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O presidente Joaquim Sousa Ribeiro está de saída do Tribunal, bem como mais cinco juízes. Os substitutos são eleitos esta quarta-feira pelo Parlamento.
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O presidente Joaquim Sousa Ribeiro está de saída do Tribunal, bem como mais cinco juízes. Os substitutos são eleitos esta quarta-feira pelo Parlamento.

JOÃO RELVAS/LUSA

O presidente Joaquim Sousa Ribeiro está de saída do Tribunal, bem como mais cinco juízes. Os substitutos são eleitos esta quarta-feira pelo Parlamento.

JOÃO RELVAS/LUSA

Os juízes do Tribunal Constitucional têm dono?

Os constitucionalistas ouvidos pelo Observador garantem que não, que os juízes do Ratton não têm dono. Mas há um dado incontornável: os campos ideológicos de cada um pesam nas decisões. Quanto?

A cor política de quem escolheu os juízes conta na altura do voto no Tribunal Constitucional? Se a história diz que sim, já a troika veio mostrar que os juízes conselheiros nem sempre alinham por aquilo que os partidos que estiveram na origem da sua nomeação mais gostariam.

Há uma coisa que os cinco conselheiros que a Assembleia da República elege esta quarta-feira sabem sobre o cargo que agora assumem, até porque consta no estatuto deste órgão de soberania criado em 1982: “Os juízes do Tribunal Constitucional são independentes e inamovíveis”. Porém, entre politólogos que estudam o assunto, constitucionalistas, um antigo conselheiro e partidos políticos, consultados pelo Observador, não há quem assuma existir ‘partidarite’ nas decisões dos juízes, mas também ninguém nega que a ideologia pesa no momento da decisão — e até mais em situações-limite. Não foi o caso do período de assistência financeira (entre 2011-2014).

Que o diga o então secretário de Estado adjunto do ministro-adjunto do primeiro-ministro. Pedro Lomba considera que neste período “o Tribunal Constitucional não teria tido o papel que assumiu se tivesse havido um acordo entre PS e PSD mais abrangente para este tempo”. “O papel do TC foi muito promovido pelo bloqueio que ocorreu dentro do meio político”. Que papel foi esse? “Um papel que ativamente e deliberadamente influenciou decisões políticas fundamentais em sede orçamental”.

No entanto, Lomba não acredita que isso tivesse sido “resultado de uma escolha ativa do Tribunal Constitucional, mas este ocupou um espaço vazio”, decorrente de “uma deficiência do sistema político no grau de compromisso e entendimento” entre as maiores forças políticas.

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Há uma coisa que, para o socialista Vitalino Canas, saiu certa deste período de maior sensibilidade constitucional: “Levou os partidos a ficarem mais alerta relativamente às escolhas que fazem para o Tribunal Constitucional”.

Como são eleitos os juízes do Tribunal Constitucional?

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O coletivo do Tribunal Constitucional é composto por 13 juízes e a forma de escolha não é igual para todos. Dez dos conselheiros são designados pela Assembleia da República e necessitam de aprovação por dois terços do plenário, ou seja, a escolha acaba por ser concertada entre as duas maiores forças partidárias. Os três outros juízes são cooptados pelo coletivo.

Há uma regra válida para todos: “Seis de entre os juízes designados pela Assembleia da República ou cooptados são obrigatoriamente escolhidos de entre juízes dos restantes tribunais e os demais de entre juristas”. O mandato é limitado a nove anos e não é renovável.

Segundo este socialista, o facto de o mandato dos juízes ser limitado a nove anos acaba por dar “margem de independência e autonomia face as forças que elegeram” determinado juiz. Além disso, sublinha o deputado do PS, “os juízes eleitos pela Assembleia da República têm proximidade relativamente a um partido, mas têm de ser aprovados por dois terços, por isso não podem ser muito radicais e nem ideologicamente muito marcados”.

O que se pretende na escolha é que “quem é eleito seja um bom jurista”, mas o socialista também admite que “a tendência, mesmo que não seja voluntariamente assumida, é que os juízes tenham mais inclinação para algumas posições”, sobretudo em situações-limite. “É possível que, em situações de dúvida e maior divisão, o juiz caia para o lado mais favorável à força política que patrocinou a sua candidatura”. “Só em casos-limite haverá contaminação política da decisão”. Mas não foi isto que se verificou durante o sensível período de assistência financeira (2011-2013), altura em que Vitalino Canas detetou “muitas vezes juízes a votarem de forma divergente das forças políticas que patrocinaram a sua eleição”.

Canas foi um dos deputados do PS que apresentou, à margem da direção do partido de então, um pedido de fiscalização sucessiva do Orçamento do Estado de 2012, o primeiro da troika. Uma iniciativa que havia de repetir-se no Orçamento seguinte, já com o PS a assumi-la e com o Presidente da República da altura, Cavaco Silva, a fazer o mesmo.

"Os juízes do PS são muito benevolentes para o Governo quando este é do PS e menos benevolentes quando quem está do Governo é o PSD", conclui Nuno Garoupa

A alta sensibilidade do período da troika

O investigador Nuno Garoupa já tinha estudado esta tendência política dos juízes do Tribunal Constitucional e está prestes a publicar uma atualização desse estudo — que ia de 1983 a 2007 — que já inclui o período da troika. A conclusão reforça a do estudo anterior: “Há um alinhamento ideológico dos juízes e há um alinhamento com o partido quando este está no poder. Os juízes do PS são muito benevolentes para o Governo quando este é do PS e menos benevolentes quando quem está no Governo é o PSD“.

O estudo que fez com o politólogo Pedro Magalhães analisa não só as decisões relativas a pedidos de fiscalização preventiva da constitucionalidade, como os pedidos de fiscalização sucessiva interpostos por órgãos políticos (Presidente da República, Assembleia da República e Governos Regionais). “As conclusões de 2007 saíram reforçadas”, assegura o investigador, que não hesita em apontar alguns desalinhados no período da troika, caso da juíza conselheira Fátima Mata-Mouros, que “foi um erro de casting do CDS”, referindo-se às posições contrárias ao partido que a fez entrar na lista de eleitos do Parlamento, em 2012.

“Não é por acaso que há uma escolha periódica de juízes que coincide com as eleições, com o início de uma nova legislatura. Espera-se que o Tribunal Constitucional reflita a maioria parlamentar", assume Fernando Negrão

O período de intervenção da troika em Portugal, de resto, acabou por tornar ainda mais evidente esse afastamento da juíza em relação às medidas aprovadas pelo Governo PSD/CDS. Entre 2012, ano em que tomou posse, e 2014, Fátima Mata-Mouros “chumbou” nada menos do que 60% dos diplomas analisados no Tribunal Constitucional.

Foi essa uma das muitas conclusões a que o Observador chegou quando decidiu analisar, em agosto de 2014, como votavam os juízes do Palácio Ratton quando eram chamados a pronunciarem-se sobre diplomas do Executivo de Pedro Passos Coelho. E os dados eram claros: entre os 13 juízes do Tribunal Constitucional, nove votaram contra mais de metade das medidas propostas pelo então primeiro-ministro e apreciadas pelo Tribunal Constitucional. Mais: três desses juízes tinham sido indicados pela maioria. Os juízes estavam bem mais desafinados à direita do que à esquerda no Constitucional.

Fátima Mata-Mouros não é, por isso, caso único. Nem o mais expressivo. Quando chamado a pronunciar-se, João Eduardo Cura Mariano Esteves, juiz indicado pelo PSD, considerou mais de 70% das medidas desenhadas pelo Governo PSD/CDS inconstitucionais. Uma percentagem de “chumbos” idêntica à de Carlos Fernandes Cadilha, escolhido pelos socialistas. O leque de “desalinhados” ficaria completo com Maria Rangel de Mesquita, escolhida pelos sociais-democratas. Em dois anos, esta juíza “chumbou” 53,3% dos diplomas em que foi chamada a pronunciar-se.

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Para Fernando Negrão, jurista e deputado social-democrata, este último período é uma prova evidente da “independência” do Tribunal Constitucional, um tribunal que é “político”, não esconde, mas que não se sujeita às diretrizes partidárias. “Não é por acaso que há uma escolha periódica de juízes que coincide com as eleições, com o início de uma nova legislatura. Espera-se que o Tribunal Constitucional reflita a maioria parlamentar”, reconhece Negrão.

Coisa diferente é dizer que os partidos procuram nomear juízes comprometidos com a “cor partidária” para garantir uma interferência clara nas decisões do Ratton (o nome do palácio onde se instala o Tribunal Constitucional). “A escolha baseia-se numa forte componente técnica”, à qual não é indiferente “o perfil do candidato”, insiste o deputado social-democrata. Essa é a regra de ouro, mesmo que o jogo político possa, excecionalmente, subverter a norma, admite.

Quem pode pedir a intervenção do TC?

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Simplificando: existem, sobretudo, duas formas de aferir a constitucionalidade de uma determinada norma: a fiscalização preventiva e a sucessiva.

No primeiro caso, o Presidente da República pode, sempre que o entender, requerer ao Tribunal Constitucional. Mas não é o único. Os Representantes da República na Madeira e nos Açores, o primeiro-ministro e um quinto dos deputados da Assembleia da República também podem fazê-lo.

No caso da fiscalização sucessiva, além dos supracitados, esta competência estende-se também ao Provedor de Justiça, ao Procurador-Geral da República e aos restantes órgãos de soberania regionais. Mais um detalhe: no caso da fiscalização sucessiva, basta que um décimo dos deputados decidam fazê-lo.

É isso que dá entender ao Observador um constitucionalista da área social-democrata, que preferiu não ser identificado, dando como exemplo a recente escolha de Cláudio Ramos Monteiro, amigo pessoal de António Costa e Diogo Lacerda Machado, para integrar o coletivo de juízes do Constitucional. “O primeiro-ministro terá aqui uma linha direta de comunicação” com o Tribunal Constitucional, “que poderá ser vantajosa”, teoriza. O mesmo constitucionalista acredita que não existiu idêntica preocupação do PSD nessa matéria. “Houve alguma desatenção na escolha dos candidatos”, considera. Mais do que o perfil do juiz é importante “o perfil do nomeado como jurista”. E, aí, o PSD poderá ter ficado a perder.

Isto porque a “interpretação da Constituição depende também das visões que cada pessoa tem do mundo”, adianta o mesmo constitucionalista. Assim sendo, é natural que os “juízes que se situam numa determinada área ideológica” estejam, tendencialmente, mais alinhados com os partidos que os nomearam. Sobretudo, em casos de fiscalização preventiva, que acabam por tornar-se num “prolongamento do debate parlamentar”. Um candidato cujo perfil não se enquadre com o partido introduz imprevisibilidade nas decisões.

Mas mesmo que exista essa proximidade ideológica, tal não é garante de via verde constitucional, como ficou evidente no período da troika. “Os juízes foram chamados a pronunciar-se sobre situações que estavam no limiar da constitucionalidade” e divergiram do Governo, lembra este constitucionalista. Foi um período de exceção na vida do Tribunal Constitucional.

"De uma maneira geral, o voto [dos juízes conselheiros] reflecte a filiação partidária", de acordo com o estudo sobre o Papel Político do Tribunal Constitucional

O que dizem os números

De acordo com o estudo “Papel político do Tribunal Constitucional”, da autoria da ex-jornalista Ana Catarina Santos (que atualmente trabalha no gabinete do primeiro-ministro), este desalinho dos juízes indicados pelo CDS não é novo. Verificou-se durante o período analisado (1983-2008), com Ana Catarina Santos a concluir que “os juízes do CDS ou próximos desta área política destacam-se (…) por terem votado contra a esmagadora maioria dos pedidos apresentados pelo próprio CDS (65%)”.

Este estudo mostra que há “uma forte ligação” entre “o comportamento dos juízes perante pedidos de fiscalização apresentados ao TC pelo seu partido político ou partido pelo qual nutrem simpatia ou proximidade”.”O voto reflete a filiação partidária”. Uma tendência que se verifica mais no PS, como mostram os dados desta dissertação de mestrado em Ciência Política (ver gráfico). E o estudo destaca mesmo juízes em que esta atuação “sobressai”: “O que mais se destaca neste contexto é António Vitorino que votou 71% das vezes a favor dos pedidos do PS”

Também conclui que os pedidos de fiscalização aumentam quando há maiorias absolutas de um só partido e que os pedidos também aumentam em períodos próximos de eleições: “Ou seja, podemos concluir que o envio de diplomas para apreciação do TC é um instrumento utilizado pelos deputados à Assembleia da República como arma política contra maiorias ou no sentido de vir a obter proveitos políticos para o partido que representam”.

Um ex-juiz conselheiro garante ao Observador que este alinhamento é “normal, não é partidário”. “Uma das razões pela qual a maioria dos juízes é nomeada pela Assembleia da República é por ter de corresponder a uma representatividade social e de quadrantes de pensamento”. Este ex-juiz sublinha até que “há matérias dos partidos em que as decisões são sempre tomadas por unanimidade” e dá como exemplo as contas dos partidos, fiscalizadas anualmente pela Entidade das Contas que funciona sob tutela do TC. Motivo da unanimidade? “Mostrar independência“.

Pedro Lomba afirma que “os juízes são independentes face ao poder político e não estão condicionados. Não são responsáveis perante os partidos e não devem ser responsabilizados” e “o alinhamento político é menor do que se pensa”. Mas “com exceção para os mecanismos de fiscalização preventiva da constitucionalidade, que são sempre mais políticos porque ocorrem quando o procedimento de elaboração das leis ainda não está concluído”. O advogado também assinala a expectativa que estas escolhas criam nos partidos: “Esperam que os candidatos sejam portadores de uma determinada pré-compreensão da Constituição“. Afinal a Lei Fundamental é só uma, mas as interpretações são tantas como as cabeças que passam pelas cadeiras de decisão do Palácio Ratton, onde se instala o Tribunal Constitucional.

Pedro Lomba, no entanto, encontra um padrão. “Os juízes mais à esquerda são mais sensíveis a questões de direitos estatutários do funcionalismo público; os mais à direita são tendencialmente mais próximos da equiparação entre os funcionários públicos e o setor privado“.

Nem sempre é assim, claro. A 14 de agosto de 2014, o Tribunal Constitucional pronunciou-se favoravelmente sobre os cortes salariais na função pública para os anos de 2014 e 2015. O diploma acabou por ser aprovado por 11 dos 13 juízes (uma juíza aprovou parcialmente). Uma larga maioria, rara numa matéria desta natureza, explicável apenas pelo contexto que se vivia. Os próximos tempos dirão se os juízes estarão mais ou menos alinhados com as decisões do atual Executivo.

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