Não há uma concorrência séria para a nomeação do partido incumbente.
Verdadeiro. Trump não teve oposição.

Número três. O candidato do partido incumbente é o Presidente atual. Também óbvia…
Claro, verdadeiro.

Número quatro. Não há uma campanha de um terceiro partido ou independente significativa.
Verdadeiro. Não há um terceiro partido que corresponda ao meu critério, que é o de ter pelo menos 10% nas sondagens.

Número cinco. A economia não está em recessão durante a campanha eleitoral.
Falso. O departamento nacional de investigação económica diz que a economia entrou em recessão este ano. São duas falsas.

Número seis. O crescimento económico real per capita durante o mandato é igual ou superior ao crescimento dos dois mandatos anteriores.
Esta estava a correr bem até termos o crescimento muito negativo este ano. Nem mesmo a grande recuperação no terceiro trimestre impediu o crescimento de ser negativo. Por isso, esta também é falsa. Três.

"Donald Trump é um homem do espetáculo, mas só chega a uma base curta. Mais de 60% dos americanos não gostam dele e acham que ele não é honesto"

Número sete. A administração incumbente fez grandes alterações nas políticas nacionais.
Essa é claramente verdadeira. Trump mudou políticas de Obama relativamente aos impostos, à imigração, no ambiente e nas alterações climáticas.

Número oito. Não há agitação social durante o mandato.
Essa também estava a correr bem até 2020. Agora temos agitação social por todo o país. São quatro falsas.

Número nove. A administração incumbente não está afetada por nenhum grande escândalo.
Claramente, é falsa. Trump foi o terceiro Presidente da história dos EUA a ser condenado pela Câmara dos Representantes num processo de impeachment, para não falar de muitos outros escândalos. Cinco falsas.

A administração incumbente não sofreu nenhum grande falhanço em assuntos de política externa ou militar.
Por muito pouco, considero verdadeira. Há, certamente, alguns falhanços, mas não são falhanços enormes, reconhecidos a nível nacional. Essa é verdadeira.

A administração incumbente teve grandes sucessos em assuntos de política externa ou militar.
Acho que o Jared Kushner leu as chaves e tentou cumprir esta com o tratado entre Israel, o Sudão e os estados do Golfo. Eu quase nunca mudei uma chave por um tratado. A única vez que o fiz foi com o grande tratado de controlo de armas entre a União Soviética e os EUA, durante o segundo mandato de Ronald Reagan. Este tratado quase não causou uma onda nos EUA. Por isso, conto como falsa. É a sexta falsa.

E agora o carisma. O candidato do partido incumbente é carismático ou um herói nacional.
As pessoas têm diferentes opiniões sobre Donald Trump, mas não importa. Para virar esta chave, é preciso enquadrar-se na definição do sistema. Tem de ser um candidato amplamente carismático. Donald Trump é um homem do espetáculo, mas só chega a uma base curta. Mais de 60% dos americanos não gostam dele e acham que ele não é honesto. Tivemos candidatos como ele antes. Barry Goldwater em 1964 só chegava a uma estreita base de apoio conservadora. George McGovern, em 1972, fez o mesmo para uma curta base liberal. Não dei a nenhum deles a chave do carisma e não a dou a Donald Trump. Essa é falsa. Sete.

"Nunca antes na história o partido da Casa Branca tinha sofrido uma reversão tão repentina e dramática da sorte, como Donald Trump sofreu em apenas alguns meses de 2020"

A última. O candidato da oposição não é carismático ou um herói nacional.
Verdade. Joe Biden é um tipo decente e empático, mas não é um Franklin Roosevelt ou um Barack Obama. Não é carismático. Essa é verdadeira.

Então o que é que isto nos diz sobre a eleição?
Diz-nos que Donald Trump tem sete chaves falsas, uma a mais do que era preciso para prever a sua derrota, e que Joe Biden vai ser o próximo Presidente dos EUA. O mais interessante é que no fim de 2019 Donald Trump tinha apenas quatro chaves falsas. Mas, depois, veio a pandemia e os apelos à justiça social e racial, e Donald Trump falhou na resposta a estes desafios, o que lhe custou mais três chaves: as chaves da economia a longo e a curto prazo e a chave da agitação social. Nunca antes na história o partido da Casa Branca tinha sofrido uma reversão tão repentina e dramática da sorte, como Donald Trump sofreu em apenas alguns meses de 2020.

Podemos dizer que a pandemia custará a Donald Trump a reeleição?
Não só a pandemia, mas a sua incapacidade de responder à pandemia. Em vez disso, ele voltou ao seu guião de oponente, que usou em 2016, e tentou usar o discurso para se escapar destas crises. Mas não se pode fazer isso quando se está no poder. Como Herbert Hoover, o Presidente da altura da Grande Depressão, disse: “O Presidente recebe o crédito pelo brilhar do sol e a culpa pela chuva”. E está a chover muito na América.

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