788kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Jorge Lacão foi eleito deputado pela primeira vez em 1983. Fez parte dos Governos de Sócrates
i

Jorge Lacão foi eleito deputado pela primeira vez em 1983. Fez parte dos Governos de Sócrates

Pedro Nunes/LUSA

Jorge Lacão foi eleito deputado pela primeira vez em 1983. Fez parte dos Governos de Sócrates

Pedro Nunes/LUSA

Jorge Lacão. "PS não deve fechar a porta a ninguém"

Rui Rio anda em "ziguezague" mas é um interlocutor que pode permitir que PS e PSD se voltem a entender, diz Jorge Lacão em entrevista, na despedida de um Parlamento que deixa com algumas frustrações.

Considera que a direção de Rui Rio foi “ziguezagueante”, mas ainda assim apela, uma e outra vez, à capacidade de entendimento dos dois maiores partidos depois das eleições: uma vez que a esquerda decidiu votar-se ao “isolacionismo” e à condição de “partidos de protesto”, o PS não deve fechar a porta ao PSD. “Tudo o que for possibilidade de entendimento é bem-vindo”.

A análise política é feita por Jorge Lacão, em entrevista na Vichyssoise, numa altura de despedida: depois de décadas dedicadas à política — foi eleito deputado pela primeira vez em 1983 e fez parte dos dois Governos de José Sócrates, como secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e Ministro dos Assuntos Parlamentares — Lacão abandona agora o Parlamento, por estes dias já dissolvido. Antes, deixa registadas algumas frustrações, como a disputa “desenfreada” que os partidos fazem da agenda do Parlamento para colocarem na ordem do dia assuntos “irrelevantes” — e uma vontade de “requalificar” a política, e o funcionamento do Parlamento, que não chegou a conseguir concretizar.

Em 2016, seis meses depois de consumada a geringonça, dizia: “os que não viam com bons olhos esta solução estão hoje mais discretos” e que “O PS confrontou-se com uma clarificação dentro de si próprio”. Esta clarificação é necessária para 2022?
Cada vez que se abre um ciclo político é sempre bom que haja uma clarificação. Nessa ocasião, creio que foi importante a imagem que António Costa tem utilizado muitas vezes de derrubar o muro, no sentido de trazer os partidos à esquerda do PS para um maior sentido de responsabilidade relativamente ao destino da governação. E com isso superar a tendência que existia na sociedade portuguesa de que só alguns partidos poderiam ter vocação de governo. Agora estamos na véspera da abertura de um novo ciclo, os mesmos partidos que foram chamados a essa responsabilidade, com a rejeição do Orçamento, eximiram-se dessa responsabilidade. Contraíram para si próprios a recuperação do seu destino anterior, pelo menos até ver. Ou seja, voltaram à lógica do isolacionismo e do protesto. Isso não deixa de introduzir um novo fator de ponderação na sociedade portuguesa e uma maior responsabilidade aos partidos do centro: seja à esquerda do PS, seja aos partidos de centro direita como o PSD, o sentido de compreenderem que a responsabilidade pela estabilidade política no país passa muito pela sua capacidade de contribuírem para isso.

É necessária uma nova clarificação ou uma reconfiguração da estratégia do PS para integrar o PSD? Porque o primeiro-ministro disse há um ano e meio que no dia em que precisasse do PSD o Governo caía…
O PS deve ser coerente consigo mesmo, ter um projeto uma visão global para a sociedade portuguesa e com isso propor condições para a governabilidade através do apoio que lhe for conferido. Independentemente do resultado eleitoral, há muitas matérias na sociedade portuguesa onde é exigível uma capacidade de diálogo entre o partidos mais representativos da sociedade.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Em que matérias específicas é preciso esse entendimento? Até agora tem sido apenas em matérias de política internacional e de defesa. Está a falar dessas ou de outras?
Na minha ótica poderão ser outras também. Naturalmente as matérias institucionais serão aquelas onde esse tipo de entendimento é mais exigível e mais compreensível que se faça, mas nem sempre essas matérias têm a relevância política que deviam ter. Há domínios no funcionamento do sistema políticos, da área da justiça onde certo tipo de entendimentos são importantes. E até de prática institucional. Creio que isso é muito necessário que ocorra, por exemplo, no modo de funcionamento da Assembleia da República.

"Tudo o que for possibilidade de entendimento é bem-vindo. Os portugueses estão muito cansados de polémicas políticas estéreis. E certamente aplaudirão todos os que revelarem capacidade de compromisso"

Não resulta confuso para os eleitores pedir grandes consenso em grandes áreas e grandes temas quando depois os dois maiores partidos não se entendem em matérias de gestão corrente?
Já houve acordos políticos muito relevantes que juntaram o PS e o PSD em momentos em que o PS estava na oposição e o PSD no Governo. Recordo-me de um acordo de revisão constitucional feito entre Mário Soares, que estava na oposição, e Francisco Pinto Balsemão que era primeiro-ministro. Em 1997 era ao contrário, estava o PS no Governo e o PSD na oposição. Apesar de muitas vicissitudes desse processo não se deixou fazer um importantíssimo acordo, de resto com muitíssimas consequências práticas para retirar. Isto para sublinhar que é possível um partido estar no Governo e outro na oposição e encontrarem plataformas de entendimento.

O PS deve procurar o PSD para aprovar os próximos Orçamentos?
Diria que ninguém deve ser excluído à partida.

Mas há um bloco preferencial? É mais natural procurar o PSD depois do que se passou neste último Orçamento?
Eu não estarei no processo de decisão do PS no próximo futuro. Mas o que queria sublinhar é que a sociedade portuguesa está confrontada com desafio muito sérios, os que resultam da crise económica e social derivados do efeito da pandemia e da exigência de juntar esforços no país para a recuperação económica que é tão indispensável utilizando as possibilidades de financiamento de origem comunitária da melhor maneira. Para isso, tudo o que for possibilidade de entendimento é bem-vindo. Os portugueses estão muito cansados de polémicas políticas estéreis. E certamente aplaudirão todos os que revelarem capacidade de compromisso.

O que está a dizer é que tem de haver esta disponibilidade do PS para esse diálogo mais aprofundado com o PSD?
Creio que o que o PS deve é não fechar nenhuma porta e ter uma clareza sobre as questões nacionais fundamentais e em função delas saber encontrar os interlocutores para que a base política de apoio seja o mais forte possível. E acho que é isso que o país quer e espera dos responsáveis políticos.

Há uma divisão dentro do PS em relação a essa escolha?
Não creio, creio que no PS há-de haver uma aposta fundamental em procurar junto do eleitorado o maior apoio possível para as suas propostas. O segundo momento é o que fazer depois de os eleitores se pronunciarem. Ou há uma maioria tão expressiva — que eventualmente até possa ter conotação de maioria absoluta — da parte do partido que ganhar ou não haverá e terá sempre de se gerar condições de governabilidade. Estou convencido que o PS saberá não fechar portas unilateralmente a quem quer que seja.

"O que os portugueses esperam é que o PS saiba encontrar o interlocutor adequado"

Mas não é útil para os eleitores saberem com o que contam? Não é indiferente votar num PS que está mais preparado para se entender com o PSD ou com a esquerda?
O PS na sua história muitas vezes tem demonstrado a capacidade de dialogar, e creio que é isso que os portugueses esperarão e exigirão: que em função das necessidades do país saiba encontrar o interlocutor adequado.

O PSD é fiável para isso?
Gostaria de dizer que sim, e espero como português que sim. Não posso deixar de sublinhar que a direção de Rui Rio foi muito em ziguezague, com posições muito contraditórias no tempo, umas vezes com sinais de aproximação, outras fazendo maiorias de bloqueio com a esquerda, outras exigindo prioridade a reformas e, quanto ao conteúdo concreto, tendo uma espécie de nada para oferecer.

"Os partidos à esquerda cansaram-se de ter uma posição construtiva e regressaram, pelo menos por agora, à velha condição de partidos de protesto"

Quando Rio surgiu a mostrar disponibilidade para entendimentos, esperava um resultado mais substancial?
Não era expectável que nesse momento acontecesse porque estávamos na fase em que a chamada geringonça estava a dar os seus passos — não se desenvolveu mais no tempo porque os partidos à esquerda do PS cansaram-se de ter uma posição construtiva e regressaram, pelo menos por agora, à velha condição de partidos de protesto.

Pedro Nuno Santos disse que não foi um parênteses e a ala da esquerda parece maioritária no PS. Como é que se consegue negociar com o PSD os próximos Orçamentos e ao mesmo tempo apaziguar um partido que parece mais virado à esquerda?
Não sei qual é a tendência mais expressiva no PS num momento em que não conhecemos os resultados das eleições. O que acho é que o PS não deve meter ninguém entre parênteses.

Portanto dependerá do resultado. Se houver maioria absoluta a questão não se coloca.
Ou então, mesmo que não seja absoluta, que seja tão expressiva que todos os partidos reconheçam que têm de dar um contributo positivo para não obstruir a governação de um partido com um apoio larguíssimamente maioritário. Lembro-me do primeiro mandato do Governo de António Guterres – uma governação sem maioria absoluta, mas muito próxima dela.

Ascenso Simões, deputado do PS, dizia há umas semanas aqui na Vichyssoise que estas eleições seriam um referendo à liderança de António Costa. Concorda com ele? Acha que isto vai pôr em causa o ciclo de Costa?
Diga-me quais são as eleições que não são uma maneira de referendar os líderes.

"Apesar das lideranças ziguezagueantes, há um ponto em que reconheço uma atitude positiva a Rio: dar sinais de disponibilidade para o diálogo"

Neste caso, pode haver uma mudança de líder no PS, tendo em conta a tendência para que o PS se virará. Há muito quem fale em Pedro Nuno Santos, caso o PS queira seguir uma via mais à esquerda.
Não vou especular porque creio que não está na ordem do dia a saída de Costa da liderança nem é previsível que o PS tenha uma derrota, pelo contrário. Seria apenas um exercício para algum deleite intelectual.

A vitória de Rui Rio foi uma má ou boa notícia para o PS?
Por mim, não foi uma notícia. Apesar das lideranças ziguezagueantes, há um ponto em que reconheço uma atitude positiva: dar sinais de disponibilidade para o diálogo. Ao contrário da outra candidatura [de Paulo Rangel], que manifestava nitidamente o propósito de estabelecer um muro em relação ao PS, que é o que os partidos com maior responsabilidade não devem fazer um em relação ao outro.

Foi ministro dos Assuntos Parlamentares, até em momentos muito difíceis, como o chumbo do PEC IV, a última situação parecida com esta. Qual é o peso dessa figura nestas negociações? Pedro Nuno Santos conseguiu aguentar a geringonça, Duarte Cordeiro conseguiu aprovar dois Orçamentos. Há aqui algum falhanço de Cordeiro?
Não creio que seja por aí, pela mera arte política. Naturalmente que as relações com o Parlamento são muito importantes para manter diálogo, mas depois há circunstâncias políticas sensíveis, nalguns casos tornam-se dramáticas, em que as portas se fecham. Tive essa experiência na vicissitude que foi o PEC IV. O Orçamento que na altura esteve em apreciação para 2011 não foi uma negociação nada fácil, eu participei até dado momento, e conseguiu-se no limite um entendimento — não vou perder tempo agora a criticar o mérito relativo desse entendimento, mas ele foi viabilizado. Ficou uma questão por resolver, dos 600 milhões de euros no corte da despesa pública que reclamava o PSD. Quando chegámos ao PEC IV, o que realizou, para melhor ou pior, foi a concretização desse corte. O que aconteceu naqueles meses? A exigência desse corte, que se ia concretizar, o mesmo partido que a exigiu… rejeitou-a. São as contradições da vida política.

"Não foram verdadeiramente as soluções do Orçamento de Estado que estiveram em causa, foi um conjunto de exigências [da esquerda] que nunca mais parariam"

Duarte Cordeiro foi vítima do mesmo agora, com este chumbo do Orçamento?
Não. Creio que as circunstâncias são muito diferentes entre si e creio que aquilo que se terá passado nesta altura é que os partidos à esquerda do PS, em função da avaliação que fizeram da sua posição depois das eleições autárquicas, se terão convencido que a sua posição construtiva de apoio ao Governo não lhes era suficientemente rendível. E, portanto, não foram verdadeiramente as soluções do Orçamento de Estado que estiveram em causa, foi um conjunto de exigências que nunca mais parariam para justificar a rutura porque entenderam que, do ponto de vista tático, o seu interesse partidário não passava já pelo apoio à ação legislativa.

Estamos perante uma nova composição do Parlamento. Ferro Rodrigues não continua. Já se falou de nomes como Augusto Santos Silva ou Carlos César. Vê com bons olhos um destes dois nomes? O Jorge Lacão não acalentou também um dia essa vontade de ser presidente da Assembleia da República?
As minhas razões íntimas guardo-as para mim. Mas mais importante do que especular sobre o futuro presidente da Assembleia era haver consciência de que seria importante que se fizesse uma exigente radiografia do modo como o Parlamento funciona ou tem funcionado. Há muitos aspetos da nossa vida parlamentar que merecem ser revisitados, no sentido de requalificação da prática parlamentar. Tenho sido crítico dos desenvolvimentos do modo de funcionamento parlamentar em vários aspetos que acho que, para a revitalização da representação democrática, carecem mesmo de alguma reforma prática efetiva.

"A agenda parlamentar tem hoje em dia uma tal quantidade de matérias, muitas delas demasiado irrelevantes para ocuparem o centro nevrálgico das atenções do Parlamento"

E, nesse aspeto, há aí autocrítica? Não em termos de funcionamento da Assembleia, mas sobre a bancada do PS: o grupo parlamentar foi subserviente? Foi autónomo?
Refiro-me a aspetos mais transversais. No sentido em que nós temos vindo, com o aumento da representação partidária na AR, a criar uma multiplicidade de representações, o que em si mesmo não tem de ser negativo, mas com uma disputa absolutamente desenfreada pela agenda parlamentar. E a agenda parlamentar tem hoje em dia uma tal quantidade de matérias, muitas delas demasiado irrelevantes para ocuparem o centro nevrálgico das atenções do Parlamento. Era necessário recentrar o sentido das prioridades políticas em matérias que contem e não apenas aquelas que desenvolvem funções tribunícias.

Avançamos para um segmento que é o Carne ou Peixe em que tem de escolher uma de duas opções:

A quem ofereceria este Natal a Constituição da República Portuguesa: Rui Rio ou Passos Coelho?
Rui Rio, certamente.

Preferia ser ministro num Governo liderado por Ana Catarina Mendes ou Pedro Nuno Santos?
Já não estou em condições de alimentar expectativas dessas e já passei pela experiência. E foi suficiente.

Então a quem é que oferecia um presente por menos de 150 euros neste Natal: Ana Catarina Mendes ou Pedro Nuno Santos?
A Ana Catarina Mendes, que foi a líder parlamentar enquanto eu fui deputado nesta última legislatura.

Preferia um Parlamento com menos deputados ou um Parlamento com o mesmo número de deputados mas sem o Chega?
Um Parlamento que pudesse ser constituído a partir de um sistema eleitoral melhor do que aquele que temos hoje.

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora