775kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

LU.CA. Quem são os graúdos que fazem o novo teatro dos miúdos?

O Teatro Luís de Camões, na Calçada da Ajuda, é, desde junho, o mais jovem teatro lisboeta. Abriu portas para receber especialmente os mais jovens. Fomos conhecer a equipa que o põe a funcionar.

Chegamos ao LU.CA ao mesmo tempo que o autocarro que traz os curiosos. As miúdas e os miúdos que aqui estão para assistir à “mini conferência para miúdas e miúdos curiosos sobre o racismo”, de Rita Pedro, trazem o rosto animado de quem prefere estar aqui do que numa sala de aula. Isso já ninguém lhes tira. Depois é observá-los na diferença: uns desembrulham o pão de leite, livram-no do papel de alumínio que o envolvia e trincam-no, confiantes; outros sentam-se na escada do átrio, meio que a fugir à chuva que já ia caindo; outros ainda sobem ao entrepiso para desenhar ou atirarem-se para os sofás. Afinal, ainda que não haja aula, continua a ser cedo, continua a existir sono. O LU.CA – Teatro Luís de Camões, na Calçada da Ajuda, é o mais jovem teatro lisboeta, aberto em junho, feito precisamente para os mais jovens, que até tem a alcunha de “lugar para as crianças, para os jovens e para as artes”. Fomos conhecer a equipa que o sustém, ou seja, os seus amigos.

É precisamente isto. A ideia que isto é tudo deles. Garantia de Susana Menezes, diretora artística do teatro inaugurado a 1 de Junho e em funcionamento normal desde setembro: “É importante que este teatro seja mais do que os espectáculos que acontecem na sala, que seja um espaço de relação, um espaço de proposta de conforto, queremos que o LU.CA seja um sítio onde nos podemos atirar para o sofá e tirar os sapatos”. E a verdade é que o nome, ou a origem do nome, já faz a sugestão: LU.CA, lugar para as crianças, para os jovens e para as artes.

Mais diretos à história deste espaço convém, antes de avançar, dizer que estamos no primeiro teatro dedicado ao público infanto-juvenil no país. E só isso já não é pouco. E depois expliquemos que antes era só Teatro Luís de Camões, inaugurado em Junho de 1880, numa altura em que se assinalavam os trezentos anos da morte do poeta, em 1580. Mais tarde, em 1911, o Belém-Clube, uma associação cultural e sociedade recreativa, que viria a dinamizar o edifício com cultura até este ter sido fechado por razões de segurança, em 2015. Pelo meio, já tinha sido adquirido pela Câmara Municipal de Lisboa.

A reabertura oficial deu-se já sob a liderança de Susana Menezes, que era a programadora para o público infanto-juvenil do Teatro Maria Matos e que consigo trouxe alguns elementos dessa equipa, aos quais se uniram novos membros.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Rosa Ramos

49 anos, bilheteira/comunicação com as escolas

Primeiro não nos queria dizer a idade. Nem nos deixou adivinhar, não fosse a coisa ficar mal na fotografia. Depois lá disse. E a sua boa disposição é seguramente um dos motivos do sorriso que o átrio do LU.CA parece ter. Rosa Ramos é como que as boas-vindas do espaço da Calçada da Ajuda.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Está por aqui desde o início de setembro e antes já tinha esta mesma ocupação – divide-se entre a bilheteira e a comunicação com as escolas – no Teatro Maria Matos, integrada na equipa de Susana Menezes. E isso significa fazer bilheteira, contactar escolas para perceber se certa proposta programática faz sentido para as mesmas, esperar por marcação, garantir transporte se for esse o caso, entre outras coisas: “As escolas são um público muito particular, que varia muito, tal como as crianças em si, que também são muito diferentes entre si”, avisa antes de dar um exemplo concreto: “Tivemos um espectáculo que se chamava ‘Um tigre-lírio é difícil de encontrar’ [encenação de Alex Cassal] e no meio daquilo tudo, às tantas, um menino e uma menina têm que dar um beijinho, mas o menino não sabe, então outra menina exemplifica, com a menina. À saída fui perguntando se tinham gostado e quase todos diziam que sim, mas havia um rapaz muito sério, que me disse que não, porque estavam duas meninas aos beijos”, conta Rosa.

Basta um exemplo como este para perceber a importância do LU.CA e de Rosa, do seu trabalho. A mesma que confessa que o quotidiano que aqui se vive não é comum: “É diferente sim, é animado e estamos todos mais perto uns dos outros, há uma relação muito mais familiar do que habitualmente se vive num teatro”, conclui.

Beatriz Vasconcelos

24 anos, comunicação

Depois, a nossa guia particular, a pessoa que nos acompanhou por corredores estreitos e baixos – cuidado com as armadilhas, se for à parte administrativa do LU.CA e é relativamente alto, vá por nós, baixe a cabeça –, que disse ao que vínhamos, que meteu as pessoas a falar. Beatriz Vasconcelos tem 24 anos e já gere a comunicação de um teatro municipal. Antes de estar aqui sempre esteve ligada à comunicação e produção cultural e passou por projetos como o Doclisboa, o Festival Silêncio, o Rama em Flor, a revista PISTA!, o Nova Batida, e até pela Ordem dos Farmacêuticos: “Aí não aprendi nada sobre farmácia, mais sobre protocolo e burocracia”, afirma. Claro, também faz falta.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Dentro destas paredes gere a comunicação, que não se pense que é só enviar press releases para as redações e aturar os humores conturbados dos jornalistas. “É pensar como queremos comunicar, qual é o nosso posicionamento e linguagem, quem é o LU.CA, quem é que ele quer ser, qual o seu pensamento, qual é o seu aspeto, através do design, tudo isso”, explica.

Fez ballet, teve sempre as artes performativas como uma das bases da sua formação e adora crianças, ou seja, meio ou quase todo o caminho andando, “gosto da sua espontaneidade e inocência, e aqui não se trabalha como se as crianças não percebessem nada, porque percebem”, diz.

Mas há mais comichões por coçar, claro. “O LU.CA acabou de abrir, queremos que os miúdos possam dizer ‘quero ir ao LU.CA porque lá posso ser e existir’. É claro que é muito gratificante estar numa missão completamente nova e inédita no país, mas ao mesmo tempo é assustador. Assusta dizer que somos os primeiros e que vamos fazer assim”.

Bárbara Fernandes

33 anos, adjunta da direção de cena

Como em todo e qualquer teatro, há que ter pessoas perto do palco, para dar apoio aos artistas, para os colocar à vontade. Bárbara Fernandes é um desses elementos, com passagens pela direção de cena em estruturas como a Fundação Calouste Gulbenkian, o CCB, o Maria Matos. “O nosso trabalho é gerir os espectáculos, fazer a preparação dos mesmos junto das companhias, gerir as suas necessidades, bem como as entradas e saídas do público, entre outras coisas”, explica.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Prontifica-se a dizer que, por comparação a outros locais onde já trabalhou, a sala do LU.CA “é incrível”, assume antes de continuar: “É muito pequena, posso estar a falar para a régie sem ter que gritar, é tudo muito fácil, é quase só esticar o braço e chego ao projetor”.

E as diferenças não acabam aqui, sobretudo se pensarmos no público-alvo. “É, de facto, um público diferente e isso é interessante, muda muito com as idades. Por outro lado, os espectáculos são durante o dia, de manhã ao fim-de-semana, acho que cada vez mais os pais querem tirar os filhos de casa, temos tido as sessões quase sempre cheias. E os miúdos sabem comportar-se, nota-se que há escolas que costumam ir ao teatro, que sabem estar”, avisa.

Glória Silva

51 anos, diretora executiva

Rumamos aos gabinete do LU.CA, onde encontramos Glória Silva, diretora executiva do LU.CA, que também vem do Maria Matos. Esta é daquelas funções menos artísticas e mais administrativas, que sempre são essenciais para a respiração de um teatro. Muito sucintamente, Susana Menezes programa, ou apresenta a programação, e Glória Silva tem que arranjar veículos para que essa programação seja concluída.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Isso e não só: “Tenho que garantir que todo o equipamento necessário para este espaço existe, tenho que gerir o orçamento anual, garantir que é executado, tenho que gerir equipas, os recursos humanos”, confessa.

E nesse aspeto, estamos bem? “Sim, a equipa é toda cinco estrelas, é uma mistura de pessoal já com alguma experiência e malta mais nova, é importante ter sangue novo”, esclarece.

Bruno Reis

37 anos, diretor de produção

Antes de dirigir a produção do LU.CA, Bruno Reis já fez produção em inúmeras entidades em Lisboa, nomeadamente no São Luiz. Também trabalhou com o Teatro Praga, com Cristina Carvalhal, no Maria Matos: “Acho que não há nenhum festival de artes performativas em Lisboa que não tivesse feito”, avisa de imediato. E também para Bruno, como Beatriz Vasconcelos já havia referido, o facto de o LU.CA ser algo inédito é como que uma condição afrodisíaca: “A ideia de estar aqui desde o zero, a coisa de não existir uma regra nem um modelo a seguir interessa-me muito”.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Bruno admite ainda que este é seguramente um teatro diferente, nem que seja porque o público é diferente, ou porque “os miúdos podem berrar, ir à casa de banho” ou até porque têm “carrinhos de bebé para guardar à entrada”. Além disso, um produtor tem que perceber do que é que os artistas precisam, gerir o seu calendário, ver do dinheiro, dos contratos e da sua execução, um bocadinho de tudo, que Bruno explica com um cliché: “É uma frase feita, mas não deixa de ser verdade, a melhor produção é aquela que não se vê. Somos o back up dos artistas, eles sabem que, em princípio, se faltar alguma coisa ou algo não estiver bem, nós resolvemos”. Bruno resolve.

Mariana Oliveira

28 anos, assistente de programação

Mariana Oliveira é formada em pintura. Algo que nos faz franzir a sobrancelha, mas que, se olharmos em redor, se atentarmos na mesa do entrepiso, onde canetas e lápis de todas as cores estão junto de folhas brancas, talvez não surpreenda assim tanto. E muito menos se dissermos que a sua formação e consequente entrada no mercado profissional teve muito menos que ver com pintura e muito mais que ver com educação cultural.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

“Trabalho com a Susana Menezes diretamente. Por agora, a Susana pediu-me para fazer um dossiê pedagógico para cada espectáculo onde a ideia é que o espectáculo não acabe aqui, que as crianças possam desenvolver aquilo que viram aqui”, enquadra. Além disso, no seu quotidiano, está sempre próxima de Susana Menezes a tentar fechar programação: “Pede-me sugestões, diz-me para lhe organizar X calendário, pede-me para contactar X artista”, conta.

Está também a gerir um outro projeto, chamado Labor. “É, no fundo, um concurso para escolas, para o 3º ciclo e secundário, onde será criado um laboratório de teatro nas escolas que se quiserem candidatar, para criar um discurso performativo que depois apresentam aqui no LU.CA”, conta.

Tasso Adamopoulos

46 anos, adjunto de direção técnica

Tasso Adamopoulos é a mais recente aquisição do LU.CA e está por aqui há um mês. “Comecei há um mês, fui freelancer durante 20 anos, fiz design de iluminação para várias companhias”, conta. Como qualquer técnico, a componente de bastidores, de contacto com as companhias para abordar questões técnicas, as montagens e os seus timings, é uma parte essencial do trabalho de Tasso.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Depressa perguntámos como classificaria, a nível técnico, este teatro: “Estamos bem servidos, e, de qualquer das formas, estamos muito no início e por isso ainda estamos a comprar coisas para servir melhor a sala, será melhor no futuro, seguramente”, explica.

Quanto à relação com este público tão específico, Tasso admite tudo: “Confesso que ao início foi um bocado estranho para mim, o quotidiano, mas já me estou a habituar, já tinha feito luzes para espectáculos para crianças, mas estar em contacto constante com elas não era um hábito meu. Além disso, acho que a Susana está a fazer um excelente trabalho, fazemos espectáculos muito interessantes para crianças e acho que isso é algo que não é muito habitual”, conclui.

Susana Menezes

45 anos, diretora artística

Entramos no gabinete de Susana Menezes e está um calor que não se aguenta, devido ao exagero da temperatura colocada no ar-condicionado. “Toda a gente se queixa disso”, começa por avisar. Mas, dizemos nós, não se devem queixar de muito mais, pelo menos a avaliar pelos constantes elogios que a equipa lhe fez durante esta nossa estadia no LU.CA – é claro que não iam dizer mal, não é? Mas podiam não ter dito nada… bom, deixemos os assuntos internos dentro de portas.

O que é que sempre se pergunta a um diretor artístico ou a alguém que dirige um entidade como esta? Que balanço é que faz destes primeiros meses, pois claro. “O balanço que posso fazer é desde dia 1 de Junho, e acho que é um balanço muito positivo. Nós, o programa e parte da equipa, viemos de uma outra parte da cidade, com uma escala mais reduzida, já lá estávamos há doze anos, tínhamos os nossos pais, as escolas, os vizinhos, e de repente perdemos essa relação com o centro da cidade, achei que o projeto se podia ressentir, é como quando tu mudas de casa…”, afirma.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Mas não se ressentiu, o projeto. Num curto espaço de tempo, o LU.CA tem sido procurado por escolas e famílias, tem a aprovação de todos, no fundo. E Susana acha que tem que ver diretamente com o facto de “as pessoas sentirem carinho por esta ideia de este ser o primeiro teatro para crianças e jovens no país”, diz.

O que é que se pergunta depois? Talvez: o que é que as crianças dizem do LU.CA: “Dizem várias coisas. Devíamos fazer uma mascote, devíamos ter um hino… sabes que perguntar a uma criança o que é que ela acha deste teatro… eu acho mais justo observá-la e ver como se comporta neste teatro feito para ela. É importante que este teatro seja mais do que os espectáculos que acontecem na sala, seja um espaço de relação, um espaço de proposta de conforto, queremos que o LU.CA seja um sítio onde nos podemos atirar para o sofá e tirar os sapatos”.

Antes de aqui estar Susana Menezes esteve doze anos à frente da programação infanto-juvenil do Teatro Maria Matos. E ainda que seja formada em design, começou nisto de pensar as artes performativas para crianças em 2001, no Teatro do Campo Alegre, no Porto. E nunca mais parou. E o que faz um diretor artístico? “Sou diretora artística e a minha função é pensar no conteúdo artístico que vai acontecer neste edifício, essa prática faz com que esteja sempre à procura, à procura nas exposições de fotografia, nos recitais de poesia, numa feira de edições em segunda mão, na Feira da Ladra. Estou sempre à procura de novas ideias e de novas invenções. Tu treinas ser criativo, exercitas isso mentalmente, as pessoas que ocupam este cargos vêm de áreas muito diferentes, não há formação em ser diretor artístico de um teatro para crianças, pelo menos ainda não descobri”, avisa. O que já existe é um teatro para crianças e jovens. E isso é muito bom.

Fotografias de André Dias Nobre

Assine a partir de 0,10€/ dia

Nesta Páscoa, torne-se assinante e poupe 42€.

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver oferta

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine a partir
de 0,10€ /dia

Nesta Páscoa, torne-se
assinante e poupe 42€.

Assinar agora