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Maio de 68: o olhar de quem estava na outra margem

Paris será sempre Paris, e isso é verdade tanto para quem levantava as pedras das calçadas como para os que olhavam da outra margem para essa revolta sem revolução. Um ensaio de Jaime Nogueira Pinto.

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Muitas das análises do Maio de 68 seguem a ideia de “revolução inexistente”, de Raymond Aron, de revolta ou rebelião tardo-burguesa sem grandes consequências, ou tendo consequências paradoxais e até contrárias às desejadas pelos seus protagonistas – como o reforço eleitoral de uma assustada maioria gaullista e a consolidação do capitalismo liberal francês. Mas talvez não tenha sido bem assim; talvez o Maio de 68 tenha afinal sido precursor da revolução dos costumes agora institucionalizada no actual reality show globalizante e na agenda pós-moderna da Nova Esquerda, com as suas novas minorias e o seu escrupuloso policiamento da linguagem, dos gestos e do pensamento.

“We will always have Paris”

“We will always have Paris”, o memorável cliché hiper-romântico do final de Casablanca é sempre um mote – e um jeux de mots– apropriado para a minha geração, formada entre filmes americanos e romances franceses.

Mas o Paris que temos ou que “teremos sempre” depende de quem somos ou de quem éramos ou julgávamos que éramos, e este cinquentenário do Maio de 68 mostra-o bem. Com ele aparecem, nostálgicos, ainda iludidos ou saudosos da ilusão, os outrora estudantes que então lançavam pedras à polícia, na Sorbonne, e desfilavam nas ruas pedindo “o impossível”. Ou os que os viam de longe e de fora e desejavam lá estar. Quase todos, os vivos, reciclados pela sociedade liberal capitalista e consumista que então abominavam – e relativamente satisfeitos.

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O Paris do meu “nós” – e por isso, e em certa medida, o Paris que “teremos sempre” – inclui o Maio de 68, mas visto de uma outra margem e à volta de um tempo anterior. O meu “nós” tinha particular fascínio pelos “americanos de Paris” e em Paris, Scott Fitzgerald, Hemingway, John dos Passos, Henry Miller

O Paris do meu “nós” – e por isso, e em certa medida, o Paris que “teremos sempre” – inclui o Maio de 68, mas visto de uma outra margem e à volta de um tempo anterior. O meu “nós” tinha particular fascínio pelos “americanos de Paris” e em Paris, Scott Fitzgerald, Hemingway, John dos Passos, Henry Miller, arrumados à volta de livrarias como a Shakespeare & Co. e de designações como a Geração Perdida; e um sem número de livros de memórias: A Moveable Feast, de Hemingway, Memoirs de Montparnasse, do americano-canadiano John Glassco, ou Paris was Yesterday: 1925-1939,de Janet Flanner. E, por interposta ficção, os clássicos pioneiros de Henry Miller, Quiet Days in Clichy e Tropic of Cancer.

Tudo isto fazia parte da nossa educação sentimental e sexual de adolescentes dos anos sessenta. Paris era uma referência literária, com uma geografia também histórico-literária que nos fazia, nas primeiras visitas, ir à procura do tempo perdido na Notre Dame de Victor Hugo, lugar de gárgulas, de demónios, de santos e do respectivo Corcunda, ou no rasto da Rue des Fossoyeurs, nº 7 (hoje o nº 12 da Rue Servandoni), onde se alojou o gascão d’Artagnan, entrado em Paris pelo Pont Neuf. Ou do Arsène Lupin, gentleman-cambrioleur, de Maurice Leblanc, que habitava o nº 8 da Rue Crevaux, no 16éme Arrondissement. E, passando das personagens para os autores, das criaturas para os criadores, percorrendo as moradas de Proust: a residência dos pais, no 45, Rue de Courcelles, ao 102, Boulevard Haussmann, onde escreveu o grosso da Recherche, entre 1906 e 1919, e o 44 da Rua Hamelin, onde viria a morrer no Outono de 1922.

“À bout de souffle”, um dos filmes icónicos de Jean-Luc Godard, com Jean-Paul Belmondo e Jean Seberg

O nosso Paris fazia-se também de imagens de fitas francesas passadas em Paris – de René Clair, de Marcel Carné, de Henri-Georges Clouzot, de Claude Autant-Lara, de Jean-Luc Godard – filmes com Jean Gabin, Michelle Morgan, Brigitte Bardot, Alain Délon, Jean-Paul Belmondo, Jeanne Moreau. Fitas primeiro a preto e branco e depois a cores. Inesquecíveis.

E como é que o vi de perto, na História, como é que nós – os que, estando nos seus antípodas político-ideológicos, também tínhamos Paris na pele e na cabeça – vimos, vivemos e pensámos esse tempo?

E para uma geração que entrou para a política em 1961 com a guerra de África e a guerra da Argélia, as imagens e as memórias eram também políticas. Assim, meio-século depois de uma história cujo epicentro é Paris, ainda mal refeito do espanto de já terem passado cinquenta anos, pergunto-me como é que hoje vejo, ao longe, esse Maio de 68? Que herança deixou, o que é que dele ficou ou se reacendeu? E como é que o vi de perto, na História, como é que nós – os que, estando nos seus antípodas político-ideológicos, também tínhamos Paris na pele e na cabeça – vimos, vivemos e pensámos esse tempo? O que foi para mim então, entretanto e agora o Maio de 68? Para o adolescente militante da Algérie Française, leitor de Maurras e da “droite buissonière”, admirador dos soldados perdidos do império francês, desembarcado em Paris pela primeira vez em 1969; para o emigrado-exilado em Madrid da segunda metade dos anos 70, que às vezes ali aterrava; para o “combatente” da segunda guerra fria que por lá passava nos anos 80; para o neo-africano dos anos 90 que lá se encontrava com os que vinham da mata para a cidade grande e com os que ali velavam pelo pré-carré da France-Afrique, de forma às vezes bem maquiavélica. E para a soma geométrica de todas estas coisas que sou hoje – porque, tirando os cigarros, nunca fui nem sou trânsfuga de nada.

Idos e Ideias de Maio

Maio de 68 é um tempo simbólico. E como sabem os que olham a História com olhos de ver, os símbolos são tudo e são nada. A Bastilha era uma prisão quase desactivada do Ancien Régime, no tempo dos já brandos costumes de Luís XVI, e naquela terça-feira de14 de Julho de 1789, tinha 32 guardas suíços, 82 inválidos de guerra e sete prisioneiros, dos quais só Auguste-Claude Tavernier, que tentara assassinar Luis XV e por isso ali estava há 30 anos, era “político”. Dois condes meios loucos e quatro falsários completavam o elenco. Tomar a Bastilha, em termos de poder, não adiantava nem atrasava nada para a solução final das coisas; mas foi “a tomada da Bastilha”, que custou 100 mortos entre os “defensores” e o “povo de Paris”, que veio a desencadear e a simbolizar a mais significativa revolução da História moderna. Se Luís XVI tivesse depois mandado dispersar os representantes populares na sala do Jogo da Pela e neutralizado a Revolução, a Bastilha teria perdido todo o valor simbólico, ou ganhado outro. Mas haveria uma outra Bastilha noutro sítio qualquer.

Em 1789 Tomar a Bastilha, em termos de poder, não adiantava nem atrasava nada para a solução final das coisas; mas foi “a tomada da Bastilha” que tomou todo o valor simbólico da Revolução Francesa

O Maio de 68 é um destes símbolos; um marco com um apelo forte, uma história que apesar da História e por entre a sua memória, tem códigos de atracção e repulsa, de fascínio e enfado inultrapassáveis e indispensáveis. Para uns, significa juventude, inconformismo, rebeldia, audácia, novidade; para outros, fraude, ilusão, subversão, fanatismo, paranóia. Para a maioria, que já não foi contemporânea dos acontecimentos, será uma efeméride percursora do Woodstock, da crise de Coimbra de 1969, dos anos de chumbo de 70, do 25 de Abril de 1974; vagas imagens e slogans de Paris em confusão, numa Europa que ia atravessar situações semelhantes na Alemanha e em Itália.

Tanto quanto me for possível, procurarei manter-me nesta reconstituição, longe de grandes consultas ou de grandes erudições, para poder recolher do longínquo rio do tempo o que ficou daquilo que o tempo foi arrastando. Todos, em Portugal, nas esquerdas e nas direitas, sobretudo os mais politizados, tínhamos referências francesas: Sartre, Nizan, Vercors, Bataille, Beauvoir, Godard, Le Monde, a Resistência. Ou Drieu, Brasillach, La Varende, Les Hussards, Lartéguy, a Argélia Francesa.

No Maio de 68, os nomes dos lugares e das pessoas também são importantes – Nanterre, a Sorbonne, o Odéon, a Rue de Grenelle, Daniel Cohen-Bendit, Alain Geismar, Alain Krivine, Georges Séguy, Georges Marchais, Jean-Paul Sartre, Jacques Chirac, Georges Pompidou, Charles De Gaulle, Jacques Massu, Raymond Aron. Há um ponto de partida da revolta estudantil, causada por um encadeamento de actos de provocação-reacção, uma dialéctica clássica de contestação geracional em que os mais velhos, ou os representantes da autoridade ou do “poder” – professores, políticos, polícias –, vão sendo progressivamente envolvidos em situações em que escolhem mal e perdem.

O movimento tem raízes diversas, mas há duas principais: um hiperindividualismo que contesta o sistema e, talvez mais importante, uma substituição da revolução pela retórica revolucionária.

O movimento tem raízes diversas, mas há duas principais: um hiperindividualismo que contesta o sistema (a sociedade industrial avançada) em nome de um “encanto do mundo”, de um mundo perdido que “o sistema” teria extraviado; e uma teoria da revolução, nas suas variantes marginais ou imaginadas como marginais – utopias trotskistas sonhadas, montagens leninistas-revolucionárias abortadas, novas frentes populares imaginadas.

E, talvez mais importante, uma substituição da revolução pela retórica revolucionária. É que, em Maio de 68, “a revolução” é sobretudo um exercício de retórica revolucionária levado ao extremo, mas sem nunca entrar ou sequer considerar o assalto ao poder. Os protagonistas – primeiro os estudantes, depois os sindicatos – mesmo com o Estado em crise e quase desarmado, não tentam a sua conquista.

Há uma linguagem radical, inspirada ou (re)colhida nos clássicos revolucionários do século XIX e XX – jacobinos, anarquistas, sindicalistas revolucionários, comunistas, marxistas, leninistas, marxistas-leninistas –, mas perante a situação concreta e a janela de oportunidade, o movimento vai sempre hesitar ou recuar, fazendo, de resto, o mesmo jogo que o poder: grande afirmação de princípios, retórica fundamentalista e maximalista, corte civilizacional, apelos à rua, mas na hora da verdade, da acção, nada ou quase nada.

A análise do movimento, dos seus fluxos e refluxos, dos seus avanços e recuos, mostra-o bem. Os estudantes saem à rua a partir de Nanterre e da Sorbone e assentam arraiais no Quartier Latin, o seu campo de batalha, um ícone nesse Paris dos anos 60.

Raízes

As raízes profundas e substanciais da crise e da contestação da “civilização burguesa” vinham doutro tempo e doutro lugar. Fora na América dos anos 50, com Kerouak, com Ginsberg, que surgira uma alternativa – utópica se se quiser – ao modo de vida do capitalismo avançado (e da democracia) dos anos 50. Os manifestos expressos e tácitos da Beat Generatione algumas iniciativas americanas falavam mais de um modelo de vida alternativo na sociedade industrial euroamericana do que num modelo alternativo de organização dessa mesma sociedade. A ideia era mais “mudar de vida” do que “mudar a vida”; atingir uma existência mais livre, mais pura, mais “autêntica” (a palavra soa hoje a banalidade telenovelesca, mas no “nosso tempo” ainda não estava tão vulgarizada).

Nos Estados Unidos a Beat Generatione começou a pregar modelos de vida alternativos na sociedade industrial

Mudar de vida e não a vida também porque o único real modelo alternativo à sociedade liberal e industrial da Europa Ocidental e dos Estados Unidos era então a União Soviética. Uma sociedade que, nesse tempo, já dizia pouco aos jovens idealistas de esquerda das classes médias. Uma dúzia de anos antes, no 20º Congresso do PC da URSS, o Relatório Kruschev sobre os crimes de Estaline e os custos humanos do regime soviético tinha mudado a percepção do comunismo no Ocidente. Tinha-se começado a deixar de explicar e justificar Estaline e o Goulag em nome dos interesses do socialismo e da própria marcha da História, separando a ideologia comunista (boa) das (más) práticas do “Czar Vermelho”.

Optava-se agora – e Maio ajudaria – por assobiar para o lado, inventando um comunismo de rosto humano, sem totalitarismo, sem polícia política, sem campos de concentração. Como se fosse possível… A Esquerda adoptava esta segunda via em 68, precisamente no ano em que a Primavera desse “comunismo de rosto humano”, numa das suas escassas tentativas, despontava e era liquidada na Checoslováquia de Alexander Dubček .

A Esquerda procurava uma outra via em 68, precisamente no ano em que a Primavera de um “comunismo de rosto humano” despontava e era liquidada na Checoslováquia

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Assim, a ideologia do Maio de 1968 concentrava-se nas propostas utópicas, maximalistas, contraditórias, conscientemente excessivas, pedindo “o impossível”. E fazia uma amálgama condenatória dos sistemas de Oeste e de Leste, que considerava igualmente repressivos. Também por isso, o PCF francês, que ao tempo continuava ortodoxo, com Georges Marchais como Secretário-Geral, Georges Séguy à frente da central sindical CGT, e Roger Garaudy, que, embora saísse dois anos depois para criticar a invasão da Checoslováquia, era o ideólogo de serviço, acabaria por jogar um papel estabilizador na crise (o que, sem surpresas, convergia com os interesses geopolíticos da União Soviética). O general De Gaulle, com a sua ideia de tirar a França do sistema militar da NATO e tentar uma terceira via anti-americana era demasiado precioso como símbolo e peça de conveniência para o Kremlin para ser sacrificado numa revolução suspeita, espontânea, vinda de uma classe – os estudantes – que não tinha papel nenhum, pelo menos até aí, na teoria geral da revolução marxista-leninista.

Os dilemas da esquerda europeia

Maio de 68 foi, assim, um grande espectáculo dessa “sociedade de espectáculo” referida por Guy Debord, que estava a consolidar-se no Ocidente: os jovens, no Quartier Latin, ocupando a Sorbonne e arrancando pedras do chão para atirar à polícia; os polícias das Compagnies Républicaines de Sécurité (CRS), com o seu equipamento anti-distúrbios que lhes dava aquele ar conveniente de robots maus ao serviço da burguesia e da sociedade repressiva, vistos como o inimigo a abater pelas generosas hostes juvenis; os grafittis, que iam de coisas engraçadas (embora não muito originais porque os futuristas, os surrealistas, Dádá e as letras do rock e do pop já tinham escrito e contado quase tudo o que era irreverente e imaginativo) até perfeitas banalidades e imbecilidades avulso.

A carga ideológica era um cocktail de tendências ou de derivações do marxismo clássico, com uma reabilitação das correntes marginalizadas, quer pelo próprio marxismo, como as anarquistas, quer pela revolução bolchevique e pelo comunismo real – o trotskismo e todas as famílias esquerdistas. Surgiam também movimentos mais elitistas e marginais, como a Internacional Situacionista.

Alguns livros e panfletos de figuras da Internacional Situacionista inspirariam a parte lúdica e desconstrutivista do Maio de 68

A Internacional Situacionista, criada em 1957 em Cosio d’Arroscia, em Itália, actuava através de golpes de teatro escandalosos. Dois dos seus mentores – Guy Débord e Raoul Vaneigen – tinham publicado em 1967 livros como La Société du Spectacle e Traité du savoir-vivre à l’usage des jeunes générations, que inspirariam a parte lúdica e desconstrutivista do Maio de 68. Muito importante também foi De la misère en milieu étudiant, um panfleto redigido por Mustapha Khayati e distribuído em Estrasburgo em Novembro de 1966.

Os situacionistas traziam, além de uma análise crítica da civilização ocidental – como a obra de Marcuse ou o cinema de Godard –, o estilo dialéctico e o lado lúdico da revolução. Mas é preciso recordar que, em 1968, a esquerda radical se debatia com o grave problema da ligação à União Soviética e da herança do estalinismo e do concentracionarismo. Uma pesada herança, quase tão pesada como fora o hitlerismo para o nacionalismo e o fascismo europeus e continuaria a ser para as direitas.

No fundo, tratava-se de um confronto interno entre realistas e utopistas; e de responder ao problema do mal praticado pelos bons, no quadro de uma tradição maniqueísta. A ideia da imanente, implícita e indiscutível superioridade ideológica, moral e metapolítica do pensamento da esquerda (obcecada com a virtude e o monopólio da virtude) obrigava-a a isso. Afinal, os massacres da guerra civil russa, o Estado policial, as liquidações dos “inimigos do povo” pelos bolcheviques e depois por Estaline sempre eram verdadeiros. Afinal, para lá da Cortina de Ferro, na Europa de Leste, subsistia um modelo concentracionário. Nos anos 60, ninguém tinha já dúvidas de que assim fosse e por isso o negacionismo, mesmo nos partidos comunistas ortodoxos, tornava-se mais difícil.

Os situacionistas traziam, além de uma análise crítica da civilização ocidental – como a obra de Marcuse ou o cinema de Godard –, o estilo dialéctico e o lado lúdico da revolução. Mas é preciso recordar que, em 1968, a esquerda radical se debatia com o grave problema da ligação à União Soviética e da herança do estalinismo e do concentracionarismo.

Passava-se à tese do desvio e da requalificação, recorrendo a revisões redescobertas dos clássicos, como “o jovem Marx”: o comunismo era bom, generoso, progressista, libertador e os seus partidários também o deviam ser. Se tinham acontecido coisas “más”, só podia ser porque os seus autores não eram verdadeiros comunistas. Talvez fossem “infiltrados”, “fascistas”: eram certamente fascistas, só o podiam ser. Daí o “social-fascismo” da URSS e a cuidada revisão histórica e sobretudo semântica a que se procedeu; revisão que funcionou para os que nela quiseram acreditar e que deixou sementes e raízes profundas.

Revolta sem revolução

A partir de 6 de Maio de 68, em Paris, a revolta dos estudantes passou rapidamente a fase de anarquia divertida para atingir as universidades e os liceus de toda a França – Toulouse, Nantes, Lyon, Bordeaux, Marseille. A 10 de Maio, na noite das barricadas, noite de violência inédita, os CRS reagem com matracas à escalada das pedradas dos estudantes. Os sindicatos comunistas não querem nem podem perder o comboio, os socialistas e os democratas-cristãos mexem-se e George Séguy, o patrão da CGT, apela a uma greve geral, agendada para 13 de Maio. O movimento grevista é rápido e contagiante. Desde os anos 30 e da Frente Popular que não se via nada assim. Por iniciativa das grandes centrais sindicais, os militantes operários arrancam – Renault-Billancourt, Sud-Aviation, Peugeot, e finalmente os ferroviários da SNCF. Sete milhões de trabalhadores em greve em todo o país, segundo Xavier Vigna.

A retórica dos esquerdistas está no limite; pululam os Marats, os Dantons, os Desmoulins, mas não há um Robespierre. Muito menos um Lenine. E, apesar de tudo, o Estado francês, mesmo na sua indecisão, era bastante mais poderoso em 1968 do que o Ancien Régime em 1789, ou do que a monarquia russa em 1917.

Mas, com tudo isto, não se dá a tomada do poder; não é, sequer, tentada. A retórica dos esquerdistas está no limite; pululam os Marats, os Dantons, os Desmoulins, mas não há um Robespierre. Muito menos um Lenine. E, apesar de tudo, o Estado francês, mesmo na sua indecisão, era bastante mais poderoso em 1968 do que o Ancien Régime em 1789, ou do que a monarquia russa em 1917. A nível das cúpulas, a ideia é evitar a todo o custo a guerra civil, que a esquerda receia perder. De Gaulle, ofendido por lhe fazerem “aquilo” a ele, não quer ceder em nada; quer que as forças de segurança retomem a Sorbonne e que desocupem as fábricas à força. O primeiro-ministro, George Pompidou, vê a questão de outro modo: percebe que os comunistas não querem nem podem tentar o golpe de mão (pela ligação à URSS, que lhes lê a cartilha da Realpolitik e dos equilíbrios da Guerra Fria e porque têm medo do Exército). No meio da crise, a esquerda democrática – os socialistas, com Mendès France e Mitterrand – tenta aproveitar a onda da contestação estudantil e de rua para chegar ao poder por eleições antecipadas, mas não se quer confundir como os aventureiros de 68. Quer uma crise político-constitucional: que De Gaulle abandone o poder ou demita o primeiro-ministro e que haja eleições presidenciais ou legislativas.

Resposta e fim

Pompidou é realista, tem a cabeça fria, não sofre dos estados de alma nem dos complexos de grandeza de De Gaulle. Lança aos sindicatos o desafio da negociação das condições de trabalho e salariais, uma vez que também é disso que falam. E as negociações começam no Ministério do Trabalho, na Rue de Grenelle: rever e aumentar o SMIG (salário mínimo interprofissional garantido), instituir a semana das 40 horas e melhorar as condições de trabalho. Numa sociedade tradicional, muito hierárquica, os trabalhadores querem ser “reconhecidos”, querem ser gente, querem ser tratados com dignidade. Fala-se de co-gestão, de auto-gestão ou de participação, como novas formas novas de gerir o capitalismo.  Esta segunda leva de conquistas sociais dos trabalhadores franceses, curiosamente uma reivindicação colateral, foi o que de mais substancial ficou do Maio de 68. O salário mínimo sobe 35%, e o resto dos salários, uma média de 10%; e criam-se os comités sindicais de empresa. Depois do Verão e da Frente Popular de 1936, era a segunda grande vitória dos trabalhadores franceses.

Os acordos da Rue de Grenelle, promovidos pelo primeiro-ministro Pompidou, resultaram num conjunto de importantes cedências às reivindicações dos sindicatos

Os trabalhadores e os seus dirigentes não querem misturas nem confusões. Quando um grupo de estudantes maoístas, a 16 de Maio, se dirige da Sorbonne para a fábrica da Renault em Billancourt com um dístico patético – “A classe operária tomará das mãos frágeis dos estudantes a bandeira da revolta” – encontra as portas fechadas. A CGT rejeitava a solidariedade daqueles filhos espúrios da burguesia.

O braço de ferro no Governo, entre duros (De Gaulle) e moderados (Pompidou), tem o seu primeiro round. Pompidou ganha, opõe-se à repressão pura e dura e, a 25 de Maio, começam as negociações com os sindicatos na Rue de Grenelle. Um jovem secretário de Estado para o Emprego faz o entre o primeiro-ministro e os chefes sindicais. Tem 35 anos e chama-se Jacques Chirac. Mas na véspera das negociações as coisas tinham piorado – e muito – na rua. Nessa noite, houve dois mortos: um transeunte que apanhou com um estilhaço de granada em Paris; e um comissário de polícia que foi atropelado por um camião largado pelos manifestantes em Lyon. A violência dos esquerdistas incendeia a noite: os agentes, cercados num comissariado a que os manifestantes pegam fogo, só com muito sangue-frio se contêm nos disparos; são salvos por reforços sem ter de abrir fogo.

Enquanto Pompidou negoceia com os sindicatos, a 29 de Maio, De Gaulle, transtornado, parte para Baden-Baden, onde está o Exército francês do Reno, comandado por Jacques Massu. “Tout est foutu”, diz De Gaulle aos generais. 

Depois dessa noite, a opinião pública – até aí simpática ou pelo menos tolerante para com os estudantes e os grevistas – muda de bordo. Enquanto Pompidou negoceia com os sindicatos, a 29 de Maio, De Gaulle, transtornado, parte para Baden-Baden, onde está o Exército francês do Reno, comandado por Jacques Massu. “Tout est foutu”, diz De Gaulle aos generais. Os chefes militares decidem apoiar o Chefe de Estado na crise e as unidades de blindados e infantaria mecanizada tomam o caminho da França. Antes, a contragosto, De Gaulle aceitara as condições, ou a condição, dos oficiais: que os seus camaradas, ainda presos por causa da Argélia francesa, do putsch de Abril de 1961 e da OAS, fossem amnistiados e libertados pelo Chefe de Estado. Salan, Denoix de Saint-Marc e mais uma dúzia de oficiais regressam a casa.

De Gaulle volta a Paris e reúne o Conselho de Ministros. A 30 de Maio vai à Televisão e proclama a sua vontade de manter o primeiro-ministro e de ficar na Presidência. Quando está prestes a terminar, uma grande manifestação, convocada pelos gaullistas e pelas direitas, sai à rua. Mais de meio milhão de pessoas em Paris, com a tricolor, a cantar a Marselhesa. A revolução estava terminada. Duas ou três semanas depois as fábricas voltavam à normalidade.

A gigantesca manifestação de 30 de Maio de apoio a De Gaulle marcou o fim do Maio de 1968

Este foi o Maio de 68 francês, o mais famoso dos Maios europeus. As marcas da época estavam presentes no esquerdismo que então se tornava moda: contra os americanos no Vietname, por Cuba, com Fidel e venerando o “Che”; pelos “chineses” da Revolução Cultural; pela revolução sexual, que vinha da Califórnia e dos escritos do trio Burroughs-Ginsberg-Kerouak, herdeiros longínquos do marquês de Sade, das drogas duras, da poesia contestante de The Howl, do flower power, do pacifismo e das “canções de protesto”, com Bob Dylan a avisar, desde 1964, que “os tempos estavam a mudar”. Passava por aqui e ia até à violência dos provose à violência estudantil.

E, no futuro próximo, a França ficaria com os seus esquerdistas – maoístas, trotskistas, situacionistas, anarquistas, seitas políticas milenaristas e utópicas – mas não optaria pela luta armada. Seria na Alemanha e sobretudo na Itália dos anos 70, os anos de chumbo, que a Rote Armee Fraktion [Fracção do Exército Vermelho], mais conhecida por Bando Baader-Meinhof, e as Brigadas Vermelhas protagonizariam uma sangrenta guerrilha de pequenas equipas urbanas “contra o sistema”.

Em Portugal – As Esquerdas

As notícias de Maio de 68 chegaram a Portugal nos últimos meses do salazarismo. Entre os dirigentes do Regime houve algum receio de contaminação; e alguma perturbação meia assustada meio divertida entre as classes burguesas. Mas foi grande a influência que teve no Movimento Associativo, com os seus grupos e grupúsculos. Na esquerda francesa havia comunistas, esquerdistas, maoistas, socialistas e “cristãos progressistas”; em Portugal, a esquerda dividia-se fundamentalmente em três famílias: a democrática, da linhagem dos republicanos da Primeira República, conhecida por Oposição Democrática ou por “Reviralho”; a comunista, formada pelo PCP e os seus companheiros de caminho; e a “católica progressista”, que, entretanto, irá fragmentar-se, com os mais progressistas e menos cristãos (ou, pelo menos, menos católicos) a militar em movimentos de extrema-esquerda.

A esquerda teve sempre a crença iluminista de grupo esclarecido e portador exclusivo das bandeiras do progresso – e também a ideia de que a superioridade moral dos seus princípios lhe dava, automaticamente, legitimidade para os impor.

O movimento associativo português adoptou do Maio de 68 o estilo e o modelo da ditadura do grupo, da facção vanguardista que intimida por “imperativos éticos” e que controla em nome de um princípio ideológico que tem por supremo e superior. A esquerda teve sempre a crença iluminista de grupo esclarecido e portador exclusivo das bandeiras do progresso – e também a ideia de que a superioridade moral dos seus princípios lhe dava, automaticamente, legitimidade para os impor.

Escalada

Esta convicção reacendia-se com a experiência do Maio de 68 e da ditadura temporária mas efectiva das minorias de controlo nos períodos excepcionais de conquista e ocupação, sobretudo na área estudantil, mas também sindical e fabril. Desenvolveram-se então numerosas técnicas de intimidação, através de um processo clássico, vindo da Convenção e do Terror e depois largamente praticado pelos bolcheviques e instrumentalizado por Estaline como fórmula de execução e de cobertura ideológica para uma cadeia de comando policial e burocrática.

Estes novos usos iam ver-se nas formas de coerção e coacção utilizadas em 1969, em Lisboa e, sobretudo, em Coimbra. Nos anos 60, na luta académica, mantivera-se um certo parlamentarismo nas AAEE, quer em Lisboa, quer em Coimbra. Por exemplo, nas Assembleias Gerais da AEFDL (Associação de Estudantes da Faculdade de Direito de Lisboa), nós, a direita, intervínhamos como oposição, com direito a resposta, e embora a retórica fosse cerrada e a inimizade política criasse um permanente clima de guerra-fria, respeitavam-se algumas regras do jogo, havia algum “civismo”.

Isso acabou em 1969, quando a ditadura de grupo procurou tornar-se efectiva por todos os meios. Daí as confrontações por vezes violentas, com matracas e barras de ferro e já não apenas de mãos limpas, isto é, sem armas, como era tradicional. Assim foram as greves de Coimbra, com o Movimento Associativo a montar um controle urbano para impedir quaisquer estudantes de fazer exames – um controle de tipo policial, tão ou mais “pidesco” do que aquele de que se diziam vítimas, com componentes que iam do terror psicológico sobre os dissidentes e os avisos e ameaças aos neutros e indecisos até à violência física. O mais curioso é que os líderes e autores destas acções as confessavam e proclamavam sem qualquer espécie de reserva ou pudor.

Essa escalada de violência vinha sobretudo da cultura do Maio de 68 e do esquerdismo revolucionário e fanático de grupos com programas de mudança social verdadeiramente radicais

O mesmo aconteceria em Janeiro de 1970 na Faculdade de Direito de Lisboa, obrigando os estudantes nacionalistas e de direita, mais politizados, e os moderados não identificados com os princípios e os valores da esquerda associativa, a organizar grupos de autodefesa para ir à aulas ou para escoltar os que pretendiam ir às aulas, o que daria origem a batalhas campais fragmentadas, nos átrios e corredores da Faculdade, que levariam ao encerramento das instalações.

Essa escalada de violência vinha sobretudo da cultura do Maio de 68 e do esquerdismo revolucionário e fanático de grupos com programas de mudança social verdadeiramente radicais – tão radicais que não havia merceeiro ou pequeno proprietário de duas leiras e quatro vacas que escapasse à fama de perigoso fascista ou inimigo de classe.

Estes grupos, como o maoista MRPP, tinham, a par do “utopismo generoso” que os seus antigos militantes gostam de recordar, uma componente de violência intrínseca, na linhagem da sanha da “virtude” e das “virtudes” da Revolução bolchevique e da Revolução Cultural Chinesa de que se reclamavam herdeiros e que procuravam imitar, não só na retórica mas também na violência física – do julgamento de estudantes não-alinhados ao linchamento de professores.

Modelos chineses e americanos

As críticas ao “aburguesamento” e “revisionismo” da União Soviética eram feitas de uma perspectiva de esquerda. Alguns destes críticos reviam-se em Estaline. E os seus ídolos recentes – Mao Tse Tung, os Guardas Vermelhos e a Revolução Cultural chinesa – eram representantes dos regimes que, no século XX, mais seres humanos torturaram e mataram (coisa que hoje já todos dizem e sabem mas que na época poucos reconheciam). Não deixa de ser elucidativo que estes grupos, que já não se identificavam com a URSS de Brejnev, procurassem modelos de continuidade nos maoistas chineses ou nos terceiro-mundismos indochineses – de onde sairiam os Khmers Vermelhos e os seus campos de extermínio.

A par deste lado totalitário dos grupos trotskistas, neo-estalinistas e maoístas – todos diferentes e até em guerra entre si, mas todos iguais na vertente utópica e nos métodos terroristas –, o Maio de 68 trouxe uma outra face mais metapolítica e cultural mas, por isso, também mais profunda e determinante para os princípios e comportamentos políticos. Essa face tinha que ver com a “revolução dos costumes”. Foi talvez mais uma “europeização” ou adaptação europeia de um modo de pensar e agir americano, ou que nesse tempo se instalava no campus das universidades americanas.

Perante as manifestações “make love, not war” dos jovens contra a guerra do Vietname, Ronald Reagan, então governador do Estado, não deixaria de notar com ironia: “Those guys look like they can’t make either of both”.

Era também uma reacção ao “desencanto do mundo”, uma contestação do modo de vida “alienante” da sociedade industrial avançada – em capitalismo ou socialismo. Esse “desencanto do mundo” – um tema que se arrastava de Hegel a Max Weber e que fora também pressentido por Nietzsche e abordado por Heidegger e Ernst Jünger – tinha tido uma expressão no futurismo, que fora uma reacção vitalista e violenta à decadência, e nos pré-fascismos, ou melhor, na cultura rebelde que encontraria ou julgaria encontrar expressão nos fascismos fundacionais. No pós-guerra americano transformava-se e acompanhava os passos da Beat Generation, que já estava a lançar os dados no final dos anos 40. Esta reacção ao desencanto do mundo tomava, com a Beat Generation, a forma de um hedonismo radical – sem tabus nem limites. Homossexualidade ou bissexualidade, sexo em grupo, drogas, uma marginalidade complacente até ao soft crime, uma young (and not so young) boys network, viciada, viciosa e ostentativa. Depois, nos anos 60, surgia numa mescla de peace movement de alcova com nirvanas orientalistas, de comunas libertárias e revolucionárias, com sexo, drogas e rock’n’roll ou com o sexo que as drogas permitiam. Quando o slogan “make love not war” começou a ser entoado na California, em 1967, Ronald Reagan, então governador do Estado, não deixaria de notar com ironia: “Those guys look like they can’t make either of both”.

Estes movimentos, como os hippies e o flower-power, assumiram uma linha política de contestação e recusa dos valores conservadores americanos, engajando-se numa posição crítica militante contra o envolvimento militar dos Estados Unidos na Indochina, e contribuindo largamente para a crise de consciência nacional que levaria à derrota no Vietname em 1975.

Em França, o Maio de 68 deu origem a uma adaptação desta vanguarda americana: Félix Guattari argumentava que da “luta de classes” se passava à “luta dos sexos”, e havia muito interesse por Wilhelm Reich e pelo Deuxième Sexe de Simone de Beauvoir. 

Ao mesmo tempo que se liberava a sexualidade dos héteros, apoiada numa releitura dos textos e pesquisas de Kinsey e de Masters e Johnson, desconstruía-se a imagem da América puritana de Eisenhower dos anos cinquenta (cujo puritanismo sempre merecera grandes dúvidas, sobretudo a partir de artes populares, com as pinups de Gil Evergreen ou de Alberto Vargas, para já não falar na sensualidade latente até ao explícito dos grandes clássicos de Hollywood).

Em França, o Maio de 68 deu origem a uma adaptação desta vanguarda americana: Félix Guattari argumentava que da “luta de classes” se passava à “luta dos sexos”, e havia muito interesse por Wilhelm Reich e pelo Deuxième Sexe de Simone de Beauvoir. Era uma nova cultura sexual, que preconizava a quebra com os padrões conservadores na heterossexualidade, proclamando que era proibido proibir, mas insistia na legitimidade das “minorias” – gays, lésbicas e os vários (e, até então, “perversos”) sadomaso. Esta revolução tinha os seus pensadores – Reich, Marcuse, Deleuze, Guattari – e uma prática a que o Maio de 68 veio dar respeitabilidade.

Sinais contraditórios: relativismo e ditadura do grupo

Em Portugal, do Maio de 68 ficaram sinais culturais que contribuíram para uma mudança na esquerda doméstica, que se vulgarizaria no pós-25 de Abril. Revistas como O Tempo e o Modo (fundada em 1963), que tinham sido espelho destas novas problemáticas, revelaram, durante o marcelismo, ao abrigo de um certo abrandamento da Censura, uma aliança tácita entre o progressismo cristão e o maoismo.

Descartada a violência, o hedonismo de massas assumido como contestação radical aos valores sociais orgânicos, é hoje poderoso e abrangente.

Com o 25 de Abril, parte da agenda de 68 transitava do movimento académico para o Estado e para a sociedade. Em 74-75, estes entusiasmos passavam à extrema violência retórica (e às vezes física) dos grupúsculos, ao purismo e fundamentalismo revolucionários, à adesão às foices e martelos, às kalash, às rodas dentadas, ao Oriente Vermelho; e, poucos anos depois, ao enfileiramento nos partidos do arco constitucional, sobretudo os do centro, os que davam acesso mais fácil a lugares no Parlamento e no Governo; e daí à respeitabilidade burguesa, estatal ou privada.

E a ideologia do Maio de 68, graças aos que ficaram fora desta transumância e adaptação, pode hoje reviver politicamente e com um conveniente recuo na retórica da violência e da guerra de classes, entre os dirigentes e aderentes do Bloco de Esquerda.

Assim, descartada a violência, o hedonismo de massas assumido como contestação radical aos valores sociais orgânicos, é hoje poderoso e abrangente. Trata-se de um libertarismo sem limites, em que o homem é essencialmente visto como um ser lúdico e consumidor, devendo libertar-se de todos os enquadramentos e lealdades transcendentes ou institucionais – religião, pátria, família, valores de orientação permanente. Um libertarismo que entende legítimo o aniquilamento dos inimigos desse mesmo libertarismo.

Maio de 68 foi a renovação deste espírito, a ponto de ainda hoje nele se reconhecerem, com manifesta nostalgia, alguns dos entretanto reconvertidos ao sistema e ao espectáculo da “sociedade burguesa”.

CHRISTOPHE PETIT TESSON/EPA

É, do ponto de vista de filosofia política e de valores, a retoma da velha linha do racionalista ateu Hobbes, do materialista Espinosa e dos elitistas, hedonistas e literatos do século XVIII, a começar pelo marquês de Sade. Maio de 68 foi a renovação deste espírito, a ponto de ainda hoje nele se reconhecerem, com manifesta nostalgia, alguns dos entretanto reconvertidos ao sistema e ao espectáculo da “sociedade burguesa”.

Maio de 68 – o regresso

As revoluções bem-sucedidas são sangrentas, como a francesa e a bolchevique. E, além do sangue – dos seus e dos seus inimigos –, precisam de um guião que pense nas formas estratégicas e tácticas de assalto ao Estado, de tomada do poder. Ora no Maio de 68, em Paris e em França, não houve praticamente derramamento de sangue. Também nisso, como no resto, foi uma revolução inexistente. Raymond Aron, o conservador liberal francês da segunda metade do século passado, odiado pelas esquerdas fanáticas e festivas, percebeu essa “inexistência”; e percebeu-a intimamente ligada ao que já tinha definido como os “marxismos imaginários”.

Outros autores em França – uma minoria – detectaram o vazio histórico e político ou até o paradoxo da revolução. Um deles foi Régis Debray, um revolucionário ou rebelde a sério que, por assim ser, nos idos de Maio, estava preso na Bolívia. Foi ele que, dez anos depois, no ensaio-panfleto Modeste contribuition aux discours et cerimonies oficielles du dixième veio fazer um balanço insólito e, atrevo-me a dizer, correcto, do evento: a “grande festa” esquerdista de 68 tinha assinalado o triunfo, em França, de uma nova ordem – capitalista ou capitalista libertária.

Régis Debray preso na Bolívia: revolucionário a sério, escreveria uma crítica demolidora do que representara o movimento de Maio de 1968

Para Debray, o Maio de 68, ou a retórica do Maio de 68, suplantara ou atropelara a velha querela entre comunistas-comunistas (comunistas soviéticos do Partido Comunista Francês) e comunistas-esquerdistas (trotskistas, maoistas, situacionistas e afins) para proclamar o triunfo de um espírito de “grande reconciliação entre um prazer sem limites e um capitalismo multinacional também libertário, selvagem, e mesmo masoquista.”

Ao atacar uma França ainda tradicional afastando-se, simultaneamente, dos velhos comunismos, o Maio de 68 acabou por abrir caminho a uma França consumista e individualista

O livro-panfleto de Debray saiu há quarenta anos, em 78, dez anos depois da “revolução inexistente”. Agora, cinquenta anos passados sobre Maio, acabada a Guerra Fria, entregues ao admirável mundo do capital sem limites e de um suposto homem novo também “sem limites” – sem regras religiosas, nacionais, familiares, sem fronteiras de género ou até de espécie – voltámos às raízes dos seus paradoxos. Marx insistira na natureza subversiva do capitalismo; mas a sua sobrevivência talvez se deva à regulação de que foi alvo e à auto-limitação a que se sujeitou ao longo do século XX. Curiosamente, ao atacar uma França ainda tradicional afastando-se, simultaneamente, dos velhos comunismos, o Maio de 68 acabou por abrir caminho a uma França consumista e individualista que, depois da curta experiência da frente popular burguesa da primeira presidência de Mitterrand, voltaria a ser governada por um centro asséptico, liberal-independente, pós-gaullista ou racionalista ou, agora, macroniano.

Em Março de 1968 a reivindicação estudantil começara com a luta dos estudantes de Nanterre, com Cohn-Bendit à cabeça, pelo acesso aos dormitórios das raparigas, em nome do direito à sexualidade e contra o interdito e a segregação então em vigor. Ou seja, os adolescentes precisavam de uma sanção burocrática para aceder ao gineceu, à zona das “meninas”. Onde o Romeu escalava a varanda de Julieta, onde Aladino e outros jovens desenrascados penetravam nos serralhos médio-orientais, depois de séculos de criatividade nos “trabalhos do amor”, os estudantes lançavam-se na epopeia heróica de pedir “o aval das instâncias estaduais para realizarem uma conquista”, inaugurando, em 68, o Ano da Libertação Sexual, em França e no resto do mundo.

Em Março de 1968 a reivindicação estudantil começara com a luta dos estudantes de Nanterre, com Cohn-Bendit à cabeça, pelo acesso aos dormitórios das raparigas, em nome do direito à sexualidade e contra o interdito e a segregação então em vigor. 

No entanto, ainda que a subversão dos costumes tivesse começado bem mais cedo, mesmo considerando só o passado recente – na Califórnia, com Peyton Place, com Lolita, com a mini-saia e a pílula na Euro-América –, a “revolução inexistente” iria chegar mais longe, generalizando-se com a correcção política, o relativismo moral, os interditos de interditos e a ditadura da linguagem. Nesse sentido Maio venceu e foi precursor na criação de uma sociedade sem valores de orientação permanente, baseada na regra da maximização do prazer individual e na livre expressão dos pensamentos, mesmo dos mais grotescos e dispensáveis. Qualquer coisa entre Sade, Sartre, os libertários e os libertinos, tudo banalizado num reality show de grande audiência.

Se analisarmos as ideias dos movimentos da Nova Esquerda – do Podemos, do Syriza, do Bloco de Esquerda, ou daquela espécie de ideologia avassaladora dos circuitos académicos americanos e de parte dos media conhecida por political correctness –, encontramos longas sobrevivências desse Maio aparentemente adormecido, fruto da gestação lenta do revisionismo cultural freudiano-marxista dos anos 60.

A ideologia da “révolution introuvable”, ou inexistente, na sua relativa volatilidade e amálgama, tinha raízes profundas na cultura ocidental, na linha da modernidade evolutiva que vinha da ala radical e ateia do Iluminismo, passara pelos socialistas utópicos do século XIX, marinara no marxismo, fora moderadamente cúmplice do marxismo soviético e do comunismo internacional e divergira depois do cânone estalinista. Esta divergência era uma divergência de método – e uma divergência cómoda para resolver a contradição entre a sua apresentação como forma superior de humanismo e a realidade do terrorismo de Estado e dos crimes contra a Humanidade na URSS, reconhecidos pelo próprio Khruschov em 1956.

Antonio Gramsci (na foto) e György Lukács fizeram uma revisão do marxismo que se afastava do dogma a partir de uma análise mais cautelosa das categorias sociais no Ocidente

Na História do Partido Comunista Bolchevique da URSS Estaline expusera os dogmas que iam ser a vulgata dos partidos comunistas de todo o mundo até à ruptura Pequim-Moscovo e às cisões e heresias dos anos 60: o Proletariado era o único sujeito da História, o sujeito que libertaria a humanidade das suas cadeias. O seu objectivo era a conquista revolucionária do Estado através da Ditadura do Proletariado. Mas o cumprimento deste objectivo exigia um meio, um instrumento – o Partido Comunista, uma organização de políticos e militantes profissionais capaz de ser a vanguarda dos proletários nessa conquista e manutenção do poder. Finalmente, o Partido tinha uma teoria – a ciência marxista da História – que, não só explicava as contradições económicas da sociedade capitalista, como indicava o modo de as prever e de as utilizar para os seus próprios fins.

Este modelo evolutivo e as suas figuras e momentos – sujeito, objectivo, meio, teoria – tinham sofrido alguma contestação tácita a partir de pensadores marxistas, como György Lukács e Antonio Gramsci, que, talvez até por terem assistido ao fracasso das tentativas clássicas de assalto e consolidação do poder nos seus países, fizeram a revisão dos métodos a partir de uma análise mais cautelosa das categorias sociais no Ocidente: os proletários não se determinavam só e apenas pelo factor económico – a religião dos rurais e o patriotismo dos operários levavam-nos a rejeitar esse enquadramento –, por isso, o marxismo tinha de examinar outros factores, nomeadamente os culturais, o que não contradizia o pensamento do Marx pré-Lenine. E a revolução, para ser bem-sucedida e não ter resultados paradoxais e perversos, como a queda do governo Béla Kun na Hungria e o advento do fascismo em Itália, tinha de trabalhar as mentalidades, os costumes, as ideias. Fora assim que a revolução burguesa triunfara em França no final do séc. XVIII.

O relativismo religioso e filosófico, o multiculturalismo, a culpabilização histórica dos povos euroamericanos perante o resto do mundo, a admissão como superiores de todas e quaisquer minorias ou seitas, tudo isto passou a fazer parte da “ideologia” nebulosa a que se chamaria “marxismos imaginários”, “nova esquerda” e, mais tarde, “correcção política”.

Estas ideias tinham sido depois desenvolvidas pela Escola de Frankfurt, que procurara harmonizar Marx com Freud e através desta dupla, revista e aumentada, fazer a “desconstrução” da sociedade tradicional. Os esforços deviam ser, portanto, culturais, ou seja, concentrados no ataque aos valores das sociedades euroamericanas e de todas as sociedades. A contestação destes valores dar-se-ia por uma demonstração das suas contradições, de modo a criar uma má consciência colectiva, seguindo, em versão alargada, o método dos Filósofos, cujas obras eram divulgadas pela Enciclopédia e nos salões do Ancien Régime (animados por senhoras da sociedade e frequentados pelas elites).

O relativismo religioso e filosófico, o multiculturalismo, a culpabilização histórica dos povos euroamericanos perante o resto do mundo, com o dever de contrição e reparação pelas ofensas passadas, a admissão como “normais” ou até superiores de todas e quaisquer minorias ou seitas, tudo isto passou a fazer parte da “ideologia” nebulosa a que se chamaria “marxismos imaginários”, “nova esquerda” e, mais tarde, “correcção política”.

A montra da Nova Esquerda

Ora o Maio de 68, apesar da sua “inexistência” como revolução ou como tomada de poder, foi muito importante como montra, como vitrina de ideias, de modelos, das “filosofias” que refizeram o valor das culturas utópicas através de um processo heterodoxo, histórico, de frente social unida. O proletariado deixara de ser o sujeito histórico – pelo contrário, “vendera-se” às conquistas salariais e corporativas, na Rue de Grenelle. E o Partido Comunista dera tréguas a De Gaulle e disciplinara as massas em vez de as guiar no assalto ao Estado.

Não é estranho que parte substancial dos dogmas da esquerda cultural e política contemporânea tenha Maio de 68 no seu ADN

Aparecia então um novo sujeito, os estudantes, que, na América, lutavam contra a guerra do Vietname (também por que não queriam ir lá parar, no tempo da conscrição ou serviço militar obrigatório) e contestavam a autoridade, fosse ela qual fosse. “Os estudantes” antagonizavam os cânones da “personalidade autoritária”, descritos por Theodor Adorno na Escola de Frankfurt e representados pelos professores, e restauravam a ideia de um marxismo e de uma revolução de rosto humano. Isto apesar da exaltação do maoismo e de um modelo de Revolução Cultural que dava lugar a alguns dos piores horrores da História.

Deste modo, não é estranho que parte substancial dos dogmas da esquerda cultural e política contemporânea tenha Maio de 68 no seu ADN, reivindicando a linhagem de uma esquerda radical que visa a destruição do enraizamento, da comunidade política e da vida social tal como a conhecemos (ou seja, fundamentada na religião, na família e na propriedade) e impondo como alternativa um conceito libertário de liberdade, indissociável do Marx reinventado pelos marxismos imaginários.

A prestidigitação a que hoje assistimos é precisamente a reposição dos ideais da utopia igualitária absoluta, não de uma igualdade de dignidade política ou perante a lei, mas de uma igualdade tábua-rasa de identidades, regras, normas, instituições. Mas este processo, nas suas manifestações políticas, além de um lado de generosa reivindicação em nome de todas as minorias – raciais ou sexuais – tem também um lado lúdico, rebelde, de “novidade”, nos partidos populistas de esquerda – Podemos, Syriza, Bloco de Esquerda. E hoje a igualdade já não se fica pelos homens (e mulheres e infinitas variações de género), estende-se também aos animais.

Partidos populistas de esquerda como o Podemos, o Syriza ou o Bloco de Esquerda advogam ums igualdade tábua-rasa de identidades, regras, normas, instituições

Esquecidas nos caixotes de lixo da História ficam as experiências comunistas de assalto ao poder como se as generosas ideias da Nova Esquerda nunca tivessem sido ensaiadas, e só esperassem uma nova oportunidade para nos conduzirem a todos a um “futuro radioso”. Assim, os novos partidos esquerdistas reclamam-se de uma espécie de virgindade pré-poder, como a que caracterizou os socialismos utópicos do século XIX e desapareceu nos socialismos reais do século XX que os impuseram; um qualquer socialismo puro, sem a violência como método essencial, a eliminação física dos inimigos políticos ou económicos e a instauração de Estados tirânicos, policiais, concentracionários. O poder que parecem desejar, mais do que um poder político-institucional normal, mesmo em democracia, é tendencialmente um poder indirecto, cultural, de conquista e policiamento das mentalidades, algures entre a influência e o poder executivo. O assalto a este poder, a este novo poder social, centra-se não nos clássicos da topografia da revolução ou do golpe de Estado “malapartiano” – as centrais ferroviárias, hidroeléctricas ou de comunicações, o Banco Central, os quartéis, os edifícios simbólicos do Estado – mas nos redutos espirituais da opinião e da legislação, que determinam os valores sociais dominantes. Um Marx mais com Gramsci do que com Lenine.

A dupla Marx-Freud já ressuscitara e encaminhara a longa marcha da revolução dos costumes que, embora iniciada antes de Maio de 68, se cristalizou ali para grande parte da opinião, nesse mês e nesse ano.

No fundo, é como se não quisessem sair de um eterno Maio, de uma eterna guerrilha, de uma guerra da pulga de hit and run: picando, importunando, confundindo, influenciando, até que as instituições, cansadas, se rendam e deixem o terreno livre.

O desaparecimento da União Soviética, e o quase-desaparecimento dos partidos comunistas ocidentais, ajudou a esta camuflagem e esquecimento, permitindo que as ideias do marxismo-leninismo regressassem à discussão ideológica pura, isentas de culpa e alheias às experiências socialistas que tinham inspirado.

A dupla Marx-Freud já ressuscitara e encaminhara a longa marcha da revolução dos costumes que, embora iniciada antes de Maio de 68, se cristalizou ali para grande parte da opinião, nesse mês e nesse ano.

 “Welcome to the post-pill Paradise”, dizia ao amante uma das “esposas” suburbanas de Couples, de John Updike, publicado em 1968

A revolução sexual começara mais cedo, nos Estados Unidos, através da liberalização legal e cultural que permitira a circulação dos livros de Arthur Miller, Vladimir Nobokov, James Joyce; ao mesmo tempo, à Europa-América, chegavam novidades – da mini-saia à pílula anticoncepcional (“Welcome to the post-pill Paradise”, dizia ao amante uma das “esposas” suburbanas de Couples, de John Updike, publicado em 1968). E quando se dava esta liberalização de textos então proibidos, as “minorias” sexuais, raciais e culturais saíam da clandestinidade e conquistavam visibilidade e reconhecimento, passando rapidamente (ou elas, ou os seus patronos), a perseguir os que até então as tinham perseguido, numa reversibilidade que não era novidade na história das sociedades. Do “só é proibido proibir” passava-se a proibir os anteriores “proibidores” e os seus valores, usando os seus métodos.

Daqui nasceram os mecanismos da chamada “correcção política”, uma espécie de novo código de Hamurabi ou Declaração de Direitos que, além de manifesto dos novos direitos, prescrevia a proscrição de uma série de atitudes, expressões, palavras, aconselhadas ou proibidas, criando uma ditadura da linguagem.

Neste sentido, Maio de 68 está vivo como precursor de um modelo de sociedade em que são suprimidos os códigos religiosos, políticos, sociais e culturais anteriores – ainda que as proibições e os interditos de que pretenderam libertá-la acabem logo substituídos por outros, devidamente acompanhados por uma rede de controlo e policiamento severo dos infractores. Daqui resulta um ideal de homem inspirado em Rousseau, Sade, Marx, Freud, um ser utopista e utópico, libertário e libertador, arquétipo pós-moderno do novo modelo único e superior de ser humano.

Daqui nasceram os mecanismos da chamada “correcção política”, uma espécie de novo código de Hamurabi que, além de manifesto dos novos direitos, prescrevia a proscrição de uma série de atitudes, expressões, palavras, aconselhadas ou proibidas, criando uma ditadura da linguagem.

Este clima cultural – e a permanente crise do Estado e da economia do Ocidente, sobretudo a partir da crise financeira de 2008, que outra vez ilustrou a teoria da inevitabilidade do ciclo no capitalismo – prevaleceu e tornou-se dominante na Academia e nos media.

Também decisiva foi a decadência demográfica da Europa Ocidental – e a consequente necessidade de imigração, sobretudo muçulmana – que veio agudizar a crise da civilização e a consciência dessa crise: a tensão e o choque entre a nova ideologia hegemonizante, com os seus dogmas multiculturalistas, e os limites que a natureza das coisas sempre põe aos desejos do pensamento e da imaginação humana, juntamente com os valores tradicionais que subsistiram na modernidade em equilíbrio com o secularismo.

A morte trazida por radicais jihadistas, não poupou Cabu e Wolinsky, dois velhos companheiros do “68” que trabalhavam no Charlie Hebdo

O semanário Charlie Hebdo, também parisiense, foi emblema desta nova/velha cultura libertária em luta pela hegemonia, com a caricatura e o ridículo como método de desconstrução dos valores tradicionais, especialmente, os religiosos. Charlie Hebdo encarniçava-se sobretudo contra o Papa, contra Roma e os católicos; mas, nos últimos anos, passara a satirizar o Islão, para um impacto extra. Só que o preceito e o hábito católico de oferecer a outra face e de perdoar as ofensas não é seguido por parte significativa dos muçulmanos e, numa manhã de Janeiro, um comando terrorista atacou a redacção do Charlie, matando doze pessoas. A morte trazida por radicais jihadistas, não poupou Cabu e Wolinsky, dois velhos companheiros do “68” que trabalhavam no jornal e estavam nesse dia no número 10 da rua Nicolas-Appert.

A agenda da Nova Esquerda é a que está hoje de pé. Régis Debray situa-a algures entre o mais extremo libertarismo de costumes e o grande Moloch do capitalismo financeiro globalizado – servido por uma tecnologia cada vez mais à solta e cada mais perigosa para o pensamento livre.

A resistência popular

E a resistência a estas formas invasoras e destruidoras das comunidades humanas reais em nome de utopias sempre reescritas, parece continuar a vir do “povo”. Há cinquenta anos, em 1968, no final do mês de Junho, os franceses votaram esmagadoramente a coligação republicana conservadora RPR e Republicanos Independentes; e nos Estados Unidos, depois de um ano de 68 de grande violência estudantil e revolucionária, os americanos elegeram Richard Nixon.

Também hoje, contra a nova bíblia, contra os dogmas da nova inquisição da correcção política e perante a ofensiva contra as identidades nacionais, os povos reagem com o que lhes resta – o voto. E fazem-no conforme podem: no Reino Unido, nos Estados Unidos, na Rússia, na Hungria, na Polónia, em França e agora em Itália.

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