O PAN chega ao Congresso na tentativa de afirmar a unidade interna. Há uma lista única à Comissão Política Nacional do partido, que dirige o PAN, e a mensagem a passar é a de que a tempestade interna que levou à saída de vários membros está ultrapassada, mas nos bastidores há alguns sinais de que se possa estar a viver uma paz podre. André Silva, que está de saída, até já deixou o lugar no Parlamento na bancada junto às restantes deputadas do PAN e tem-se sentado mais afastado nos plenários. Nos Açores e na Madeira fazem-se propostas de Estatutos para tentar a tão desejada autonomia. Recorde-se que as críticas apontadas por Francisco Guerreiro e Cristina Rodrigues — eurodeputado e deputada — frisavam a crescente “centralização de poder” a acontecer no seio do PAN, algo que os estatutos para as regiões autónomas tentam agora contrariar.

Será este Congresso a bonança que o PAN precisa para enfrentar as provas eleitorais que se seguem sem desaparecer de cena? Ou a saída do rosto mais conhecido do partido pode causar um rombo nas intenções do Pessoas-Animais-Natureza? Um quem é quem na versão animada do PAN.

André Silva. O Rei Leão que sai de cena inesperadamente

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Personificou durante muito tempo uma espécie de one man show no partido. Deixa o PAN no pós-congresso com o argumento de se dedicar à vida pessoal e à paternidade. Publicamente diz que “neste momento não vê rigorosamente cenário nenhum que o faça voltar à política”, mas nos bastidores do partido há quem já anteveja um regresso caso se confirme um cenário de perda eleitoral acentuada. Em entrevista, diz que no futuro será possível encontrá-lo a reabilitar a casa dos avós, fazendo jus à formação em engenharia civil e património arquitetónico e histórico, na horta ou a plantar árvores de fruto. Com um filho de oito meses, André Silva passou os últimos sete dos 45 anos de vida à frente do PAN.

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O PAN tarda em apresentar candidatos às autárquicas — onde conquistou alguns mandatos em 2017 — e as sondagens a nível nacional colocam o partido abaixo dos 3% (teve 3,3% nas legislativas de 2019) que lhe valeram quatro deputados na bancada. Há nos bastidores do partido quem veja como inevitável a redução da bancada do PAN e, caso a queda seja grande, há quem esteja confiante que André Silva poderá voltar “para salvar a situação”.

Inês Sousa Real. Simba, em ascensão?

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Líder parlamentar e cara conhecida, especialmente em Lisboa onde controlava a distrital do partido, Inês Sousa Real foi tida como a solução para “sucessão natural” e transição na liderança do PAN. No currículo conta já com vários anos em autarquias, além de Lisboa, foi jurista na Câmara Municipal de Sintra desde 2006 e chefe de divisão e execuções fiscais e contraordenacionais entre 2015 e 2019, o mesmo tempo que André Silva foi deputado único do PAN na Assembleia da República.

Promete um partido “ecocentrista”, mas está longe de poder dormir tranquila sobre a almofada. As ondas de choque da tempestade passada ainda a assombram e sabe que internamente conta com oposição.

Terá a tarefa de encerrar o Congresso, com um discurso, no dia em que assumirá a liderança do PAN e comemorará o 41.º aniversário, mas nem sempre o ambiente será de festa para Sousa Real. A chamada “corrente Norte” mantém-se presente no dia a dia do partido (e aumenta a presença nesta Comissão Política Nacional) e também em Setúbal teve que lidar com alguma resistência. O Observador sabe que a distrital não concorda com a formação da lista para a Comissão Política Nacional e que criou grandes entraves à composição da lista.

Ao longo do mandato, Inês Sousa Real terá que contrabalançar as forças também com Bebiana Cunha, a deputada que conta neste momento com maior apoio da corrente mais tradicional no partido.

Bebiana Cunha. Scar, secundada pela corrente Norte

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Com Inês Sousa Real a assumir o cargo de porta-voz do partido, Bebiana Cunha deverá assumir a liderança da bancada aos 35 anos. Com um forte apoio da “corrente Norte”, a deputada eleita pelo círculo do Porto pode assim conquistar maior protagonismo no partido onde se estreou como voluntária há 10 anos. A futura líder parlamentar do PAN participou desde cedo em projetos de intervenção comunitária, foi dirigente associativa e participou em associações de cariz cultural e social, mas não lhe são conhecidas relações com partidos políticos antes do PAN.

Bebiana Cunha, psicóloga, que se diz “fortemente anti-especista” é — ao mesmo tempo que se apresenta como aliada — a maior ameaça à liderança de Inês Sousa Real que se inicia neste Congresso. Bebiana Cunha conquistou um mandato na Assembleia Municipal do Porto nas autárquicas de 2017, chegou ao Parlamento nas legislativas de 2019 e é tida como uma das pessoas fortes do partido para conseguir ir ao encontro das expectativas nortenhas.

Continuará a contar com a presença do marido, Albano Lemos Pires, na Comissão Política Nacional ele que é também visto como um dos nomes mais fortes do PAN a Norte.

Nelson Silva. O descontraído Timon?

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Não é a estreia das estreias já que Nelson Silva, 35 anos, já substituiu André Silva no hemiciclo durante a licença de paternidade, mas não deixa de ser uma novidade. Fica por saber se terá um estilo tão descontraído como Timon, mas este cineasta de formação, já conta com a experiência autárquica no currículo. É deputado municipal na Assembleia de Odivelas, fez parte da comissão política distrital de Lisboa (que tinha Inês Sousa Real como líder) e foi eleito também comissário político nacional, mas dentro do partido há quem garanta que a causa animal é aquela a que menos dedica atenção. Com conhecimento mais próximo de Inês Sousa Real nas lides distritais pode tornar-se um dos conselheiros no tempo que ainda lhe sobrará de mando.

Fundadores do partido. Sarabi, a mãe

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Se André Silva era até aqui o ‘pai’ do PAN, os fundadores do PAN surgem nesta história ao lado, no papel da mãe que não simpatiza com as escolhas dos filhos. Muito críticos da liderança de André Silva, os fundadores do partido reclamaram uma mudança de rumo em março, pouco tempo antes de o agora líder cessante ter anunciado que iria deixar a liderança do partido e o lugar de deputado. André Silva jurou que a decisão não tinha nada que ver com a dura carta que os fundadores (Pedro Taborda, António Santos e Fernando Leite) tornaram pública, onde pediam o fim da “palhacização” do PAN, mas há quem não acredite em coincidências.

Em março Pedro Taborda, ao Observador, não descartava a hipótese de apresentar uma lista à direção do partido, mas não avançou. De entre os fundadores era o menos crente nas capacidades de Inês Sousa Real para voltar a colocar o PAN na trilha do animalismo. Já António Santos acreditava que uma solução com Bebiana Cunha e Inês Sousa Real seria o suficiente, considerando que ambas já tinham dado provas do trabalho que podiam desenvolver em prol dos animais. Como qualquer mãe, os fundadores do PAN manter-se-ão atentos ao passos do partido que criaram.

Cristina Rodrigues. Shenzi, a hiena

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Cristina Rodrigues passou de chefe de gabinete de André Silva a deputada eleita por Setúbal. As primeiras entrevistas não foram brilhantes e a deputada foi atirada para a ribalta depois de ter assumido desconhecer o programa eleitoral do partido pelo qual era cabeça de lista num dos círculos. Com trabalho de casa acumulado dos quatro anos de experiência nos corredores do Parlamento até pode ter sido aquela que teve a habituação às novas funções mais facilitada, mas a rutura com o partido não tardou. Depois de ver sair o eurodeputado Francisco Guerreiro, Cristina Rodrigues decide por também um ponto final na relação com o PAN e manter-se como deputada não inscrita.

Acusou o partido de tentar silenciá-la e limitar a sua capacidade de trabalho e de não querer compactuar com uma deriva nos princípios do PAN. Do lado do partido recebeu em troca acusações de oportunismo e, mais recentemente enquanto deputada não inscrita, de não apresentar qualquer trabalho ou rasgo diferente.

Aos 35 anos a advogada é uma das vozes mais críticas do atual PAN, acusando a direção de falta de democraticidade. Ainda assim, continua a defender os ideais do partido e colocando a hipótese de ver ex-colegas de bancada sair, não considera um regresso impossível.

Francisco Guerreiro. Ed, a hiena

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Ao contrário de Ed, que na história da Disney nunca foi amigo de ninguém, Francisco Guerreiro até entrou na história como bom amigo de André Silva, mas as desavenças políticas acabaram por ditar o fim da relação partidária e pessoal. Depois de uma campanha eleitoral bem sucedida, o PAN conseguiu conquistar um mandato no Parlamento Europeu. Francisco Guerreiro, o cabeça de lista do partido, comemorou efusivamente secundado por André Silva, mas pouco mais de um ano depois da data da eleição anuncia a saída do partido por “divergências políticas com a direção”.

Licenciado em comunicação social, Francisco Guerreiro trabalhou como project leader e analista de estudos de mercado antes de ter aderido ao PAN em 2012 e se ter dedicado por completo ao partido. À semelhança de Cristina Rodrigues, também ele trabalhou na Assembleia da República durante os quatro anos de mandato de André Silva na condição de deputado único. Antes já tinha sido candidato em 2014 à câmara de Coimbra e em 2017 candidatou-se à câmara de Cascais (onde o partido conseguiu dois mandatos).

Depois de anunciar a desvinculação do partido, manteve o lugar de eurodeputado o que lhe valeu duras críticas e acusações. Um dos motivos da discórdia entre Guerreiro e o PAN, a existência de falsos recibos verdes no partido, já chegou aos bancos de tribunal e o eurodeputado tem sido uma das pessoas ouvidas na condição de testemunha, tal como a esposa Sandra Marques que se desvinculou também do partido na mesma altura que Francisco Guerreiro saiu.

Manuela Gonzaga. Zazu (conselheiro real)

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Manuela Gonzaga volta à vida política ativa como mandatária e membro da CPN de Inês Sousa Real. Com a longa experiência quase dispensa apresentações. Foi jornalista durante mais de 40 anos, é escritora e também historiadora. A idade surge associada à sabedoria e experiência e, por isso, Manuela Gonzaga surge no enredo como Zazu, o conselheiro real. Depois de ter sido comissária política nacional do PAN entre 2013 e 2016, Gonzaga chegou a ser anunciada como candidata apoiada pelo PAN às Presidenciais de 2016, mas não reuniu as assinaturas necessárias para avançar com o processo e saiu da corrida. Em 2021, o PAN decidiu apoiar Ana Gomes.

Volta agora confiante numa “renovação estimulante” a ocorrer no partido e reconhece em Inês Sousa Real “valores de inteligência, integridade e humanidade acima da média”. Para Manuela Gonzaga “é uma questão de sobrevivência” ter em Portugal pessoas como a futura líder do PAN.