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Membros da comunidade LGBT comovidos com o atentado, deslocaram-se ao local
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Membros da comunidade LGBT comovidos com o atentado, deslocaram-se ao local

OBSERVADOR

Membros da comunidade LGBT comovidos com o atentado, deslocaram-se ao local

OBSERVADOR

“Não respires.” Os minutos do ataque em Oslo que reavivam trauma de Breivik

Tiroteio investigado como terrorismo reavivou memória dos atentados de Breivik. Organização cancelou Marcha Pride mas comunidade reuniu-se na rua. Sobreviventes relatam ao Observador em Oslo o ataque.

Anna atirou-se para o chão assim que ouviu os primeiros disparos. A amiga, de costas para a rua de onde partiram os tiros, não se mexeu durante todo o tempo em que um homem atirou sobre a multidão que estava nos bares e que passava pela avenida Rosenkrantz, no centro de Oslo, capital da Noruega. Duas pessoas morreram e pelo menos 21 outras ficaram feridas, algumas baleadas e outras com cortes no corpo, provocados pelos vidros dos copos partidos e das divisórias das esplanadas ao longo da rua. “Muita gente não se apercebeu de que aquilo eram disparos. Eu lembrei-me logo das pistolas que se usam nas provas de atletismo para dar o tiro de partida. Um senhor ao meu lado queria levantar-se e correr mas eu agarrei-lhe o braço e disse-lhe: ‘Não respires’”, conta ao Observador poucas horas depois do ataque que ocorreu na madrugada de sábado.

A mulher está de cócoras, encostada à parede do Hotel Thon, do lado oposto ao dos bares que foram alvo do ataque. Vestida de preto da cabeça aos pés, fuma um cigarro atrás do outro e vai colocando as beatas na taça de café que acabou de beber. Na manhã seguinte ao atentado, Anna — nome fictício, já que pede ao Observador para não ser identificada — vai falando longamente ao telefone e tranquilizando família e amigos, garantindo-lhes que está tudo bem. “Dez minutos antes, tinha pedido à minha amiga para trocar de lugar comigo porque era aborrecido estar ali sentada de costas para a rua, queria ver as pessoas a passar.”

Apesar de ser cerca de uma da manhã, estavam centenas de pessoas na rua em Oslo, na madrugada deste sábado. Foi a amiga de Anna, de costas para a rua, quem acabou por assistir com mais detalhe aos minutos de terror. “Ele chegou a pé, vindo da rua principal. Trazia um boné na cabeça, uma t-shirt de um amarelo muito forte e umas calças pretas”, começa por descrever Ase, que também prefere não dar o nome verdadeiro. “Parou em frente ao [bar] Nilsen, tirou duas armas da mochila e começou a disparar a pistola.” Empunhou uma arma em cada mão e começou a atirar, aparentemente sem alvos definidos mas com a clara intenção de atingir quem ali se encontrava.

Os óculos de sol escondem as marcas com que Thomas ficou da noite anterior — tem um hematoma por baixo do olho direito, possivelmente provocado por uma pancada quando tentava proteger-se dos disparos. Ainda na praça em frente ao Hotel Thon, o homem refere ao Observador que a primeira arma disparada até ao último cartucho era uma Glock. Quando gastou as munições da pistola — “devem ter sido uns seis, sete tiros”, diz o homem —, começou a disparar a semi-automática.

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Nenhum dos três sabe precisar quanto tempo durou aquele episódio. Anna descreve que o homem começou a disparar quando estava em frente ao bar Nilsen, na praça Rosenkrantz — onde terá feito as duas vítimas mortais —, e foi avançando para os bares seguintes, do lado esquerdo da rua. “Tinha cerca de 1,75 e era um homem de envergadura média”, descreve Ase. “Algumas pessoas, como eu, atiraram-se para o chão. Outras começaram a correr em todas as direções. Essas gritavam muito. Quem estava no chão ficou em silêncio absoluto. Eu só queria sobreviver, só pensava nisso”, recorda Anna.

O atacante não disse uma única palavra, garante.

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“Era espancado ali mesmo.” Atacante detido por populares

Passados alguns instantes, Anna ouviu alguém dizer em voz alta: “Aqueles que não estão feridos, corram”, possivelmente um dos muitos elementos responsáveis pela segurança dos espaços noturnos na cidade. Ase continuava exatamente no mesmo sítio, sem conseguir reagir. “Eu congelei, não tive reação nenhuma, fiquei simplesmente paralisada.”

No momento em que ouviram a indicação para sair dali, o grupo de amigos, todos na casa dos 50 anos, apercebeu-se de que o atacante estava a ser imobilizado. “Algumas das pessoas que estavam nos bares conseguiram agarrá-lo e mantiveram-no deitado no chão até a polícia chegar”, poucos minutos depois, relata o marido de Ase ao Observador. “Se a polícia não tivesse chegado tão rápido, penso que ele [o atacante] teria sido pontapeado e esmurrado por quem ali estava. Era espancado ali mesmo. As pessoas estavam muito revoltadas, sentiam muita raiva pelo que tinha acabado de acontecer”, diz Anna, enquanto apaga outro cigarro para atenuar os nervos.

O hotel (o Thon Rosenkrantz) onde o grupo de amigos se tinha alojado para passar o fim de semana serviu de hospital de campanha do ataque. Num primeiro momento, dezenas de pessoas foram encaminhadas para o interior do hotel, foi distribuída água e avaliada a condição dos feridos. Depois, as testemunhas do ataque foram sendo transferidas para o último piso, já com o alerta da polícia de que não poderiam comunicar entre si — teriam prestar depoimento por escrito antes de poderem regressar aos quartos ou seguir para outro local. “De todas as pessoas com quem falei depois, nenhuma pensava que estava a acontecer um ataque, não identificaram aquele som como sendo de disparos de arma”, refere Anna.

Com ela foi diferente. “Pensei que poderia não ser só uma pessoa. Tive medo de que estivesse aqui um atirador e que mais abaixo pudesse haver outro, pensei que poderia haver explosões, bombas. Lembrei-me do Breivik.” Fala de Anders Breivik, terrorista de extrema-direita que matou 77 pessoas num atentado em 2011.

No hotel Thon, mas dentro no quarto do sétimo piso estava o sueco Erik Joahnssun e a companheira. “Ouvimos tiros e pouco depois as sirenes. Ainda tentámos sair para ver o que se passava, mas eles não deixavam. Do quarto, ainda víamos parte da praça, mas não a zona dos disparos”, conta ao Observador Erik. O casal de suecos veio de Sunsvall, cidade a 342 quilómetros de Estocolmo, para celebrar a semana do orgulho LGBT. “É a minha primeira vez aqui e foi logo acontecer isto”, lamenta.

Erik está indignado com o que aconteceu e “triste” por já não participar nos eventos que tinha planeado, mas compreende que garantir a segurança seja importante e elogia “a ação rápida da polícia”.

A mancha de sangue nas bandeiras e o orgulho que se recusou a ficar em casa

Na noite de sexta-feira, a poucos minutos da tragédia, Oslo era uma verdadeira cidade arco-íris. Junho tem sido um mês assim, de celebração, e tudo culminava com uma grande marcha do orgulho LGBTQIA+ prevista para as 14h00 deste sábado. Pela cidade, onde foi de dia até bem perto das 23h00 da noite, noruegueses e estrangeiros vindos de vários pontos do globo exibiam bandeiras e símbolos. Concertos em vários pontos da cidade, com um palco principal no parque Spikersuppa (uma espécie de pequeno Central Park em Oslo) e festas por bares, todos eles com bandeiras a anunciar que a tolerância é unânime.

Há bandeiras do orgulho LGBTQIA+ em todos os edifícios públicos, mas também em taipais da construção civil, em empresas privadas, casas particulares ou em qualquer suporte que dê para segurar uma bandeira. São mais, muitas mais, que as bandeiras da Noruega.

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Três horas antes do ataque, a presidente da câmara de Oslo, Marianne Borgen, discursou num evento restrito — com fact checkers que participaram no encontro global que decorreu na cidade e no qual o Observador esteve presente — e destacou o entusiasmo da cidade em “voltar a ter uma marcha do orgulho LGBT presencial” depois de dois anos de pandemia em que isso não foi possível.

Foi neste ambiente friendly e tolerante que o atentado ocorreu, deixando a comunidade em choque. E o local do ataque não desprovido de simbolismo. O London Pub, bem como a esquina mais próxima, é um local de referência para encontros entre pessoas do mesmo sexo desde 1979.

Na manhã deste sábado, o Observador pôde testemunhar a comoção geral, com várias pessoas a depositarem flores em homenagem às vítimas no local onde ocorreu o tiroteio. Na florista Akersgata, a mais próxima do local, a fila nunca pára e o stock já revela dificuldades, ao início da manhã, para corresponder à procura. Para a esmagadora maioria dos presentes, está claro que este não foi um ataque aleatório, mas sim um ataque à comunidade e à sua liberdade. “Isto nunca vai parar, não estamos seguro em nenhum lado”, lamentava um dos presentes, ao mesmo tempo que lembrava o trágico massacre no Pulse, em Orlando, nos EUA.

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A marcha do orgulho LGBT nos moldes que estava prevista foi entretanto cancelada. Em comunicado, a Oslo Pride, responsável pela organização do desfile, informou que “recebeu conselhos claros e recomendações da polícia para cancelar o desfile, o parque Pride e todos os outros eventos relacionados com Oslo Pride”. No mesmo documento, o Oslo Pride pede a “todos os que planeavam assistir ou assistir ao desfile que não compareçam.” E reforça: “Todos os eventos associados com Oslo Pride foram cancelados.”

Quatro horas depois deste pedido do Oslo Pride,  milhares de pessoas, como testemunhou o Observador, organizaram-se numa concentração e marcha espontâneas nas imediações das ruas do ataque. A marcha com milhares de pessoas está assim, à hora de saída deste artigo, a realizar-se de forma não-oficial.

A polícia ainda está a investigar se o alvo do ataque eram mesmo as comemorações da semana do orgulho LGBTIA+ em Oslo.

Polícia investiga motivações do ataque

Horas depois do ataque, como o Observador pôde testemunhar, várias equipas forenses recolhiam provas no local. Os comunicados da polícia norueguesa são, para já, recuados quanto às motivações do ataque. Numa primeira comunicação, a polícia confirmou que o ataque está a ser investigado como um ato terrorista e disse também que tinha reforçado a sua presença em virtude da conjugação “do incidente com vários eventos que existem em Oslo este fim-de-semana”. É uma alusão aos eventos da Oslo Pride, sem especificar.

Também na sequência do atentado, a polícia norueguesa informou que a polícia foi armada na sequência do ataque. No país, a maioria dos polícias (em particular aqueles que fazem policiamento de proximidade e andam nas ruas) não andam armados, naquilo que é considerado um exemplo de segurança. A primeira resposta foi, assim, armar a polícia.

As primeiras indicações da polícia, neste momento, é que foi um ato isolado e, por isso, as autoridades acreditam que não haverá sequência deste ataque. Apesar disso, essa despistagem está a ser feita e é possível que, nas próximas horas, seja alterado o nível de segurança.

O trauma de um homem só que matou 77 num dia

O ataque da madrugada deste sábado em Oslo é o primeiro a ser investigado como ato terrorista desde o atentado de 22 de julho de 2011. No 22/7, data traumática para os noruegueses, o terrorista de extrema-direita Anders Breivik operou ataques no centro de Oslo junto a edifícios governamentais (com recurso a explosões que atingiram civis) e na ilha de Utoya, onde decorria um acampamento da organização juvenil do Partido Trabalhista da Noruega.

Nesse dia, na sequência do atentado, morreram oito pessoas que passeavam na rua e mais 69 jovens que estavam no acampamento em Utoya — ou atingidos diretamente por Breivik ou porque se afogaram na tentativa de fugir ao ataque. Um total de 77 mortes provocadas por um homem só.

Uma das bombas que explodiu na cidade de Oslo foi colocada numa zona próxima do gabinete então primeiro-ministro — também ele do Partido Trabalhista — Jens Stoltenberg, que é secretário-geral da NATO desde que abandonou o cargo em 2014.

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