789kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

RUI CARTAXO RODRIGUES

RUI CARTAXO RODRIGUES

Hugo Gonçalves escreveu um policial para responder à pergunta: e se o destino de Salazar tivesse sido outro?

Num novo livro, Hugo Gonçalves muda o século XX português, incluindo o papel de país na II Guerra. Em entrevista, fala da visão romântica sobre os autores e confessa-se um "operário da escrita".

Ao sexto romance, Hugo Gonçalves viaja até às primeiras décadas do século XX e fixa-se nos anos 40 para contar uma história familiar envolta em crime e mistério. Deus Pátria Família chegou às lojas há poucos dias, com chancela da Companhia das Letras. Começa com o homicídio de uma mulher no Cabo Espichel e rapidamente avança para uma versão alternativa de factos históricos.

Salazar deixa a liderança do Governo ao ser alvo de um ataque e Portugal “abandona a neutralidade na guerra e alinha-se com as forças do Eixo”, como diz o resumo da editora. “Nas ruas da capital, começa o cerco aos refugiados judeus e ecoam as tenebrosas memórias das perseguições da Inquisição.”

Nascido em Sintra há 44 anos, Hugo Gonçalves cresceu na zona do Estoril e começou a trabalhar como jornalista no fim da década de 90, tendo recebido em 2000 o Prémio Revelação do Clube Português de Imprensa (por uma reportagem sobre as cheias na Venezuela em dezembro de 1999).

Passou pela revista Focus, foi correspondente do Diário de Notícias em Madrid, esteve como editor na Atlântico, assinou crónicas na Visão e no jornal i, publicou em quase todos os títulos da imprensa portuguesa. Deixou definitivamente as redações em 2005 e não se vê a regressar, “porque não faz sentido e estou noutra fase”, diz. Continua a ser um ávido leitor de notícias e entende que “a qualidade da escrita jornalística parece pior do que há 20 anos, o que pode estar relacionado com a rapidez dos ciclos noticiosos, 24 sobre 24 horas”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Pelo meio viveu em Madrid, Nova Iorque e no Rio de Janeiro. Em 2015 fixou-se novamente em Lisboa. Além de romancista, é guionista de séries televisivas, caso de Até Que a Vida nos Separe, da RTP. A entrevista ao Observador, feita no Jardim da Estrela, em Lisboa, serviu para abordar o novo romance e ouvir o que pensa Hugo Gonçalves sobre a escrita, o Acordo Ortográfico e a relação dos portugueses e dos brasileiros com a língua que têm em comum.

"Deus Pátria Família", de Hugo Gonçalves, Ed. Companhia das Letras, 2021

Porque razão o título é Deus Pátria Família e não Deus, Pátria e Família?
Nos meus mergulhos no universo da propaganda fascista, a frase comum que aparecia não tinha o “e”: era Deus, pátria, família e não Deus, pátria e família.

Esses mergulhos significam que houve uma pesquisa muito intensa sobre o Estado Novo?
A pesquisa pode ser perigosa, pode ser muito sedutora. Dei por mim a ler o Diário de Lisboa na internet durante horas e horas e às tantas já estava a dar atenção a coisas que não tinham nada a ver com o que me interessava, já andava a ler os anúncios e as crónicas sociais de 1940.

A pesquisa pode ser perigosa porque desvia o autor do objetivo.
Sim, porque distrai. É como começar a ver uma série da Netflix e de repente passaram-se oito horas. Além disso, há muitos livros, e eu não queria correr esse risco, em que o autor acha que vai explicar a História ao leitor. É a morte do artista quando o escritor tem um parágrafo, ou uma frase que seja, de carácter didático, como se fosse um professor de História. Na minha conceção, a História tem sempre de estar ao serviço da história que quero contar. Não queria de todo fazer um livro pedagógico, queria contar a minha história. Os factos históricos que realmente aconteceram é que servem a dramaturgia do romance, essa era a minha preocupação.

O que não quer dizer que aqui não haja ficção sobre os próprios factos históricos, que também há, inclusivamente sobre o destino de Salazar.
Claro que sim.

Qual foi o ponto de partida: as personagens que estavam na cabeça do escritor ou as figuras reais da História de Portugal?
Foi um casamento entre as duas coisas. Sabia desde o início que queria contar uma história sobre crimes de motivação religiosa. A religião perpassa todo o livro, era um elemento muito importante para o povo e para o Estado naquela época. Queria conjugar isso com a ficção noir, o que significa que na primeira página aparecem juntos o protagonista, o detetive e o cadáver. Era uma premissa que me interessava, que aparece nos livros clássicos do género. Mas sabia que não ia escrever um policial puro e duro. Em Portugal há uma visão dourada de 1940…

Por causa da Exposição do Mundo Português?
Não só. O Portugal dessa época costuma ser visto como um paraíso em que havia estreias mundiais de cinema com a presença de estrelas de Hollywood, que não podiam ir a Paris ou Londres, por causa da guerra. Encontrei imensas reportagens sobre as celebridades que estiveram em Portugal, sobre o Casino Estoril, a aristocracia, os espiões. Esse lado glamouroso é muito atraente, entendo isso, mas não nos podemos esquecer de outros factos e foi isso que quis retratar no livro. Estávamos no fim do processo de purga da oposição à esquerda e à direita, por parte de Salazar. O país tinha taxas assustadoras de analfabetismo, de morte à nascença e de pobreza. Há uma história que refiro quase no fim: como as pessoas tinham sido proibidas de andarem descalças na rua, para que Lisboa tivesse um aspeto mais limpo durante a Exposição do Mundo Português — aliás, os mendigos foram afastados do centro da cidade e enviados para a Mitra [Albergue da Mitra, que funcionou em Marvila entre 1933 e 1960] —, os miúdos que andavam descalços, especialmente os engraxadores, enrolavam panos à volta dos pés. Isto só em Portugal: às vezes só enrolavam panos num dos pés, porque a lei referia que se a pessoa tivesse pelo menos um pé calçado já não ia presa. Fiz uma boa pesquisa fotográfica e encontrei registos de pessoas que vivam em grutas em Monsanto, como bichos. Há fotos disso.

"Os brasileiros são mais maltratados em Portugal do que os portugueses no Brasil. Não são todos, claro. Mas se quantificarmos as vezes que um brasileiro em Portugal foi vítima de 'vai para a tua terra' ou 'és uma puta porque és brasileira', não há comparação com a minha experiência no Brasil e a dos meus amigos portugueses."

Ou seja, quis tirar o glamour que normalmente se atribui àquela época em Portugal.
Sobretudo, quis mostrar a contradição. A contradição e o conflito seduzem bastante o escritor. “Olhem para este Portugal que constrói uma Disneylândia, que é a Exposição do Mundo Português, com palhotas africanas e casas de Trás-os-Montes, para comemorar as nossas façanhas e assinalar a fundação e a restauração, mas que é ao mesmo tempo uma cabeça de império cheia de pobreza material e existencial.” Já para não falar da opressão e da falta de liberdade de expressão. Hoje, por causa dos casos de corrupção, volta a ideia de que no Estado Novo não havia corrupção ou crime. É hilariante. Não há nenhum país pobre nem nenhuma ditadura que não resulte em corrupção. A União Soviética era um país profundamente corrupto, a própria China tem graves problemas de corrupção. Quem ler os jornais dos anos 1930 — tivemos, aliás, nessa época um jornal intitulado O Crime, que durou pouco tempo —, encontra casos de homicídios passionais, violência sobre crianças, violência sobre mulheres. Muito mais do que hoje, sem comparação.

Embora os valores fossem diferentes e a violência contra crianças talvez não tivesse à época a gravidade que tem hoje.
Sim, mas objetivamente é falsa a ideia de uma época dourada, com lei e ordem e sem corrupção. Os grandes grupos económicos de então, alguns dos quais sobrevivem, existiam em conivência com o poder político. Havia tráfico de influências como continua a haver. A ideia de belle époque é curiosa. Se repararmos, todos os extremismos, sejam os mais populistas, como no caso de Trump, ou os religiosos, como no caso do Estado Islâmico — e o Estado Novo, com os Descobrimentos — têm uma visão dourada do passado. Daí a ideia do “antigamente é que era bom”.

Durante o salazarismo, "os grandes grupos económicos existiam em conivência com o poder político", porque "havia tráfico de influências" e "continua a haver", defende Hugo Gonçalves

ARQUIVO DN

É um romance com motivações ideológicas?
Não, de todo. Estas reflexões aconteceram a posteriori. Queria contar uma história naquele momento histórico e acabei por explorar as contradições. Mas não posso dizer que a minha motivação seja de denúncia ou ideológica. Se isso acontece, é de maneira indireta, porque no fim a ambivalência está lá.

É um romance histórico ou policial?
Falei com a editora sobre como o mercado editorial precisa de encontrar categorias. Há escritores que procuram uma voz única para todos os livros, o que é completamente legítimo. Sempre me interessaram mais os artistas que depois de encontrarem uma fórmula de sucesso se reinventaram por completo nos trabalhos seguintes. Cada história precisa de coisas diferentes. No livro anterior, Filho da Mãe [2020], contei uma história pessoal, na primeira pessoa, a matéria-prima era a minha memória e a memória dos outros. Neste caso, quis o modelo clássico do romance, com muitas personagens, que atravessa 40 anos, países e realidades diferentes, e que por isso me exigia maior fôlego. Não podia continuar no registo do livro anterior, fez-me sentido misturar géneros.

Não gosta da categoria “romance histórico”?
O problema é que o romance histórico, tendo exemplos extraordinários — a triologia Wolf Hall, de Hilary Mantel, por exemplo —, está também associado a muitos maus exemplos. Se romance histórico é uma história passada noutra época, então o meu livro é um romance histórico. Se é a tentativa, especialmente através de reis e rainhas, de assumir uma atitude didática, então não é.

Ao fim de seis romances, como é que vê a evolução da sua escrita?
O primeiro romance [O Maior Espectáculo do Mundo, 2004] foi escrito com 24 anos, quando estava a viver em Nova Iorque. É claramente o romance de um rapaz com muita vontade de escrever. Um escritor brasileiro de que gosto muito, Sérgio Rodrigues, diz que só se deve ser escritor se isso for algo de que não se consegue desistir. Acho que essa pulsão me fez falta desde cedo, como há pessoas a quem faz falta fazer desporto. Isso fez com que quisesse começar a escrever e a publicar muito cedo. Há quem só queira publicar depois dos 40. Hoje consigo ver nos meus romances um reflexo da evolução da minha maturidade. Os meus medos, a minhas obsessões e as minhas insuficiências estão de certo modo espelhados nos livros. Era impossível ter escrito o Deus Pátria Família ou o Filho da Mãe quando tinha 20 e tal anos. Contaram-me uma história, que não sei se é verdadeira, de um poeta português que tinha tanto horror do seu primeiro livro que o procurava nos alfarrabistas para depois o enterrar num jardim. Acho que todos os escritores já tiveram essa vontade. Mas tenho de olhar para a pessoa que era, é absurdo julgar o primeiro livro com os olhos de hoje.

É esse o risco de quem começa muito cedo a escrever em público: expor as incapacidades próprias da idade.
Prefiro mil vezes esse risco do que o outro flagelo que atormenta muito mais pessoas: “Ainda não estou preparado para a obra-prima, por isso não vou escrever nada.”

É uma boa desculpa?
Não sei, mas como diz o Pessoa, há génios que estão à janela mas nunca fazem nada. A ideia de que nos sentamos e vamos escrever uma obra-prima. Quem não estiver preparado para aceitar que o primeiro rascunho de uma obra é sempre uma merda, acho que tem uma visão romantizada do ofício de escritor e se calhar uma visão endeusada de si mesmo.

"Gosto de reconhecimento? Claro. Gosto que as pessoas me digam que estão a gostar muito do livro? Claro que sim. Mas tenho de ser honesto: o mais fabuloso disto é o processo. Sentar-me, escrever, pesquisar, rever."

O que é que o faz escrever?
É o processo. Gosto de reconhecimento? Claro. Gosto que as pessoas me digam que estão a gostar muito do livro? Claro que sim. Mas tenho de ser honesto: o mais fabuloso disto é o processo.

O que é o processo?
Sentar-me, escrever, pesquisar, rever. Todo o processo de criação do livro. Senão, não fazia sentido estar dois anos a escrever 400 páginas, sabendo que não vou ter um grande retorno financeiro, como não tem a maioria dos escritores portugueses, à exceção dos best sellers, que são poucos. Se dividir o dinheiro da venda do livros pelas horas gastas, não deve dar o salário mínimo nacional.

Esse processo deve ser mesmo muito gratificante. Caso contrário, desistia.
O Jonathan Franzen disse uma vez numa conferência aqui em Lisboa que o tempo que gastou em todos os romances somava sete anos e que esses tinham sido dos melhores sete anos da sua vida. Identifiquei-me com aquilo. Não sou fanático a ponto de dizer que todos os melhores momentos da minha vida foram passados a escrever, mas muitos dos melhores momentos foram.

É uma obsessão?
É, mas não gosto de dizer assim, porque há a tendência para se sacralizar ou romantizar a escrita. “Ah, isto é uma causa, uma entrega, há um espírito que desce sobre mim.” É uma ideia que existe em todo o mundo, mas muito em Portugal, talvez por ser um país com poucos leitores. Tenho uma ética completamente blue-collar da escrita, sou operário da literatura. Claro que quando estou a escrever um romance — mais um romance do que um guião, porque o guião tem elementos mais técnicos — estou durante horas imerso naquele universo. A minha namorada diz-me que ando “com cara de livro”, que é quando estou presente, mas a minha cabeça está noutro lugar. Tudo isso é verdade, mas tiro a esta atividade o carácter mágico que alguns lhe atribuem, porque sei que há outras atividades que exigem o mesmo grau de dedicação. Diz-se que os basquetebolistas estão in the zone quando fazem cinco ou seis cestos seguidos, porque estão num “já” e num “agora” em que a coordenação motora e a concentração se alinham como uma orquestra filarmónica.

O autor viveu no Rio de Janeiro entre 2011 e 2015

RUI CARTAXO RODRIGUES

E a saturação de ser um trabalho monótono e solitário?
Monótono, não acho. Solitário, estou habituado. Claro que gera angústias e inseguranças, como qualquer outra coisa que se faça na vida.

Para se escrever bem é preciso dominar totalmente as palavras e as frases em vez de serem elas a dominar quem escreve?
Entendo a escrita como uma confluência… Outro dia pensei nesta frase: quero que a minha escrita seja lúcida, pertinente, a um tempo profunda e leve, e que tenha beleza.

É a mistura do erudito com o popular, como tem referido noutras entrevistas?
Sim e acho que temos isso neste livro. Pelo menos, prestei-me a tentar fazê-lo. Há reflexões sobre a religião e a ideologia e conversas de bar entre os detetives. Gosto desses saltos entre mundos diferentes. Posso estar em casa a ler um livro de filosofia e a seguir vou tomar um café com amigos e conversar sobre futebol. Vimos de uma tradição literária muito lírica, aqui em Portugal. No Brasil, algumas pessoas que leram os meus livros diziam que sou muito poético a escrever. Há momentos em que gosto desse lirismo, no entanto, procuro um equilíbrio. As ferramentas que tenho à minha disposição, que são a língua e o uso que faço dela, mais o desenvolvimento das personagens e do enredo, têm de se articular de forma a que o leitor não encontre as costuras, não note a técnica. Há escritores que se dedicam exclusivamente ao enredo, que querem uma história que surpreenda e engane; outros, para quem o uso inovador da linguagem é o que conta mais. No meu caso, é mixed martial arts, um pouco de tudo.

Viveu quatro anos no Rio de Janeiro. É verdade que os brasileiros têm maior destreza com a língua portuguesa dos que portugueses?
Os portugueses também têm essa destreza, na literatura é que não se nota tanto. Um grupo de miúdos portugueses comunica de uma forma muito ágil e coloquial. Não sei se seremos tão inventivos, porque o Brasil é uma mistura de muitas culturas e línguas, mas não somos tão rígidos e compostinhos como no cânone literário.

Mas há ou não uma enorme distância entre as duas variantes?
Em nenhum momento, enquanto lá estive, houve algo que impossibilitasse a comunicação. O que não se entende é uma forma de aproximação, de aprendizagem, de nos rirmos. A intercompreensão é total, tirando algumas questões fonéticas. Falamos muito para dentro, o que às vezes torna difícil para os brasileiros identificar o som da palavra que utilizámos. Mas isso acontece dentro do Brasil. Um tipo do Rio de Janeiro não vai entender totalmente a pronúncia de um vilarejo de um estado do norte. Nos últimos tempos tem-se falado muito de lusofonia, o Sérgio Rodrigues escreveu um artigo na Folha de S. Paulo, que teve uma reposta do Rui Tavares. Há a questão do Acordo Ortográfico…

"Os brasileiros são mais maltratados em Portugal do que os portugueses no Brasil. Não são todos, claro. Mas se quantificarmos as vezes que um brasileiro em Portugal foi vítima de 'vai para a tua terra' ou 'és uma puta porque és brasileira', não há comparação com a minha experiência no Brasil e a dos meus amigos portugueses."

Já agora: é favorável ao Acordo Ortográfico de 1990?
Faz-me lembrar a frase do Shakespeare: much ado about nothing [“tanto barulho por nada”]. Não sou linguista, mas há coisas no Acordo que estão mal feitas, que me causam algum transtorno. É o caso do “para” sem acento. O que não entendo é o fanatismo de pessoas que se recusam a ler um livro por ele estar escrito segundo o Acordo. Em que é que a ausência de uma consoante ou de um acento prejudica a compreensão de um livro? Como leitor, nunca me senti prejudicado por causa disso. Como autor, já tive pessoas a dizer que não iam ler porque estava com o Acordo. Essas pessoas esquecem-se de que quando estão a ler o Eça ou o Pessoa já não estão a ler com a grafia com que os autores escreveram. Há várias formas de falar a minha língua e de entender o mundo, isso é um ganho.

Esse argumento também serve aos detratores do Acordo Ortográfico, porque entendem que a uniformização da ortografia tira diversidade às variantes da língua portuguesa.
Mas estamos a falar de diversidade formal. São letras. A diferença entre “frigorífico” e “geladeira”, “marés-vivas” e “ressaca” ou “pirilampo” e “vagalume” vai continuar. O espanhol argentino terá mais diferenças face ao castelhano do que o português do Brasil face ao português de Portugal e eles entendem-se perfeitamente, e os escritores argentinos vendem em Espanha, fazem séries de televisão em conjunto, os atores viajam. Ora, a língua é um negócio…

Um negócio?
Pode ser um negócio, uma indústria, no sentido das indústrias culturais. É uma das visões possíveis. Se tivermos, como no mundo de língua inglesa ou espanhola, um intercâmbio cultural, que vai da música ao cinema, passando pelo teatro… Não temos isso. Não sei porquê, não sei como é que se faz. Se não é suficiente apelar ao bom que isso traz — mais cultura, mais conhecimento, mais intercâmbio—, podemos ao menos apelar ao ponto de vista económico, que muitas vezes é que faz mover as pessoas.

Há ressentimos de fundo entre os países de língua portuguesa?
Não sei, mas posso dizer que os brasileiros são mais maltratados em Portugal do que os portugueses no Brasil. Não são todos, claro. Mas se quantificarmos as vezes que um brasileiro em Portugal foi vítima de “vai para a tua terra” ou “és uma puta porque és brasileira”, não há comparação com a minha experiência no Brasil e a dos meus amigos portugueses. Nem tudo foi um mar de rosas, fizeram-me sentir estrangeiro uma ou duas vezes no Brasil, tal como nos EUA ou em Espanha, porque em todo o lado há cretinos. Não estou a dizer que os portugueses são mais racistas, mas especialmente no Rio de Janeiro ainda existe um certo carinho pela ideia do português. Existe um complexo de superioridade de uma certa elite cultural portuguesa, se podemos dizer assim, que resulta de um sentimento de inferioridade. Ouvi portugueses no Brasil que diziam “estes gajos não sabem falar, isto nem sequer é a mesma língua”. Claro que há coisas que soam muito mal aos portugueses, mas para os brasileiros também é muito estranho dizermos “mais pequeno” em vez de “menor”, já que não dizemos “mais grande”. Há quem pense que nós é que fomos os inventores da língua e quem não fala como nós está a usar um subproduto linguístico. É uma visão retrógrada e provinciana.

Depois do Estado Novo, qual é o tema do próximo livro?
O período pós-revolucionário, entre 1974 e 75.

Romance?
Sim, mas não quero falar muito disso agora. É um livro no qual já estou a trabalhar.

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora