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PAULO CUNHA/LUSA

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Poluição no Tejo. Inquérito tem 5 arguidos, mas ainda não há culpados para pagar os 2 milhões da limpeza

Há 3 anos, o Tejo encheu-se de espuma. Governo apontou o dedo a celuloses. Pagou a remoção das lamas, mas queria reembolso da fatura de 2 milhões. Inquérito tem 5 arguidos, mas ainda não há culpados.

Em janeiro de 2018, com o país a viver um inverno sem chuva depois de vários meses de seca, as imagens da espuma acumulada levaram para o topo da atualidade os episódios, recorrentes, de poluição no rio Tejo. Foram abertas investigações — da Inspeção-Geral e do Ministério Público — e os responsáveis públicos foram chamados ao Parlamento. As unidades suspeitas foram obrigadas a reduzir as descargas, mas isso não foi suficiente, As autoridades ambientais avançaram com mega-operação de limpeza que durante semanas retirou milhares de toneladas de material orgânico, assumindo o custo de despoluir o rio, mas com a intenção de enviar a fatura para o/os responsáveis.

Três anos depois, ainda não se sabe se houve um crime ambiental no Tejo, a investigação criminal ainda decorre, há cinco arguidos, mas não há culpados. Mais mediático, este é um dos muitos casos que se verificam no ambiente onde o grau de julgamentos e condenações por crimes é residual.

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O Governo não tem a quem imputar o custo de dois milhões de euros que foi pago com verbas do Fundo Ambiental. O Ministério do Ambiente diz ao Observador que depende do resultado da investigação judicial aberta em fevereiro de 2018.

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Se a seca trouxe à superfície os impactos que as descargas das indústrias locais, celuloses mas não só, foram provocando ao longo dos anos casos de poluição que foram denunciados, e até investigados pelas autoridades ambientais, sem que se conheçam os resultados ou consequências. Segundo o Ministério do Ambiente, desde 2016 houve 12 processos de contraordenação, dos quais 10 tiveram como alvo a Celtejo, a empresa que estava no centro das suspeitas. Destes, oito ainda se encontram em fase de instrução. Dois resultaram em sanção e estão a ser  impugnados em Tribunal, sem que tenha sido revelado o valor das coimas aplicadas.

Em 2018 os responsáveis políticos e ambientais foram rápidos a apontar o dedo à indústria da celulose e, em particular, à fábrica da Celtejo que opera em Vila Velha de Ródão pelo episódio. Ainda que não se pudesse afirmar que tinha havido crime ambiental — nem na altura, nem agora — para João Pedro Matos Fernandes a Celtejo “contribui com uma grande percentagem. No limite, até pode ser a única responsável pelo acumular daqueles sedimentos ao longo do tempo”.

Aspeto do rio no Inverno de 2018

PAULO CUNHA/LUSA

Segundo a informação então divulgada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e pela Inspeção-Geral ambiental, a acumulação da matéria orgânica no leito do rio foi o resultado de descargas realizadas ao longo de vários anos pela indústria das celuloses, combinadas com a falta de água no rio, e uma inércia das autoridades ambientais em atuarem — seja assegurando que a empresa cumpria as regras para fazer essas descargas, seja ajustando o nível das mesmas ao caudal no rio, o que veio a ser definido em legislação aprovada nos meses seguintes.

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Após os primeiros alertas de espuma no rio, a IGAMAOT (Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território ) identificou os potenciais suspeitos: três ETAR (estações de tratamento de águas residuais) urbanas (Mação, Vila Velha de Ródão e Abrantes) e três unidades industriais — Celtejo, Navigator e Paper Prime, que foram alvo de inspeções. Em apenas uma delas, a ETAR de Abrantes, foram detetados incumprimentos em relação aos níveis de carência bioquímica e química de oxigénio e de sólidos suspensos totais.

O Inspetor-Geral, Nuno Banza, desvalorizou o seu impacto, uma vez que a ETAR de Abrantes — autarquia liderada então pela atual ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes — contribuía apenas com 5% da carga orgânica despejada no Tejo. Apesar de ser “tecnicamente muito improvável” que este incumprimento tivesse capacidade para gerar aquele episódio, foi aberto um processo de contraordenação.

A Agência Portuguesa do Ambiente confirmou entretanto que o resultado das análises feitas às águas do Tejo apontava na direção da indústria da celulose. E uma empresa em particular foi visada. A Celtejo do grupo Altri localizada em Vila Velha de Ródão, que, segundo as autoridades seria a responsável por 90% das descargas de matéria orgânica feitas neste local do Tejo e com origem nas indústrias de celuloses.

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A empresa descartou a responsabilidade por uma descarga ilegal capaz de produzir a tal espuma no rio Tejo e chamou jornalistas para conhecer a nova ETAR (Estação de Tratamento de Águas Residuais), recusando ser transformada num “bode expiatório” de  um problema que não estava apenas em Vila Velha de Rodão.

A situação no Tejo provocou vários protestos locais

António José/LUSA

A Celtejo reclamou também a divulgação das análises realizadas pela APA, o que nunca chegou a acontecer. A informação consta da denúncia feita pelo Ministério do Ambiente ao Ministério Público e está sujeita ao segredo de justiça. Isto apesar de a Procuradoria ter afirmado em fevereiro de que 2018 que, “atendendo à relevância pública da matéria objeto do inquérito, serão prestados esclarecimentos, ao abrigo do art.º 86.º, n.º 13, alínea b) do Código de Processo Penal quando, acauteladas as exigências da investigação criminal, os elementos constantes do processo estiverem consolidados e sejam comprovadamente fiáveis”.

A atuação da autoridade ambiental, no mínimo tardia, também foi questionada no Parlamento.

Em 2016 durante a revisão da licença da Celtejo, a Agência Portuguesa do Ambiente reviu em alta o limite para um indicador que a empresa não conseguia cumprir a pedido da própria. A carência bioquímica de oxigénio (CBO), serve de medida aproximada da quantidade de matéria orgânica degradável. Em 2015, os valores médios anuais de emissão da empresa — 2,5 quilogramas por tonelada de matéria seca ao ar (kg/tSA) — mais do que duplicaram os valores limite de emissão — 0,9 kg/tSA. A empresa comprometeu-se a construir uma nova ETARI para o tratamento de águas residuais de forma a cumprir os limites mais exigentes. Esta unidade já estaria a funcionar quando o problema que estava escondido no fundo do rio veio ao de cima, por causa da seca.

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O Estado avançou com a remoção das lamas, uma operação que durou várias semanas, e cujo custo foi assumido pelo Fundo Ambiental. Na altura, o Ministério do Ambiente e o presidente da APA (Agência Portuguesa do Ambiente), Nuno Lacasta, afirmaram que seria pedido o ressarcimento da verba se e quando fossem apurados culpados.

Numa resposta ao Observador, fonte oficial do Ministério do Ambiente lembra que foi apresentada uma queixa ao Ministério Público e que é “ao poder judicial, aos tribunais, que compete apurar qual ou quais os eventuais responsáveis pelos factos ocorridos, passo prévio e imprescindível para que o Fundo Ambiental possa saber a quem pedir o reembolso dos custos em que incorreu com a operação de limpeza do rio”. A operação de remoção e transferência das lamas acabou por custar dois milhões de euros ao Fundo Ambiental, incluindo o transporte e deposição em aterro, segundo dados avançados ao Observador pelo Ministério do Ambiente.

Fonte oficial do Ministério Público revelou apenas ao Observador que existem cinco arguidos constituídos neste processo — sem os identificar — que se encontra ainda em investigação. E mais não revelou por causa do segredo de justiça. O Observador remeteu vários pedidos de esclarecimento à Celtejo que não respondeu em tempo útil.

O que aconteceu às mais de duas mil toneladas de lamas

A licença de descargas da Celtejo foi reduzida para metade, logo em janeiro, mas isso não foi suficiente para repor os níveis de qualidade na água dada a situação causada pela seca. Decidiu-se por isso avançar com a remoção dos sedimentos depositados na proximidade e a jusante do emissário dos efluentes das indústrias de pasta a papel, como condição para autorizar a retoma das descargas, sujeita à monitorização da qualidade da água.

A iniciativa de emergência que foi executada e paga pelo Estado acabou por permitir à Celtejo retomar o nível de produção e descargas, que não seria compatível com o estado de poluição e o nível de caudal do rio que não permitia uma regeneração natural.

Local onde estão a ser depositados os resíduos provenientes dos trabalhos de limpeza do Rio Tejo

As bacias de retenção onde ficaram temporariamente depositadas as lamas

ANTÓNIO JOSÉ/LUSA

As operações de remoção começaram em junho de 2018, depois de ter sido identificada a existência de 30.000 metros cúbicos de lamas no troço do Tejo ente Vila Velha de Ródão e Belver. Algumas destas lamas tinham até dois metros de altura e elevados teores de matéria orgânica que eram uma fonte significativa de consumo de oxigénio na coluna de água. Esta quadro explicava a degradação da qualidade da água e as situações de anoxia (falta de oxigénio) verificadas, e que provocaram a morte de peixes. Não obstante, não foram detetadas substâncias perigosas, como metais pesados e pesticidas e os resíduos foram classificados como não perigosos.

As lamas foram instaladas numa bacia de retenção, protegida por telas impermeabilizantes, numa antigo areeiro cuja localização numa área protegida suscitou o protesto de associações ambientais. A Zero chegou a colocar uma providência cautelar para travar a operação, exigindo a realização de uma avaliação de impacto ambiental.

Segundo explicou ao Observador fonte oficial do Ministério do Ambiente, as lamas desidradatas, após um período de secagem em que estiveram contidas em sacos filtrantes foram retiradas, através de meios mecânicos (retroescavadora/giratória), e transportadas para destino final adequado, em camiões com reboque estanque, mediante recurso a operador licenciado para o efeito. As 2576 toneladas de lamas foram transportadas entre 2 e 12 de outubro de 2018. As lamas foram encaminhadas para as instalações da Terra Fértil, na Carregueira — Chamusca, onde foram objeto de compostagem.

O rio Tejo tem continuado a ser palco de situações pontuais de poluição, mais associadas a períodos de seca e até a descargas vindas de Espanha, mas sem atingir a gravidade da vivida em 2018.

Numa resposta dada ao PAN (Partido Pessoas Animais e Natureza) no ano passado, o Ministério do Ambiente refere que tem vindo a ser efetuada uma monitorização mensal de 11 estações que avaliam os níveis de vários indicadores sobre a qualidade das águas. Essa avaliação inclui os reportes da Celtejo sobre os resultados aos efluentes tratados na respetiva ETAR, bem como junto a pontos de descarga na albufeira do Fratel, no concelho de Nisa, e os resultados da sondas instaladas pela própria Agência Portuguesa do Ambiente.

O Ministério acrescenta que foram realizadas três ações de fiscalização na primeira metade de 2020, com recolha pontual de amostras do efluente, tendo-se verificado que este cumpria as condições da licença de rejeição de águas residuais em vigor. E sublinha que não foi identificada qualquer ocorrência de descarga ilegal nas várias deslocações efetuadas, com a empresa a cumprir as condições de descarga que foram revistas após o episódio de 2018.

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