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ELEIÇOES LEGISLATIVAS: Rui Rio, lider do Partido Social Democrata (PSD), numa reunião com a Associação dos Agricultores do distrito de Portalegre. Acompanhado de João Pedro Luís, cabeça de lista do partido pelo circulo eleitoral de Portalegre. As eleições legislativas realizam-se no próximo dia 30 de Janeiro. 24 de Janeiro de 2022, Portalegre TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Os argumentos de Chega, IL e CDS para derrotar o inimigo comum: o voto útil (em Rio)

Três partidos, duas estratégias: Chega e CDS tentam convencer eleitores a não votar no PSD marcando muito as diferenças para Rio, IL não hostiliza PSD e só agora insiste: voto útil é nos liberais.

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São todos primos à direita do PSD, mais ou menos afastados. O Chega e a IL querem crescer muito, o CDS luta pela sua sobrevivência parlamentar, mas os três têm um inimigo em comum: o voto útil. Os argumentos dos três tocam-se: todos alertam que um voto em Rui Rio pode ir parar a António Costa e chamam a si o papel de polícia numa coligação não-socialista liderada pelo PSD.

Como acontece à esquerda — com BE e PCP relativamente ao PS, CDS — Chega, IL e CDS tentam criticar o PSD para irem buscar votos ao PSD, mas com o cuidado de não passar aos eleitores a ideia de que estariam fora de uma maioria não-socialista. O líder centrista, Francisco Rodrigues dos Santos, é o mais leve nas críticas a Rio, Cotrim consegue manter-se moderado e a Ventura foge-lhe muitas vezes a voz para a crítica mais agressiva. O Chega é o partido, tendo em conta as sondangens, com potencial para conseguir mais votos à direita (o PSD vai dizendo que não é de direita), mas também é aquele com quem ninguém quer coligar-se. Já PSD, CDS e IL admitem vir a entender-se entre si numa coligação de direita.

Há depois uma outra dimensão: naquilo que for o voto não-socialista que não vai parar ao PSD, estes três partidos concorrem entre si. O Chega e a IL foram roubando eleitores ao CDS, um partido que era a terceira força há 10 anos, que tinha 24 deputados e que há seis fez parte da coligação que ficou em primeiro lugar nas eleições. Em período oficial de campanha os partidos tentam desdobrar-se para combater o maior inimigo, que é comum aos três: o voto útil.

CDS quer casar para evitar um PSD em “maus caminhos” com Costa

A estratégia foi sendo calibrada ao longo da primeira semana. Francisco Rodrigues dos Santos começou a campanha a atirar sobretudo contra António Costa e “os seus parceiros da extrema-esquerda”, o “animalismo radical” do PAN, com pózinhos de farpas ao Chega, que acusou de roubar bandeiras que são há décadas do CDS (como a segurança). Mas Francisco Rodrigues dos Santos, que tem recusado comentar sondagens — chama-lhes “estudos de alfaiate à medida do bloco central” — está, porém, atento a elas, e foi adaptando os alvos.

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Tanto que no final da semana, quando as sondagens começaram a apontar para uma vitória do PSD, o líder centrista tentou capitalizar. Por um lado vincando as críticas aos adversários da direita —  Iniciativa Liberal e Chega —, assumindo-se como o “antídoto contra o liberalismo bloquista” e o “fanatismo populista”.

Por outro lado, procurando estabelecer “nuances” com o PSD: é que os sociais-democratas, argumenta, não fecham a porta a António Costa e só o CDS, diz Rodrigues dos Santos, é a “direita certa”, capaz de garantir uma nova maioria de direita no Parlamento, com valores tradicionais. As outras alternativas ou são iguais à esquerda “em tudo menos na economia” (crítica feitas à IL) ou propelam “fanatismo” (apontando ao Chega). Ou são António Costa (com a “extrema-esquerda ou num “bloco central de interesses” com o PSD).

Argumento 1: Voto no CDS é útil porque vai formar uma “nova maioria de direita”

“Pode ter a certeza de uma coisa. Todos os votos que o CDS tiver, todos os deputados que eleger, é para termos uma coligação de direita.” A garantida de que os votos no CDS serão para dar força a um novo governo de direita tem sido dada por Francisco Rodrigues dos Santos aos jornalistas e eleitores com quem se cruza nas ruas, durante a campanha eleitoral. Neste caso específico, a promessa foi deixada a José e Maria, um casal que, em Caminha (Viana do Castelo), mostrou ao líder dos democratas-cristãos como é ter um “casamento” entre CDS e PSD: ele é militante social-democrata; ela “simpatiza” com Rodrigues do Santos.

O presidente do CDS mostrou intenção de copiar a dupla. Embora diga que não está arrependido de ir a eleições sozinho, sem um parceiro de coligação, repete que CDS e PSD são “parceiros tradicionais”, num casamento que, argumenta, funcionou sempre que teve lugar (ao contrário do bloco central). E que quer ver reeditado num acordo parlamentar após dia 30 (desde que sem o Chega — mas já iremos ao partido de André Ventura). Francisco Rodrigues dos Santos tem, aliás, tentado deixar claro que votar no CDS “é votar num governo de direita”, contra António Costa e a “extrema-esquerda”, pelo que não será um “voto desperdiçado” — mas à esquerda também já lá iremos.

Saudosista do passado — diz mesmo que é o único líder da direita com “orgulho” do Governo Portugal à Frente (PàF) —, Rodrigues dos Santos quer voltar a mostrar que “com quem o PSD se entende é com o CDS, não é com outros partidos”. Ainda assim, já avisou Rio: só valerá a pena ao CDS ir para um Executivo social-democrata se “tiver força” para inscrever as suas propostas “reformistas” no programa de governo. Mas mesmo com estes avisos esporádicos, Rodrigues dos Santos mantém a porta aberta para o diálogo, que não só nunca foi fechada como está cada vez mais aberta.

Argumento 2: O CDS é o único partido que impede o PSD de “ir por maus caminhos” e formar um bloco central

Aqui a lógica é tentar colar o PSD a António Costa. Francisco Rodrigues dos Santos tem por diversas vezes repetido que um voto no CDS será para “impedir” que Rui Rio “vá por maus caminhos” — o que na narrativa do líder centrista significa coligar-se com o PS, num novo bloco central. Para Francisco Rodrigues dos Santos, esse é o “elefante” na sala destas eleições. Não só “os votos do PSD podem vir parar ao bolso de António Costa”, como os “votos no PS podem servir para entendimentos no bloco central”, tem repetido.

Rodrigues dos Santos tenta diabolizar a ideia do bloco central, uma investida que tem subido de tom nos últimos dias, à medida que as sondagens mostram um PSD mais forte. Por exemplo, diz que a solução de entendimento entre PS e PSD seria um “perigo para o país”, com “ausência de reformas, jogos de bastidores, jogos de influência, de poder”. E que sempre que esteve em marcha “tem dividido o Estado pelas clientelas e amigos, estruturas de poder, pelo nepotismo” e é “completamente avesso às reformas que o país precisa, como a libertação da economia do Estado, à diminuição de impostos”. “Sempre que há poder para distribuir quais é que são os arranjinhos que se fazem? É entre PS e PSD, como nas CCDR.”

As maiorias de bloco central são “esmagadoras” e “impedem o escrutínio”, argumenta. Por isso, insiste que o partido é o “único” que impede esse bloco central de interesses de acontecer, permitindo o que seria uma “nova maioria de direita no Parlamento”.

Além disso, tenta mostrar que já houve blocos centrais durante o atual e anterior governos do PS que “penalizaram” o país. “Sempre esteve implícito na aproximação que houve ao longo desta legislatura, convergindo em matérias que muito penalizaram a vida democrática do país, com a abolição dos debates quinzenais, arranjinhos para as CCDR. O PSD foi mais colaboração do que oposição, o PS abriu sempre possibilidade de, caso descartasse os seus companheiros de extrema esquerda, vir a entender-se com o PSD.”

Argumento 3. Só o CDS mantém os valores tradicionais, ao contrário da Iniciativa Liberal e do Chega

Outra linha de argumentação prende-se com os valores “tradicionais e conservadores” que o CDS quer manter — e que, diz, a restante direita não defende. A ideia é frisar que só o CDS é pelos valores “certos”, “com orgulho um partido conservador que se reconhece nos valores da doutrina social da Igreja”, uma força política da “direita social”, que “não tira pensões a quem menos tem”.

Francisco Rodrigues dos Santos tem insistido que o partido será sempre a “voz em nome da família” (aliás, num jantar-comício criticou um cartaz de uma conferência da Universidade de Coimbra sobre relações não monogâmicas e o “fim” da família), pela defesa da vida, contra a eutanásia — admitida pela IL —, a castração química ou a prisão perpétua — defendidas pelo Chega. Numa tentativa de marcar diferenças à direita, chegou a dizer que é o único partido nesse espetro político que não é o Bloco de Esquerda (os outros são “iguais” ao partido de Catarina Martins em tudo, exceto na economia). E que a “nova direita” (usou esta expressão gesticulando umas aspas) copiou ideias adotadas pelo CDS há décadas.

CDS contra evento da Universidade de Coimbra sobre relações não-monogâmicas. “Uma afronta a todos os portugueses”

O partido assume-se como um “antídoto contra o liberalismo bloquista” e o “fanatismo populista”. Quanto à primeira expressão, a mira é apontada ao partido de João Cotrim de Figueiredo: “Dizemos não à eutanásia, não à legalização das drogas, não à prostituição, não ao cancelamento cultural, e sim às proteções sociais porque sempre fomos um partido ao contrário deste novo liberalismo, que se esquece das pessoa para encontrar os mercados“.

Mas a crítica estende-se também ao Chega. Francisco Rodrigues dos Santos tem acusado o partido de Ventura de defender “tonterias” que “um verdadeiro democrata-cristão não pode nunca tolerar”. Por isso, assegura, o CDS nunca defenderá a castração química, a pena de morte, a prisão perpétua. E também nunca estará “contra aqueles que precisam do Estado para poder sobreviver”.

Na argumentação do líder centrista, dar força a estes partidos seria dar força a valores que não são nem tradicionais nem conservadores e que podem, eventualmente, segurar um governo de Rio.

Argumento 4. A “extrema-esquerda” tem destruído o país

Além de combater o crescimento da direita e da “extrema-direita”, assim como de António Costa, um voto no CDS impede o crescimento da “extrema-esquerda” — Bloco e PCP, na visão de Rodrigues dos Santos. A esquerda tem, sugere, levado a uma diminuição do investimento estrangeiro e a aumentos da dívida pública e da carga fiscal. Por outras palavras, tem “esmagado a economia”, criando um “clima de escravatura fiscal, em que trabalhar não compensa”.

Ao contrário do CDS — que se diz um partido pelos empresários e pela “liberalização” da economia — Rodrigues dos Santos tem acusado a esquerda de querer “taxar tudo aquilo que mexe”. E por isso, praticamente dia sim dia não, repete as medidas que tem para as empresas, entre elas a baixa do IRC e incentivos fiscais para as empresas que se mudem para o interior.

Argumento 5. O voto útil acabou em 2015

Desde as eleições de 2015 — em que o PSD e o CDS tiveram mais votos, mas António Costa é que conseguiu uma maioria no Parlamento com os parceiros à esquerda — “o voto útil acabou”. Rodrigues dos Santos argumenta que já não interessa quem fica em primeiro lugar e vence as eleições, mas antes que maiorias se podem desenhar no Parlamento.

Por isso, insiste que é preciso dar força ao CDS para que o partido possa contribuir para essa “nova maioria de direita no Parlamento”. E frisa que que o voto do dia 30 não serve para eleger um primeiro-ministro, mas os deputados do Parlamento — o desenho governativo é cada vez mais incerto.

Na IL, o voto útil começou a ser combatido no final da 1.ª semana. E não foi acaso

No combate ao voto útil, a Iniciativa Liberal fez uma espécie de campanha a dois tempos. Primeiro, quis fazer do socialismo e do PS de António Costa saco de boxe quase único, ignorando olimpicamente todos os outros partidos e contrapondo o “estatismo” do PS ao liberalismo alternativo da IL. Só depois — na reta final pré-voto antecipado, no final da primeira semana — começaram a aparecer as comparações com PSD e as tentativas de apelo aos eleitores liberais para não votarem em Rui Rio.

A postura de procura de pontes com Rui Rio, particularmente notória na pré-campanha e ao longo da primeira semana de campanha, até valeu a Cotrim uma boca de André Ventura: "Já se venderam ao PSD"

A estratégia dos primeiros dias ficou visível logo nos debates individuais, ainda antes do arranque oficial da campanha. A postura pouco bélica, de procura de pontes, de Cotrim Figueiredo com Rui Rio chegou a ser vista como surpreendente por alguns partidos políticos: quando Cotrim disse num debate com André Ventura que Rio poderia ser um bom primeiro-ministro desde que a IL influenciasse a governação, ouviu do líder do Chega uma boca dita três vezes e três vezes ignorada: “Já se venderam ao PSD”.

A posição era estratégica: a Iniciativa Liberal sabia que fazer uma campanha a hostilizar e distanciar-se do PSD seria uma aposta altamente arriscada, num partido que até se tenta diferenciar do Chega ao apresentar-se como uma força política construtiva, que pode contribuir para uma governação à direita da qual André Ventura continua a ser excluído.

Mais do que isto, a Iniciativa Liberal sabe que muitos dos seus possíveis eleitores no dia 30 querem também que Rui Rio seja primeiro-ministro. Não o desejam necessariamente por grande convicção ideológica, mas porque é Rio que é hoje o presidente do PSD. E só se o PSD ficar em primeiro lugar tentará formar Governo, como aliás avisara o líder laranja, que deixou claro que se tiver menos votos do que o PS ajudará a viabilizar um Governo socialista (sem Bloco e PCP).

A IL sabe que muitos dos seus possíveis eleitores no dia 30 querem também que Rio seja primeiro-ministro. Hostilizar os sociais-democratas e criticar permanentemente o possível parceiro comportaria demasiados riscos

Se os possíveis eleitores liberais já podiam portanto estar tentados a ceder ao voto útil para retirar o PS e a esquerda do poder — Rio tem insistido na tese de que só o voto no PSD derrotará o PS e tirará Costa do Governo —, hostilizar os sociais-democratas e criticar permanentemente (desde o dia 0) o possível parceiro de dia 31 comportaria demasiados riscos. Os possíveis eleitores da IL, acredita-se na comitiva liberal, querem o partido a mostrar-se disponível para retirar o PS do poder. E para isso é preciso andar de mão dada com um PSD forte.

Antes do voto útil, tiro ao PS, “o adversário político e estratégico”

A procura de pontes com o PSD ajuda a decifrar a mensagem dos primeiros dias de campanha da Iniciativa Liberal. Entre sobretudo reuniões de trabalho (com associações empresariais, ordens profissionais e universidades) e algumas ações emblemáticas para criticar os dinheiros públicos na TAP e a carga fiscal que a IL considera excessiva, Cotrim nunca procurou criticar explicitamente o PSD.

Críticas aos sociais-democratas só mesmo no dossiê TAP, mas implícitas — quando Cotrim disse aos jornalistas que a Iniciativa Liberal foi “o único partido” que já há dois anos defendeu a privatização futura da companhia, a mensagem subliminar era que PSD e CDS-PP (que hoje estão alinhados com a IL na matéria) acordaram tarde para a privatização.

Nos primeiros dias a mira estava porém permanentemente, até quase exclusivamente, apontada ao PS. E o presidente da Iniciativa Liberal explicava porquê aos jornalistas: “Temos claro na nossa cabeça quem é o adversário político e estratégico nesta eleição: é o Partido Socialista e a visão estatista da sociedade. Portanto não desviamos desse foco, não vamos apagar fogos aqui e acolá”.

"Sabíamos que nos últimos dez dias de campanha este era o principal problema estratégico, não só da Iniciativa Liberal mas de qualquer partido que não são os partidos de alternância do costume"
Cotrim Figueiredo

O tiro estratégico ao PS manteve-se no final da primeira semana de campanha, mas o discurso começou a ganhar nuances. E há fatores que ajudam a explicar a mudança: por um lado a aproximação ao dia 23 de janeiro, domingo, dia em que milhares de portugueses já foram votar; por outro lado, a convicção dos liberais de que os apelos ao voto útil iam intensificar-se à medida que a campanha avançava. Nessa altura seria preciso convencer quem acredita no liberalismo económico de que votar no “mal menor” — isto é, no PSD — seria um erro.

Ao Observador, o presidente do partido defende que a entrada do voto (in)útil como um dos temas centrais da campanha liberal já estava prevista antes de se saber que milhares de portugueses iam votar no dia 23. Diz Cotrim Figueiredo: “Sabíamos que nos últimos dez dias de campanha este era o principal problema estratégico, não só da Iniciativa Liberal mas de qualquer partido que não são os partidos de alternância do costume”.

Argumento 1: Voto útil “trouxe o país até aqui”

Na sexta-feira, no final da primeira semana de campanha, Cotrim Figueiredo começava no contra-ataque aos apelos ao voto útil de Rui Rio.

Depois de uma reunião com a a AISET– Associação da Indústria da Península de Setúbal, Cotrim falaria aos indecisos: “Peço aos portugueses que pensem se a decisão de voto útil que provavelmente tomaram muitas vezes nas últimas sete ou oito eleições legislativas lhes serviu bem”. O voto útil, acrescentava mesmo o candidato, “trouxe o país até aqui”.

Argumento 2: na Europa desenvolvida, voto nos pequenos produz “coligações mais capazes”

Outra das ideias que a Iniciativa Liberal tem passado é que o voto útil é contrário às democracias mais desenvolvidas e aos Governos dos países mais avançados da Europa.

No final da primeira semana de campanha, em Setúbal, Cotrim usava o argumento falando diretamente aos eleitores: perguntava aos que equacionam votar nos dois grandes partidos (PS e PSD) “se gostam das situações políticas e económicas de países na Europa com os quais se identificam e admiram”. E concluía o raciocínio: “Vejam se esses países não têm coligações de partidos que concorreram sozinho e se os eleitores desses países terem escolhido de acordo com a sua consciência não produziu coligações que são mais capazes de resolver os problemas dos países do que as nossas têm sentido”.

O presidente da Iniciativa Liberal (IL), João Cotrim de Figueiredo, durante uma visita ao Instituto Politécnico de Setúbal, durante uma ação de campanha eleitoral, 21 de janeiro de 2022. Mais de 10 milhões de eleitores residentes em Portugal e no estrangeiro constam dos cadernos eleitorais para a escolha dos 230 deputados à Assembleia da República RUI MINDERICO/LUSA

Cotrim Figueiredo quer evitar que os eleitores que simpatizam com a Iniciativa Liberal caiam na tentação de "votar laranja" (em Rio) para derrotar o PS

RUI MINDERICO/LUSA/LUSA

Argumento 3: voto em Rio “pode ir ao dar ao Costa”

No sábado, dia 22 de janeiro, a Iniciativa Liberal fazia o seu primeiro comício de campanha em Lisboa e Cotrim discursava alertando que não é líquido que um voto no PSD contribuía necessariamente para uma maioria não socialista. Dizia o candidato: “Só há verdadeiramente um partido em que é útil votar, esse partido é a Iniciativa Liberal. É o voto verdadeiramente útil porque um voto na IL nunca irá dar ao Costa. Um voto dado ao Rio pode eventualmente ir dar ao Costa“.

Não se trata só da garantia, há muito dada por Rui Rio, de que se o PS ficar em primeiro lugar o PSD vai “respeitar” e dispõe-se a negociar e viabilizar um Governo socialista — coisa que a Iniciativa Liberal já disse que não fará. É também a hipótese de Rio, mesmo vencendo procurar um acordo com o PS dado que as sondagens sugerem que não há maioria há direita sem o Chega. E se o Chega entrar, é a Iniciativa Liberal que sai.

Depois de no domingo percorrer bandas de peixe, fruta e produtos regionais (como o mel) no Mercado do Livramento, em Setúbal, Cotrim alertava: o cenário de Rio tentar negociar com o PS mesmo ficando à frente “não foi taxativamente afastado” e pode mesmo haver bloco central, mesmo que informal (através de um acordo de incidência parlamentar). Ora, para a IL, “o bloco central e a tentativa de harmonizar e esbater todas as diferenças entre as alternativas tem sido mau para o país. Não vamos colaborar num cenário desses”.

Argumento 4: PSD e IL podem ter ambos bons resultados

Mais um argumento, mais um combate à tentação de um eleitor que simpatize com a Iniciativa Liberal votar em Rio para derrotar Costa.

Socorrendo-se das “tendências” visíveis nos estudos de opinião, Cotrim Figueiredo apontava: “É possível ter o PSD e a Iniciativa Liberal a subir ao mesmo tempo”. Essa perspetiva ajuda “as pessoas a perceberem que a utilidade do voto na Iniciativa Liberal não vai tirar votos a outras forças políticas que podem ser alternativas ao PS a partir de 30 de janeiro”.

Para esta tese há um exemplo que pode complicar a argumentação do partido: o que aconteceu em Lisboa nas autárquicas.

O presidente da IL chegou a dizer que foram os liberais que deram a vitória a Carlos Moedas em Lisboa — explicando que a IL teve mais bem votos para a Assembleia Municipal do que para câmara, onde alguns eleitores podem ter votado “útil” em Moedas para derrotar Medina — e há um risco de que o voto possa fugir novamente para o “mal menor” Rui Rio, que pode derrotar António Costa.

Numa arruada em Santos e no Cais do Sodré, no final da primeira semana de campanha, o candidato da IL a Lisboa, Bruno Horta Soares, dizia ao Observador que “houve pessoas que foram ter comigo a dizer: acredito nas ideias liberais mas gostava menos do Medina do que gostava do liberal”. Daí o voto em Moedas e no PSD. Agora, Bruno Horta Soares acredita que não acontecerá o mesmo: “Se os eleitores insatisfeitos com o PS, que são muitos, votarem massivamente, haverá muitos votos no PSD [para vencer as eleições] e ainda sobrará muita, muita gente para elegermos muitos deputados da IL”.

Cotrim Figueiredo a discursar no comício da Iniciativa Liberal em Lisboa, de 22 de janeiro

ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Argumento 5: PSD é um dos “partidos do sistema”

Se até ao final da primeira semana Cotrim tinha a mira quase em exclusivo no Partido Socialista, o PSD começou a entrar no discurso e até acabou por ser descrito como um dos “partidos do sistema”, no comício liberal de sábado, 22 de janeiro.

No comício em Lisboa, o candidato liberal defendia que o seu partido tinha “o nível de exigência, de independência, de determinação, de frescura e de energia que os partidos do sistema já perderam, ao mesmo tempo que perderam o ímpeto reformista que já tiveram”.

No dia seguinte, questionado pelo Observador sobre quem são os partidos do sistema, Cotrim Figueiredo detalhava o raciocínio: “Os partidos do sistema são sobretudo o PS e PSD, por motivos que se compreendem olhando para a história democrática portuguesa. Não só deixámos ao longo destes 47 anos que o aparelho do Estado se tornasse uma coisa incrivelmente pesada como esses partidos deixaram que os seus próprios aparelhos se tornassem uma central de interesses particulares”.

Para o político, a IL quer “transformar profundamente” Portugal “e dar ao país uma configuração completamente diferente”. E disso nunca o PSD será capaz sozinho: “É certo que vamos ferir muitos interesses para o fazer. Para além dos interesses económicos e interesses particulares de alguns setores, no caso desses partidos iremos ferir os interesses dos aparelhos”.

Esta terça-feira, 25 de janeiro, o argumento ia ainda mais longe: “Um Governo do PSD sem a Iniciativa Liberal é um Governo igual ao Partido Socialista, não vai realmente mudar as coisas”.

Argumento 6: A IL é “diferente” do PSD. Por diferente, leia-se “melhor”

No momento de se distanciar do PSD, Cotrim Figueiredo puxou a brasa à sardinha liberal. Chegou a dizer: “Somos diferentes [dos sociais-democratas], mais determinados, mais desejosos de mudança, mais corajosos a assumir os custos” de medidas impopulares.

Numa outra ocasião, já este domingo, aprofundava o raciocínio: “Não vejo ninguém que à direita do PS esteja a oferecer tantas alternativas, tão testadas e que funcionam tão bem noutros países como a Iniciativa Liberal. E espero que isso signifique muita confiança de muitos portugueses no dia 30”.

Já em conversa com o Observador, também no domingo, Cotrim Figueiredo ia mais longe e dizia: nestas eleições, “votar no que se quer é mais importante do que votar contra o que não se quer”. E vincava: “Independentemente da solução governativa que saia de 30 de janeiro, é fundamental ter ideias como as da IL a influenciar a governação e a gestão do país — seja enquanto suporte de um Governo, seja enquanto alguém que viabiliza o Governo no parlamento, seja mesmo enquanto oposição se for caso disso”.

Chega partiu solitário e a querer manter-se (mais ou menos) assim

A caravana do Chega arrancou para a estrada numa espécie de bolha solitária. O partido com quem ninguém se quer entender (e já nem é escondido) é também o partido que continua a ser, com base nas sondagens, o favorito a ter mais votos à direita do PSD. As fichas estavam na mesa e o Chega definiu uma tática baseada, por um lado, num ataque constante a todas as forças políticas (PS e PSD como alvos preferenciais) e, por outro, uma mão estendida à direita para que aceitem o partido num executivo que venha a existir.

Ora, a postura bipolar tinha duas justificações: o Chega andou a tentar roubar votos a todas as forças com a abertura de portas aos eleitores “descontentes com o sistema” — para isso teve de desconstruir tudo o que critica nos partidos que já governaram em Portugal — e tinha de captar eleitorado para cumprir os objetivos a que se propôs, dar continuidade à “implantação nacional” e para combater o voto útil em Rui Rio.

Argumento 1: para fazer “exigências”, é preciso ter votos

André Ventura durante um jantar-comício na Alfândega do Porto

(Rui Oliveira/Observador)

“Se houver uma maioria à direita e Rui Rio não se sentir confortável com quem tem à sua direita, só tem uma hipótese: fazer as malas e sair.” Num dos primeiros dias de campanha, André Ventura partia ao ataque. As linhas vermelhas do Chega foram sendo estabelecidas e a posição perante um cenário de governabilidade à direita também. Depois de vários volte-face, o (alegado) veredito: com mais de 7%, André Ventura exige presença no Governo; com menos do que isso vai analisar o que estiver em cima da mesa.

Desde logo, o facto de ser estabelecida uma meta numérica aumenta a pressão sobre o eleitorado do Chega, passando a ideia de que o voto útil no PSD pode tirar força ao partido para chegar a um executivo. Daí a insistência constante de Ventura nos números e o facto de todos os dias recordar que o partido quer ser a terceira força política.

Com a campanha ainda a decorrer, há duas grandes questões em cima da mesa: a primeira sobre o que fará Rui Rio caso um cenário de governo à direita seja uma realidade. O presidente do PSD já disse que não contará com o Chega para o executivo, mas também não recusa os votos do partido de André Ventura para ver um governo viabilizado. A segunda: o que fará o Chega se for encostado à parede e tiver de escolher entre viabilizar um governo de direita ou chumbá-lo. À partida, e tendo em conta o que André Ventura disse numa entrevista ao Observador, votará contra. “Temos uma maioria. Imaginem, 8 ou 9% do Chega, 30 do PSD, 4 da IL, não sei o que o CDS terá. Rui Rio diz: que se lixe o Chega, que se lixem os eleitores do Chega. É contra tudo e contra todos.”

André Ventura assim quer mostrar que o eleitorado do Chega vai ficar sem representação num governo de direita e, por isso, andou dias e dias a pedir um voto que obrigue a um entendimento. Ou seja, o presidente do partido nacionalista entende que o PSD, por muito que queira afastar o Chega, não conseguirá continuar a apontar uma espada a um Chega com uma expressão eleitoral elevada.

Argumento 2: Açores, “nunca mais” 

Caso haja uma maioria de direita no Parlamento e Rui Rio insista em deixar o Chega de parte, coloca-se a questão sobre se poderá ser repetido o entendimento nos Açores. A repetição dessa solução governativa, onde foi construída uma espécie de geringonça à direita e que André Ventura não vê como um exemplo de sucesso, é dos cenários afastado pelo Chega. “A experiência dos Açores nunca mais se vai repetir”, garante.

Na prática, o PSD e o CDS formaram um Governo que está dependente do Chega e da Iniciativa Liberal para aprovar tudo o que seja necessário. Os acordos e compromissos foram assinados unilateralmente com cada um dos parceiros, mas há uma co-dependência, tal como acontecia na geringonça nacional.

Neste caso, André Ventura aproveita cada ocasião para atacar o PSD, para dizer que o acordo não foi cumprido e chegou até a dizer que “não confia” no partido de Rui Rio, acusando-o de não ter cumprido o que ficou acordado. Se assim for, no dia seguinte às eleições, uma geringonça açoriana não terá reflexo na Assembleia da República.

Argumento 3: atirar Passos contra Rio 

Ainda mal a campanha tinha começado e já se notava um distanciamento do PSD do passado como arma de arremesso ao PSD do presente. É como quem diz: André Ventura usou Pedro Passos Coelho para atacar Rui Rio e para prometer que com o Chega o eleitorado não voltará a viver essa direita.

“Da última vez que tivemos um Governo dito de direita cortaram-se pensões, mandaram-se pessoas emigrar… a nova direita tem de ser a direita que aumenta salários, pensões e que quer fixar jovens”, afirmou num discurso na Guarda.

O foco foi apresentar o Chega como uma “nova direita”, mais confiável e que não deixe os “portugueses que trabalharam a vida inteira para trás”. E André Ventura que vender a imagem de que é o único homem à direita capaz de o fazer, prometendo muito nas mais diversas áreas e acrescentando ideias em cada sítio onde passa (nomeadamente propostas que não estão no programa, como aconteceu no caso da pensão-extra aos antigos combatentes).

Apesar disso, André Ventura sabe que esse PSD do passado era o seu PSD, que Passos Coelho foi o líder que o convidou para uma candidatura à Câmara Municipal de Loures, onde foi eleito vereador, e que essa visibilidade lhe permitiu fundar o Chega. Quando confrontado com essa realidade durante a campanha eleitoral, a defesa: “Não fazia parte da direção do PSD.”

“Alternativa não é o PSD, é votar no Chega como única alternativa em Portugal"
André Ventura, presidente do Chega

Argumento 4: a terceira força política, do distanciamento do BE à pressão do PSD

O objetivo de o Chega se consagrar nestas eleições legislativas como terceira força política é a mais ambiciosa meta do partido e também uma das que mais ajuda ao combate ao voto útil. Ao entrar no pódio, não só o Chega acredita que terá mais força em possíveis negociações com um governo de direita (como foi referido acima) como consegue provar a aceitação e normalização do partido, com base num “descontentamento” que sempre foi a base do discurso.

“Só com um Chega forte no Governo ou como terceira força expressiva é que teremos a capacidade de impor que valores não se perdem. Substituir um Governo mau por outro mau, não trará nada de bom”, alertou líder do Chega.

“Em três anos fizemos o que ninguém fez: derrotámos a extrema-esquerda e sabemos que vamos ser a terceira força política”
André Ventura, presidente do Chega

André Ventura apresenta-se como a “única alternativa” para Portugal e fá-lo durante uma campanha inteira em que atira à esquerda com o intuito de “tirar António Costa do poder” e à direita com o intuito de ter o máximo de votos possível para deixar o PSD sem escolha. No final do dia, esse é o grande objetivo de Ventura (e di-lo muitas vezes): se o Chega tiver “500 mil votos como nas Presidenciais”, não pode ser “ignorado”.

É uma espécie de “nós contra todos os outros”. De “alternativa” vs. “sistema”. De transmitir que um voto no PSD pode levar a um fecho de portas ao Chega e que um voto no Chega servirá para deixar o PSD sem solução.

André Ventura durante um jantar-comício em Braga

(Rui Oliveira/Observador)

A mesma ideia de terceira força política também serve para ser usada contra a esquerda. “Em três anos fizemos o que ninguém fez: derrotámos a extrema-esquerda e sabemos que vamos ser a terceira força política.” Por várias vezes, Ventura levanta as salas de apoiantes com parangonas contra os partidos de esquerda e ao passar a ideia da rapidez com que o Chega (ao que parece tendo em conta as sondagens) poderá ser a terceira força política à frente do Bloco.

Além do objetivo do lugar em si por uma questão de afirmação do partido, a meta de o Chega ser a terceira força significa ultrapassar o partido coordenado por Catarina Martins — um trunfo extra que André Ventura quer usar para levar eleitores às urnas. Durante a campanha, aproveitou as críticas do partido de esquerda (e a atenção dada) para cavalgar a ideia de distanciamento da ideologia e das políticas. Este é um estratagema idêntico ao foi usado por Ventura nas eleições com Ana Gomes em que, mais do que uma percentagem, o líder do Chega definiu como objetivo ficar à frente da socialista. Não teve êxito nessa missão e demitiu-se.

No discurso em Braga — um dos mais inflamados da campanha — André Ventura fez o que faz todos os dias na rua: “Temos de ir votar, temos de levar todos a votar.” Um apelo ao voto reforçado com um “que ninguém fique para trás porque o horário é este ou aquele” — uma referência ao facto de os isolados terem horas aconselhadas para votar. E um entusiasmo final: “Termos de esmagar BE, PCP e IL nas urnas.”

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