Enviada a Madrid
Este domingo à noite, o Wanda Metropolitano serviu de palco aos Bon Jovi, a banda norte-americana. O concerto, que reuniu 50 mil pessoas no estádio do Atl. Madrid, foi um eventos do mês na capital espanhola e atraiu enorme atenção mediática. Mas isso foi domingo. Arrumadas as guitarras, desmontadas as baterias, reunidos os microfones, era tempo de entrar outro Jon em ação em Madrid: não o Bon Jovi, mas o Félix.
Esta segunda-feira, dia da apresentação enquanto novo reforço do Atl. Madrid, foi o primeiro dia oficial do até aqui jogador do Benfica em Madrid. Duas semanas depois de passar pela capital espanhola para assinar contrato válido para as próximas sete temporadas e filmar o vídeo onde aparece entre as obras de arte expostas no Museu do Prado, João Félix voltou à cidade que durante quase dez anos foi de outro português, Cristiano Ronaldo. O jovem jogador aceitou o desafio para “escrever a própria história”, objetivo que delineou e repetiu ao longo da apresentação, e chegou ao Atl. Madrid para começar um novo capítulo colchonero que continua a ter no número 7 a sua figura de proa: só mudou o nome na camisola, de Griezmann para o português.
O dia de João Félix até começou por outras paragens, a cerca de uma hora de carro de Madrid. O Atl. Madrid já está a estagiar em Los Ángeles de San Rafael, uma estância que foi do polémico ex-presidente Jesus Gil y Gil. O jogador português treinou pela primeira vez às ordens de Diego Simeone, sempre muito próximo de Diego Costa, e fez depois uma rápida deslocação ao Wanda Metropolitano para sorrir em público com a camisola rojiblanca nas mãos. Enquanto Félix ouvia as primeiras indicações de Simeone – já a apontar à International Champions Cup, o torneio de pré-época onde também está o Benfica e onde o Atl. Madrid encontra o Guadalajara já no próximo dia 24 de julho –, os adeptos colchoneros começavam a aproximar-se e a colorir as imediações do estádio, quase todos a tentar perceber se poderiam ou não assistir à apresentação da contratação mais cara da história do clube.
“¿A qué hora llega el niño?” (a que horas chega o menino?), perguntavam entre eles, utilizando uma alcunha que noutros dias já foi de outro avançado em Madrid. Fernando Torres, o espanhol que terminou a carreira há poucas semanas e fez história ao serviço do Atl. Madrid, era conhecido como El Niño, por se ter estreado com a camisola da equipa principal dos colchoneros ainda muito novo. João Félix, com 19 anos, é agora el niño – o menino de quem se espera tudo e mais alguma coisa. E por quem se faz tudo e mais alguma coisa: até esperar ao sol, com os mais de 30 graus que esta segunda-feira se faziam sentir em Madrid, até ser possível entrar no balcão de informações do estádio para perguntar se a apresentação será aberta ao público.
A resposta é negativa. O Wanda Metropolitano só abrirá as portas do auditório e a cerimónia será à porta fechada. Desilusão para os adeptos, que estavam à espera de um momento como o que o Real Madrid proporcionou a Cristiano Ronaldo em 2009, mas não necessariamente a tristeza total: do balcão de informações dirigiam-se para a porta 10 do estádio do Atl. Madrid, mesmo a meio da estrutura, e tiravam fotografias com o enorme placard com a cara e nome de João Félix nas costas. Daí, partiam para a loja oficial do clube, onde a camisola 7 do jogador português está em todo o lado e é já um best seller (em dois dias, foram vendidas sete mil camisolas com o nome de Félix).
A benção de Futre à porta fechada
No meio de tudo isto, e com a memória rápida de que na próxima quarta-feira se assinala um ano desde que Cristiano Ronaldo foi confirmado enquanto novo jogador da Juventus (o que significa também que se assinalam três anos desde que Portugal foi campeão europeu em França), é fácil esquecer que poucos sabiam quem era João Félix há um ano. A 10 de julho de 2018, o mundo parava para olhar para as redes sociais da Juventus, onde Ronaldo deixava de vestir apenas o branco do Real Madrid e passava envergar as riscas negras da equipa de Turim. Há um ano, falava-se de Mbappé, que ainda não era campeão do mundo com a seleção francesa; comentava-se, como sempre, a novela Neymar e a aparentemente sempre muito provável saída do PSG; e especulava-se sobre a possibilidade de Modric, face ao Mundial que estava a realizar com a Croácia e à Liga dos Campeões conquistada com o Real, vencer a Bola de Ouro. Há um ano, João Félix não entrava nas equações dos mercados de transferências, dos negócios mais valiosos de sempre e gigantescos placards luminosos nas fachadas de grandes estádios europeus.
Há um ano, João Félix era apenas João, o miúdo das camadas jovens do Benfica que até estava na calha para se estrear pela equipa principal. A ascensão meteórica do jogador de apenas 19 anos, que começou com um golo valioso marcado ao Sporting e terminou com uma reta final de temporada acima da média que foi muito útil ao Benfica para conquistar o título nacional, faz com que nos esqueçamos de que João Félix acabou de chegar – e tem ainda um futuro inteiro à sua disposição. Memórias à parte, o jovem português entrou no auditório do Wanda Metropolitano pouco depois das 13h, a hora marcada para a apresentação, e cumprimentou de imediato Paulo Futre com um abraço demorado. Sentou-se perto dos pais e do irmão, ouviu com atenção as palavras do presidente do Atl. Madrid, Enrique Cerezo, e foi chamado a palco.
No momento em que subiu os três degraus que dão acesso ao palco do auditório, e já depois de cumprimentar Cerezo, Félix não conseguiu evitar uma fração de segundo que provocou algumas gargalhadas na assistência – e que deixa claro, em toda a linha, que o jogador natural de Viseu ainda não interiorizou (ou não quer interiorizar) que é a contratação mais cara da história de um clube que está todos os anos na Liga dos Campeões e que luta pela liga espanhola.
Uma cadeira que não sabia ser sua
No palco, estavam apenas um palanque com um microfone e uma cadeira, mesmo no centro, a reunir todas as atenções: confrontado com este cenário, João Félix achou que a cadeira não poderia ser para si. Encostou-se ao palanque, pronto para falar, e só quando foi alertado pelo assessor do Atl. Madrid é que entendeu, entre sorrisos, que a cadeira de honra era mesmo para si.
Depois dos conselhos de Paulo Futre e Adelardo Rodríguez, dos agradecimentos à família, aos amigos e ao Benfica, das respostas claras e sem grandes rodeios às perguntas dos jornalistas, da fotografia da praxe com a camisola na mão, lá foi ele. De camisa branca e calças cinzentas mas de ténis, João Félix saiu pela porta do auditório do Wanda Metropolitano, entrou num carro e regressou a Los Ángeles San Rafael para se juntar novamente à comitiva do Atl. Madrid. À porta da garagem, à espera de que o jogador português saísse, juntaram-se vários adeptos vestidos a rigor: afinal, Madrid tem novo niño. Mas este é português – e já garantiu que está “contente e confiante” com o novo desafio.
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