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Fatboy Slim: “Sou o tio que observa os millennials enquanto se divertem”

O DJ que pôs meio mundo a dançar nos anos 90 é amigo de Vhils e criou uma exposição para a galeria do artista português. O Observador perguntou-lhe se já pensa na reforma.

Não é uma estranha novidade, mas quem poderia adivinhar? O DJ Fatboy Slim e o artista visual Vhils tornaram-se amigos e agora o português abriu as portas da galeria lisboeta para que o britânico fizesse a curadoria de uma exposição temporária. O resultado é “Smile High Club”, coletiva que abriu esta semana na Underdogs Gallery, na zona de Marvila, onde são exibidos quer objetos da coleção de “smileys” que pertence a Fatboy Slim quer obras de 12 artistas convidados a trabalhar sobre esse mesmo símbolo. Os britânicos Carrie Reichardt, The London Police e RYCA, o americano Ron English e o português Estúdio Pedrita são alguns desses nomes – e todas as obras estão à venda, até 21 de julho.

Ao Observador, enquanto decorria a montagem das peças, o músico e produtor revelou que coleciona obras gráficas de artistas como Keith Haring, mas descreveu-se como leigo em matéria de artes visuais, ainda que não exclua a hipótese de fazer novos trabalhos de curadoria.

Norman Cook, de seu nome, nasceu nos subúrbios de Londres e vive no sul de Inglaterra, em Bristol, a 120 quilómetros da capital. Foi baixista dos Housemartins (na época do grande êxito “The Caravan of Love”, de 1986) e tornou-se DJ no fim da década de 80, quando a música de dança tomou conta do Reino Unido, no auge do acid house. Ganhou enorme popularidade na segunda metade dos anos 90 ao publicar dois álbuns que hoje serão clássicos: You’ve Come a Long Way, Baby, de 1998 (onde constavam temas como “The Rockafeller Skank” ou “Right Here, Right Now”), e Halfway Between the Gutter and the Stars, em 2000 (de que “Sunset – Bird of Prey” foi o single principal).

Conheceu Vhils (Alexandre Farto) no ano passado, quando atuou de surpresa na quarta edição do Festival Iminente, no parque florestal de Monsanto, e juntos criaram uma peça multimédia que depois foi apresentada na versão londrina do mesmo evento. Eis agora Fatboy Slim, aos 55 anos, com 70 concertos por ano e a estrear-se como curador de exposições de arte contemporânea. Se a vida dele já está no crepúsculo, o facto é que a noite pode esperar.

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Uma parte da coleção de smileys que Fatboy Slim iniciou nos anos 90

Que exposição é esta e porquê sobre o “smiley”?
Foi o Vhils que me pediu para fazer a curadoria de uma exposição, a minha primeira exposição de sempre.Nunca tinha tido responsabilidades num evento deste género. Sou, acima de tudo, músico e DJ, sempre gostei de arte contemporânea, mas nunca estive envolvido neste mundo. Eu próprio não faço arte, sou apenas apreciador e colecionador. Mas depois de me tornar amigo do Vhils, e de termos colaborado no Festival Iminente, ele convidou-me para estas funções. Senti que precisava de um tema, que teria de haver um denominador, e o “smiley” pareceu-me óbvio, porque é uma paixão, quase uma religião, na minha vida. Tenho uma enorme coleção de objetos relacionados com “smileys”.

Todo o tipo de objetos?
Talvez, sim.

Não tem a certeza?
Hesito porque não estou habituado a esta linguagem. Será que estamos a falar de objetos propriamente ditos ou da escultura, pintura, etc? Na verdade, não estou habituado a falar de arte e tenho algumas dúvidas, não sou fluente nesta linguagem. A minha obsessão com “smileys” vai desde o telhado da minha casa, que tem um “smiley” gigante, até objetos minúsculos. Aqui, no braço direito, também tenho um “smiley” tatuado. É o logótipo não-oficial da minha carreira. Há muitas pessoas que me vêm oferecer objetos e obras de arte com “smileys”.

Quando é que recebeu o convite?
Foi já no início deste ano. Basicamente, o Vhils tinha aqui um mês livre na galeria e achou que eu poderia tomar conta do espaço. Ele já tinha estado em minha casa e mostrei-lhe a coleção, mas provavelmente, quando me convidou, não pensou nisso. Quando lhe disse qual era a ideia, concordou logo.

"A primeira vez que prestei atenção ao “smiley” foi quando o vi na capa de um “single” dos Talking Heads [1977]. Fui adolescente no fim da década de 60, inícios de 70, e nessa época o “smiley” era símbolo de paz e amor, mas de repente estava associado a “Psycho Killer”, uma canção de punk rock."

Explique-nos melhor a origem dessa admiração pelos “smileys”? Porquê a paixão?
A primeira vez que prestei atenção ao “smiley” foi quando o vi na capa de um “single” dos Talking Heads [1977]. Fui adolescente no fim da década de 60, inícios de 70, e nessa época o “smiley” era símbolo de paz e amor, mas de repente estava associado a “Psycho Killer”, uma canção de punk rock. Foi a primeira vez que o vi utilizado com ironia e isso deixou-me espantado. Os Talking Heads tinham retirado o “smiley” da cultura pop para o contextualizarem noutra área. Fiquei impressionado. Nos anos seguintes, 10, 20 anos, começou a ser utilizado de formas muito díspares, e a seguir veio o boom do acid house em Inglaterra, no fim da década de 80, e o “smiley” tornou-se ícone da música de dança. Acontece que, precisamente por causa disso, o “smiley” começou a ser mal visto por quase toda a gente, menos por mim, provavelmente.

Porque é que isso aconteceu?
Por causa da ligação ao acid house.

Às drogas?
Houve excessos, há muitos lugares-comuns sobre este assunto, mas a verdade é que toda a gente se quis afastar do “smiley”. O ícone original foi criado por Harvey Ball [em 1963, nos EUA] e, em grande medida, esta exposição em Lisboa é uma homenagem que lhe prestamos.

Conheceu-o pessoalmente?
Não, mas correspondemo-nos. Ele nunca registou o “smiley”, não tinha direitos de autor, quis oferecê-lo às pessoas. Uma vez, escreveu-me a dizer que eu poderia tornar-me embaixador internacional não-oficial do “smiley”, já que gostava tanto de o usar como símbolo. Foi assim que passei a integrar esta irmandade mundial do sorriso. É o que estou também a fazer agora, com a concordância dos herdeiros dele. O filho de Harvey Ball tem dado continuidade a este legado.

Fatboy Slim no festival Super Bock Super Rock do ano passado

Quando é que começou a sua coleção?
Foi quando vi uma caixa cheia de crachás com “smileys”, logo a seguir à onda acid house, quando já ninguém queria saber deste símbolo. Mas quer ele esteja na moda quer não, será sempre, para mim, um símbolo positivo. Não necessariamente “cool”, mas sempre positivo, um sorriso positivo. É um símbolo internacional, porque mesmo que não seja possível falarmos todas as línguas sabemos que um sorriso é uma forma de comunicação entre todas as pessoas.

Coleciona outras obras de arte contemporânea?
Tenho algumas peças de pop art e street art, mas apenas trabalhos em papel: Keith Haring e Kenny Scharf, por exemplo.

Não é daqueles que compram paredes inteiras com street art para depois as porem em casa.
Só se tivesse dinheiro para isso.

Porque é que escolheu estes 12 artistas? Encomendou-lhes trabalhos para esta ocasião?
No caso do Estúdio Pedrita, por exemplo, foi uma encomenda, sim. Sou fã do trabalho deles. Vi aqui uma oportunidade de juntar artistas que admiro, alguns são amigos já com créditos firmados como criadores, outros são amigos que ainda estão a ganhar nome. E há outros, claro, que eu não conhecia. Enviei e-mails, expliquei quem sou e eles aceitaram, alguns conheciam bem o meu trabalho.

Espera voltar a ser curador?
Desde que começámos a divulgar esta exposição em Lisboa passei a ser contactado por outras pessoas, sobretudo galeristas que me conhecem em Inglaterra. Daqui a um mês já saberei como é que esta exposição correu e se vou fazer mais. Se os artistas ficarem satisfeitos, e a galeria e o público, e eu também, não haverá motivos para não repetir a experiência. Isto para já é apenas uma ideia louca de dois amigos, uma tentativa, é como atirar barro à parede a ver se cola.

"Sou um homem de 55 anos, não vou fazer de conta que me divirto com os miúdos. Tenho a sorte de fazer e tocar música com que eles se identificam, portanto, é pela música que estou perto da nova geração. Sou DJ dos miúdos de 18 anos, não dos homens de 55."

Estará a nascer uma nova faceta na sua vida: DJ e curador de arte contemporânea?
Nunca me imaginei curador. Fiz umas colaborações com artistas, em tempos, mas com esta exposição sinto que estou a participar a sério no mundo da arte. Talvez possa haver uma continuidade. Se calhar, da próxima vez, ligo a alguém a perguntar se quer fazer parte de uma exposição organizada por mim e a resposta vai ‘claro, estava mesmo à espera do convite’. Nunca se sabe. O meu papel, como DJ, é o de abrir portas.

Não se vê como criador de arte contemporânea? Um DJ não é um artista?
É outro tipo de arte. Estou a falar de artes visuais, nessas é que nunca tive um papel. Quer dizer, há uma ligação entre todas as artes e sempre me envolvi no processo de criação das capas dos meus discos, em termos de design gráfico. Não há muitas pessoas como o Vhils, que, sendo artista visual criou também o Festival Iminente e faz o cruzamento entre música e arte.

Um DJ não cria arte?
A música é uma arte. Existem artes performativas, artes plásticas, a música é uma arte. E há até quem junte as duas coisas, o Goldie, por exemplo, ou o 3D [Robert Del Naja], dos Massive Attack. Para mim, a ligação entre música e as artes visuais teve um eixo fundamental no que dizia respeito às capas dos álbuns, com bandas que as encomendavam aos seus artistas preferidos. Com o advento do download e do streaming, as capas desapareceram e essa ligação perdeu-se.

A propósito: há quem diga que 3D e Banksy são a mesma pessoa. Conhece-os aos dois?
Conheço e posso garantir que são duas pessoas diferentes. Será que posso dizer isto em público?

Um colecionador de Banksy que está agora a apresentar uma exposição em Lisboa diz que não pode confirmar se 3D é Banksy.
Ah, então, a minha resposta final é a mesma: não sei se são a mesma pessoa.

A exposição Smile High Club pode ser vista até 27 de julho

Aos 55 anos, em que fase da carreira se encontra?
Boa pergunta. Provavelmente, estou no crepúsculo da minha carreira, é uma fase muito bela. O crepúsculo [“twilight”] é aquela hora antes do pôr-do-sol. Em inglês também se diz hora mágica, porque é quando a luz do sol torna todas as pessoas bonitas. Estou na minha hora mágica, aquele período de reflexão em que tomamos uma primeira bebida, mas ainda temos a noite à nossa frente.

Já está a pensar deixar de trabalhar?
Não, o entardecer não é ainda o fim do dia. Claro, já não estou na manhã da vida, nem no início da tarde. Já cheguei às seis da tarde, o sol está a descer, tudo parece belo, toda a gente à volta está pensativa, mas a noite é uma criança.

Sente-se próximo das novas gerações?
Sinto, no sentido em que, através de atuações em festivais e discotecas, crio a banda sonora da adolescência que eles estão a viver, a banda sonora das noitadas e da euforia. Sou o tio que observa os “millennials” enquanto se divertem. Por outro lado, sinto uma ligação direta com os mais novos através do meu filho, que é o perfeito “millennial”, porque nasceu há 18 anos. Ele é a minha ligação direta a essa realidade. Mas, quer dizer, sou um homem de 55 anos, não vou fazer de conta que me divirto com os miúdos. Tenho a sorte de fazer e tocar música com que eles se identificam, portanto, é pela música que estou perto da nova geração. Sou DJ dos miúdos de 18 anos, não dos homens de 55.

Quantas atuações faz por mês?
Depende das épocas, mas por ano são cerca de 70. Não mudou muito em comparação com os anos 90, por exemplo. O que mudou foi que antigamente passava seis meses em estúdio a preparar um disco e depois andava por aí em digressão e tocava quase todas as noites. Agora, distribuo o trabalho pelo ano. À medida que envelheci, comecei a moderar o ritmo.

"Não reconheço o streaming como uma forma de arte. O streaming é o fim de tudo aquilo em que acredito na indústria musical. Quando era jovem, comprávamos discos, gostávamos de os levar para casa para cheirar, ler todas as letras pequenas da capa, era uma excitação. A música tornou-se descartável por causa da maneira como passou a estar disponível."

Como é que ouve música? Tem o Spotify ou a SoundCloud no telemóvel?
Procuro novos sons no BitPort ou no Juno. O BitPort é um dos sites mais utilizados por DJs, permite encontrar músicas no formato WAV, porque não usamos MP3 e evidentemente não usamos streaming. Não reconheço o streaming como uma forma de arte. O streaming é o fim de tudo aquilo em que acredito na indústria musical. Quando era jovem, comprávamos discos, gostávamos de os levar para casa para cheirar, ler todas as letras pequenas da capa, era uma excitação. A música tornou-se descartável por causa da maneira como passou a estar disponível. Um dos efeitos do streaming foi o fim do conceito de álbum. Os miúdos hoje já não têm paciência nem disponibilidade para estarem a ouvir um disco inteiro, ouvem faixas isoladas. Sim, venho de outro tempo, admito estar desatualizado, mas vejo que a música se tornou um objeto de consumo rápido e gosto da ideia de que quando compramos o disco de uma banda passamos a integrar um culto, como se fosse uma religião.

O que é que anda a ouvir?
Estou sempre à procura de sons novos, coisas muito específicas. Diria que Eats Everything e Chocolate Puma são dois dos meus preferidos, porque fazem um som eletrónico que me interessa. Em termos mais gerais, quando não estou a trabalhar, gosto de coisas diferentes, que não soem a eletrónico, sons antigos, sujos e negros. Por exemplo, blues, gospel, soul. Ou então King Tubby. Oiço aquilo que não sei fazer.

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