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Michelle Evans é a responsável pelo estudo das tendências do consumidor na Euromonitor
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Michelle Evans é a responsável pelo estudo das tendências do consumidor na Euromonitor

Michelle Evans é a responsável pelo estudo das tendências do consumidor na Euromonitor

Nas lojas do futuro vai experimentar um casaco como se estivesse no Alasca

Lojas em Portugal "parecem tradicionais" e "muito à base de pagamentos em dinheiro". Michelle Evans investiga tendências de consumo até 2040 e explicou a executivos portugueses como se podem preparar.

Prateleiras “inteligentes” que nos dizem quantas calorias tem aquele leite condensado e de que outros ingredientes precisamos, tendo em conta os que já temos em casa, para fazer um bolo. Lojas de roupa desportiva onde podemos experimentar um casaco quente para uma viagem à montanha como se estivéssemos, efetivamente, numa encosta gelada.

Michelle Evans, da Euromonitor, empresa de análise de mercados, dedica-se investigar o que os consumidores do futuro vão querer ter em casa e nas lojas. Esteve em Portugal a apresentar os resultados da investigação a empresários, num encontro interno da Sociedade Francisco Manuel dos Santos. “Estive a fazer uma apresentação, agora fiz uma pausa para falar consigo enquanto eles se dividem em grupos e preparam perguntas para me colocar. Vou ser trucidada“, brinca a especialista, em conversa com o Observador. Já está habituada a ‘confrontos’ deste tipo, especialmente porque as suas mensagens sobre o rumo da tecnologia deixam as pessoas a pensar. Certa vez, já depois de ter falado, uma das pessoas na audiência confessou-lhe: “Hoje nem vou dormir“.

As lojas inteligentes serão uma tendência em 2040 — e para que tenham clientes, os retalhistas e os fabricantes terão de investir em experiências direcionadas ao consumidor. Alguns sinais das tendências estudadas por Michelle Evans já começam, aos poucos, a ver-se em Portugal — a Jerónimo Martins inaugurou no início de outubro uma loja sem caixas de pagamento nem transações em dinheiro físico; e no centro Vasco da Gama, em Lisboa, há cacifos para a recolha de compras feitas online. Ainda assim, do pouco que conheceu dos estabelecimentos lisboetas, Evans não ficou muito convencida. “Pareceu-me tudo muito tradicional.” Mesmo no que toca aos métodos de pagamento, “ainda muito à base de dinheiro físico”.

Li no seu Twitter que esteve à procura de uma loja em Lisboa com tecnologia inovadora de experiência direcionada ao consumidor. Encontrou alguma?
Não… (risos) Estive em Nova Iorque há algumas semanas e perguntei algo semelhante. Algumas pessoas que estão por dentro da indústria de retalho disseram-me para visitar isto e aquilo. E fui a uma loja da Samsung, onde não são vendidos produtos. Não dá para comprar nenhum produto da Samsung. A loja foca-se na experiência do cliente, na interação com telemóveis da marca. Por exemplo, desenhamos num telemóvel e a imagem é replicada algures. Esse tipo de ideia. No segundo piso têm apoio técnico ao cliente, mas a ideia principal é experimentar a própria marca.

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Experimentamos o produto, mas não podemos comprá-lo se gostarmos?
Eles têm outra loja onde podemos efetivamente comprar. Disseram-me que podia ir à loja X para comprar o produto, se quisesse. É interessante… sem produtos para comprar, só para os experimentar.

Michelle Evans (à esquerda) no evento de inauguração do novo escritório do Euromonitor em Dusseldorf, em junho de 2019

Daquilo que conhece de Lisboa, parece-lhe que a cidade ainda tem muito para aprender sobre experiências do consumidor?
Fiquei num hotel na Avenida da Liberdade e andei a passear pelas lojas. Pareceu-me tudo muito tradicional, mesmo nas lojas de luxo. Fui às lojas perto de um elevador histórico… não vi nada que me chamasse à atenção e que se destacasse.

Ainda são tradicionais relativamente a essa loja da Samsung, mesmo em relação às formas de pagamento…
Sim, e parecem muito à base de pagamentos em dinheiro físico.

Veio a Lisboa dar uma palestra a executivos sobre as novas tendências de consumo. O que lhes disse?
Temos este projeto chamado “Commerce 2040” [Comércio 2040]. Trata-se de pensar sobre como diferentes drivers [intervenientes] — sendo a tecnologia a mais importante — podem mudar diferentes ambientes direcionados ao consumidor. Falei sobre os “locais de entretenimento”, seja a casa ou a loja de retalho. Estamos também a refletir sobre os serviços de comida, como o restaurante do futuro. E na mobilidade, em que não há carros, mas temos viaturas nas quais podemos fazer as compras. Estamos, sobretudo, a pensar no comércio.

E quais as mudanças no comércio em 2040?
Penso que em casa vamos poder comunicar com muitas das nossas transações de comércio eletrónico. Há uma tendência da “casa inteligente”, tem havido muito hype à volta disso. Até agora ainda não ‘descolou’, mas há fatores-chave a juntar-se: a conetividade está a tornar-se mais forte, a banda larga mais universal. Além disso, muitos fabricantes de eletrodomésticos estão a dizer que a sua linha de produtos no futuro, em 2020, 2021, estará toda interligada. Não apenas no que toca aos produtos mais caros, mas até nos mais baratos. Portanto, vai ajudar a que se chegue a mais consumidores. Por último, os fabricantes estão a desenvolver mais produtos que vão intrigar os consumidores. Pensemos num fabricante de eletrodomésticos… Os aparelhos estão mais interligados, podemos não só, enquanto consumidores, ter uma relação com eles durante cada 10 ou 15 anos, mas estando conectados, os fabricantes podem oferecer-nos mais serviços devido a essa conetividade.

Por exemplo?
Pode ser manutenção preditiva, ou seja, a máquina é capaz de dizer que algo vai avariar no frigorífico antes de perderes toda a carne.

Vai dizer-nos ‘Preciso de manutenção’.
Exatamente. Além disso, estamos a ver a tecnologia nestes eletrodoméstico a avançar no sentido de podermos começar a ‘re-encomendar’ detergente automaticamente, por exemplo. Hoje, isso é algo que um retalhista já pode rastrear e dizer ‘Precisa de encomendar isto em cada três meses ou de mês em mês, e está na altura, por isso quer ‘re-encomendar’? Começamos a ver situações destas, em que a tecnologia está a ser embutida nestas máquinas e, assim, rastreia o nosso uso e o nosso consumo de forma mais precisa. E pode alertar-te ou voltar a encomendar automaticamente. Mas penso que os consumidores ainda querem ter um papel ativo. A minha hipótese é a de que os consumidores, mesmo apesar da automatização, ainda querem ser eles a tomar a decisão.

"Fiquei num hotel na Avenida da Liberdade e andei a passear pelas lojas. Pareceu-me tudo muito tradicional, mesmo nas lojas de luxo. Fui às lojas perto de um elevador histórico... não vi nada que me chamasse à atenção e que se destacasse."
Michelle Evans

Querem ser eles a dizer: ‘Eu preciso disto, eu quero aquilo’.
Sim. Isso é uma mudança de paradigma porque envia uma assinatura automática, que é bom para a maioria dos players envolvidos porque, neste caso, se somos o fabricante sabemos que o nosso detergente vai ser vendido em cada X semanas. Mas se não somos o fabricante ou retalhista que o vende, é eliminado todo o processo de descoberta, de certa forma, do produto. Se alguém está “preso” a comprar um detergente à Amazon, como é que outro fabricante pode influenciar essa decisão?

Como referiu, o consumidor pode querer ter uma postura mais ativa, pode ser ele a procurar…
Sim. Penso que o consumidor terá de procurar, de forma ativa, tomar outra decisão porque… quando olhamos para o que os consumidores dão valor, cerca de 65% dizem que o importante é terem a vida simplificada. E cerca de 40% a 50% dizem que estão dispostos a gastar mais dinheiro para pouparem tempo, portanto, há o elemento da conveniência. Ambas as situações estão a aumentar. Os consumidores podem optar por se “filiarem” a um fabricante apenas para simplificarem as suas vidas, apenas para pouparem tempo.

Os consumidores ainda querem ir às lojas físicas ou preferem que os produtos lhes sejam entregues em casa?
Quando falamos sobre a loja de retalho, os dados mostram que definitivamente estamos a mudar em direção ao comércio online. O outro lado da moeda é que quando questionamos os consumidores, 47% dizem que querem ver ou experimentar algo. Essa é uma razão para ir às lojas. Penso que a tecnologia pode ajudar a criar essa experiência da loja dentro de casa, porque poderemos vir a usar inteligência artificial para ver como algo nos assenta, podemos usar a realidade virtual para criar uma experiência virtual que faz com que pareça que estou numa loja a fazer compras.

"Cerca de 65% dos consumidores dizem que o importante é terem a vida simplificada. E cerca de 40% a 50% dizem que estão dispostos a gastar mais dinheiro para pouparem tempo."
Michelle Evans

Mas dentro de casa?
Sim, poderíamos pôr óculos e ver como ficaria. Há formas de melhorar a experiência, mas no que toca a determinadas categorias de produtos, há definitivamente a necessidade de os sentirmos. Provavelmente o que vai acontecer é que os produtos do dia-a-dia, de conveniência, podem ficar mais automatizados, poderemos comprá-los online, mas os produtos que compramos raramente ou por impulso, podem ter uma funcionalidade na loja. Por exemplo, o que disse hoje [aos empresários] é que provavelmente continuará a haver uma loja de conveniência, e provavelmente serão mais tecnológicas, onde escolhemos o produto da prateleira, que me informa sobre a constituição nutricional, se é consumível, etc. Se for comida pode dar-me ideias de receitas, pode estar ligado a minha casa e diz: tens este ingrediente, mas não tens este, queres este também? A grande diferença tem que ver com as categorias de produtos como eletrónica, mobiliário, vestuário, e até beleza. Para esses produtos ainda é divertido ir às lojas.

Como na experiência da Samsung.
Sim, tal como na experiência da Samsung de que falei há pouco… Tocamos nos diferentes produtos da Samsung e vemos as várias formas de uso. Muitos players na área da maquilhagem estão a experimentar a inteligência artificial, em que podemos experimentar maquilhagem e podemos fazer isso em casa. Mas se virmos lojas como a Sephora… eles fazem um trabalho fantástico com as maquilhadoras nas lojas, e há um atendimento pessoal. É uma grande mudança que vamos ver porque as lojas de conveniência apenas vão representar uma pequena percentagem de lojas de retalho no futuro. Acho que muito mais do que vem é esta mudança em torno da experiência. Ou talvez no caso da Samsung, como disse no início, há uma loja à qual podemos ir comprar, mas se é uma loja de roupa, talvez tenham um exemplar de cada produto que possamos experimentar e talvez nos seja entregue mais tarde.

Poderemos no futuro experimentar um casaco e na loja podemos sentir como se estivéssemos no outro lado do mundo?
Esse foi o exemplo que usei na palestra, o de uma loja de vestuário desportivo. Por exemplo, experimentamos um casaco de inverno porque queremos ir fazer uma caminhada na Patagónia, ou no Alasca, onde faz frio. Parte da experiência pode ser testar o produto, neste caso, testar para o frio. Ou talvez seja apenas uma roupa bonita que queremos usar num sábado à noite. Podermos ver com diferente luminosidade. Ou experienciar o terreno para onde vamos com os sapatos que queremos. Tudo na loja. Tem que ver com sermos capazes de criar estas experiências da vida real ou cenários para percebermos como iria resultar nas lojas.

O futuro do retalho. Como será ir às compras num “shopping” em 2028?

Quando é que isso estaria disponível? As lojas já estão a experimentar essa tecnologia?
Estamos a ver pouco a pouco. A razão por que chamamos a este projeto ‘Commerce 2040’ é porque achamos que legitimamente vai demorar 20 anos até que esta tecnologia esteja mais largamente disponível. Irá começar em alguns países, ou cidades, de forma mais rápida do que noutras, será mais significativo em certas categorias de produtos. Iremos ver esta ascensão, mas muito do que achamos que o futuro espera vai requerer muito mais mudanças nas  infraestruturas, o que vai obviamente abrandar o processo. Quando pensamos nas mudanças tecnológicas dos últimos cerca de dez anos, o Airbnb, a Uber, estas plataformas usam tecnologia a um nível muito superficial — o Facebook para ligar amigos, o Airbnb para ligar um comprador a um vendedor. Portanto acreditamos que a próxima leva de mudanças será mais em termos de infraestruturas.

Que mudanças seriam necessárias?
Refiro-me à casa, por exemplo, ter mais espelhos ou ecrãs interativos na casa. Tudo isso precisa de ser construído. As lojas de retalho, se apostarem em sistemas de experiência focados no cliente… isso vai requerer muitas mudanças. Mesmo o ambiente das lojas de conveniência, aquilo a que chamamos o ‘comércio desacompanhado’ — a ideia de agarrar algo das prateleiras e ir embora. Vemos isso a emergir. Por exemplo, a Amazon está a aplicar isto nalgumas das lojas, estão a construir novas lojas de raiz. Há algumas startups a aparecer que podem desenvolver estas ideias com tecnologia algo simples, pode ser apenas pôr câmaras nos tetos para monitorizar as pessoas na loja, mas a Amazon está mais ao nível da prateleira. Tudo tem de ser construído com a tecnologia a seguir as pessoas.

Mas porquê?
É uma questão de os consumidores sentirem os produtos, que são depois automaticamente adicionado ao nosso ‘carrinho de compras’ virtual. Podem sair da loja sem terem de fazer ‘checkout’, ir à caixa.

Os retalhistas teriam de investir muito para aplicar essas mudanças. Estão dispostos a isso?
No caso da Amazon penso que é um grande investimento. O que estamos a ver com algumas destas startups é que será menos intensivo em termos tecnológicos, penso que será mais ‘fazível’ para algumas empresas. Como qualquer investimento, temos de ver aonde nos irá levar, quanto é que vamos ganhar em vendas, ou cortar em custos laborais. E provavelmente só vai acontecer nalguns locais. Pensemos numa loja conveniência em que colocamos esta tecnologia… pode ser apenas numa escala mais pequena, para que a loja possa funcionar 24 sobre 24 horas. Talvez apenas uma pessoa esteja lá só para repor o stock das prateleiras e ajudar caso haja algum problema de tecnologia. De outra forma, não serão precisos tantos trabalhadores.

Jerónimo Martins, dona do Pingo Doce, inaugurou loja sem caixas nem pagamentos em numerário

Haverá menos trabalhadores então.
Estamos a ver uma grande quebra de trabalhadores nas lojas, devido à mudança para o online. As mudanças de que falei pode certamente levar a isso. Provavelmente, serão necessárias outras skills. Talvez o operador de caixa no supermercado, que faz o scanner dos items, pode ser substituído. Provavelmente o empregador vai preferir contratar alguém que tem mais competências de comunicação interpessoal, que consegue ajudar a criar estas experiências, dar vida à marca e ajudar os consumidores a terem uma melhor experiência dentro da loja. Esse tipo de trabalhos irão com certeza existir.

Vou poder ir a uma loja e não ter ninguém, só tecnologia?
Depende. É uma questão muito cultural e geracional. Até que ponto as pessoas estão dispostas a fazer compras ou a ir um restaurante sem um humano envolvido? Podemos ter robots a servirem-nos. Mas acho que haverá diferentes dinâmicas. No caso de uma loja sem humanos… posso ver isso a acontecer mais, talvez, numa pequena loja de conveniência a que vamos apenas a correr para comprar alguma coisa e saímos a correr, em que não precisamos de ajuda, a não ser que a tecnologia não funcione.

Mas as pequenas lojas vivem do contacto entre o cliente e o proprietário ou o empregado. E chega a ser pessoal: eu vou ali porque conheço aquele funcionário. Como podem as pequenas lojas atualizar-se?
É verdade e isso é muito importante nalgumas culturas, sem dúvida. É uma questão de… alguns consumidores podem nunca ir à loja de tecnologia com um conjunto de experiências, mas a questão é se as lojas conseguem que o consumidor continue ir a essas lojas apenas com base na relação que têm. E quando vai durar essa relação. Quando pensamos nas cadeias que podem colocar mais dinheiro nestes upgrades tecnológicos… há o investimento na tecnologia mas, em teoria, estão a cortar muito nos custos com trabalhadores, portanto, provavelmente faz mais sentido em certos mercados em que o custo laboral é maior. Pode fazer mais sentido nos EUA do que na Colômbia.

Nas conferências que faz com executivos, gestores, o que lhe dizem, que perguntas e preocupações têm?
Lembro-me de estar numa retalhista a falar sobre isto e houve uma ronda de perguntas. E uma mulher disse-me ‘não vou dormir hoje’.

O que lhe disse?
Foi uma apresentação semelhante. A pergunta dela era mais filosófica de certo modo. Ela estava a perguntar como fundamentalmente diferentes os consumidores vão ser no futuro. Irá a tecnologia isolá-los? Ou ainda haverá um sentido de comunidade?

Já vimos o que os retalhistas podem fazer nas lojas. E nos armazéns? Como podem os processos tornar-se mais eficientes com a tecnologia?
Há muitas formas de a tecnologia ajudar a cadeia de abastecimento, melhorar os processos nos armazéns, com robôs, etc. Acho que a grande tendência é a de sensores que se colocam nos produtos, e que estão a ficar mais baratos. Através deles podemos monitorizar os produtos ao longo da cadeia de abastecimento. E até dentro da loja até chegar ao consumidor.

Que vantagens poderia trazer?
Identifica o produto, permite saber onde está. Em termos logísticos, isso ajuda na eficiência. Tem também vantagens no combate à fraude. E pode ajudar quando se envia um produto a um consumidor, para ter a garantia de que o receberam. São tendências que se começam a observar.

Há pouco falou de tendências que vamos observar daqui a 20 anos. Que mudanças podem as lojas aplicar já e que fazem a diferença na experiência do consumidor?
Acho que depende do retalhista. Muito está a acontecer nos bastidores, em termos de uso da tecnologia no armazéns, como os sensores. Há muitas tecnologias aplicadas à experiência de checkout, para facilitar a saída do consumidor. Há diferentes tecnologias de auto-checkout, por exemplo, fazermos scan aos produtos com o telemóvel. Ou até um departamento na loja em que o funcionário tem um tablet e é ele que faz o checkout por nós, mas isto não se aplicaria tanto a supermercados.

Na nova loja Pingo Doce, não há caixas, filas nem dinheiro. Há sensores, câmaras e (claro) uma “app”

Disse há pouco que, segundo as suas previsões, será possível ir a um supermercado e saber quantas calorias, por exemplo, tem um produto. 
Foi uma das coisas de que falei com o grupo, tanto sobre essa situação de supermercado, mas também em casa. Pense num frigorífico conectado com outros dispositivos — e já há alguns que podemos comprar por apenas alguns dólares –, que pode tirar fotografias ao interior do frigorífico para saber que produtos tem lá dentro, e temos acesso a um ecrã no qual podemos encomendar os produtos de mercearia. No caso dos supermercados, acho que, no futuro, quando tirarmos o produto da prateleira, o sistema da prateleira estará ligado aos nossos sistemas pessoais, um pouco como o ‘Fitbit’ [pulseira de fitness] que monitoriza os meus passos e a minha atividade física.

A ingestão de calorias será assim monitorizada.
Se calhar, sim. O sistema saberá o que estamos a tirar da prateleira e pode guiar-me melhor numa decisão. Isso é algo que estamos a descrever para as lojas também. A chave aqui é que há várias bases de dados dispersas. E vemos que estão a interligar-se devido a parcerias. Estamos aliás a tentar perceber se não haverá mais fornecedores de dados que juntam toda a informação e que nos vendem enquanto consumidores. E nós dizemos: ‘Vou dar acesso a estas entidades porque quero esta experiência’. Essa é a grande questão com o projeto ‘2040’. É usar a informação de forma a que não seja assustadora. Subscrevemos porque a queremos. Mas as empresas terão de ser transparentes para dizerem o que estão a fazer e porquê.

RGPD. Um ano depois, os nossos dados já são privados?

E parece-lhe que os consumidores estão dispostos a prescindir da sua privacidade?
Acho que se formos transparentes, e se os consumidores souberem o que está a ser usado e como, acho que é diferente. Na nossa investigação fizemos um questionário a 40.000 consumidores e perguntámos se esta ideia é uma invasão da privacidade. É interessante olharmos para as respostas por gerações, porque os mais velhos dizem que sim, mas no caso da geração Z [nascidos entre finais dos anos 90 até sensivelmente 2010], há muito menos pessoas a concordar, e muito menos do que os millenials [geração que antecede a Z]. Ainda são muito jovens, por isso, se calhar não pensam nas implicações ou já cresceram com esta tecnologia a um nível em que aceitaram como uma forma de vida.

Mas há riscos…
Sim e aqui na Europa há a regulamentação GDPR [Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados] e é algo de que se está a falar globalmente. Se somos a Apple e estamos a operar aqui ou nos EUA, usamos o GDPR como guia e acabamos por fazer o mesmo em todo o sítio. Há legislação, pelo menos aqui na UE, que põe mais poder nas mãos dos consumidores. É uma questão de as empresas serem diretas para eles… e eles poderem quebrar as relações se se sentirem enganados. Tem que ver com a transparência.

Será suficiente para proteger os direitos dos consumidores?
São as multas vão manter as empresas na linha. Temos de assumir que os reguladores vão fazer o seu trabalho e vão atrás das empresas que não cumprem. A multa vai até 4% do volume de negócios em termos mundiais. Pode ser uma mudança global. Para alguém como a Google, pode ser uma multa muito significativa. Mas terá de haver essa atitude dos reguladores para manter as empresas na ordem.

Estuda as tendências do consumidor há quase dez anos. Lembra-se de algo que previu que iria acontecer e que não aconteceu?
Bem, não sei. Hum… antes de estar na Euromonitor, investigava os métodos de pagamento. Juntei-me em 2010 e, nessa altura, começava a falar-se dos pagamentos através de um dispositivo móvel. É uma tendência que ainda não avançou como muitos pensavam que iria avançar. Havia muita expetativa em relação a isso.

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Mas ainda tem sido um avanço lento.
Ainda tem sido muito lento. Está a avançar rapidamente, por exemplo, na China. No Reino Unido ou na Austrália há um mercado de cartões contactless muito forte. Esta ideia de colocar os telemóveis sobre o leitor contactless… nos EUA é muito difícil implementar estas mudanças porque há mais de mil bancos, portanto, a forma como os cartões são emitidos é muito diferente. Até há três anos ainda abundava muito a banda magnética, depois mudaram para chip e assinatura — nem sequer para chip e PIN, não somos assim tão evoluídos — e no último ano, ano e meio, é que têm investido mais no contactless. Em geral, a mudança desenvolve-se de forma muito diferente em diferentes grupos de consumidores, diferentes países e depois há uma dinâmica em cada indústria que tem influência.

Há uma resistência dos consumidores, dos comerciantes? Porque na República Checa, por exemplo, os cartões contactless estão muito generalizados.
Todos têm influência. No caso da República Checa e da Polónia… aí diferentes players da indústria juntaram-se para ajudar os comerciantes a atualizar-se e subsidiariam os novos terminais POS. Daí que nesses países a tecnologia contactless seja muito dinâmica. Esses dois mercados são grandes casos de estudo em contactless, mas porque foi a indústria a juntar-se. E a partir do momento em que estes cartões chegaram às mãos dos consumidores, eles começaram a usá-los. Nos EUA, como disse, a situação é mais fragmentada. Quando pensamos em quão mais desenvolvidos são os EUA… sim, é verdade que posso pagar com o meu Samsung, mas há uma razão para pagar com o telemóvel em vez de com um cartão?

Qual a resposta a essa pergunta?
Falei muito tempo sobre a questão da ‘lealdade’. Alguns players têm adicionado sistemas de pontos [em que o utilizador pode colecionar pontos à medida que faz pagamentos com o sistema móvel, podendo depois convertê-los em recompensas]. Tenho usado o Samsung Pay [um serviço de pagamentos móveis] há alguns anos, e ganhei alguns pontos, mas ainda não o suficiente para os converter. Nunca ganho o suficiente para converter nada. E, portanto, esta tecnologia ainda não arrancou com força. Há muito que podemos fazer no que toca à inteligência artificial e a personalização. Se juntarmos isso à experiência com o telemóvel, então, a lealdade nesse caso não tem só que ver com milhas, noites num hotel ou coisas grátis.

E os governos podem ajudar a subsidiar esta tecnologia?
Podem sem dúvida. Londres é disso exemplo. Vimos uma ascensão da tecnologia contacless depois dos Jogos Olímpicos de 2012. Eles já tinham cartões contactless nos transportes para Londres, e mesmo antes dos jogos passou a ser possível, em vez de termos de usar o cartão Oyster [uma espécie de Lisboa Viva ou Andante], podíamos usar os nossos cartões do dia-a-dia. E foi isso que impulsionou a tecnologia contactless.

Qual a tendência para o próximo ano que mais a entusiasma?
Para o próximo ano… Algumas coisas que já se destacaram para mim têm que ver com a casa inteligente, com os eletrodomésticos interligados. 2020 será um ano chave em que todos os produtos que se lançarem vão estar conectados. Isso vai impulsionar uma mudança em torno das casas inteligentes. Penso que outra inovação que vai marcar o ano é o 5G. Vai ser um ano em que países chave vão impulsionar o 5G. O Japão vai ter os Jogos Olímpicos e vai dar um empurrão à economia digital.

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Em que sentido?
O Japão é um caso estranho… é conhecido por terem muito conhecimento tecnológico, mas na verdade não é totalmente assim nalguns casos. É uma sociedade ainda muito dependente das transações em dinheiro, acho que não confiam nos cartões de crédito. Mas estão a investir na economia digital nesse sentido dos pagamentos digitais, e estão a dar um empurrão às iniciativas como o 5G para se prepararem para os Jogos. Também há testes a decorrer no Reino Unido e nos EUA. Mas quando falamos no 5G… os aparelhos têm de ser compatíveis e nem o novo telemóvel da Apple o é. Provavelmente só no próximo ano, quando o novo telemóvel sair, é que haverá compatibilidade com o 5G. Mas as pessoas estão a falar sobre o assunto.

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