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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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O que António Costa ouviu dos economistas sobre como recuperar da maior crise que "dá cabo do turismo"

Primeiro-ministro ouviu mais do que falou. Abertura da economia deve ser feita sem perder confiança. Economistas temem recessão mais profunda por causa do turismo. Retoma exige mudanças estruturais.

Uma recessão mais profunda do que a queda de 8% projetada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), muito por causa do colapso do turismo, e a dívida pública a disparar 10 pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB) no final de 2020. Estas foram algumas das ideias trocadas num encontro entre o primeiro-ministro e outros membros do Governo com mais de 20 economistas, de acordo com os testemunhos ouvidos pelo Observador.

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A necessidade de cautela no processo de abertura da economia foi um dos pontos destacados. Um levantamento precipitado das restrições pode gerar uma recaída no controlo da epidemia, que parece agora controlado, e isso seria o pior que poderia acontecer à confiança de pessoas e empresas. Essa precaução foi aliás uma das notas que dominou as declarações do ministro Adjunto e da Economia, no final do encontro.

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“Temos ir construindo a confiança coletiva na capacidade de proteger as populações, e os elementos mais frágeis, à medida que vamos preparando o levantamento das restrições à atividade e circulação”, sublinhou Siza Vieira, reconhecendo também que estes serão os tempos mais duros.

Este “é o momento de começar a preparar a abertura, e o “próximo passo” será abrir gradualmente estas medidas”, mas de forma a que os cidadãos tenham confiança na capacidade de se protegerem e de proteger os outros. “É preciso começar a pensar na forma como vamos ser capazes de criar na nossa população e nas empresas a confiança de que estão reunidas as condições para um retorno gradual à atividade”.

"É preciso começar a pensar na forma como vamos ser capazes de criar na nossa população e empresas a confiança de que estão reunidas as condições para um retorno gradual à atividade".
Ministro Adjunto e da Economia, Siza Vieira, no final do encontro à distância com os economistas

Até porque uma das vantagens assinalada neste encontro, sublinhou Siza Vieira, é a forma positiva como o país tem vindo a gerir esta crise “e que projeta uma imagem externa de Portugal como destino seguro e com coesão social” que são vantagens no posicionamento estratégico da economia portuguesa”.

A reunião realizada por videoconferência durou quase quatro horas. Todos os economistas tiveram oportunidade de falar e os membros do Governo e António Costa estiveram sobretudo focados em ouvir. Não foi um exercício de propaganda como alguns chegaram a recear, mas foi uma sessão longa e um dos economistas presentes assinala que cada um teve pouco tempo para exprimir as suas opiniões.

“Fomos todos sucintos, mas mesmo assim a sessão alongou-se e, portanto não houve segunda ronda como teria sido a expectativa de quem organizou. O primeiro-ministro (que tinha dado uma entrevista ao Observador de manhã) aguentou estoicamente a ouvir, com bastante atenção, honra lhe seja feita”. Mas saíram de lá sem uma data para a a anunciada “reabertura da economia”.

Turismo pode ser o elo mais fraco na retoma

Parte dos economistas estiveram mais preocupados com a transição do isolamento para a normalidade, enquanto outros centraram atenções na economia portuguesa a longo prazo. Um dos pontos de partida para a discussão foram as projeções do FMI, conhecidas esta terça-feira, com vários economistas a apontar para quedas do produto mais acentuadas do que a estimada por esta organização.

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E o setor que mais preocupa, pelo grande impacto que tem na economia portuguesa, é o turismo. Com um peso de 11% no Produto Interno Bruto, o colapso deste setor vai ter um efeito muito negativo na evolução económica e no emprego. E a retoma no turismo deverá ser mais lenta. Pode demorar anos a regressar ao nível a que estávamos antes da pandemia do novo coronavírus.

Para Susana Peralta, da Universidade Nova de Lisboa, “não vai haver turismo durante dois ou três anos”, pelo menos. “Enquanto não houver vacina, ninguém vai estar a viajar pelo mundo nestas condições”, acredita a economista, em declarações ao Observador no final da reunião. “É o lastro que deixa esta crise: dá cabo do turismo”, porque esta pandemia “é uma cicatriz gigantesca na confiança”. Em Portugal, “ainda haverá algum turismo interno”, mas “ir para fora, cá dentro” só dará “para mitigar”.

Enquanto não houver vacina, ninguém vai estar a viajar pelo mundo nestas condições”. (...)É o lastro que deixa esta crise: dá cabo do turismo”, porque esta pandemia "é uma cicatriz gigantesca na confiança”. Em Portugal, "ainda haverá algum turismo interno", mas "ir para fora, cá dentro” só dará "para mitigar”.
Susana Peralta, economista da Universidade Nova de Lisboa

Por arrasto, há ainda crises no setor imobiliário e na restauração. “É evidente que terá de haver uma reconversão de trabalhadores”. Como é que será feita? É a grande questão. Susana Peralta reconhece que a resposta não é fácil, mas deixa o aviso: não se devem repetir “erros cometidos no pós-crise” de 2008/09. “No caso português, o milagre económico foi baseado, em grande medida, em emprego com má qualidade no turismo”, considera a economista.

O turismo foi precisamente o setor em que Tiago Sequeira, economista da Universidade de Coimbra, centrou a sua apresentação de 5 minutos. Mais precisamente nos impactos que a crise está e ainda vai ter no setor.

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“Principalmente porque o alívio das medidas do confinamento vai coincidir com a época alta do turismo em Portugal”, disse ao Observador o economista, o que reforça a necessidade de um plano específico para o setor. Tiago Sequeira defendeu perante os membros do Governo presentes – entre os quais o primeiro-ministro e o ministro da Economia, que tem a tutela do Turismo – que “são necessárias medidas fiscais com ênfase no turismo”, entre as quais “créditos fiscais ao investimento e mais apoios à tesouraria”.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O ministro da Economia referiu a necessidade de apoios desenhados especificamente para os setores mais penalizados, mas também é preciso pensar “como articularmos isto com as perspetivas do longo prazo”.  E se o turismo foi a porta de saída da crise financeira e económica de 2010/2013, agora terão de ser outros setores a puxar pela retoma, o que implica a necessidade de uma transformação estrutural do tecido económico.

Alguns economistas avisaram que muitas empresas de turismo não vão sobreviver a esta queda da procura e a um certo ponto, o Governo terá de reavaliar as ajudas atualmente disponibilizadas às empresas, como o lay-off. E é importante focar as estratégias e os apoios na recuperação das empresas viáveis, mas muitas empresas, sobretudo pequenas, não vão resistir e isso vai ter impacto muito negativo no emprego. Essa mudança estrutural terá de ser apoiada, mas não só em termos financeiros.

Não bastam apoios de curto prazo, intervenção do Estado tem de ir mais longe

Estruturalmente, a economia portuguesa precisa de algo mais, disse Tiago Sequeira. “É preciso medidas, reformas a longo prazo: uma maior previsibilidade do quadro fiscal [para as empresas deste e de outros setores] e um investimento na educação e na I&D, a investigação e desenvolvimento”. Ou seja, algo que prepare a economia muito para além da recuperação da crise sanitária atual.

"É preciso medidas, reformas a longo prazo: uma maior previsibilidade do quadro fiscal [para as empresas deste e de outros setores] e um investimento na educação e na I&D, a investigação e desenvolvimento”.
Tiago Sequeira, economista da Universidade de Coimbra

Foi também apontada a necessidade de aumentar a qualificação dos trabalhadores que vão perder o posto de trabalho. Um estudo do centro de sondagens da Universidade Católica indica que são as pessoas com rendimentos do trabalho mais baixo que estão já a sofrer as maiores perdas no rendimento.

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É também necessário incentivar a economia digital, baixando os custos de acesso que ainda são elevados.

Entre as atividades onde podem surgir oportunidades estão o setor da saúde, a nível nacional, mas também internacional, que pode vir a absorver alguma da capacidade produtiva de setores tradicionais como o têxtil ou dos componentes automóveis. Já há há empresas a direcionar a sua produção para as novas necessidades que estão a surgir neste setor. Outro dos pontos fortes destacados, segundo Siza Vieira, é a existência de um setor científico e tecnológico mais forte, empresas flexíveis e uma mão de obra competente, fatores que permitiram a várias organizações reorientar a sua atividade para responder a novas procuras.

Reforço do setor da saúde é apontado como uma via possível para a retoma

MÁRIO CRUZ/LUSA

Mas não só. A economista Susana Peralta deixou pistas durante a reunião sobre o que poderá ser a economia portuguesa numa realidade pós-pandemia. Por exemplo, acredita que o Estado “terá de investir numa economia mais resiliente, com melhores serviços públicos”, aproveitando para “reordenar algumas partes da economia” para setores essenciais — a saúde, sim, mas também as utilities [água, gás, eletricidade, etc] e a alimentação, por exemplo.

Fator decisivo para o futuro, antevê Susana Peralta, será também a perceção de risco, que “muda com esta pandemia”. As gerações mais jovens “estão a viver uma situação como nenhum de nós viveu nas suas juventudes e isso deixa marcas — porque é uma situação surreal”. Teremos, portanto, uma “sociedade mais virada para nos protegermos de riscos” durante “muitos mais anos”.

Apesar de tudo, a economista vê nesta crise “uma janela de oportunidade” — perceber bem o que é o verdadeiro risco. Defende, por isso, que Portugal deveria analisar de forma consistente para catástrofes climáticas e terramotos, “investindo para ficarmos mais protegidos” face a riscos futuros. “Nos terramotos, por exemplo, temos zero preparação e qualquer dia bate-nos à porta”, avisa Susana Peralta. A economista aponta ainda uma real possibilidade de fazer uma melhor transição energética e de mudar hábitos de vida — teletrabalho, menor utilização de transportes, diminuição de CO2, transições menos abruptas entre local de trabalho e a vida caseira e melhor gestão do tempo.

As questões europeias, e a discussão sobre o apoio financeiro da UE às economias, foram transversais a várias intervenções, tendo sido abordada a eventual mutualização da dívida, que tanta polémica gerou nas últimas semanas. Susana Peralta sublinha ainda que a União Europeia precisa “de aumentar a capacidade para obter receitas próprias”, ou seja, deve “cobrar mais impostos” para ter maior poder de fogo no futuro.

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