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KIMMY SIMÕES/OBSERVADOR

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KIMMY SIMÕES/OBSERVADOR

"Pintei móveis", "fartei-me de cozinhar", "o stress baixou muitíssimo". 6 histórias de como o teletrabalho mudou hábitos de vida na pandemia

Da aposta na cozinha e no comércio local à remodelação de casas e à criação de novos hobbies, como aprender a tocar guitarra ou piano, o teletrabalho mudou estilos de vida que vieram para ficar.

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Para alguns o teletrabalho continua, seja a tempo inteiro ou de forma intermitente. Para outros, a vida laboral regressou ao normal possível. Em tempos de pandemia as vidas ajustam-se, com as mudanças de hábitos a surgirem de forma inesperada e a criarem raízes num novo dia a dia. É o caso destas seis histórias, de pessoas que aproveitaram o trabalho em casa para mudar os seus ritmos: comer melhor e fazer exercício, ter mais tempo para descansar e acordar em cima da hora de trabalho ou, então, praticar novos hobbies e até fugir da cidade para viver numa casa comunitária rodeada pela natureza.

“O stress baixou muitíssimo mesmo sabendo que há uma pandemia lá fora”

Durante o período em que esteve em teletrabalho, Mariana Santos acordava frequentemente cinco minutos antes da hora combinada para arrancar mais um dia a partir de casa. Bastava-lhe beber um copo de água, lavar a cara e sentar-se à frente do computador. Os minutos para consultar os emails, e assim perceber que não existiam urgências de maior, eram sucedidos de um pequeno-almoço mais demorado na companhia do namorado. “Os níveis de stress são muito menores, estou mais feliz e levo isso para o trabalho”, comenta numa altura em que o teletrabalho acontece agora de forma alternada, isto é, semana sim, semana não.

A trabalhar há alguns anos em comunicação, Mariana diz que ter trabalhado em casa a partir do momento em que a pandemia mais se sentia no país (e no mundo) a fez perceber o quão cansada andava — em falta estava também a “disponibilidade mental e criativa”. O descanso dos transportes públicos e do carro pesou na hora de fazer o balanço final, incluindo os 80 minutos diários que poupava — o tempo que demora a ir e vir do local de trabalho. “Em poucos dias de descanso em casa tive logo muito mais ideias, coisas que nunca me tinham passado pela cabeça nestes anos de trabalho. Houve menos interrupções”, argumenta, lembrando que antes andava com mais frequência em modo piloto automático, sem tempo ou disponibilidade para grandes reflexões.

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“Estamos sempre apressados. Cheguei à conclusão de que andava a fazer tudo à pressa e de que não preciso de 7 ou 8 horas de trabalho, nem preciso de estar num ambiente pouco saudável, com muita gente e todos os dias. Agora sinto-me muito mais produtiva e a qualidade de trabalho aumentou muitíssimo”, diz, defendendo o teletrabalho em regime parcial. Porque “falar com colegas e debater ideias” presencialmente não deixa de ser importante.

Mariana acordou frequentemente cinco minutos antes da hora combinada para arrancar mais um dia em teletrabalho

KIMMY SIMÕES/OBSERVADOR

Mas as mudanças não ocorreram apenas no que ao trabalho diz respeito e enraizaram-se em pequenos hábitos no dia a dia. “Tenho muito mais tempo para preparar as minhas refeições. Logo aí sei exatamente o que como. Experimentei receitas que nunca tinha feito antes e, agora, faço todas as minhas refeições em casa. Fiz encomendas de sítios que não sabia que existiam”, continua, referindo-se a cervejas artesanais e hambúrgueres vegetarianos que teve oportunidade de descobrir. Mariana vai agora muito menos vezes ao supermercado. Foi, aliás, na fase do teletrabalho que visitou pela primeira vez o Mercado da Amadora, mesmo ao lado de casa. “Só tinha o fim de semana para ir, agora passei a usar a minha hora de almoço para isso.”

O facto de não ter filhos, diz, terá certamente contribuído para que o teletrabalho tenha trazido mudanças boas que ainda hoje consegue pôr em prática e exemplo disso é o facto de ela e o namorado terem começado a fazer exercício físico em casa diariamente. “Acho que estávamos todos a trabalhar demais, eu estava trabalhar demais. Sinto que nunca parei para observar o que estava a fazer. Chegava ao fim de semana de tal maneira cansada que desligava. As cidades são sítios muito stressantes. Os meus níveis de stress baixaram muitíssimo mesmo sabendo que há uma pandemia lá fora. Sou uma privilegiada, a minha casa foi o meu refúgio.”

“Fartei-me de cozinhar. Fiz tudo e mais alguma coisa”

Ana Lourenço, de 36 anos, técnica comercial da TAP, continua em teletrabalho — à hora desta entrevista, uma reunião virtual impossibilita-a de falar, mas o marido, João Luís Pratas, de 38 anos, intercede sem quaisquer problemas. João, engenheiro eletrotécnico, já regressou ao escritório, mas as muitas mudanças que decorreram do período em que esteve em teletrabalho subsistem. “O que mudou logo foi a alimentação. Na quarentena fizemos o plano de todas as refeições para evitar idas ao supermercado. Fartei-me de cozinhar. Fiz tudo e mais alguma coisa. Cozinhava todos os dias.” Ao Observador enumera alguns dos pratos mais elaborados que deu por si a fazer — como arroz de marisco ou galinha no forno — e a fotografar: entretanto, tornou-se numa espécie de “foodie” do Instagram.

Antes da pandemia, João tomava o pequeno-almoço todos os dias no café. Há anos que era assim, e sempre o mesmo pedido: sandes mista ou croissant misto. Desde que ficou “fechado” em casa que prepara essa primeira refeição para a família (tem dois filhos pequenos). Além da “poupança astronómica”, as opções que chegam agora à mesa são bastante mais saudáveis: o pão ficou para segundo plano e a fruta é a estrela da companhia, juntamente com ovos ou panquecas caseiras — e não é raro ir à horta dos pais, que à semelhança dele também moram no Cartaxo, buscar alguns ingredientes para preparar as diferentes refeições do dia. Há também um planeamento maior da comida que é comprada lá para casa, com João a garantir que não tem nada no frigorífico que precise de ir para o lixo à conta de prazos de validade apertados ou ultrapassados.

João passou a fazer o pequeno-almoço todos os dias para a família

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A par da comida, o casal transformou um anexo do quintal que tinha como único propósito servir de espaço para arrumação. Numa primeira fase, conta, o barracão transfigurou-se num “mini apartamento” onde a família chegou a dormir durante a quarentena: “Já que não podíamos sair, criámos uma zona diferente, como se fosse um hotel. As crianças adoraram”. Atualmente é um “espaço de tertúlia”, uma sala de estar para receber os amigos. À mesa para 12 pessoas juntam-se os sofás, a aparelhagem e os quadros decorativos. “Explorámos a casa de maneira diferente”, explica.

Mas há mais: foi preciso vir uma pandemia, diz, para que mergulhasse pela primeira vez no rio Tejo. “Fomos ao rio com os miúdos, fizemos caminhadas nas margens, fizemos piqueniques. Publiquei as fotografias no Instagram e fui bombardeado com perguntas. Descobri sítios, como Porto Muge, onde nunca tinha estado e vivo mesmo aqui ao lado”, comenta. O recém-anunciado gosto pelas viagens junto ao rio levou a família a fazer as malas e ir, aos poucos, descobrindo Portugal. “Também começámos a fazer desporto. Eu e a Ana começámos a correr. Agora, corro uma hora, três vezes por semana.”

“Pintei paredes e móveis, fiz cabeceiras de cama e molduras para espelhos”

Durante 13 anos, Filipa Torres trabalhou como consultora financeira. Há cerca de um ano, ainda antes de ser declarada a pandemia que vai paralisando o mundo, deixou o emprego que tinha para mudar de carreira e seguir o sonho da decoração — um projeto que ainda está numa fase embrionária.

Após um período de confinamento vivido na cidade do Porto, Filipa, o marido e os dois filhos mudaram-se para uma casa de família no Algarve, onde o gosto por decorar resultou na remodelação de divisões. A cozinha foi o alvo de maior intervenção, onde pintou os móveis de madeira antigos e uma parte da parede — fê-lo para surpresa da cunhada e da sogra. Também a sala e os quartos sofreram alterações: “Pintei paredes e móveis, fiz cabeceiras de cama e molduras para espelhos”. Isto ao mesmo tempo que foi professora dos dois filhos, de seis e oito anos. Fez ainda macramé (uma espécie de renda grossa) e peças de artesanato.

Filipa remodelou divisões da casa de praia da família

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“Se não fosse a pandemia, não teríamos tido a possibilidade de passar dois meses no Algarve com os miúdos em telescola, a 600 quilómetros do Porto. Como sou asmática, levei a situação do confinamento muito a sério e foi por isso que estive em casa. Caso contrário, teria passado mais tempo na praia.” Foi ainda o estar em casa e sentada na cozinha a olhar para móveis de que não gostava que a fez mexer-se. O que também mudou, garante, foi a alimentação: “Comecei a comprar mais localmente e coisas mais saudáveis”.

“Todos os dias ensaiávamos durante uma hora”

Íris Carvalho e Pedro Fragateiro, de 32 e 33 anos, não têm filhos, pelo que o teletrabalho, que começou ainda antes da pandemia ser declarada, significou mais esforço do que o habitual. Ao Observador, Íris recorda como houve dias em que esteve ligada ao computador das 7h às 21h. “Comecei a notar que passava muitas horas no PC e isso começou a dar-me cabo da saúde. Andava cansada, com queda de cabelo e cheia de stress. Era levantar e trabalhar. Mal almoçávamos. Parávamos para jantar e eu voltava ao trabalho.”

Ambos a trabalhar na mesma empresa, Íris reconhece que o namorado tem “muito mais capacidade de gestão” em relação às horas de trabalho. Foi também ele que, com o bichinho da música, insistiu na ideia de criar um novo hobbie para combater o excesso de tempo oferecido aos ecrãs lá de casa: comprou uma guitarra e Íris um teclado. “Na altura tínhamos uma regra: todos os dias ensaiávamos durante uma hora.”

Íris e Pedro aprenderam a tocar viola e piano durante o teletrabalho

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“Sacámos umas aplicações para aprender a tocar. Ajudaram imenso, embora seja diferente de ter aulas. Começámos com coisas muito básicas”, diz, recordando temas como “Atirei o pau ao gato” ou o imbatível “Parabéns”. Entretanto, Pedro já consegue tocar coisas mais complexas, extraídas do repertório musical dos AC/DC e dos Pink Floyd. “Neste momento está a aprender as músicas do ‘Feiticeiro de Oz’”. Já Íris, assegura, ainda está na fase “dos Ed Sheeran e dos Robbie Williams da vida”. Ainda não começaram a tocar juntos, mas talvez para o ano façam uma demonstração para os amigos. “Isto é muito caseiro!”, defende-se.

Mas estes novos hobbies não foram os únicos que o casal encontrou para passar melhor o tempo. Puzzles, fazer pão e cozinhar muito mais também fizeram parte da experiência de trabalhar a partir de casa — uma realidade que ainda permanece atual. “Em relação ao piano, as primeiras cinco semanas foram importantes para relaxar e distrair a cabeça. Entretanto mudámos de casa. Continuamos a tocar, mas não uma hora por dia. Fazemos mais exercício. Começámos com caminhadas quando foi possível e mudámos muito a alimentação”, diz, contando que começaram ainda a comer mais opções biológicas e de produção local. “Ambos emagrecemos imenso durante o confinamento.”

“Desligava o PC às 19h e podia apreciar uma mini ou um copo de vinho depois de fazer o jantar”

Sofia Tavares, consultora informática, passou algum tempo em lay-off mas também em teletrabalho. Trabalhar a partir de casa foi uma coisa que sempre quis e que até já tinha comentado com a chefia. “Foi, efetivamente, preciso uma Covid-19 para que o teletrabalho começasse a ser um tema falado abertamente.” A vida voltou mais recentemente a uma velha normalidade, mas entre o início de março e meados de julho Sofia ficou em casa.

Sofia tornou-se uma entusiasta da cozinha

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“Nessa fase o tempo parou! Ninguém tinha pressa porque não havia para onde ir, a não ser ao supermercado. Desligava o PC às 19h e podia apreciar uma mini ou um copo de vinho depois de fazer o jantar”, diz. A viagem de 30 minutos que liga a casa ao escritório deixou de fazer sentido e, de um momento para o outro, já não era preciso acordar de madrugada para preparar a lancheira e “conduzir com pessoas parvas na estrada”. Foi nessa altura que se dedicou entusiasticamente à cozinha. Comprou mais utensílios, incluindo um robot de cozinha para fazer bolos do qual está “fã”. Além disso, “os almoços ao fim de semana eram prolongados para a tarde e havia tempo.”

Apesar de lhe ter custado o não poder sair de casa e a consequente falta de convívio, a fase do teletrabalho deu-lhe “tempo para cozinhar e relaxar”. “De qualquer forma”, continua, “foi uma altura sem filhos. Se tivesse filhos acho que via as coisas de forma diferente.”

“Em vez de estarmos num apartamento estamos numa quinta”

Marina Rodrigues e Ana Romão, de 48 e 37 anos, estão juntas há seis anos. Ambas são “facilitadoras de biodanza” e até há cerca de um mês viviam no centro de Lisboa. Se a fase do confinamento foi “extremamente desafiante”, como contam ao Observador, a qual obrigou a encerrar temporariamente o “espaço terapêutico” onde dão consultas, a do desconfinamento não trouxe melhorias consideráveis: “As pessoas não regressaram ao trabalho, alguns negócios continuavam fechados, viam-se pessoas com máscaras e com medo”, conta Marina. Foi esse confronto com uma realidade não muito desejada que as fez deixar Lisboa. “Vem aí o inverno e não dá para viver assim”, pensaram. Depois de alguma reflexão, o casal decidiu mudar-se para uma casa comunitária, algures “entre Malveira e Mafra”.

“Já conhecíamos a casa comunitária porque já tínhamos feito um encontro de biodanza com o nosso grupo. Era um espaço vocacionado para receber eventos, retiros, formações e workshops em regime residencial. Durante a pandemia foi reformulado para um  projeto de ‘cohousing’”, explicam. Atualmente, 11 pessoas vivem debaixo do teto de uma mesma casa com cerca de mil metros quadrados. Há espaço mais do que suficiente para todos, além da zona exterior cujos hectares são tantos que nem Marina nem Ana conseguem precisar. “A quinta é muito grande!”

Marina e Ana mudaram-se para uma casa comunitária algures entre a Malveira e Mafra

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“Mudámo-nos há precisamente um mês. Não estávamos habituadas ao conceito, é tudo novo”, comentam. A vida mudou muito desde então. Há mais qualidade de vida, dizem, e mais tempo para desfrutar da natureza, apesar de irem a Lisboa três a quatro vezes por semana por motivos profissionais. Ainda que esta seja uma casa onde vivem diferentes pessoas e famílias, não está organizada de forma comunitária, com as sinergias entre os inquilinos e a acontecerem espontaneamente. Aos espaços individuais há outros comuns “usados de forma intuitiva”. Acontece “uma ou duas vezes por mês fazermos um jantar todos juntos”, acrescenta o casal, que fala em “boa vizinhança” ao invés de “comunidade”.

Até quando vão ficar nesta casa não sabem responder. “Enquanto estivermos bem vamos ficar aqui”, dizem Marina e Ana. “Em vez de estarmos num apartamento estamos numa quinta.”

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