A suspeita surgiu durante a tarde de terça-feira, quando Graça Freitas ficou a saber que tinha estado em contacto com uma pessoa infetada com o novo coronavírus. Na avaliação de risco, foi decidido testar a diretora-geral da saúde e a tarefa de recolher a amostra coube à equipa especial do INEM para as altas individualidades do Estado, que foi ao seu encontro, já ao final da tarde. Saber o resultado era urgente e os técnicos do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) haveriam de confirmá-lo já à noite: positivo.
A partir daí, foi preciso pôr a máquina de rastreio a funcionar: alguns dos contactos próximos dos últimos dias eram também eles altas individualidades, neste caso a ministra e os secretários de Estado de Saúde. E, além deles, foram testados também os familiares próximos identificados como eventuais contactos de risco.
O processo acabaria por se estender durante a noite. Marta Temido foi testada em sua casa, segundo o Expresso. O secretário de Estado Adjunto e da Saúde, António Lacerda Sales, e os seus familiares já só foram testados durante a madrugada de terça-feira, uma vez que uma das equipas especiais do INEM teve de se deslocar até Leiria. Também na mesma noite foi testado o secretário de Estado da Saúde, Diogo Serras Lopes, e os seus familiares considerados de risco.
Os seus resultados, porém, demorariam mais tempo a chegar: só já afinal da manhã desta quarta-feira se confirmaria que estão todos negativos. Até aí, ministra e secretários de Estado estiveram em isolamento, apesar de estarem assintomáticos — ao contrário de Graça Freitas, que está com sintomas ligeiros.
Também segundo o Expresso, o marido da ministra, Jorge Simões, antigo presidente do Conselho Nacional de Saúde também testou negativo. E como nenhum dos três governantes foi considerado contacto de alto risco por parte das autoridades de saúde, puderam deixar o isolamento, confirmou o Ministério da Saúde ao Observador. Aliás, Marta Temido até esteve na reunião desta tarde sobre o plano de vacinação contra a Covid-19, que teve lugar no Palácio da Ajuda.
As suas rotinas passam, porém, a ter de incluir as regras impostas aos contactos de baixo risco. De acordo com a norma da DGS sobre o rastreio de contactos, ministra e secretários de Estado terão de estar diariamente atentos ao surgimento de sintomas compatíveis com a Covid-19, medir a febre duas vezes por dia e cumprir “rigorosamente” o distanciamento social, a higienização das mãos e a etiqueta respiratória. Além disto, os governantes terão de evitar locais com muitas pessoas, ainda que mantenham a atividade profissional, e, caso surjam sintomas, terão de se auto-isolar e contactar a autoridade de saúde.
Na Direção Geral da Saúde, o impacto também acabou por ser menor do que o previsível. Em parte porque muitas das reuniões dos últimos dias têm sido feitas por vídeoconferência, o que reduziu o número de contactos, mas também por parte dos funcionários da DGS estão em teletrabalho — e, portanto, não contactaram com Graça Freitas recentemente. Até ao seu regresso, será substituída por Rui Portugal, o subdiretor-geral, que, curiosamente, também está em isolamento até à próxima semana, apesar de não estar infetado.
3 casos de infeção, dirigentes sem sintomas, equipas em espelho e “muita gente em teletrabalho”
Ao longo desta quarta-feira, foi feita na DGS uma “avaliação global de toda a situação e dos contactos” para se poder determinar quem tem de ser testado e quem tem de ficar em isolamento, adiantou ao Observador Rui Portugal, subdiretor-geral da Saúde e a pessoa que está a substituir a diretora-geral enquanto autoridade de saúde nacional. O seu trabalho, contudo, será feito à distância, uma vez que se encontra em isolamento. Não devido a esta situação, mas porque esteve a cuidar da mãe, de 92 anos, que esteve infetada com o novo coronavírus. O seu período de isolamento termina na próxima semana.
“A Dra. Graça Freitas está bem. Teve um azar, como qualquer um pode ter“, afirmou Rui Portugal, acrescentando que a responsável pela DGS tem sintomas “muito ligeiros”, sem precisar ao certo quais, mas garantindo que não tem febre.
Apesar de toda a situação, o subdiretor-geral da Saúde falou num “dia normal” na Direção-Geral da Saúde e assegurou que a “operação da DGS” está a ser mantida: “Está assegurado todo o trabalho da DGS, até porque estamos a trabalhar em espelho e está muita gente em teletrabalho“, garantiu Rui Portugal. Aliás, as várias pessoas contactadas pelo Observador que tiveram recentemente reuniões com a DGS referiram que elas foram feitas remotamente, o que poderá ter ajudado a que a infeção não se espalhasse.
De acordo com o subdiretor-geral da Saúde, nada se alterou em termos de funcionamento de trabalho na DGS. Foram precisos, porém, alguns ajustes — como no caso de algumas pessoas que nunca estiveram em teletrabalho e que, não apresentado sintomas, irão agora para casa trabalhar, como é o caso de “um ou outro dirigente”.
Sem avançar números em concreto, o número dois de Graça Freitas confirmou que já há pessoas em isolamento e a serem testadas. Ao que o Observador apurou foram testadas cerca de 15 pessoas. Segundo um comunicado da DGS, enviado às redações na noite de quarta-feira, foram até ao momento confirmados três casos de infeção na sede do organismo — contando com a diretora-geral de Saúde — e estão 10 funcionários em isolamento profilático. A DGS não especifica, contudo, quais os cargos das pessoas infetadas ou em isolamento.
Estes resultados surgem no âmbito da investigação epidemiológica, que está em curso, em articulação com a Autoridade de Saúde, tal como estipulam as normas vigentes, apenas se aplicando teste quando for considerado relevante”, lê-se ainda no documento.
Até ao momento, no que toca aos dirigentes da DGS, ninguém tem sintomas e “está tudo operacional”, assegurou Rui Portugal, indicando que “alguns irão para isolamento e continuarão a trabalhar” a partir de casos e alguns serão testados. Tudo irá depender do grau de exposição determinado pela autoridade de saúde.
Quem também será contactado e observado será a equipa de comunicação, o motorista e o secretariado: “Ainda agora estava a falar com o secretariado e até nem tiveram muito contacto com a Dra. Graça. Foi [um contacto] mais à porta [do gabinete] ou uma conversa à distância”, notou. Isto sem esquecer os “contactos externos”, ou seja, pessoas fora da Direção-Geral de Saúde, que também estão a ser observados. No entanto, de acordo com o subdiretor-geral da Saúde, Graça Freitas “teve muito poucos contactos externos” nos últimos dias. Tal como aconteceu com os governantes, os familiares da diretora-geral da Saúde considerados contactos de risco também foram testados.
ACES da residência de Graça Freitas acompanha a situação
Toda esta situação está a ser acompanhada pela unidade de Saúde Pública do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) Lisboa Central, a que pertence a residência de Graça Freitas, e supervisionada pelo delegado de Saúde Regional de Lisboa e Vale do Tejo, António Carlos Silva. Durante o dia esteve um elemento desta equipa de Saúde Pública a fazer “todo o levantamento” dos contactos e a falar com as pessoas uma a uma, adiantou ainda Rui Portugal.
Contactado pelo Observador, António Carlos Silva explicou que ainda está a ser feita avaliação de risco, até porque está “muita gente envolvida”, e não quis adiantar os dados provisórios que tem. Ainda assim, indicou que “a maioria das pessoas está em termos preventivos em casa“.
Artigo atualizado às 21h54 com o comunicado da DGS, enviado às redações na noite de quarta-feira