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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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"Não voltem a fechar-nos em casa". Lúcia tem 85 anos e vive num bairro confinado de Madrid

Lúcia, 85 anos, está há sete meses sem abraçar os familiares, que a visitam pela janela com medo de a infetar. Ao Observador diz que mal conseguia andar quando acabou a quarentena.

Reportagem em Madrid

No dia em que Lúcia voltou a pisar o chão da rua, depois de dois meses enfiada em casa, as suas pernas pareciam não querer andar. O pé doía, e ainda dói, e o caminho parecia multiplicar-se à medida que avançava, tornando difícil percorrê-lo. Aos 85 anos, com o peso da idade a consumir-lhe a massa muscular do corpo, voltou a caminhar pela manhã com duas amigas, mas de uma forma complemente diferente: cada uma de máscara, com a distância de 1,5 metros entre delas, que tentam manter também quando escolhem um banco de jardim para se sentarem e ganharem fôlego.

Um dos hábitos que permaneceu com a pandemia foi, no entanto, o das visitas à distância das filhas e dos netos. Desde fevereiro que não sente o calor de um abraço ou de um beijo e que os seus familiares a veem apenas pela janela ou lhe deixam os bens essenciais à porta temendo infetá-la com o novo coronavírus.

Lúcia mora no rés do chão de um dos prédios em tijolo laranja que tornam o bairro de Almendrales um local acolhedor com vontade de ser explorado num sábado de sol. Num normal dia de sol, que não é o caso. Alemendrales faz parte do distrito (o equivalente a uma freguesia) de Usera, em Madrid, que tem cerca de 142 mil habitantes e está entre os três com maior taxa de incidência de casos de Covid-19 nas últimas duas semanas. E que foi dos primeiros 37 a serem alvo de restrições.

Luzia está em casa, de máscara, enquanto recebe os netos à janela

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Além deste bairro, os moradores dos bairros de Las Calesas, Zofío, Orcasur e San Fermín, no mesmo distrito, estão igualmente sujeitos a essas regras: não podem sair da sua área de saúde (correspondente ao centro de saúde onde estão inscritos), a menos que seja para trabalhar e tenham uma declaração a atestá-lo; não podem receber pessoas de fora, a menos que seja para prestar-lhes cuidados de saúde, por exemplo; e devem sair de casa apenas para o essencial. Esta sexta-feira, o bairro de Orcasitas, também em Usera, somou-se a esta lista, estando entre os 11 novos locais sujeitos a iguais restrições — por decisão da Comunidade Autónoma de Madrid, e contrariando o governo central que, por sua vontade, sujeitaria toda a cidade de Madrid às mesmas regras.

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Segundo os últimos dados disponibilizados pela Comunidade Autónoma de Madrid, a 22 de setembro Usera tinha 740 novos casos positivos, com uma taxa de incidência acumulada nos últimos 14 dias de 529,55 por 100 mil habitantes.

O ministro da Saúde voltou a apelar este sábado ao governo executivo de Madrid que tome medidas porque está a pôr em perigo as comunidades limítrofes.

Lúcia está à janela, de máscara, enquanto fala com os netos que a visitam numa altura em que o ministro da Saúde volta a falar ao país através de uma conferência de imprensa realizada em Barcelona, na manhã deste sábado. Já 24 horas antes Salvador Illa tinha falado (ao mesmo tempo que a presidente Isabel Díaz Ayuso apresentava medidas diferentes das dele), defendendo que toda a cidade de Madrid deveria ser confinada e sujeita às mesmas regras, assim como os municípios com uma incidência de mais de 500 casos por cada 100 mil habitantes nos últimos quinze dias. Este sábado, enquanto Lúcia falava com Lorena e o namorado, voltou a fazê-lo, mas num tom mais incisivo.

Alemendrales faz parte do distrito (o equivalente a uma freguesia) de Usera, em Madrid, que está entre os três com maior taxa de incidência de casos de Covid-19 em quinze dias. E que foi dos primeiros 37 a serem alvo de restrições

O governante insistiu novamente para que o executivo regional tome medidas sob risco de colocar também as comunidades limítrofes de Madrid em risco, convidando a presidente Ayuso a alterar as regras o mais rapidamente possível.

“A situação em Madrid é complicada, muito séria e vêm aí semanas muito duras, o que há a fazer é concentrar as energias”, disse, citado pelo El Mundo, e insistindo que “não estamos perante uma batalha ideológica”, mas, sim, epidemiológica.

Lúcia só deseja uma coisa: “Não voltem a fechar-nos em casa”.

O bairro de Usera está localizado ao pé do hospital 12 de outubro, mas os seus moradores só podem ir para aquela zona com autorização escrita

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Do lado de fora da janela, a neta Lorena e o namorado conversam com ela. Vivem uns quarteirões acima, mas no mesmo bairro, e desde fevereiro que não entram na casa da avó. Apenas falam com a idosa pela janela. Ainda não tinha sido declarado o estado de alarme no país — foi declarado a 14 de março –, já a escola onde trabalha como professora fechava portas e mandava todos para casa.

“Na altura decidi logo não estar com a minha avó, porque podia ser um risco”, lembra Lorena.

A família de Luzia, que vive num bairro confinado, deixou de ter contacto próximo com ela em fevereiro. Deixam-lhe a comida à porta e falam com ela pela janela do rés do chão onde vive.

O almoço durante a semana e os convívios de família foram cancelados. Era costume Lúcia passar o sábado com ela e os pais e o domingo com a outra filha e netos. Agora que Lorena regressou à escola onde trabalha, manteve as mesmas restrições na sua vida.

“Neste momento tenho três salas fechadas. Por isso, vou manter-me assim”, diz, enquanto olha para a avó, que parece já resignada com esta nova realidade.

“Avó, quando foi a última vez que abraçaste os teus netos?”, pergunta-lhe. “Uiiiiiii, netos e filhas! Desde fevereiro…”, diz, sem se conseguir ler as suas expressões, que estão escondidas atrás de uma máscara. “Foi um golpe muito duro para os idosos. A minha vida agora é em casa”, revela a idosa.

Lorena trabalha numa escola e logo em fevereiro deixou de visitar a avó

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Esta semana, com estas novas medidas, Lúcia saiu para o seu passeio habitual, até que chegou próximo do hospital 12 de Outubro e lhe disseram que aquela área já não era a sua. “Não sabia, então fui para outra rua. Não nos deixam ir para um lado, vamos para outro”. Lúcia só quer poder continuar a caminhar, para não perder a mesma força que perdeu na quarentena, quando foi obrigada a manter-se em casa.

Sem saber o que aí vem, a neta teme o Inverno: “Por enquanto, os serviços médicos ainda não estão cheios, mas com constipações, gripes e a Covid-19, temo que tudo vá colapsar”.

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