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Harry e Meghan vão casar. Quanto ganham (e perdem) os britânicos com isso?

O orçamento é secreto, as projeções são incertas e o passado não é exemplo. Para alguns britânicos, o casamento é oportunidade para fazer lucro. Outros preferiam "ser poupados a isto".

Este sábado, 19 de maio, cerca de 100 mil pessoas deslocar-se-ão à pequena cidade, a cerca de 40 quilómetros da capital britânica, para assistir ao enlace público entre o príncipe Harry e a atriz Meghan Markle na capela de St. George, no castelo de Windsor. Jack Rans, filho da terra, não será um deles: “Pessoalmente sou algo apático relativamente à Família Real e não tenho qualquer interesse no casamento real”, confessa ao Observador o jovem de 24 anos, que trabalha como software developer em Londres.

Essa posição, contudo, não o impediu de aproveitar o casamento real para tentar fazer algum dinheiro extra: Jack convenceu a mãe, que ainda vive em Windsor, a alugar o seu quarto no Airbnb a partir do dia 16 de maio. “Fizemos algumas obras de fundo em casa nos últimos anos e só agora conseguimos receber alguém de forma confortável. O casamento real pareceu-nos uma ótima oportunidade para começar, tendo em conta a elevada procura”, resume.

Jack admite que se atrasou com a colocação do anúncio e, depois de investigar a oferta dada pelos seus vizinhos, optou por apresentar um preço “um pouco acima do que faria normalmente”: 188€ no dia da cerimónia pela estadia num quarto com áreas comuns partilhadas. “Sinto que é um valor abaixo da média, mas mesmo assim dá para fazer dinheiro que chegue para valer a pena o aluguer”, diz Jack — sobretudo quando comparado com os anúncios de casas que ultrapassam os três mil euros por noite na pequena cidade inglesa. Apesar disso, o jovem inglês ainda não tem nenhum interessado.

Meghan Markle e o príncipe Harry vão casar a 19 de maio (KELVIN BOYES/AFP/Getty Images)

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Jack é um dos vários habitantes de Windsor e arredores que aproveitaram a loucura com o casamento de Harry e Meghan para fazer algum lucro — e estão longe de serem poucos. Anthony Pickles, responsável pelo Turismo do organismo público britânico Visit Britain, avançou ao Observador que a Airbnb registou um aumento em 1400% nas reservas em Slough (cidade a cerca de 5 km de Windsor). “É uma plataforma relativamente nova, por isso é claro que estamos a ver um crescimento muito forte. Mas os hotéis e outros tipos de alojamento também terão um aumento”, garante. O Visit Britain estima um aumento no número de visitantes no Reino Unido este ano em cerca de 7%, ultrapassando os 40 milhões de visitantes, mas não consegue, para já, determinar o peso do casamento real nesse crescimento.

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Certo é que o turismo será uma das áreas onde o casamento real trará mais ganhos económicos aos britânicos. A consultora financeira Brand Finance é das poucas a arriscar números: de acordo com o seu estudo, o casamento real pode trazer mais de mil milhões de euros à economia britânica, 300 milhões dos quais na área do turismo.

“Tenho muita relutância em dar números concretos. Quando as pessoas arranjam números caídos do céu… Não sei como é que os justificam”, afirma Howard Archer, conselheiro económico do EY Item Club, ao Observador. Já Yael Selfin, economista-chefe da consultora KPMG no Reino Unido, também não arrisca valores, mas não crê que se confirmem as projeções megalómanas: “O casamento real vai ser uma ocasião feliz e uma oportunidade para os britânicos celebrarem. Embora possa levar a um aumento do consumo, o mais provável é que o impacto geral na economia do Reino Unido seja pequeno”, resume.

Do “chá Real” aos preservativos “à medida de um príncipe”, ideias para produtos não faltam

Ambos os especialistas ouvidos pelo Observador, contudo, são unânimes em afirmar que o turismo será sem dúvida a área onde o impacto do casamento será maior: “O facto de Meghan Markle ser americana combinado com uma libra enfraquecida e uma economia americana forte pode levar a um aumento de turistas dos EUA neste verão”, declara Selfin.

O Visit Britain prevê que cerca de 88 mil turistas norte-americanos visitem o Reino Unido durante o mês de maio, tendo-se já registado um aumento de 3% nas reservas face ao ano passado. Pickles não tem dúvidas de que tal se deve mais ao “efeito Markle” do que à queda da libra: “As flutuações diárias da moeda só são um fator para aqueles turistas que conhecem a posição de uma moeda antes de fazerem as reservas”, diz. “Markle é uma atriz famosa e o facto de haver uma ligação entre ela e o Reino Unido é uma coisa valiosa para nós. Qualquer aumento no número de visitantes americanos é significativo.”

“Tenho muita relutância em dar números concretos. Quando as pessoas arranjam números caídos do céu… Não sei como é que os justificam.”
Howard Archer, conselheiro económico do EY Item Club, comentando as projeções de ganhos económicos

Apesar de ainda não ser certo se o “efeito Markle” pode ter repercussões nas reservas hoteleiras, certo é que toda a indústria hoteleira está dentro do espírito “real”. Desde o “pacote real” de um hotel de luxo que custa quase quatro mil euros para duas pessoas até às tours relacionadas com o casal, o mercado turístico tem aproveitado este filão.

“Sabemos que muitos hotéis estão a oferecer programas específicos como ‘chá Real das 5h’ ou ‘cocktails reais’, esse tipo de coisa”, avança Pickles. “Há um aumento do chamado ‘turismo Real’. Achamos que mais gente vai querer ver coisas como a mudança da guarda, por exemplo.”

Outro tipo de marcas também não deixam passar em branco o evento, apostando em merchandising de todo o tipo. Há serviços de chá com a cara dos noivos, vários tipos de peças de cerâmica, uma réplica do anel de noivado e até preservativos “reais” que se assumem como sendo “à medida de um príncipe”.

No Reino Unido, quase todos procuram capitalizar com Harry e Meghan: a cadeia de supermercados Iceland, por exemplo, tentou copiar o bolo de casamento, vendendo uma réplica que utiliza o mesmo creme de limão siciliano por cerca de 10 dólares — bem longe dos cerca de 74 mil euros que o original terá custado.

Caneca comemorativa do casamento real (OLI SCARFF/AFP/Getty Images)

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O aumento do consumo pode ter impacto limitado, avisam os economistas consultados pelo Observador, mas tal não impede os vários sectores de apostarem em força na semana do casamento. A Associação de Bares e Cerveja britânica, por exemplo, saudou a decisão de alargar o horário de funcionamento dos bares na véspera do casamento, já que crê que irá trazer um aumento de mais de 10 milhões de euros em vendas.

Nem todos os ingleses, contudo, são assim tão otimistas. “Não quero faltar ao respeito ao Harry e à sua senhora, mas não vejo como é que o casamento real possa ser decisivo para o negócio dos bares”, declarou ao The Guardian Tim Martin, presidente da cadeia de pubs JD Wetherspoon. “O povo deseja-lhes tudo de bom, mas creio que a importância deste casamento é muito exagerada.” Apesar disso, estima-se que no dia da cerimónia haverá cerca de oito mil festas de rua um pouco por todo o país.

Quem paga um casamento de 30 milhões? E vale a pena o gasto?

Se ninguém sabe ao certo quanto entrará nos cofres do Reino Unido como consequência deste casamento, haverá consenso quanto ao valor que sairá dos bolsos dos contribuintes britânicos? Dificilmente, até porque não há números oficiais.

A aplicação Bride Book estimou que o valor total do casamento deverá estar à volta dos dois milhões de euros — um valor que, de acordo com a Harper’s Bazaar, é 100 vezes maior do que a média do país. Os consultores de casamento garantem que uma cerimónia destas nunca ficará por menos de meio milhão, mas ninguém sabe o valor concreto que a Casa Real pretende gastar.

Sabe-se, isso sim, quanto é que deverá custar algumas despesas de forma individual. A Bride Book, por exemplo, garante que as melhores empresas de catering em Londres cobram, no mínimo, cerca de 100€ por convidado e coloca a estimativa total em mais de 300 mil euros pelo copo de água. A consultora Sarah Sadler, por outro lado, estima à CNN que só os convites terão custado, no mínimo, oito mil euros. E a organizadora de casamentos Mindy Weiss avança à Cosmopolitan que o vestido de noiva custará cerca de 200 a 250 mil euros. A questão que se coloca então é: quem paga tudo isto?

“Tal como aconteceu com o casamento do Duque e da Duquesa de Cambridge, a Família Real irá pagar pelos elementos essenciais do casamento, como o serviço na Igreja, a música, as flores, a decoração e a receção”, anunciou a Coroa britânica. Sabe-se também que o vestido de noiva será pago pela própria Meghan. Mas isso não significa que os contribuintes britânicos não contribuem de forma nenhuma para este casamento, já que os custos com a segurança do evento serão assegurados pelas instituições públicas.

Quanto serão esses custos? Mais uma vez, não se sabe ao certo o valor. “Não há números oficiais”, queixa-se ao Observador Graham Smith, representante do grupo Republic, que faz lóbi pela abolição da monarquia britânica. “O número que foi avançado [com o casamento de William e Kate] em 2011 foi de seis milhões de libras [quase sete milhões de euros] com a segurança, mas há uma estimativa de que pode ter sido cerca de 30 milhões [quase 35 milhões de euros]. Não sabemos ao certo, porque o Governo não é transparente sobre isto.”

Em 2011, a polícia britânica assumiu que teve sete milhões de euros de custos, mas vários media, como o New York Times, dizem que 26 dos cerca de 28 milhões de euros que o casamento terá custado terão sido alocados para a segurança e pagos pelo Estado. A Bride Book estima que, este ano, o valor também ficará acima dos 30 milhões de euros, com gastos com forças policiais, snipers e equipamento militar como drones.

“Os casamentos reais devem ser eventos públicos, porque o papel da Família Real é o de entreter o país e dar-lhe esperança. Caso contrário, não sei para que servem os meus impostos…”
Jack Rans, habitante de Windsor

Para além disso, parte da própria riqueza da Família Real é financiada pelo erário público, através da chamada “bolsa de soberania”, para custear os gastos de representação da chefe de Estado, a Rainha. Em 2018, a bolsa recebeu um aumento, tendo ficado à volta dos 88 milhões de euros — um valor que, segundo o tesoureiro da Rainha, é justo. “Corresponde a cerca de 65 pences por pessoa, por ano. É o preço de um selo”, disse Alan Reid em 2017. Grupos como o Republic, no entanto, garantem que os custos estatais com a monarquia são bastante mais elevados, colocando o valor perto dos 400 milhões por ano.

“É difícil perceber o que é financiamento público e o que não é”, resume o porta-voz Graham Smith. “Provavelmente o que será gasto no casamento virá das contas pessoais dos membros da Família Real e não da bolsa pública. Mas nunca sabemos ao certo.” Em abono dos membros da Coroa, é necessário relembrar que a “bolsa de soberania” contribui apenas em parte para a riqueza da Rainha e dos seus descendentes: para além do financiamento público, Isabel II recebe ainda os lucros do Ducado de Lancaster, um conjunto de propriedades que pertencem à Monarquia desde o século XII e cuja exploração trouxe cerca de 20 milhões de euros à Rainha no ano passado. E, como extra, há ainda investimentos privados da Família Real em áreas como a bolsa ou em coleções de arte e de selos.

Tal não impediu o Republic de mobilizar cidadãos que estão contra os gastos públicos neste casamento, lançando uma petição que conta atualmente com 30 mil assinaturas. “A Monarquia serve para termos um chefe de Estado, não há necessidade de fazer de um casamento, que é do foro privado, um evento público. Boa sorte ao casal, mas deviam ter-se casado numa capela em privado e poupar-nos a todos a isto”, declara Smith ao Observador.

Graham Smith, líder e porta-voz do movimento Republic (BEN STANSALL/AFP/Getty Images)

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Esta posição, contudo, não é consensual entre a população. As sondagens revelam que mais de 70% dos britânicos são a favor da Monarquia e, mesmo entre os que preferiam ter um Presidente, nem todos estão contra o facto de o casamento de Harry e Meghan ser um evento público. É o caso de Jack, o programador de Windsor que colocou o seu quarto no Airbnb: “Os casamentos reais devem ser eventos públicos, porque o papel da Família Real é o de entreter o país e dar-lhe esperança. Caso contrário, não sei para que servem os meus impostos…”, afirma.

Jack destaca o “impacto positivo” que a cerimónia trará para Windsor, sobretudo ao nível económico, mas isso não o faz mudar de opinião em termos políticos. “Não acredito numa Monarquia que se baseia em direitos de nascimento em vez de eleições. Mas também não gostava de estar no lugar deles. Por outro lado, sou fã da ‘Suits’”, atira em jeito de piada, referindo-se à série que Markle protagonizava e que teve de abandonar para se juntar à Família Real britânica.

Como se mede o “fator feel-good“?

Olhando para a balança dos gastos e dos ganhos, já percebemos que é difícil perceber ao certo qual será o impacto deste enlace. Mas um bom ponto de referência é o casamento real anterior, do príncipe William com Kate Middleton. Segundo um estudo da PricewaterhouseCoopers que fez estimativas prévias, o casamento real de 2011 pode ter trazido cerca de 120 milhões de euros à economia britânica, um valor bastante superior aos cerca de 30 milhões que terá custado.

Isso não significa, contudo, que desta vez seja igual. “Acho que dessa vez foi um evento muito mais relevante, porque o William está em linha direta para se tornar Rei, coisa que o Harry não está. Tivemos um feriado dessa vez, também. Acho que o impacto foi muito maior, para ser honesto”, resume Howard Archer, da EY. Em sexto na linha de sucessão, Harry não terá uma cerimónia de Estado e contará com apenas 800 convidados (face aos cerca de dois mil que estiveram no casamento de William).

A história dos casamentos reais é bastante inconclusiva nesta matéria, como revela correspondência interna do Visit Britain divulgada pelo The Guardian em 2011, onde um responsável revelava preocupação pela diminuição de visitantes em 1986, ano do casamento real do príncipe Andrew com Sarah Ferguson, face ao ano anterior.

É por essa razão que críticos dos casamentos reais, como Graham Smith, falam em estimativas pouco firmes: “Não há provas que sustentem [este crescimento], os números que vão saindo não são de confiança.” O Visit Britain, por seu turno, garante que a situação se alterou desde os anos 80 e que agora é possível medir este impacto com mais certezas. Anthony Pickles garante que o casamento de 2011 se traduziu num “aumento de visitantes de 7%” nesse ano.

Em Windsor, uma cerveja foi feita de propósito para o evento (Jack Taylor/Getty Images)

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“Graças ao interesse gerado por este casamento, provavelmente haverá maior interesse no Reino Unido. Vamos poder exibir o Reino Unido como destino”, explica o responsável pelo Turismo, colocando o foco no marketing. “Já estávamos à espera de um ano forte de qualquer das formas. Qualquer acrescento a isto é bem-vindo.”

“Esta é uma boa maneira de promover o Reino Unido. E nós somos bons a organizar grandes eventos”, reconhece o economista Howard Archer, que crê que, em matéria de casamentos reais, “há mais ganhos do que perdas”. “É claro que se uma pessoa já se sente apertada em termos financeiros, isto pode trazer alguma alegria temporariamente, mas quando acabar a pessoa volta a sentir-se apertada. Por isso é de curto alcance, não é algo que vá alterar o Reino Unido”, resume Archer. “Mas, numa economia que teve um primeiro trimestre tão mau, qualquer ajuda é bem-vinda.”

Num Reino Unido na ressaca do Brexit, o “fator feel-good”, diz o analista, nunca é de descartar. As festas de rua, os pubs abertos até mais tarde, o merchandising bem disposto ou o dinheiro extra trazido por um quarto alugado em Windsor, tudo isso pode servir para dar aos britânicos a impressão de que, nem que seja por um instante, a vida vale a pena ser vivida. E, como relembra Jack, não é para isso que serve a Monarquia? Só falta perceber quantas libras isso vale.

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