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Getty Images for Vanity Fair

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"O dilema das redes sociais": Se a tecnologia tivesse consciência chamava-se Tristan Harris?

No documentário “O dilema das redes sociais”, o programador avisa: “Se não está a pagar o produto é porque você é o produto”. A história do homem que nos quer defender das más práticas da tecnologia.

É um quadro cru, com pouco mais de uma hora e meia, pintado por quem integra ou integrou algumas das empresas responsáveis por nos colar aos ecrãs. Falamos de “O dilema das redes sociais”, o documentário da Netflix que aponta o dedo à adição tecnológica e às preocupações que esta levanta, justificadas pela crescente noção dos perigos a que todos estamos expostos. É, na verdade, um paradoxo: uma peça imaginada para nos alertar sobre os efeitos da tecnologia na saúde mental e a forma como esta se intromete no quotidiano, mas que é veiculada por uma plataforma de streaming, vista, provavelmente, no ecrã de um telefone ou computador.

No centro da mensagem desta hora e meia, há uma figura que se destaca: Tristan Harris, “a coisa mais próxima de uma consciência que Sillicon Valley pode ter”, como o descreve a publicação norte-americana The Atlantic. Talvez o seja, mas para perceber o homem responsável pela frase “se não está a pagar o produto é porque você é o produto”, é preciso perceber-lhe os passos. Atualmente, Harris é o líder do Center For Humane Technology (Centro para a Tecnologia Humana, em português), uma plataforma que visa “reverter a ‘degradação humana’ e realinhar a tecnologia com a humanidade”.

[Veja o trailer do documentário “O dilema das redes sociais]

Criado na Bay Area, zona que compreende a cidade de São Francisco e a área metropolitana, por uma mãe solteira que trabalhava como defensora de trabalhadores com invalidez, Harris passou a infância a criar software simples para computadores Macintosh e a escrever cartas a Steve Wozniak, que juntamente com Steve Jobs cofundou a Apple. Naturalmente, a paixão pela computação levou-o até Stanford, uma das universidades mais prestigiadas dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, começava a fazer um estágio na Apple. Foi pela sua mão que nasceu a ferramenta “Spotlight For Help”, uma barra de ajuda criada pela empresa da maçã e que está disponível tanto no sistema operativo MacOSX como no iOS, ainda hoje em uso.

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Prosseguiu para um mestrado e é aqui que passa pelo Persuasive Technology Lab. Administrado pelo cientista social B. J. Fogg, o laboratório conquistou seguidores por ser um local de culto entre os empresários que esperavam dominar a questão do design comportamental. Na prática, a doutrina de Fogg ensinava o caminho para aquele que viria a ser o Santo Graal da tecnologia, através do estudo, criação e desenvolvimento de conceitos de software que nos tornem dependentes desses mesmos softwares.

No curso, Harris compreendeu a psicologia da mudança de comportamento, ou seja, a forma como o treino com métodos de condicionamento pode inspirar produtos para as pessoas. Um desses exemplos é a recompensa que um like (gosto) instantâneo pode provocar em quem acabou de publicar uma fotografia — o documentário explica como as interações nas redes sociais fazem aumentar os níveis de dopamina [neurotransmissor associado ao bem-estar] no cérebro. O reforçar da ação pode, potencialmente, mudá-la de uma atividade ocasional para uma atividade diária.

[Tristan Harris a explicar como a tecnologia pode ser usada a favor dos utilizadores]

Foi aqui que Harris começou a perceber que a tecnologia não é, como lhe tinham muitas vezes dito, uma ferramenta neutra. Pelo contrário. Saiu do curso e criou uma startup, a Apture, cujo objetivo era mostrar pop-ups de conteúdo direcionado em milhares de sites, incluindo o do The New York Times.

Foi na sua primeira exposição direta aos bastidores da indústria que Harris deparou com um dilema: a missão social da sua empresa era despertar a curiosidade dos utilizadores, tornando os factos facilmente acessíveis mas, do outro lado, estava a pressão dos editores para que os leitores gastassem mais e mais minutos nos sites. E, embora Harris insista que evitou táticas persuasivas, foi precisamente com estas que acabou por se familiarizar. A aventura despertou o interesse da Google, que adquiriu a Apture em 2011, absorvendo o empreendedor diretamente como funcionário. O mestrado ficou para trás.

A nova função fez com que trabalhasse diretamente na aplicação da caixa de entrada do Gmail e foi aí que começou a reparar nas utilidades a que tinha de responder. Um ano volvido, Tristan Harris começou a perceber o efeito que pequenos pormenores de design podiam ter nas vidas das pessoas. Exemplo: a pequena interrupção do nosso telefone a vibrar quando recebemos um email, por exemplo, é multiplicada por milhões de pessoas.

Milken Institute 2019 Global Conference

O programador tem falado em diversas conferências no mundo sobre o quão urgente é realinhar a tecnologia com a humanidade

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Do Burning Man ao email que chega a 5 mil pessoas na Google

Foi depois de rumar ao festival Burning Man, no deserto do Nevada, que Harris tomou a decisão de avançar com algo que considerou necessário: uma apresentação de 144 páginas, denominada “A Call to Minimize Distraction & Respect Users ‘Attention” (Uma chamada para minimizar a distração e respeitar a atenção dos utilizadores), em que fala pela primeira vez sobre a forma como um punhado de designers, a maioria brancos, com idades entre os 25 e os 35 e das equipas da Google, Facebook e Apple estava a impactar a vida de milhões de pessoas em todo o mundo.

O documento, enviado apenas aos dez colegas mais próximos, chegaria a mais de cinco mil funcionários da Google incitando discussões internas sobre as práticas da empresa. O então presidente executivo da Google, Larry Page, acabou a discutir o assunto com o próprio Harris um ano depois, em reunião. A conversa valeu-lhe a negociação para uma nova posição na empresa, como filósofo de produto, o que envolvia pesquisar soluções que tornassem o design da empresa mais ético.

[Harris a apresentar o movimento “Time Well Spent” na conferência DLD]

Alguns meses depois, Harris deixou a Google e cofundou o Time Well Spent, um movimento com o qual esperava mobilizar apoio para a sua luta por um novo tipo de desenvolvimento de software —  que fosse construído de forma diferente, em torno de valores centrais, que ajudasse as pessoas a gerir melhor o seu tempo ao invés de exigir mais.

Em 2019, Tristan Harris foi ao Senado norte americano testemunhar numa audiência sobre “Tecnologia de persuasão e otimização para envolvimento”, abrindo o jogo em relação à indústria da tecnologia e em como esta está a utilizar algoritmos e máquinas para manipular os consumidores. Entretanto, o californiano é o cofundador do Center For Humane Technology, a plataforma que acabou por derivar do Time Well Spent e que visa “reverter a ‘degradação humana’ e realinhar a tecnologia com a humanidade”. É ele, juntamente com Aza Raskin, outro dos pilares da plataforma, que apresenta o podcast Your Undivided Attention, no qual conversa com outros especialistas em tecnologia.

Jeff Orlowski, vencedor de um Emmy com o documentário de cariz ambiental “Chasing Ice”, de 2012, e com quem Harris estudou em Stanford, é o nome por detrás d'”O dilema das redes sociais”. Em entrevista ao Financial Times, o cineasta explicou que o projeto tinha sido inspirado por uma conversa que teve com Harris. “[Harris] ajudou-me a perceber que existe uma ameaça existencial [através da tecnologia]”.

O filme explora a ascensão das redes sociais e a forma como estas lucram com o capitalismo de vigilância, a mineração de dados, os efeitos que têm na saúde mental e a forma como disseminam teorias da conspiração. “Isto é a alteração climática da cultura que está a acontecer visivelmente através dos nossos dispositivos”, disse Orlowski ao Financial Times. E é Tristan Harris quem está sob os holofotes da consciencialização das massas.

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