O deputado Tiago Moreira de Sá é o coordenador das relações internacionais do PSD e foi eleito deputado nas últimas eleições legislativas. O responsável pelo partido na Comissão de Negócios Estrangeiros lamenta a posição do PCP e diz que “o lado certo da história é o do agredido.

Sobre a vida interna do PSD, o social-democrata não revela quem apoia, mas defende que “a estratégia de um PSD centrista moderado”, aquela que foi seguida por Rui Rio, “é a correta”. Ainda assim, Moreira de Sá não deixa de reconhecer que “há quase uma mexicanização da vida política nacional com uma grande hegemonia do PS”.

[Ouça aqui O Sofá do Parlamento com a entrevista ao deputado Tiago Moreira de Sá e os passos perdidos, com a resposta de Fernando Medina a André Ventura]

Tiago Moreira de Sá, o “MNE do PSD”, lamenta que o PCP fique do “lado do agressor”

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Está expectante com esta declaração que hoje [esta quinta-feira] se espera do Presidente da Ucrânia?
Acho que é um momento importante sob vários pontos de vista. É preciso dizer claramente que a Ucrânia está do lado certo da história. Há uma luta pela paz, pela liberdade e pela dignidade humana e pelos valores da humanidade. Não há uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia ou com o ocidente como alguns querem fazer crer. É entre a Rússia e os valores da humanidade e que a Ucrânia está do lado certo dessa luta e que Portugal, como se tem visto, está do lado do povo ucraniano. Mas também é uma declaração importante como forma de condenar o comportamento da Rússia. Esta é uma guerra ilegal, ilegítima e desnecessária. A Rússia decidiu ir para a guerra sem que a Ucrânia fosse uma ameaça para a segurança russa e é preciso uma condenação clara desta decisão de um ato de agressão ilegal e é preciso mostrar que se se sofrem punições

O PSD tem defendido o embargo ao petróleo e gás russos. Essa é uma posição que o Governo português devia adotar?
Sim, esse é aliás um caminho que tem vindo a ser feito por vários países. Ainda há muitos que recusam essa solução mas é claro que não podemos ficar no meio da ponte. As sanções económicas são um bom instrumento para lidar com esta guerra e para punir a Rússia por ter feito esta guerra por opção. Não podemos é ficar no meio da ponte nas sanções, isso é o pior dos dois mundos. Temos que ir até às últimas consequências e a forma mais eficaz é secar a Rússia das fontes de financiamento que tem para fazer a guerra. É uma decisão difícil e com consequências, mas não é possível ficar a meio da ponte. O que se está a passar é demasiado grave e tem consequências para toda a ordem europeia e mundial. Se a Rússia não sentir essas consequências sente-se livre para continuar a modificar essa ordem. E surgem-me logo outros nomes como a Coreia do Norte e outras potências revisionistas, que também se podem sentir confortáveis para mudar as ordens regionais e mundiais

António Costa disse esta quarta-feira numa entrevista que não defende uma adesão imediata da Ucrânia à União Europeia, mantendo-a com o estatuto de candidato. Esta é uma posição sensata ou devia dar-se um sinal maior e aceitar a entrada?
Antes da posição do Governo, essa foi a posição do PSD, a de que a Ucrânia tenha o estatuto de candidato à adesão à União Europeia, porque esse é um sinal político. Ao mesmo tempo, não podemos descurar que há procedimentos, critérios para que um país possa entrar na União Europeia. Não podemos passar por cima desses critérios, sob pena de pôr em causa a ordem europeia.

Acredita que o Governo tem dado os passos certos na via diplomática? Como na questão da expulsão de diplomatas russos, por exemplo.
Nesta matéria não temos divergências. Podemos discutir se o perfil dos funcionários expulsos podia ser maior, mas não creio que essa discussão seja muito útil. Não há uma divergência neste assunto.

Isso é também um histórico nas relações entre PS e PSD
Sim, com uma ou outra exceção. É um consenso bem mais alargado, com exceção do PCP, que tem um posicionamento incompreensível. Esse consenso é importante. Países de média dimensão para conseguirem aumentar o poder lá fora têm que falar a uma só voz.

Já disse que a atitude do PCP é inqualificável. Acredita que o PCP a corre o risco de desaparecer do Parlamento?
Essa avaliação não consigo fazer. O que é importante é fazer um apelo para que todos os países estejam do lado certo e o lado certo da história é a do lado do agredido não é do agressor, é do lado da soberania dos Estados, do lado da integridade territorial e não de quem viola essa integridade. O mundo não é do mais forte, de potências que consideram que têm poderes especiais em zonas de influência e que consideram que o direito internacional não têm nenhum valor, um mundo de todos contra todos. Esse não é o mundo que queremos.

“Ultrapassa a minha capacidade de compreensão como é que alguém pode não querer condenar estes massacres”

Na reunião da Comissão de Negócios Estrangeiros foi criado um grupo de trabalho para criar um consenso sobre os votos de condenação à guerra na Ucrânia. Não é um bocadinho irónico que seja preciso criar um grupo de trabalho para esta matéria?
É bastante irónico, não só por condenar um conflito armado, mas também porque este voto está relacionado com os massacres em Bucha e todos os textos referem isso. Sinceramente, ultrapassa a minha capacidade de compreensão como é que alguém pode não querer condenar estes massacres. Esperava que no final fosse possível haver um texto conjunto. Não vejo como é que será possível conciliar o texto do PCP com os restantes mas gostaria que fosse

Vai ser possível encontrar um acordo de paz em breve, neste conflito?
Neste momento, os termos das negociações são inaceitáveis. O que a Rússia quer não é uma negociação, é impor os termos do acordo de paz e os termos que propõe não são aceitáveis. A Rússia pede a um país que aceite uma amputação territorial pela força, que aceite a desmilitarização e por isso precise do apoio exterior para se defender e aceitar que um país estrangeiro possa dizer quem é que pode governar ou não. É isso que quer dizer a desnazificação, que é um termo de 1945 e que é remover a elite governante da Ucrânia. Isso não é aceitável, tal como não é o reconhecimento das repúblicas de Donetsk e Lugansk. E não é aceitável só para a Ucrânia; é para o resto do mundo. Caso contrário isto transformar-se no faroeste e isso não é bom para ninguém

A França está em processo eleitoral. Uma vitória de Le Pen pode mudar as regras do jogo a nível europeu? 
Tudo indica, de acordo com as sondagens, que isso não vai acontecer. Tudo indica que o presidente Macron vence. Se isso acontecer, são boas notícias para a Europa e para o projeto europeu. Se não acontece, o problema não é só para a guerra. É muito preocupante para todo o projeto europeu e vamos esperar que não aconteça.

“A estratégia seguida estava certa, do PSD centrista e moderado, é a correta e desviar daqui terá, aí sim, males maiores”

Sobre a vida interna do PSD. São conhecidos dois candidatos, Jorge Moreira da Silva e Luís Montenegro. Qual é que vai apoiar?
Muito sinceramente ainda não decidi. Acho que são dois bons candidatos, com bom currículo político e, ganhe quem ganhar, cá estarei para trabalhar. Sobretudo acho importante estarmos todos muito unidos para combater esta estratégia Mitterrand do PS.

Mas acha que Montenegro, sendo opositor do rioísmo nos últimos anos, consegue unir o partido? 
Acho que sim, até por esta razão da ameaça da estratégia Mitterrand e também pelo que tenho lido. Os dois candidatos claramente definem como a grande prioridade unir o partido. Não vejo nenhuma razão para não existir essa unidade. Mas vamos deixar a campanha decorrer.

Tem acompanhado Rui Rio ao longo da liderança do PSD. Há responsabilidades do presidente do partido em particular nestas últimas eleições? 
Não acho nada disso. Seria bom que fosse isso porque assim era fácil: substituía-se o líder e estava o problema resolvido. O problema é de fundo e transcende o PSD. É um problema de fundo sobre os sistemas políticos pós-segunda guerra. Do ponto de vista do PSD, não é por acaso que se fizer as contas em 2025 completam-se 30 anos desde os governos de Cavaco Silva. Desde então, o PSD esteve no executivo quatro anos com Passos Coelho e dois anos e meio com Durão Barroso. Ou seja, há quase uma mexicanização da vida política nacional com uma grande hegemonia do PS. Há problemas de fundo que não estão relacionados com a liderança A ou B e se não reconhecermos isso não mudamos as coisas. Tenho pensado bastante sobre isso e tenho ideias concretas sobre essa matéria.

Mas vai pô-las ao serviço do candidato que vencer?
Sim, esse contributo irei dar. Quero dizer também que a estratégia seguida estava certa, do PSD centrista e moderado é a correta. Desviar daqui terá, aí sim, males maiores. Tenho uma grande admiração por Rui Rio, é das pessoas mais dignas que conheci na vida política e acho que o tempo o julgará de forma diferente. É sempre assim e não queria deixar de dizer isto em relação a um homem de grande dignidade com quem tive o gosto de trabalhar de forma próxima durante estes anos.