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FILIPE AMORIM

FILIPE AMORIM

Espalhafato e 'Neymarmania' contra eficiência e sossego alemão: o yin e yang da final da Champions que se viveu fora do estádio

Pela primeira vez na história da Liga dos Campeões a final do torneio foi disputada sem presença de público. Isso não significa, mesmo assim, que não se tenha vibrado fora do estádio da Luz.

“É só mesmo uma grande paixão, no fim de contas”

Passavam poucos minutos das 16h quando Sandra de Preux, brasileira residente na Suíça de 55 anos, justifica o facto de estar há duas horas à espera para ver o autocarro do Bayern sair da unidade hoteleira de luxo onde esteve alojado. Faltavam ainda umas horas para a final da Liga dos Campeões no Estádio da Luz, contra os franceses do Paris Saint-Germain, mas esta “super-adepta” já vivia o espírito do grande jogo pelo menos há um dia.

“Já fotografei o autocarro do PSG ontem, lá no hotel deles”, conta. “Cheguei aqui eram quase quatro horas da tarde mas ficaria até às oito. Estou tranquila, não tenho pressa…”, acrescenta. Sandra acompanha o mundo do futebol de topo desde 1998, ano em que se mudou do Brasil para a Suíça e foi assistir ao Mundial que nesse ano foi celebrado em França. Desde então já assistiu a quatro finais da Liga dos Campeões (2016, 2017, 2018 e 2019), uma mão cheia de eliminatória desta competição, Jogos Olímpicos e até Mundiais.

“Sempre fui apaixonada por futebol. Torço por uma equipa em cada país. Em Itália sou do Milan, em Portugal do Benfica e na Alemanha sou do Bayern”, afirma. Todas estas equipas têm a cor vermelha em comum e Sandra diz que talvez seja isso que a puxa mais para um clube e não outro. É precisamente por isso que torcia pela equipa de Munique mesmo admitindo alguma “divisão no coração” – afinal, do outro lado do campo iriam brilhar três compatriotas, Marquinhos, Thiago Silva e Neymar. “Acho que vai ficar 3-1 para o Bayern. O Lewandowski faz hat-trick e o Neymar marca também”, remata. O astro polaco não marcou (e não ultrapassou o recorde de golos de Cristiano Ronaldo), Neymar não fez o gosto ao pé mas a verdade é que a “orelhuda” foi parar às mãos dos bávaros.

Sandra de Preaux foi a fã mais dedicada do Bayern de Munique em Lisboa. D.R.

Todas as equipas deviam ter adeptos assim: dedicados, confiantes e apaixonados. Todas as equipas certamente os terão, contudo, enquanto o exemplo de Sandra era praticamente único à porta do Penha Longa Resort, o hotel onde estava alojada a comitiva do Bayern (e não só): as várias pessoas que se viam nesta zona eram jornalistas. Adeptos? Só Sandra e um casal com dois filhos pequenos que chegou já quase o autocarro tinha ido embora. Ao menos o pai e o filho levavam uma camisola dos bávaros. A uns bons quilómetros daqui, junto ao quartel-general do PSG, o cenário não podia ser diferente.

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Mais um dia de “Neymarmania” na zona da Expo

Aquilo que de um lado estava em falta, do outro havia em demasia. O cenário à porta do hotel Myriad by Sana não podia ser mais diferente daquele que se podia ver em Sintra. O barulho da natureza e dos carros a passar dava lugar a um sem fim de gritos, assobios e outros sons que rompiam o silêncio assim que se via um jogador do PSG a atravessar uma zona de vidro visível da parte de fora do hotel.  Nem se notava que os franceses tinha sido votados numa sondagem do desportivo L’Equipe como a equipa mais odiada de França. Mas quem lá estava, estava a torcer pelo clube? De certa forma sim. Contudo, bastava olhar para os nomes nas centenas de camisolas que por lá andavam para perceber que o grande chamariz era o brasileiro Neymar – bastava sentir-se o cheiro do astro brasileiro para os decibéis subirem a pique. Até mesmo sendo finalista vencido o jogador formado no Santos era quem mais surgia por todo o lado, das televisões às redes sociais.

A "discreta" saída do Bayern da luxuosa unidade hoteleira onde estavam hospedados. Diogo Lopes/Observador

Diogo Lopes/Observador

Enquanto à porta do hotel do Bayern o ambiente estava são solene que mais parecia o acesso a uma cimeira do G20, o cenário em Lisboa, na zona da antiga Expo, reinava um clima de festival de verão. Muitos jovens brasileiros, franceses e portugueses (a maioria destes assistia a tudo mais ao longe) cantavam, gritavam por Neymar, por Mbappé. De um modo geral, as plateias eram o reflexo cristalino das equipas: o Bayern mais sério e cerebral vs. um PSG espalhafatoso e emotivo. O exemplo de Neymar e da sua coluna eram a prova disso mesmo já que na sua estadia em Lisboa o craque fez-se sempre acompanhar de um sistema de som enorme e bem audível – à saída para a final lá estava ela de novo, a gritar uma mistura de funk brasileiro com reggaeton – e um dos grupos mais animados à porta do Myriad era precisamente um conjunto de jovens franceses que volta não volta faziam soar as suas próprias colunas e irrompiam num show off dançarino.

Uma das coisas mais curiosas desta final foi precisamente perceber o quão diferentes eram os seus intervenientes e a forma tão clara como isso se percebia em quase tudo, do momento das saídas dos hotéis ao tipo de adeptos, passando por estilo de jogo e, claro, a própria escolha do alojamento.

À saída para o Estádio da Luz, Neymar (como sempre), foi o motivo de loucura de centenas de fãs. Filipe Amorim/Observador

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Paz e sossego, o segredo dos alemães

Olhando para trás no tempo é fácil de ver algumas semelhanças entre o percurso da seleção nacional da Alemanha que venceu o mundial de 2014 no Brasil e este Bayern que sai de Lisboa com mais um troféu da Champions debaixo do braço. Manuel Neuer e Thomas Müller estiveram nos dois cenários, por exemplo. Em ambos os casos as equipas dinamitaram por completo a sua concorrência jogo após jogo e até houve nos dois planos uma goleada histórica –  o 7-1 contra a “canarinha” e o 8-2 contra o Barcelona. Uma dessas parecenças tem também a ver com o alojamento das comitivas.

Contrariando as direções da FIFA e o senso comum de qualquer pessoa minimamente precavida, a seleção alemã em 2014 escolheu como base uma localidade na zona da Bahia que só se conseguia aceder atravessando um rio. De barco. A escolha da localidade de Santo André, em Santa Cruz Cabrália (extremo sul baiano) teve as suas polémicas – alegadamente foi construída de propósito para cumprir os requisitos da federação alemã ainda antes desta saber que iria ter os seus jogos nessa zona do Brasil – mas a verdade é que o centro de treinos que lá estrearam foi um oásis de tranquilidade, de tal forma que muitos treinadores e comentadores questionavam se a proximidade da praia não era até um sinal de desleixe. Não era, claramente, e permitiu que os alemães vivessem o seu mundial em sossego máximo e segurança, sem assédio de fãs ou jornalistas. Ao Parque Natural Sintra-Cascais, onde o Bayern passou os últimos dias, só faltava ter praia a cinco minutos a pé para ser exatamente igual ao cenário de Santo André.

Foi esta a luxuosa e discreta "casa" do Bayern Munique em Lisboa. D.R.

O Penha Longa Resort, que é propriedade do grupo internacional de luxo Ritz Carlton, preenche todos os requisitos – até supera muitos deles – que os alemães parecem procurar desde que perceberam, nesse mundial em que sairam vitoriosos, que no recato e sossego é que está o ganho. Rodeado de natureza e acessível por uma estrade estreita de dois sentidos, esta unidade hoteleira tem um total de 194 quartos e suites, jardins, lagos, piscinas e até um campo de golfe. O melhor de tudo é que se encontra numa zona vedada do público geral, só acessível através de um ponto de segurança que o Observador pôde ver que estava devidamente reforçado com a ajuda da GNR.

Na mesma linha estilística do hotel esteve também o campo de treinos utilizado pelos alemães, o Parque Desportivo Municipal mafrense: foi o que estava mais longe de todos os que foram utilizados e pouco ou nada se soube daquilo que nele aconteceu. Tudo isto a antítese, novamente, dos franceses.

Sobre os treinos do PSG até nem se soube muito, apenas que decorreram na Academia do Sporting, em Alcochete. Agora pormenores sobre a estadia no hotel lisboeta que mora na Torre Vasco da Gama, mesmo tendo em conta todo o sigilo e contratos de confidencialidade, foram-se conhecendo. Discrição não é o ponto forte dos finalistas vencidos que ficaram com todo o Myriad by Sana só para si. O hotel tem a porta de acesso visível a quem quer que passe por aquela zona do Parque das Nações, as estruturas de vidro permitem ver algumas deslocações dos atletas e tudo isso só cativou ainda mais os curiosos que queriam acompanhar tudo o que se passava, daí ter havido um reforço de segurança (maior ainda do que aquele que a cadeia hoteleira já tinha feito noutra unidade sua em Lisboa onde ficou alojado o Atl. Madrid).

O hotel onde ficaram as estrelas do Paris Saint-Germain é na antiga Torre Vasco da Gama, símbolo da Expo 98. D.R.

A mentalidade de celebrar a Champions pensando já na próxima

O objetivo deste texto era para mostrar um pouco daquilo que foi a final da Liga dos Campeões 19/20 mas tudo o que o Observador foi conseguindo ouvir e observar fez com que passasse a ser sobre isso, na mesma, mas também sobre as diferenças que tanto separam os dois lados deste jogo. Não é muito comum ver dois rivais com a sua identidade cristalizada de forma tão abrangente e uniforme. Até a forma como assistiram à partida mostra isso.

Quando o Observador chegou à cervejaria lisboeta “O Reserva” faltava uma hora para o começo da partida e o espaço já estava composto. Cumprindo todas as normas de segurança, o espaço ia recebendo os adeptos de futebol que, não podendo estar no estádio, vibrariam fora dele. Inicialmente eram mais portugueses, os franceses foram chegando depois. No total, quando o apito inicial soou nos televisores, avistavam-se apenas duas camisas de futebol, uma do Bayern e outra do PSG. Mesmo assim, os adeptos franceses eram facilmente reconhecíveis sem terem de usar insígnia nenhuma.

O natural entusiasmo de ver a sua equipa participar numa final da Champions pela primeira vez (ainda para mais no ano do 50.º aniversário), a esperança de ver o futebol gaulês de equipas ganhar um novo fôlego internacional e o efusivo modo de ser fazia com que se visse a léguas quem puxava pelos franceses: barafustavam com tudo, vociferavam tanto nos ataques da sua equipa como no dos adversários, gritavam contra o árbitro. Uma das mesas com mais franceses tinha um português, Diogo Gonçalves, que explicou ao Observador que os seus amigos estavam entusiasmados com o simples facto de ver a sua equipa neste patamar do futebol mundial – talvez o mais relevante a seguir à final do Campeonato do Mundo – independentemente de ganharem ou não. Desportivismo é sempre de louvar mas o esbracejar dos franceses não enganava ninguém. A fome pela vitória era gigante.

Bayern Munique, os cerebrais vencedores desta peculiar edição da Liga dos Campeões.

Getty Images

Noutro lado da cidade, perto do Cais do Sodré, o Time Out Mercado da Ribeira foi outro ponto onde se viu a vitória do Bayern por 1-0 (golo de Kingsley Coman, um francês que ironicamente fez a sua formação no PSG).  Quem tivesse conseguido sobreviver às longas filas de acesso ao interior do espaço descobriria o recinto dividido em dois, um ecrã gigante em cada ponta, e um contingente alemão mais composto – mesmo assim menor que o francês. O cenário d’O Reserva repetia-se: franceses irrequietos contrastavam com os alemães que praticamente só se fizeram notar por três vezes: quando marcaram o golo, quando aos 80 minutos entoaram um cântico e quando soou o apito final e celebraram a conquista durante uns breves minutos. Tudo sempre com moderação e tranquilidade. Como em tudo o resto.

Numa das eliminatórias desta fase final da Champions em Lisboa surgiram imagens do PSG a celebrar a passagem à final como se fosse um grande baile – com a coluna de Neymar, claro. Viu-se também Joshua Kimmich, o defesa direito dos bávaros, no pós-goleada ao Barcelona a sentar-se no banco a beber uma água de forma compenetrada. Estes dois exemplos fecham esta espécie de análise do yin e yang que são estas equipas. Os bávaros acabaram por ganhar mais uma vez, houve a festa mas no final não se viu nenhuma coluna de som. Porquê? É preciso começar já a pensar na próxima conquista.

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