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A Padaria Portuguesa tem atualmente 78 lojas.
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A Padaria Portuguesa tem atualmente 78 lojas.

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

A Padaria Portuguesa tem atualmente 78 lojas.

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

Nasceu de uma inspiração, cresceu para ser o Starbucks do pão e agora está à venda. O que vale a Padaria Portuguesa?

A Padaria Portuguesa nasceu em 2010 e 14 anos depois terá colocado o negócio à venda. Expandir muito mais requer dinheiro e a internacionalização ainda não avançou.

Engordou sete quilos nos primeiros meses da Padaria Portuguesa. Tinha de provar os produtos que entravam nas lojas, a primeira inaugurada a 5 de novembro de 2010, há 14 anos. As portas abriram na Avenida João XXI número 9, em Lisboa, chegando pouco tempo depois a Vila Franca de Xira (que acabaria por fechar).

Nuno Carvalho deu, desde a primeira hora, a cara (e literalmente o corpo, o que o fez engordar) pelo projeto que ambicionava ser o “Starbucks do pão”. “Queremos ter a maior rede de padarias de bairro do país”, declarava desde logo o presidente executivo (CEO) da Padaria Portuguesa. E ambicionava mais. Depois traçou como objetivo chegar a 2030 com uma faturação de 200 milhões de euros e até falou na internacionalização da operação. Hoje, a Padaria Portuguesa tem 78 lojas, a maior parte na Grande Lisboa, e já chegou ao “difícil” Porto. Fatura cerca de 43 milhões de euros. E os sócios puseram a empresa à venda.

A Padaria Portuguesa tem agora sete donos. Todos familiares. Nuno Carvalho surge à cabeça como o operacional dos primos e irmãos. Mas o mais mediático sócio é José Diogo Quintela, que integrou a equipa dos Gato Fedorento e que ainda hoje trabalha com Ricardo Araújo Pereira, além de ser colunista do Observador. “Tirando o sócio fundador, Nuno Carvalho, meu primo, ninguém faz nada. Só come croissants e dá bitaites”, indicava o humorista recentemente na Rádio Observador, onde assumiu que a internacionalização ainda não era para agora: “Ainda temos muito que crescer em Portugal”,

A empresa do humorista (denominada ZDQ e que além de José Diogo tem como sócia a mãe, Maria da Graça) é a detentora da maior participação na Padaria Portuguesa, designação que a sociedade RSCQ, constituída em março de 2010, adquiriu em dezembro desse ano. José Diogo Quintela tem quase 42,49% da companhia liderada por Nuno Carvalho, que por sua vez detém 33,33%. Os restantes cinco sócios têm quotas em nome individual e são todos da família de José Diogo e Nuno Carvalho, que são primos.

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Todos terão posto a sua participação à venda, tendo, segundo avançou o Jornal Económico, contratado o Haitong Bank, ex-BESI, para colocar o negócio no mercado. No pensamento estão fundos de investimento, com mais apetite por estas operações. Explorer, Oxy Capital, Crest, Atena são algumas entidades gestoras de fundos que se perfilam, sem o assumirem. A própria Padaria Portuguesa — assim como os seus sócios e o seu CEO — recusa comentar esta intenção de venda e nem presta informações sobre o negócio. Um negócio que tem vários desafios pela frente, apesar de ser uma operação lucrativa e que ano após ano tem vindo a crescer.

A última das atuais 78 lojas foi inaugurada já este mês de dezembro. “A Padaria Portuguesa acaba de reforçar a sua presença em território nacional com a inauguração da primeira loja em Alverca — a abertura faz parte do sólido plano de expansão da marca que atinge, assim, um total de 78 lojas. Como manda a tradição, durante esta quarta-feira, A Padaria Portuguesa vai oferecer café orgânico a todos os clientes que visitem a nova loja, situada na Rua Santa Maria, n.º4 A”. O comunicado, enviado às redações a 4 de dezembro, antecedia, por dois dias, a notícia do Jornal Económico, a dar conta da intenção de venda.

padaria portuguesa alverca

A loja de Alverca foi inaugurada este mês de dezembro

DR

Um negócio com expansão limitada?

Estas já 78 lojas estão, em particular, concentradas na Grande Lisboa, chegando já a Setúbal, Vila Franca de Xira, Alverca e Porto. Em 2023, a empresa fez uma parceria com a Galp para instalar a insígnia nos postos de combustíveis. “A Padaria Portuguesa 24” (APP24) foi pensada, revelou a empresa, para quem está à espera de carregar os carros elétricos. “A marca identificou a oportunidade de criar um espaço acolhedor e diversificado, oferecendo uma experiência de consumo mais agradável e completa – a par de tudo o que existe numa loja standard da marca, juntaram-se novas categorias como tabaco, snacks, jornais e revistas, e flores frescas”. Também este projeto foi iniciado em Lisboa, mas o objetivo é expandir para o Porto e Setúbal.

Acresce a este negócio de venda ao público as duas fábricas que fornecem as lojas: a de Marvila, em Lisboa, e a do Porto, que nasceu para fornecer as lojas na cidade Invicta, mercado que a Padaria Portuguesa iniciou em 2023. O Porto é, no entanto, um desafio adicional. Fontes do setor financeiro apontam limites ao crescimento do conceito no Porto, que tem unidades tradicionais de combate difícil. Em Lisboa, na altura do arranque da operação, havia muitas padarias e pastelarias dispersas. A tradicional Versailles só tinha, então, a loja histórica no Saldanha, iniciando anos mais tarde a expansão para várias unidades. Em 2017 abriu em Belém e no Centro Comercial Colombo (tem ainda unidades em três hospitais de Lisboa). Foi também num longínquo (em 1922) mês de novembro (dia 25) que a Versailles foi inaugurada. Em 2023, a Versailles faturou pouco mais de 5,3 milhões de euros, tendo registado lucros que ainda estão a limpar prejuízos anteriores.

Já a Padaria Portuguesa, em 2023, faturou quase 43 milhões de euros. No final desse ano tinha 64 lojas próprias (59 situadas na região de Lisboa e cinco no Porto), além das duas fábricas, uma em Marvila e outra em Matosinhos, e um centro logístico na Matinha. Se o negócio fosse gerado apenas pela área comercial significaria uma faturação por loja de mais de 600 mil euros/ano ou cerca de 1.800 euros por dia — uma conta que é meramente indicativa, já que as lojas não funcionaram todo o ano e há outros negócios, como o fabrico, não equacionados nesta divisão.

Nuno Carvalho é o CEO da Padaria Portuguesa. Não quis justificar a colocação no mercado da Padaria Portuguesa

Diana Quintela / Global Imagens

Segundo as contas da empresa, consultadas pelo Observador, a faturação de 2023 está ainda longe dos 200 milhões que a Padaria Portuguesa disse ter intenção de alcançar em 2030. Terá de quintuplicar o negócio. Através de uma agência de comunicação, a Padaria Portuguesa recusou indicar ao Observador se mantém essa projeção, indicando agora que pretende em 2028 estar na fasquia dos 80 milhões. Aliás, esse plano a três anos é o mais recente da Padaria Portuguesa e contabiliza o investimento necessário em 16 milhões de euros para a abertura de mais 40 unidades, que irão permitir criar 600 empregos. O que significa um custo médio de 400 mil euros por loja a abrir.

Com este plano, se for cumprido, a empresa chegará a 2028 com 120 lojas. No comunicado no qual anunciava a expansão a empresa não indicava de que forma vai ser financiada. A dívida bancária da empresa estava, no final de 2023, em cerca de 6,8 milhões de euros (sendo 4,3 milhões de médio e longo prazo), ou seja cerca de duas vezes o EBITDA, e registava 2,16 milhões em liquidez (caixa e depósitos bancários). Foi em 2023 que as contas registaram o recebimento de um financiamento de perto de 2,5 milhões de euros, que fez engordar a dívida.

No final desse exercício o ativo estava contabilizado em 17 milhões de euros, acima do passivo, que totalizava 13,5 milhões de euros.

No início, Nuno Carvalho garantiu, em 2012, à Económico TV que o arranque foi feito com base em capitais próprios dos sócios. “Eu tive a ideia do conceito, comecei a estruturá-lo, durante ano e meio, inspirando-me no mercado francês e alemão. A partir do momento em que tive o conceito montado discuti com um primo meu, José Diogo Quintela, que não tem nada a ver com a área de gestão, mas com quem eu tenho uma relação de proximidade muito grande, somos primos, mas na realidade é como se fossemos irmãos, que gostou do conceito, na altura tinha capacidade financeira e estruturámos uma fase inicial do projeto que era testar o conceito em algumas lojas e começámos à procura dos negócios, de uma fábrica, de lojas”. Nessa altura, recusou revelar os números envolvidos. “Não temos interesse em revelar números”, justificando que o negócio estava a ter sucesso comercial: “Não temos interesse em dar informação sobre o negócio a quem possa também entrar no mercado. É normal que o faça. É um mercado apetecível, é grande e há espaço para mais do que uma marca. Não temos interesse em facilitar a vida”.

O espaço foi, mesmo, sendo ocupado por outras marcas, nomeadamente pela Gleba e, mais recentemente, pelo arranque da operação em Portugal da Pret a Manger. Em Lisboa, a padaria de bairro já está a ser ocupada. A densidade de lojas em alguns locais é elevada, apontam fontes financeiras, que admitem que a Padaria Portuguesa estará a chegar ao limite de expansão dentro de Lisboa, a cidade que poderá ser a melhor para absorver o conceito. É esse um dos desafios atuais da marca. Até onde conseguirá crescer em Portugal?

O estrangeiro — que foi sendo assumido como não estando nas prioridades — será um projeto desafiante e não apenas pela marca (que há quem considere pouco internacionalizável). É que as necessidades de investimento para exportar o conceito são elevadas. E é aqui que um fundo pode aportar maior valor, na capacidade financeira para expandir.

Um negócio de margens limitadas e a pagar dividendos

Contratar um banco de investimento para tentar vender o negócio demonstra, dizem fontes ao Observador, que não chegou qualquer proposta de compra, mas antes contrata-se uma entidade para procurar eventual comprador. Nem Nuno Carvalho nem José Diogo Quintela deram explicações, quando contactados pelo Observador, sobre as razões que os levaram a tomar esta decisão. Os compêndios apontam para cerca de 10 anos o prazo para uma startup conseguir o designado exit, ou seja, para ser vendida ou entrar num processo de fusão, para conseguir ganhar lastro financeiro ou de mercado. A Padaria Portuguesa tem 14 anos. E os dois sócios principais estão a chegar perto dos 50 anos.

O gestor Nuno Carvalho até assumiu, na mesma entrevista ao Económico TV, que não tinha nascido com a missão de criar um negócio próprio. E José Diogo Quintela, à Renascença, disse que “a ligação a mim não beneficia assim tanto o negócio e não vale a pena, cria ruído”: “A Padaria Portuguesa é um negócio que vale por si, pela sua qualidade. Não é por ser a padaria do Zé Diogo, portanto, lamento, mas não vou revelar ideias de futuro para os meus negócios, que as tenho. Mas vou guardá-las”.

Sócio d' A Padaria Portuguesa, José Diogo Quintela diz que o negócio não beneficia particularmente da sua ligação

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Não revelando ao certo o que pretendem com a venda ou o que farão no futuro, os donos da Padaria Portuguesa viram chegar-lhes um dividendo de 800 mil euros (registado como pagamento em 2023). Isto depois de em 2020 e 2021 a empresa ter registado prejuízos, por “culpa” da pandemia que até levou Nuno Carvalho, em 2020, a ameaçar fechar.

“Desde o dia 13 de Março que o nosso negócio teve quebras de 50% e, desde que foi decretado o estado de emergência, as quebras são superiores a 60%. Se por um lado estes números são positivos por representarem uma manifesta adesão da população à necessária quarentena, por outro lado, numa perspetiva empresarial, são números verdadeiramente desastrosos e que põem em causa a viabilidade do negócio e comprometem, já no curto prazo, a resposta aos compromissos com os colaboradores, com os fornecedores e até com o próprio Estado. Sendo este o caso na A Padaria Portuguesa, uma empresa com uma gestão profissional e já com uma escala considerável, imagino que seja talvez pior para um conjunto alargado de players do setor por todo o país”. Na carta enviada a Pedro Siza Vieira, então ministro da Economia, Nuno Carvalho pedia que o Estado injetasse “capital fresco de imediato nas empresas” e confiasse “nos empresários que têm acrescentado valor ao país e sempre têm sido responsáveis nos seus compromissos e obrigações”. Pedia mudanças nos instrumentos que tinham sido disponibilizados — como o layoff simplificado, as linhas de crédito, carências de pagamentos — sob pena, “caso contrário, empresas como a A Padaria Portuguesa perdem a viabilidade e irão fechar portas em poucas semanas”.

Padaria Portuguesa diz que medidas do Governo “são ineficazes e de forma alguma oferecem soluções para os problemas”

Assumia, nessa missiva, que a empresa tinha sido, desde a fundação, “financeiramente saudável e sempre honrou a tempo e horas os seus compromissos e, felizmente, vive uma realidade favorável em matéria de tesouraria (tesouraria invertida). Contudo, por ser uma empresa de mão de obra intensiva e devido à pesadíssima carga fiscal existente em Portugal, é um negócio de margens baixas”.

De facto, se o volume de negócios foi de 42,6 milhões de euros em 2023, o EBITDA (resultado antes de depreciações, gastos de financiamento e impostos) ficou nos 3,34 milhões de euros. Em 2023 manteve lucros, de 1,63 milhões de euros, beneficiando de um crédito fiscal de quase 800 mil euros. O resultado antes de impostos foi de 836 mil euros, o que compara com os 966 mil euros em 2022 (ano em que teve lucros de 886 mil euros).

Nos dois anos anteriores, o resultado foi negativo, o que determinou uma interrupção dos lucros que em 2019 atingiram 1,32 milhões de euros, para um EBITDA de 4 milhões de euros. Nesse ano, a empresa registou, nos pagamentos e recebimentos, um dividendo de 755 mil euros a sair da companhia. Um pagamento que só voltou em 2023.

A margem EBITDA, que afere a rentabilidade operacional de um negócio, passou de 10,2% em 2019 para 7,8% em 2023. Uma empresa como a Ibersol que opera na restauração, mas que tem mais insígnias e segmentos variados (sendo a responsável pelo lançamento da concorrente Pret a Manger), está com margens EBITDA de dois dígitos. A Starbucks teve, em 2023, uma margem operacional de 16,3%.

Quanto pode valer um negócio destes?

Não são conhecidos os números que estão a ser pedidos para a venda desta operação, mas fontes financeiras sugerem ao Observador que, neste setor, há negócios a acontecer por cinco ou seis vezes o EBITDA, o que daria um valor de 16,5 milhões ou quase 20 milhões de euros. No entanto, é preciso avaliar se o comprador quer também adquirir a entrada num novo mercado e aí pode estar subjacente um prémio em cima dos múltiplos de EBITDA transacionados.

Não surpreendem essas fontes que se possa, no limite, chegar ao múltiplo de 10 vezes o EBITDA, ou seja 30 milhões de euros. Se for um comprador já com presença em Portugal dificilmente os múltiplos chegam aí.

Há ainda a ter em conta que em cima destes múltiplos há uma dívida de cerca de seis milhões, que tem de se descontar ao valor final do negócio.

Não há negócios recentes a nível internacional cujos valores envolvidos sejam conhecidos. Aconteceram algumas operações que visaram a entrada de insígnias europeias nos Estados Unidos da América na indústria de padaria, mas que não implicaram lojas. O atrativo mercado dos Estados Unidos também chegou a estar no radar da Padaria Portuguesa. Nuno Carvalho chegou a confidenciar ao Expresso o seu sonho americano e que passava por abrir lojas em cidades como Nova Iorque, Washington e Boston. Em 2019 — antes da pandemia — assumia estar a “estudar a abertura de lojas próprias com um parceiro local que tenha conhecimentos do negócio, mais do que capacidade financeira. Temos vindo a olhar para vários países e gostamos do mercado americano, por ter escala, ser uma economia que funciona bem e um desafio para qualquer gestor se internacionalizar”. Não havia data. E continua sem existir negócio internacional no portefólio da Padaria Portuguesa.

O chamamento de Alexandre Soares dos Santos num arranque que teve o filho de Marcelo e Dias Loureiro. Como tudo começou

Depois de terminado o curso no ISEG, Nuno Carvalho entrou na Jerónimo Martins. Chegou a diretor. “Tinha uma carreira ótima, trabalhava num grupo excelente, adorava o negócio e sentia-me ultraidentificado com os valores da empresa”, mas “senti-me muito pequeno”. Foi ao ouvir Alexandre Soares dos Santos que diz que o levou a reposicionar o posicionamento na sua vida, porque queria dar algo à sociedade. “A determinada altura achei que tinha reunido competências para acrescentar valor ao país e montar o meu próprio negócio, no sentido de deixar legado”, diz, assumindo não ter nascido “com a missão de desenvolver o negócio próprio. Nunca me chateou trabalhar para terceiros, sobretudo tive uma experiência profissional riquíssima, no grupo Jerónimo Martins”, onde trabalhou dez anos.

Depois do momento de introspeção, tomou a decisão de montar o negócio e pensou e discutiu várias ideias e áreas de negócio. “Um dia vai aparecer uma ideia engraçada”. Um dia a ideia foi a Padaria Portuguesa. Havia uma pastelaria em cada esquina, um local onde se bebe café, comem pastéis de nata e as pessoas se encontram. Um local de experiências sociais que tem como veículo os pães, os bolos e o café. O conceito foi estruturado em mais de um ano.

Em março de 2010 os registos comerciais notaram a constituição de uma nova sociedade. RSCQ – Atividades Hoteleiras. Tinha um capital social de 25 mil euros e como sócios Vasco Ferreira Metelo de Carvalho (irmão de Nuno), ZDQ (de José Diogo Quintela) e Nuno Rebelo de Sousa, filho de Marcelo Rebelo de Sousa. Em agosto desse ano já era Nuno Carvalho que aparecia como gerente dessa sociedade. A primeira loja da Padaria Portuguesa abriu portas em novembro desse ano. Pouco tempo depois Nuno Rebelo de Sousa deixou de constar como sócio e surgiu uma empresa denominada Bakers Capital como um terço do capital, tendo subscrito um aumento de capital nesse momento. A Bakers Capital tinha sido criada em novembro desse ano e tinha dois sócios: a Onec e a DL pertença, respetivamente, de Fátima Alvarez Madeira, da África do Sul, e Manuel Dias Loureiro, ex-ministro da Administração Interna e que esteve ligado ao BPN, tendo a sua investigação sido arquivada. A Bakers Capital foi dissolvida em 2014, mas já tinha há uns anos saído do capital da Padaria Portuguesa.

Por que razão Dias Loureiro não foi acusado no caso BPN?

Foi no momento em que a Bakers Capital entrou, com aumento de capital, que a RSCQ mudou a designação para Padaria Portuguesa. E em 2012 a companhia já com essa designação inscrevia, nos registos, como sócios: Nuno Carvalho, ZDQ, e mais três elementos da família. Hoje são sete os sócios todos do núcleo familiar. O capital social de 37.500 euros mantém-se, ainda que haja outros instrumentos de capitais próprios que atingem 462 mil euros.

Nuno Rebelo de Sousa — que está no centro do caso das gémeas que está a ser escrutinado no Parlamento em comissão de inquérito — teve uma presença passageira por esta empresa, mesmo antes de algumas das polémicas que a envolveram. Já sem o filho de Marcelo no capital, o Presidente não passou ao lado da expansão da Padaria Portuguesa. A 12 de maio de 2016, poucos meses depois da eleição e da tomada de posse, Marcelo Rebelo de Sousa aparecia na 40.ª loja da empresa, no Príncipe Real, antes da inauguração oficial. “Uma inesperada visita matinal”, declarava a Padaria Portuguesa no seu Instagram.

Nuno Carvalho dizia ser motivo para comemorar essa inauguração que marcou a criação de uma loja de autor criada pela arquiteta Joana Astolfi.

E à 40ª loja, a Padaria Portuguesa mudou (quase) tudo

As polémicas da Padaria Portuguesa com o mercado laboral

A inauguração continuaria com a presença do ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, José Vieira da Silva, e o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina. Acontecia um ano antes da polémica em torno de declarações do patrão Nuno Carvalho que suscitaram críticas. Em janeiro de 2017 defendia uma maior flexibilidade do mercado de trabalho. A subida do salário mínimo e um debate, no Parlamento, sobre a descida da taxa social única levaram Nuno Carvalho à SIC (que entretanto não se consegue encontrar na internet) a defender a flexibilização na contratação, no despedimento e no pagamento das horas extra — “[A jornada laboral] não deve estar fechada a 40 horas semanais, só porque a lei o diz. Tem que se pagar horas extra com volumes consideráveis de acréscimo de custos de pessoal que penalizam as organizações”, declarou.

Justificou-se, então, ao Expresso: “Faz todo o sentido [aumentar o salário mínimo]. Nenhum patrão fica feliz por pagar o salário mínimo. Agora (…) a realidade para o colaborador é diferente da realidade para uma organização. Este salário mínimo de 557 euros tem um peso de 877 euros por mês para as empresas, são 300 euros que o Estado leva. A definição ideal de um salário num mercado livre seria a relação entre a oferta e a procura, mas está condicionada pela fiscalidade, que em Portugal é dramática. As pessoas querem pagar mais, mas não podem pagar mais. Como os custos fixos de uma organização têm de ser geridos com muita responsabilidade, na Padaria Portuguesa pagamos a sério na componente variável. E acredito piamente que a flexibilidade laboral nos vai permitir agilizar as organizações a ponto de pagar mais ao colaborador”. E indicava que o salário médio na Padaria Portuguesa, então com cerca de 900 trabalhadores, era de 695 euros, ao qual acrescia o subsídio de almoço, “que tem valor integral para os colaboradores, porque oferecemos as refeições”.

Nuno Carvalho tinha ainda referido na SIC que 25% da massa salarial da Padaria Portuguesa era referente a trabalhadores “em regime de transição” para o salário mínimo. “O que quis dizer é que nesta organização temos uma política de mérito e estamos a fazer uma avaliação de desempenho a todos esses trabalhadores para tomar decisões: se passam para o escalão acima, se fazemos um determinado aumento, o que é que acontece na organização. Perante o aumento do salário mínimo na lei, temos de rever os nossos escalões e temos de fazer uma avaliação de desempenho para tomar decisões”, esclareceu, já que esses trabalhadores passariam a ficar no nível do salário mínimo, quando no ano anterior estavam acima. Em 2017, o salário mínimo nacional era de 557 euros, um aumento de 5,1% face aos 530 euros de 2016.

A Padaria Portuguesa nasceu com a intenção de colocar uma padaria em cada bairro

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

A polémica valeram-lhe a crítica de vários quadrantes com o Esquerda.net, ligado ao Bloco de Esquerda, a apontar 10 “provas” de que a Padaria Portuguesa “tem patrões do século XIX”. Em defesa de Nuno Carvalho saiu o sócio e primo José Diogo Quintela. Na altura escrevia opinião no Correio da Manhã (artigo que já não se encontra disponível no site do jornal, mas há notícias a falarem desse artigo que era intitulado: “Queria ser um patrão explorador”. Nela escrevia ironicamente: “Não foi com esses pressupostos que entrei no negócio. Quando aceitei fazer a empresa, o objetivo era claro: tornar-me um grande patrão explorador (passe a redundância). Basicamente, ambicionava parasitar empregados.” E ainda sobre o salário mínimo, José Diogo Quintela ainda acrescentava: “Quer isso dizer que os trabalhadores da PP são pagos? Em dinheiro, ainda por cima? Mais indignado fico com a preocupação do Nuno com a flexibilização da lei laboral. Então a PP respeita legislação? Mau!”.

Uns meses depois nova polémica ainda por causa dos trabalhadores. Numa entrevista ao Dinheiro Vivo, Nuno Carvalho dizia que “o espírito de equipa” valia “muito mais do que o salário base”, aproveitando para dar exemplos do “investimento sério nas pessoas” com a organização do arraial de verão ou a oferta de um creme e um babygrow quando nasce o filho de um trabalhador. Várias declarações que até levaram a que fosse criado um pedido de boicote às unidades lideradas por Nuno Carvalho. Já lá vão sete anos. Em 2019, a empresa passou a ter 1.104 trabalhadores, mas em 2023 inscreveu, nas contas, um quadro de pessoal de 905, sendo 764 a tempo completo e 141 a parcial. Os gastos com pessoal registados, nesse ano, atingiram os 15,9 milhões de euros, tendo 68,8 mil euros sido remuneração para os órgãos sociais e 12,68 milhões com remunerações do pessoal. O que significa que a remuneração média destes trabalhadores é de cerca de mil euros (considerando a totalidade dos trabalhadores, independentemente de trabalharem a tempo parcial ou total).

No dia em que a empresa comemorou o 14.º ano, Nuno Carvalho escreveu no LinkedIn: “Há sobretudo um grande motivo para tantas conquistas ao longo destes 14 anos: as nossas pessoas. São as nossas pessoas que fazem a marca, numa dedicação diária e com um enorme empenho – dos padeiros e pasteleiros das nossas fábricas em Marvila e no Bom Sucesso, passando pelas equipas da Logística, Lojas e Sede”, anunciando que a empresa decidira “fazer um grande investimento: atribuir seguro de saúde a todos os colaboradores efetivos da empresa, mais de 600 pessoas, já a partir de 2025”. A partir de 2025 os seguros de saúde oferecidos aos trabalhadores pelas empresas passam a ser dedutíveis nos impostos em sede de IRC, conforme norma aprovada no Orçamento do Estado para o próximo ano.

Não foram apenas as questões laborais que ocuparam os dias de polémica ao longo de 14 anos da Padaria Portuguesa. O ano de 2017 não chegaria ao fim sem que a empresa tivesse de responder por umas fotografias tiradas a um caixote de lixo em frente a uma das suas lojas com vários bolos-rei. “A imagem choca-nos”, declarou Nuno Carvalho, que assumiu que a loja da Graça não teria seguido as “diretrizes que lhes foram transmitidas pelo que iremos proceder a uma análise interna de forma a apurar responsabilidades e tomar as devidas medidas corretivas“.

Diretor-geral da Padaria Portuguesa sobre bolos-rei no lixo: “A imagem choca-nos”

Já este caso tinha caído no esquecimento quando o Jornal de Negócios noticiou, em agosto de 2018, que o sumo de laranja da empresa tinha surgido com larvas. A Padaria Portuguesa assumiu que tinham “surgido casos pontuais de presença de larvas no sumo de laranja natural”, o que atribuiu à “qualidade” da laranja do Algarve que atrai a “mosca da fruta”. Casos pontuais sem risco para a saúde, assumia a Padaria Portuguesa.

Polémicas à parte, a empresa já apagou 14 velas. Nuno Carvalho compensou os quilos ganhos a mais nos primeiros tempos com a corrida. E também esta é uma prova de obstáculos. Viu que o negócio do pão estava a fugir para os supermercados e correu atrás do negócio. Nasceu em 2010. Logo a seguir veio a troika e a crise financeira. Mais tarde uma pandemia. E ainda o disparar da inflação. Os desafios não param e “cada cêntimo que investimos é farinha que temos de transformar”. Palavras do “padeiro” (como o próprio se referiu) Nuno Carvalho que estará agora a fermentar a ideia de passar as chaves a outros.

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