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JOÃO SEGURO/OBSERVADOR

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Entrevista ao "sr. Europa" de Macron: "UE lida com o Brexit como se fossem quotas de pesca"

Tem 31 anos, pouca experiência política, mas é "o senhor Europa" de Macron. O sucesso eleitoral, explica Pieyre-Alexandre Anglade, passa por apelar à “inteligência" em vez do "instinto" do eleitorado.

Se lhe pedirem para imaginar o currículo e a experiência do homem que o Presidente francês, Emmanuel Macron, escolheu para ser o seu pivô na Europa, o mais provável é o retrato não coincidir com o de Pieyre-Alexandre Anglade. Com apenas 31 anos de idade, o jovem deputado (e vice-presidente da Comissão de Assuntos Europeus no Parlamento francês) nunca tinha feito parte de um partido, nunca ocupou um cargo político e passa mais tempo em Bruxelas do que em território francês. No entanto, é este o homem a quem o Le Monde chama “O Senhor Europa da ‘Macronia’”.

O sucesso político de Emmanuel Macron explica-se, para o deputado do movimento A República Em Marcha!, pela decisão do agora Presidente de se dirigir ao eleitorado “pelo que ele é” — “ou seja, pessoas inteligentes. Muitas vezes os movimentos políticos tradicionais e, sobretudo, os populistas, só apelam aos instintos das pessoas. Nós fizemos o contrário, nós tentámos apelar à sua inteligência.” A reflexão foi partilhada pelo próprio com o Observador numa passagem por Lisboa, a propósito da sua participação na conferência “Fortalecer a Democracia na Europa”, organizada pela Fundação Gulbenkian.

Anglade cresceu em Paris, estudou História e Assuntos Europeus em Estrasburgo e, à semelhança de tantos outros europeus nascidos em 1986, fez Erasmus — em Glasgow, na Escócia. Aos 30 anos, depois de experiência como assistente parlamentar da eurodeputada Nathalie Griesbeck e como chefe de gabinete de um vice-presidente do Parlamento Europeu (PE), Pavel Teliczka, Anglade abraçou o projeto En Marche e aceitou concorrer ao lugar de deputado pela comunidade de franceses a viver na região do Benelux (Bélgica + Holanda + Luxemburgo). Foi escolhido pelo facto de conhecer bem Bruxelas e os corredores do PE.

"Muitas vezes os movimentos políticos tradicionais e, sobretudo, os populistas, só apelam aos instintos das pessoas. Nós fizemos o contrário, nós tentámos apelar à sua inteligência.”

“Macron tinha uma visão clara do que queria para o país — e para a Europa também. O que é raro em França, porque durante muito tempo só tínhamos umas declarações vagas do Presidente [sobre a Europa] e nunca era nada concreto. Juntei-me ao En Marche por isso. Não esperava ser deputado, isso foi algo que… apareceu a meio do caminho, digamos.” Algo que não esperava acontecer quando muitos meses antes, era ainda Macron ministro da Economia, lhe escreveu encorajando-o a criar o seu próprio movimento e oferecendo-se para participar nele — uma ação ousada, é certo, mas que o fez entrar no radar da equipa mais próxima de Macron, que acabaria para convidá-lo para a corrida no Benelux.

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A aposta revelou-se certeira: Anglade arrebatou o lugar com cerca de 75% dos votos na segunda volta, dando razão aos que lhe apontavam qualidades em Bruxelas. “Por baixo da sua aparência descontraída, ele é agressivo. O seu temperamento é perfeito para o seu percurso político, vai muito provavelmente levar uns murros inicialmente, mas rapidamente vai reagir”, vaticinou um colega do EP em junho de 2017.

As críticas: falta de ação política e desinteresse alemão

Depois de ter impedido a vitória da Frente Nacional de Marine Le Pen nas Presidenciais, o furacão Macron espera agora replicar o feito nas eleições europeias de 2019. Isso mesmo admite Anglade, sem margem para dúvidas. Resta saber de que forma irá o En Marche concorrer ao ato eleitoral de maio, já que não tem atualmente presença no PE: formará a sua própria lista independente ou irá buscar eurodeputados a outros partidos? E, dentro do Parlamento, terá deputados suficientes (25) para criar um grupo político à parte ou juntar-se-á aos liberais do ALDE, a família política ideologicamente mais próxima de si?

Anglade não quer adiantar grandes explicações, limitando-se a assegurar que está a negociar com movimentos “de toda a Europa”, sempre com uma base “reformista, progressista e pró-europeia”. “Seja do centro-direita, do centro-esquerda, dos Verdes, de onde quer que seja. Temos é de ter ambições semelhantes para o continente.” Essas ambições baseiam-se sobretudo nas propostas feitas pelo próprio Macron, plasmadas no seu discurso na Sorbonne, lido em setembro: reforma do euro, reforço da defesa e segurança a nível europeu, respostas comuns a desafios como as crises migratórias e as alterações climáticas.

Anglade no debate promovido na conferência "Fortalecer a democracia na Europa" (JOÃO SEGURO/OBSERVADOR)

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“Durante muito tempo, o centro-direita e o centro-esquerda abandonaram o debate europeu e deixaram-no à mercê dos populistas, ou seja, a extrema-direita e a extrema-esquerda. Aqueles que deviam defender o projeto europeu não o fizeram, portanto é lógico que tivemos o crescimento do populismo e de sentimentos anti-europeus”, diagnostica o deputado. “Nós [no En Marche] temos uma atitude completamente diferente: queremos tomar a iniciativa no debate europeu e explicar porque é que ele é importante. As pessoas percebem que em temas como o terrorismo, as alterações climáticas, o emprego, a resolução da crise de refugiados, o país sozinho não consegue resolvê-los.

A perspetiva otimista do jovem deputado não significa, contudo, que não seja capaz de estender críticas aos próprios dirigentes europeus. Anglade reconhece que os eleitores têm razões de queixa legítimas, sobretudo no que diz respeito ao funcionamento interno de Bruxelas. “Eu digo sempre que não devemos esquecer que tivemos o Brexit neste mandato e o Brexit não é um fenómeno normal: é um grande país a deixar a UE e nós não temos dado uma resposta política suficiente a esta situação. As instituições da UE lidam com o Brexit como se estivessem a lidar com as quotas de pesca do Atlântico Norte. Só damos uma resposta técnica, quando o que é preciso é uma resposta política”, sublinha.

“O centro-direita e o centro-esquerda abandonaram o debate europeu e deixaram-no à mercê dos populistas, ou seja, a extrema-direita e a extrema-esquerda. Aqueles que deviam defender o projeto europeu não o fizeram portanto é lógico que tivemos o crescimento do populismo e de sentimentos anti-europeus.”

Também quando questionado sobre a influência do Governo alemão nas decisões europeias, o batedor de Macron na Europa aponta o dedo a algumas atitudes de Berlim no passado: “Os alemães nos últimos anos têm-se focado muito neles próprios, na sua economia, no sucesso do seu país, e não têm dado tanta atenção ao resto do continente. Mas penso que a situação está a mudar, veja o que aconteceu até há pouco tempo: foi a crise política mais longa no país desde a Segunda Guerra Mundial e tivemos a entrada da AfD no Bundestag…”

Se não houver mudanças, “daqui a cinco anos é o fim do projeto europeu”

Em Paris, o Palácio do Eliseu acompanhou com expectativa as negociações para formar um novo Executivo alemão. “Se ela se aliar ao FDP, sou um homem morto”, terá dito Macron em julho, referindo-se a possíveis negociações de Angela Merkel com os Liberais — que viriam a acontecer na sequência das eleições, juntamente com os Verdes, mas que colapsaram.

O acordo com o SPD, alcançado apenas um dia antes da conversa do Observador com Anglade, é uma notícia positiva para os membros do En Marche: “Penso que Merkel e o novo Governo percebem que, se não tiverem uma visão do que querem para o continente e se não partilharem as benesses que têm alcançado na Alemanha, irão antagonizar cada vez mais outras partes da Europa”, resume o deputado.

Pieyre-Alexandre Anglade tem 31 anos e foi eleito deputado pelo círculo do Benelux com 75% dos votos (JOÃO SEGURO/OBSERVADOR)

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Com este contexto, não é de admirar, defende Pieyre-Alexandre, que os partidos populistas tenham tido ganhos eleitorais tão impressionantes nas últimas eleições europeias — uma situação que pode repetir-se em 2019. “Em 2014, em França, a extrema-direita ganhou a eleição [com 25% dos votos]. A vencedora foi Marine Le Pen e para nós isso não é de todo satisfatório…”, diz. Para impedir que tal se repita, o jovem deputado do En Marche defende que os nomes escolhidos para as listas de eurodeputados devem ser fortes: “O Parlamento Europeu não deve ser a segunda divisão da política francesa”, tem repetido.

O tempo, admite, urge. “Se no próximo mandato não formos capazes de provar aos europeus que esta Europa é capaz de avançar, então em França daqui a cinco anos as pessoas vão dizer ‘se eles não conseguiram, ninguém consegue’ e é o fim do projeto europeu.” Aos 31 anos, Pieyre-Alexandre Anglade, recém-batizado na política e bafejado com 75% dos votos, mantém a sua fé inabalável em Macron: “Há esta nova oportunidade dada pelo Presidente e temos de aproveitá-la, porque não vai haver uma segunda hipótese”. Falta saber se a fé se estende ao resto dos franceses. Ou dos europeus.

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