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Corden chegou há 18 meses aos Estados Unidos, mas o seu programa já tem 9,5 milhões de subscritores no Youtube
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Corden chegou há 18 meses aos Estados Unidos, mas o seu programa já tem 9,5 milhões de subscritores no Youtube

Corden chegou há 18 meses aos Estados Unidos, mas o seu programa já tem 9,5 milhões de subscritores no Youtube

James Corden. Dos papéis de miúdo desajustado ao karaoke viral com Michelle Obama

Apesar da figura redondinha, não lhe falta elasticidade. Ator, comediante, produtor, apresentador e cérebro do viral Carpool Karaoke. James Corden é o inglês deprimido que vai apresentar os Grammy.

Agora é fatos haute couture, estatuetas várias na prateleira lá de casa e a sua assinatura em vídeos virais. James Corden é o cérebro, a voz, o embaraço e a candura por detrás de Carpool Karaoke, o segmento do seu programa The Late Late Show, na cadeia de televisão norte-americana CBS, no qual se vê Corden atrás do volante de um enorme SUV preto ao lado das maiores estrelas da música entoando com cada uma os seus maiores hits.

E depois há aquela vez em que Corden, fingindo que tinha agendada uma banal visita guiada à Casa Branca, acaba às voltinhas pelos jardins da residência presidencial com…Michelle Obama, a cantar All The Single Ladies. Está quase nos 53 milhões de visualizações.

Pausa. Rewind. Inglaterra, fim dos anos 90. Corden, vermelhusco e envergonhado, à porta de um luxuoso hotel de Chelsea, em Londres, de calças de ganga preta, largas, com uma camisa de flanela verde e branca aos quadrados porque, bom, são os anos noventa e toda a gente ouve Pearl Jam.

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Com 18 anos, Corden já era uma presença habitual no programa da manhã Good Morning Britain e uma das primeiras entrevistas que faz é a Meat Loaf, lendário músico britânico cujos maiores sucessos aparecem na internet sob uma coluna que diz “rock wagneriano”. Corden é humilde e permeável às palavras do seu ídolo. Nos textos escritos sobre a sua ascensão, lê-se muitas vezes que nunca perdeu a capacidade de se impressionar com os outros.

Então com 18 anos, Corden fazia parte do elenco de Boyz Unlimited, uma série sobre uma boys band inglesa com ilusões de grandeza à procura de um sucesso no qual só eles acreditavam. Num dos episódios, a personagem de Corden diz: “Há muita gente que acredita que eu serei o melhor escritor de canções da minha geração”. E os colegas perguntam: “Mas quem é que diz isso?”. Resposta: “Não acabei de dizer? Muitas pessoas”.

Depois de pequenas participações em Little Britain e Hollyoaks, duas das séries britânicas mais populares de sempre, começa, no ano 2000, a gravar Fat Friends, uma comédia com drama pelo meio, sobre um grupo de amigos com excesso de peso. Constrangedor, auto-crítico, o dedo nas próprias feridas, uma facilidade em gozar consigo próprio que sempre o acompanhou e que está na base do seu sucesso. Em Fat Friends ele é Jamie, um miúdo que é gozado na escola, que, então, desiste da escola para ser repositor num supermercado, que faz dieta e come os chocolates que acabou de repor, e cujas festas de aniversário “só têm velhos e nenhuns amigos”.

Verosímil, ele é milhares de miúdos. Como se lê num perfil publicado pela revista Relevant, “o tipo de comédia que Corden faz mostra-o mais vulnerável. É como se estivéssemos a assistir às parvoíces de um dos nossos amigos engraçados, não apenas ao trabalho de um ator talentoso”.

https://www.youtube.com/watch?v=2jW-4qEjU48

Em 2004, passou do pequeno ecrã para um palco de teatro e a crítica começou a levá-lo mais a sério. Foi escolhido para o papel de Timmy, na produção The History Boys assinada pelo dramaturgo britânico Alan Bennett. Mais uma vez, o bobo sensível da corte, sempre a mandar piadas para que não reparem nele, Corden levou Timmy à Broadway, aos palcos da Austrália e de Hong Kong e finalmente ao cinema.

The History Boys é a história de um grupo de estudantes do norte de Inglaterra, orientado por um conjunto de três professores excêntricos, com objetivo de conseguirem uns impossíveis lugares em Oxford e Cambridge. A adaptação ao cinema, de Nicholas Hytner, tornou-se uma referência dentro do género cinematográfico “dores de crescimento”, tal como um O Clube dos Poetas Mortos, O Bom Rebelde, ou, mais recentemente, Juno ou Submarine. No vídeo de apresentação do filme é visível a frustração de Timmy quando lhe pedem para estudar poesia porque “a poesia só fala de coisas que não nos acontecem”.

Entre 2007 e o início de 2010, mais um enorme sucesso: Gavin & Stacy, transmitido na BBC 3. Corden é Smithy, ou “Smiffy” no sotaque denso de Essex, terra gozada até à exaustação em variadíssimas comédias britânicas por ser uma espécie de viveiro de parolos. Meia branca, calça justa e cabelo com gel para os homens; decotes acentuados e muitas horas de solário para as mulheres. As noites servem unicamente para beber muito, em salões de bowling bafientos, e o sonho é trabalhar ali perto da rua direita, no Costa Coffee.

Exageros próprios da comédia. Smithy é o amigo anafadinho do rapaz giro, que acaba por gostar da “tipa enorme” que, por sua vez, claro, é amiga da namorada gira do amigo giro. Além de ter sido ator na série também a escreveu a meias Ruth Jones, a tal “tipa enorme”, frase do próprio Smithy antes de reparar que isso não interessa nada. Jones acabou por se tornar uma das melhores amigas de Corden.

Tempos conturbados

Mais uma aproximação da fição à realidade. Dois anos depois do sucesso, Corden estava perdido nos bastidores da fama. Noitadas das quais não se lembra que acabavam invariavelmente em camas de mulheres que ele não conhecia. Ressacas monumentais, arrogância e sobranceirice com os jornalistas, os agentes e os júris dos prémios para os quais era nomeado, uma necessidade de atenção patológica e uma solidão permamanente, tudo descrito com detalhe na autobiografia que publicou em 2011 – “May I Have Your Attention, Please?”.

Estava tudo já mau o suficiente com a crítica do seu lado. Mas quando, em 2009, começou também a ver o seu trabalho, o seu último reduto, invadido por críticas inclementes, Corden entrou numa espiral de auto-destruição. O filme Lesbian Vampire Killers, cuja história se passa numa aldeia onde todas as mulheres viram vampiras lésbicas assim que atingem a maioridade, foi demolido pela crítica.

“Fomos de heróis a zeros. Doeu e a culpa era minha. A pessoa que eu era não era a pessoa que eu queria ser. Tinha-me afastado tanto dos meus amigos mais próximos e da minha família que deixei de saber como pegar no telefone e falar com eles”, escreve na sua autobiografia. “Os meus sonhos tinham-se tornado realidade. Tinha marcado o golo mas quando passei os dois postes da baliza para ir buscar a bola já não a encontrei. Com todo o nevoeiro, perdi o caminho”, acrescenta mais à frente.

"De repente, o meu Pai abraçou-me. Não consegui não chorar. Senti-me tão envergonhado com a forma com que tinha andado a viver a minha vida, a arrogância e a falta de respeito que tinha demonstrado comigo mesmo e com o meu trabalho."
James Corden, comediante britânico

Mas alguém ainda sabia usar o telefone. Um dia de manhã recebe uma chamada dos pais. Estavam a caminho de Londres e queriam vê-lo. “Estava com uma ressaca enorme mas não podia mandá-los para trás”, confessa no livro. Abre a porta de casa em Primrose Hill, no Oeste caríssimo de Londres, que partilhava com o seu grande amigo e ator Dominic Cooper mas não tem nada para lhes dizer: “Infelizmente tinha-me afastado deles mas odiei que me vissem naquele estado”, escreve Corden.

De repente, o gelo quebrou com um abraço do pai, de quem, em miúdo, nunca tinha merecido grande confiança. Os pais discutiam por causa dele. A mãe a defendê-lo e o pai a dizer que ele estava bem era num colégio interno.

“De repente, o meu Pai abraçou-me. Não consegui não chorar. Senti-me tão envergonhado com a forma como tinha andado a viver a minha vida, a arrogância e a falta de respeito que tinha demonstrado comigo mesmo e com o meu trabalho”, acrescenta mais à frente.

Família católica e uma desgraça na escola

Nascido em Agosto de 1978 no seio de uma família fortemente católica, o pai músico da Força Área e membro do Exército de Salvação, a mãe assistente social, Corden não é, apesar disso, um homem crente. Num café com a revista Rolling Stone, disse que toda a vida de igreja “é uma desgraça completa”. E ironiza: “O que é um cristão? Tanta gente a entrar e a sair por aquelas portas, pregando coisas e não era de todo dessa forma que conduziam as suas vidas”.

Mas não esquece que foi “uma oração do pai” que mudou tudo. “Por cada lágrima que chorava sentia-me mais leve. O meu pai rezou um pouco e deu-me um beijo na testa. A minha mãe veio abraçar-nos também. Não faço ideia quanto tempo ficamos ali, uma vida, pareceu-me”, escreve na autobiografia. Na despedida, um aviso: “Tens tanto pelo qual agradecer, James. Foi um ano mau mas não podes continuar assim”.

"Se és um tipo grande na escola tens duas opções: vais ser um alvo, isso é certo. Então tens que dizer a ti mesmo, ok eu vou fazer de mim um alvo ainda maior, a minha confiança vai assustar toda a gente. Por dentro estás petrificado, mas tens que ser engraçado, mais rápido e mais perspicaz que eles assim já não te apanham na esquina".
James Corden, comediante britânico

Tal como a sua personagem em Fat Friends, Corden não queria saber de aulas. Ele próprio admite sem problemas que era terrível na escola, bom apenas em disciplinas tipo “gestão do lar” e “teatro”. Para ele não fazia qualquer sentido aquilo: “Eu não preciso de saber como é que um glaciar se separa”, disse à Rolling Stone. Muitas vezes sentia-se culpado por não se esforçar mais mas fazer maluquices nas aulas, fazer os outros rir “era uma droga, e uma das pesadas”, escreve na sua autobiografia.

Ignorou os estudos, tentou formar uma banda — mais uma das vezes em que a sua vida real acabaria por se repercutir nos seus papéis — e obrigava o pai a levá-lo a Londres a dezenas de audições. Nunca desistiu, mas os seus primeiros papéis estavam diretamente associados à sua figura física. Preconceitos que ainda prevalacem em Hollywood: “A noção de que, por alguma razão, as pessoas menos bonitas ou mais pesadas não se apaixonam foi coisa que nunca entendi nas comédias românticas. E se isso acontece é meio estranho, um embaraço, uma coisa feita de forma pateta, mas não é extamente a mesma coisa na vida real”, disse à Rolling Stone.

“Se és um tipo grande na escola tens duas opções: vais ser um alvo, isso é certo então tens que dizer a ti mesmo, ok eu vou fazer de mim um alvo ainda maior, a minha confiança vai assustar toda a gente. Por dentro estás petrificado mas tens que ser engraçado, mais rápido e mais perspicaz que eles assim já não te apanham na esquina, contou ainda Corden.

Um desconhecido — e que bom é isso

Em 2011 as coisas começam a correr melhor. Os jornais preenchem a preto todas as cinco estrelinhas para One Man, Two Guv’nors, uma peça passada na estância balnear de Brighton, nos anos 60, quando a fina-flor da sociedade lá passava férias e um ou outro gang feroz assombrava as noites. Corden é um jovem trabalhador com dois patrões extremamente exigentes e a peça é uma mistura inteligente de ironia e crítica social. Ganhou um Tony Award, os mais importantes do teatro, pelo seu papel.

Depois disso mais uma aclamação crítica pela interpretação em Into the Woods, mais um galardoado musical de Stephen Sondheim, ao lado de Meryl Streep e Anna Kendrick. Corden é O Padeiro, um homem que deseja mais que tudo ter um filho mas está amaldiçoado por uma bruxa que um dia viu o seu pai roubar, impedindo toda a descendência futura da família.

"Quando cheguei pensei que, se ao fim de dois anos, tivéssemos dois milhões de subscritores isso seria um sucesso enorme, estou super entusiasmado e um pouco arrebatado pelo sucesso do programa."
James Corden, comediante britânico

Apesar de se ter endireitado — e os créditos disso são todos, diz ele, para a sua mulher, Julia Carey, que trabalha na associação de apoio a crianças desprotegidas Save The Children — a fama não passou completamente. No Reino Unido ainda há quem o critique por ser um miúdo arrogante, com piadas fáceis e um humor fácil, até “machista”.

A América, porém, é todo um novo mundo. Quando decidiu aceitar o novo desafio mudou-se para Los Angeles com a mulher e os dois filhos: Max, que tem quatro anos, e Carey, uma menina com quase dois. Pediu conselhos a David Beckham, outro inglês que se mudou para os Estados Unidos e saltou. Como diz Corden “o que é engraçado é engraçado e viaja bem”. As páginas negras de Corden, na imprensa conservadora britânica, para sua sorte, não voaram com ele e quando se sentou à frente do talk-show The Late Late Show já tinha mudado o suficiente para que quem acompanha o seu trabalho nos Estados Unidos só lhe reconhecesse humildade. É uma cara fresca, diz a Relevant, com um estilo menos ensaiado do que as restantes estrelas dos programas de entretenimento.

A sua abordagem sem grandes artifícios e menos politizada distingue-o de Jimmy Fallon (The Tonight Show), e de Steve Cobert (The Late Show) . São “verdadeiros performers” como diz a Relevant e ele é “um conservador natural ainda que seja, às vezes, um pouco embaraçoso vê-lo”.

Mas a América abraçou-o. Está há pouco mais de ano e meio à frente do talk-show que já tem quase 10 milhões de subscritores no canal de vídeos YouTube. “Quando cheguei pensei que, se ao fim de dois anos, tivéssemos dois milhões de subscritores isso seria um sucesso enorme, estou super entusiasmado e um pouco arrebatado pelo sucesso do programa”, disse ao telefone com New York Times quando se soube que iria ser ele a apresentar os importantíssimos prémios Grammy.

O sucesso deve-se à equipa e “à internet”. Na televisão, com um programa que passa à uma da manhã “as pessoas só tem duas opções: ou veem o programa ou vão dormir, mas na internet as coisas são bem mais puxadas”, disse Corden também à Revelant. Além do sucesso do segmento Carpool Karaoke, uma ideia que surgiu porque Corden achou que sera giro ir buscar George Michael à prisão e dar uma volta de carro com ele a cantar sucessos dos Wham.

A estreia de Corden no Late Late Show foi um sucesso, e um dos vídeos mais vistos ainda é esse, o primeiro, com o ator Tom Hanks. Um dos segmentos é Corden numa espécie de interpretação relâmpago dos filmes mais conhecidos do ator norte-americano.

Sobre a hiperpolitização da comédia nos Estados Unidos, Corden considera-se demasiado outsider para se meter (já) nisso este domingo, quando for apresentar os prémios Grammy. “Seria estranho para mim ir para o palco falar de legislação federal, acho que ainda não tenho esse direito, sou um tipo de 38 anos de High Wycombe no condado de Buckinghamshire, as pessoas não vão ligar a televisão à espera de me ouvir um grande discurso político”, disse Corden ao New York Times.

Ao contrário dos Emmy, por exemplo, ou dos Óscares, os prémios Grammy não estão tão presos ao génio de quem os apresenta. A noite é dominada pelos artistas em palco. É um bom primeiro passo para alguém que quando foi escolhido para apresentar um talk show americano… nunca tinha estado, nem como convidado, num talk show americano. “É uma loucura, é mesmo”, disse Corden à Variety sobre a decisão “super ambiciosa” de tomar as rédeas do Late Late Show.

Apesar de não se achar no direito de opinar sobre política norte-americana Corden fez um vídeo no aeroporto de Los Angeles depois da ordem executiva de Donald Trump, que impediu dezenas de milhares de pessoas de países maioritariamente muçulmanos de entrar no país. A ele ninguém o impediu de nada. No fim do vídeo uma frase: “Liberdade de movimento devia ser fácil para todos os imigrantes em situação legal. Não apenas para os brancos cristãos”.

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