No primeiro dia em que o país se vê obrigado a um novo confinamento João Ferreira teve a agenda mais preenchida desde o início da campanha eleitoral. Com quatro ações presenciais e tempo ainda para participar num fórum online da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, o candidato à Presidência da República quer mostrar os que “não podem confinar” e transmitir a gratidão dos portugueses a cada um deles. Em ações rotinadas, com a habitual disciplina comunista, a maior surpresa haveria de chegar durante um ‘quase-comício’ na Baixa da Banheira, em Setúbal.

Com Marisa Matias a ganhar terreno nas redes sociais com o movimento #vermelhoembelem João Ferreira acabou por quebrar a intenção inicial de “não se desviar um milímetro” para deixar alguns recados, claros, a André Ventura (ainda que nunca tenha dito o nome do adversário). Começou logo de manhã, ainda em Coimbra, a aflorar aquilo que haveria de ganhar maior dimensão horas depois. Sem mencionar diretamente o líder do Chega, João Ferreira falou dos que “tentam instrumentalizar a revolta que os portugueses sentem” e que não têm por objetivo mudar nada, apenas continuar “políticas iguais às que criaram os problemas”.

Mas perante algumas dezenas de comunistas, na Baixa da Banheira, João Ferreira levava segredos no bolso e, na altura em que já todos se entusiasmavam com o discurso, não teve qualquer problema em mostrá-los. Dizia João Ferreira que as “manifestações de ódio, insultos, má educação grosseira e desbragada” não têm como alvo qualquer candidato, mas sim a Constituição, e que quem tem mantido essa postura “odeia o Portugal que está inscrito nas páginas da Constituição” quando levou a mão ao bolso do casaco para de lá tirar um exemplar da Constituição da República Portuguesa.

Com a mesma velocidade quem aplaudia sentado saltou da cadeira para se colocar de pé e entoar: “João, avança, com toda a confiança”. Com o mesmo ritmo, o candidato acenava com a Constituição na mão. Não há dúvidas, João Ferreira é mesmo o candidato da Constituição e a resposta aos problemas (e críticas mais acesas) estará também escrita naquelas páginas.

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Já no que diz respeito às ações do dia, João Ferreira a dar especial atenção a empresas que deixaram de ser públicas e passaram para a esfera privada. De manhã os CTT, ao final da noite a AMARSUL de gestão dos resíduos sólidos urbanos dos municípios de Setúbal. Os lamentos são os mesmos: os horários de trabalho estão piores, os salários cada vez mais curtos. A mensagem? Em “setores essenciais” é preciso que o Estado recupere o controlo para dar garantias aos cidadãos.

E não esquecendo os trabalhadores na linha da frente no setor da saúde, João Ferreira lá esteve para ouvir questionar “quem cuidava” deles. Para se solidarizar com a necessidade de reforçar os meios e contratar mais profissionais, dando garantias do reforço do Serviço Nacional de Saúde — conforme dita a Constituição.

A versão de bolso erguida para responder a críticas

O grande protagonista do sexto dia de campanha foi mesmo… Um livro de bolso. A edição comemorativa da Associação dos Municípios da Região de Setúbal tem 178 páginas (e até está à venda na internet por um euro) saiu do casaco de João Ferreira para animar um pavilhão bem composto. E o presidente da Associação dos Municípios da Região de Setúbal também marcou presença na sessão onde a Constituição brilhou, mas noutra condição. A condição de presidente da Câmara Municipal da Moita. Rui Garcia que é presidente da câmara municipal desde 2013 (onde chegou depois de ter assumido anteriormente a vice-presidência) e é um histórico autarca comunista da região de Setúbal.

O desvio milimétrico, mas sem fugir à Constituição

João Ferreira bem tentou, mas acabou por ter que dar resposta às vozes que queria ignorar. Ainda que o tenha feito através da Constituição — que não larga por um segundo —, o alvo ao longo do dia foi mesmo André Ventura. Procurando traçar as diferenças claras entre os dois, afirmando mesmo que Ventura “odeia a Constituição” e que quer combatê-la João Ferreira quis deixar aos “que só veem desesperança” que o caminho também não é esse. Além de querer votos da esquerda, João Ferreira também quer garantir que o voto descontente — tantas vezes capitalizado pelos comunistas — não foge para a direita.