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Mortágua vs. Ventura. O não levantamento de imunidade que levou o Chega a querer mudar a lei

O Parlamento travou o pedido de levantamento de imunidade de Mariana Mortágua por considerar que a queixa é contra o partido e não contra a deputada. Caso levou Chega a apresentar projeto de lei.

André Ventura afinou a estratégia para acusar Mariana Mortágua de querer fugir ao escrutínio da justiça pelo facto de o Parlamento ter recusado um pedido de levantamento de imunidade que dispensa a deputada de prestar declarações na qualidade de arguida. A Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados decidiu que a queixa que levou o Ministério Público a pedir a exceção no regime dos deputados é contra o Bloco de Esquerda e não contra Mariana Mortágua, o que ilibou a deputada e indignou o Chega. Há cinco dias o mesmo Parlamento levantou a imunidade ao próprio André Ventura em dois processos, um deles motivado por uma queixa da deputada bloquista.

Alexandra Leitão, presidente da comissão, viu-se obrigada a justificar a decisão relativamente a Mariana Mortágua, argumentando que o caso não tem comparação com outros em que os deputados tiveram de responder à justiça.

Mas o Chega não quer deixar morrer o assunto e vai apresentar um projeto de lei com alterações ao estatuto dos deputados para pôr fim ao atual sistema de imunidade dos deputados. Numa conferência de imprensa marcada de propósito para o efeito, André Ventura não poupou nas palavras (e muito menos nas críticas): “Isto viola o que de mais grosseiro a separação de poderes tem em Portugal. Não pode haver dois pesos e duas medidas sobre justiça.” O presidente do Chega considera a atuação do Parlamento uma “vergonha”, argumentando que a mesma “abre um precedente gravíssimo”.

Para o presidente do Chega esta decisão demonstra que “a maioria absoluta pode impedir a constituição de arguido de qualquer deputado”, tendo em conta que “um grupo de deputados entendeu que um ofício do Ministério Público e do tribunal não são suficientes para que [Mariana Mortágua] seja ouvida na qualidade de arguida”.

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Da recusa do levantamento de imunidade à justificação

No passado dia 31 de maio, a Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados assinou um parecer que não autorizou o levantamento da imunidade a Mariana Mortágua, na sequência de um pedido do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa. De acordo com o parecer a que o Observador teve acesso, também o ex-deputado Jorge Costa seria visado no caso de ter sido reeleito, mas a comissão não deliberou sobre o dirigente por este ter ficado fora dos eleitos pelo Bloco.

No despacho do tribunal, citado várias vezes pela Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, a justiça notava que “não podendo o partido ser responsabilizado criminalmente pela prática do ilícito”, os deputados eram os “responsáveis quer pela gestão da referida página na internet, quer pela decisão quanto à reclamação oportunamente apresentada pela queixosa e respetivo pedido de eliminação da publicação”.

Os deputados que analisaram o pedido consideram que “não se vislumbram nos elementos remetidos pelo tribunal, nem nos esclarecimentos adicionais prestados pelo Ministério Público, dados que permitam dar pela presença de quaisquer indícios da prática pela senhora deputada Mariana Mortágua, a título individual e pessoal, de quaisquer atos de execução dos ilícitos criminais sob investigação”.

Entre os argumentos, o facto de o Bloco de Esquerda ter “respondido ao pedido de identificação de quais os colaboradores responsáveis” pela página em causa com “a mera indicação de que a responsabilidade pela mesma é do próprio Bloco de Esquerda”. “Sem mais, não permite inferir a prática pela deputada Mariana Mortágua.”

Mais do que isso, a procuração do Bloco de Esquerda em nome de Mariana Mortágua e Jorge Costa não é, na visão da comissão, “suficiente para demonstrar indícios de que a senhora deputada esteve envolvida na conceção ou gestão da página na internet através da qual a queixosa foi lesada”. Perante este cenário, em declarações aos jornalistas, Alexandra Leitão justificou que a procuração assinada pelos bloquistas não é recente, que foi assinada num outro processo e que, com base nisso, foi desenhado um “nexo de causalidade que não existe”.

A Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados realça, no parecer, que o Ministério Público esclareceu que “o que está em causa é a investigação de comportamentos individuais que consubstanciam a prática de ilícitos penais” e concluiu que os elementos remetidos à Assembleia da República “não o demonstram minimamente”.

Caso de Mariana Mortágua "é diferente de outras em que não havia dúvidas que tinham sido [os deputados] a praticar aquele ato e o que se ia investigar é se o ato é ou não um ilícito criminal”
Alexandra Leitão, presidente da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados

“Se é clara a resposta do Ministério Público de que o Código Penal não permite a responsabilização penal da pessoa coletiva por este ilícito, perante um elenco taxativo constante do n.º 2 do artigo 11.º do Código Penal, não nos parece poder depois concluir, como faz, que os “deputados, enquanto representantes do partido denunciado, deverão ser constituídos arguidos e interrogados nessa qualidade, visto que assumem que o responsável pela publicação é o partido que representam”, pode ler-se no parecer da comissão.

Alexandra Leitão, presidente da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, fez uma conferência de imprensa após as declarações de André Ventura, e justificou que esta situação “é diferente de outras em que não havia dúvidas que tinham sido [os deputados] a praticar aquele ato e o que se ia investigar é se o ato é ou não um ilícito criminal”.

A ex-ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública assegurou ainda que Mariana Mortágua “não se opôs ao levantamento da imunidade” e que se mostrou disponível para responder à justiça. “Não é verdade que tenha sido pedido o não levantamento pela senhora deputada, muito pelo contrário.”

De que é que Mariana Mortágua é acusada?

A queixa em causa remete para o site despedimentos.pt, em que o Bloco de Esquerda propunha ajudar a “mapear a responsabilidade social de quem despede e abusa dos trabalhadores em plena pandemia”.

No site, criado para o efeito, o partido recebia as denúncias de violações dos direitos laborais e tornava-as públicas, nomeadamente exemplos de despedimentos, salários em atraso, situações irregulares de lay-off ou ameaças a trabalhadores.

O Observador sabe que um dos empresários visados sentiu-se lesado e fez queixa contra o Bloco de Esquerda. A denúncia nunca foi particularmente dirigida a Mariana Mortágua nem a Jorge Costa, os dois dirigentes apenas tinham assinado uma procuração do partido que acabou usada para este caso e apenas por esta razão viram o nome envolvido na necessidade de pedido de imunidade parlamentar.

O Chega quer acabar com a imunidade parlamentar?

Depois da decisão do Parlamento, o Chega vai apresentar um projeto de lei que pretende levar a cabo uma alteração ao estatuto dos deputados, seguido de um “projeto de alteração constitucional para acabar com o sistema de imunidade dos deputados”.

"A Assembleia da República deve autorizar que os deputados sejam ouvidos como declarantes ou como arguidos, sempre que os factos subjacentes ao pedido não digam respeito a votos ou opiniões que emitirem no exercício das suas funções", pode ler-se na proposta do Chega

Onde se lê que “os deputados não podem ser ouvidos como declarantes nem como arguidos sem autorização da Assembleia, sendo obrigatória a decisão de autorização, no segundo caso, quando houver fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a 3 anos”, o Chega pretende que passe a ler-se que “a Assembleia da República deve autorizar que os deputados sejam ouvidos como declarantes ou como arguidos, sempre que os factos subjacentes ao pedido não digam respeito a votos ou opiniões que emitirem no exercício das suas funções”.

A justificação do partido de André Ventura prende-se com o facto de os deputados “não poderem ser responsabilizados relativamente aos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções, e outro relativo às imunidades em específico”.

“O sistema de imunidades parlamentares que se justificava no século XIX mas já não tem nenhuma justificação nos dias que correm”, sublinhou.

O líder do Chega, em conferência marcada propositadamente para falar sobre o tema, referiu-se à situação como um “caso inédito e sem comparação na atividade parlamentar portuguesa” e prometeu levar “o assunto até às últimas consequências”.

Em comparação com as vezes em que já viu a imunidade levantada, André Ventura disse que a Assembleia da República fez um bom entendimento do caso e referiu ainda que “o Chega nunca se refugiará em qualquer estatuto de imunidade”.

“Uma deputada escondida atrás da imunidade parlamentar não envergonha só a própria deputada, envergonha todos os deputados”, acusou André Ventura.

O Chega vai votar contra o parecer em causa, tendo já sido o único partido dos presentes que se opôs na Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados.

Mortágua vs. Ventura. O tweet que une e que os separa

Um dos levantamentos de imunidade de André Ventura é exatamente devido a uma queixa de Mariana Mortágua. Em causa estava uma publicação no Twitter da comentadora espanhola e a consequente partilha de André Ventura — em que o líder do Chega dizia estar existir uma questão “grave demais” e onde eram pedidas “algumas explicações” à deputada.

A resposta de Mariana Mortágua acabou por acontecer exatamente na rede social, onde a deputada antecipou que iria fazer queixa por difamação. “Ventura e Seguí vão responder em tribunal por difamação. Mesmo ridícula, uma calúnia é uma calúnia”, escreveu a deputada.

Mais tarde, no programa da SIC Notícias “Linhas Vermelhas”, Mortágua voltou a referir-se ao caso dizendo que se trata de “um caso de justiça” que “deve ser julgado na Justiça”. Além disso, realçou ainda que “é preciso muito desespero político para se inventar uma mentira como esta”.

No dia em que o Ministério Público pediu o levantamento da imunidade de Ventura, o líder do Chega referiu ao Observador que a queixa “mostra como Mariana Mortágua lida mal com o escrutínio público e que o quer para os outros não é o que quer para ela”, referindo-se ao caso em que a deputada do BE acumulou exclusividade no Parlamento com programa remunerado na SIC — uma situação que disse estar resolvida, tendo pedido para haver um acerto de contas no valor do salário.

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