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Duarte Drago

Duarte Drago

Reportagem. Nuno Melo na estrada a pedir que o CDS se dê novamente "ao respeito"

Em contarrelógio, Melo aposta tudo na volta ao país democrata-cristão. Em Faro, criticou a passividade face ao Chega e os que dão a derrota como dado adquirido. "Os militantes não são carneiros".

Faltam três minutos para as onze da manhã e não há sinal de Nuno Melo. Na esplanada do La Escala, na Rua do Bocage, em Faro, Mónica Guedes Ferreira, líder da distrital do CDS/Faro, conversa com meia dúzia de militantes, defronte para a sede do partido, entalada entre o edíficio do Inatel e o Faro Boutique Hotel. Lá em cima, no segundo andar do número 64, as persianas ainda estão por abrir. A dirigente revelaria mais tarde que há mais de um ano que não entrava naquele espaço, hoje mais um pousio para ocupar os tempos livres da JP do que uma sede partidária.

Entrando, não seria difícil de adivinhar a ausência de um inquilino zeloso: caixas de cartão por todo o lado, esfregonas e vassouras, parafernália de campanha esquecida e amontoada, um televisor algures dos anos 90, o retrato de um jovem Paulo Portas logo à entrada, o cheiro típico de uma casa há muito fechada. “Mantenham as portas abertas“, pede Mónica Guedes Ferreira, algo embaraçada.

No que seria originalmente uma sala com marquise, uma secretária e não mais do que 20 cadeiras iam servindo os militantes algarvios que esperam pacientemente Melo. Há lamentos sobre o estado do partido, fala-se do Chega e do PSD, mas também sobre a falta de contacto com a direção e de um rumo evidente para o partido. Pormenor: não há um único retrato de Francisco Rodrigues dos Santos nas paredes brancas. Dois anos depois de ter sido eleito líder do CDS, “ainda não enviou sequer uma fotografia”, queixar-se-iam mais tarde os presentes. É o único que não enfeita a sede.

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Trinta e sete minutos depois da hora marcada, Nuno Melo chega finalmente. Na noite anterior, o eurodeputado tinha estado na Escola de Quadros do CDS, em Portimão. Faro é a primeira paragem de um fim de semana preenchido: depois do Algarve, Melo vai seguir para Setúbal e, mais tarde, Lisboa; no domingo, continua a viagem para as Caldas da Rainha e Coimbra. É um homem com uma missão: fazer em menos de trinta dias aquilo que Francisco Rodrigues dos Santos fez nos últimos meses de contacto com estruturas locais do partido e militantes.

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Assim que chega, fato cinzento escuro e sapato de fivela preto, Melo faz sinal aos jornalistas. Quer que o encontro seja à porta fechada, longe do olhar indiscreto da comunicação social. Depois de algumas negociações, acaba por ceder e permitir que os jornalistas se juntem mais tarde — bem mais tarde, quase uma hora e meia depois, período presumivelmente passado a tentar convencer o CDS/Faro a juntar-se à causa sem as amarras de um discurso mais polido adaptado para consumo externo.

No regresso, já o blazer tinha desaparecido. Melo está de mangas arregaçadas a justificar a sua candidatura à liderança do CDS. A linha orientadora pode ser resumida em duas ideias: devolver o partido às origens (uma casa de várias sensibilidades, liberais, conservadores e democratas-cristãso, profundamente programático, com ideias e mensagens claras); e autossuficiente, capaz de combater o seu adversário ideológico (a esquerda), mas também os seus adversários políticos (PSD, IL e, sobretudo, Chega).

Tal como fizera horas antes em Portimão, o eurodeputado fala dos riscos de “definhamento” do partido e da “conjuntura extraordinária” em que se encontra o CDS, com dois novos adversários à direita e uma dependência excessiva face ao PSD. Só é possível inverter o atual estado de coisas, diz Melo, se o CDS vencer a “batalha da credibilidade”, arrastando para o centro do partido figuras reconhecidas pela sociedade; e se for capaz de trazer “ideias concretas” e “marcas distintivas” que façam com as pessoas saibam o que verdadeiramente defende o CDS.

“Eu não gosto nada do Chega, mas as pessoas sabem o que o Chega quer. A Iniciativa Liberal é um produto extraordinário de marketing político. Se perguntarem na rua uma ideia concreta que nos marque e nos distinga dos outros não encontram. Não encontram, não encontram”, lamenta Melo. Os militantes ali presentes acenam em concordância.

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“O CDS tem de se dar ao respeito”

É preciso devolver uma identidade a um partido que já teve várias tonalidades, a grande maioria sob a liderança (ou, pelo menos, a inspiração) do mesmo homem: Paulo Portas. Assumido herdeiro do portismo, Nuno Melo recorda as várias bandeiras da história recente do CDS, que, tal como as que estão guardadas nas caixas de cartão da sede de Faro, foram encaixotadas algures no tempo.

O candidato lembra Portas e o CDS como “partido dos contribuintes”. Fala dos agricultores e de como o partido nunca foi uma coisa de elites. Recorda a preocupação com os reformados e pensionistas, uma das feridas mais dolorosas provocadas pelos tempos da troika. Não esquece como o CDS foi sempre o partido contra a insegurança e pelos polícias, tema que, como os restantes, deixou cair para mãos alheias. Lamenta a falta de comparência da atual direção e, em alguns casos, a passividade deste novo CDS.

Passividade que, argumenta Melo, vai para lá da falta de participação no debate de ideias. “Se vamos tentar fazer de conta que o elefante não está na sala, se vamos fazer de conta que o Ventura e o Chega não existem, se de cada vez que apoucam o nosso líder, chamando ao presidente do partido ‘Chiquinho‘ ou ‘menino‘, nós ficamos calados, claro que eles se vão sobrepor. Temos de chamar os temas e fazer combate político”, insiste Melo.

É o mais longe que Melo vai nas críticas a Rodrigues dos Santos. Pelo menos, à porta aberta. Não deixa de ser, no entanto, uma forma pouco subtil de sugerir que Rodrigues dos Santos é incapaz de se afirmar perante Ventura. Mesmo desafiado a concretizar a ideia, o candidato nunca vai para lá do que se intui. O subtexto é suficiente para passar a mensagem que quer passar aos militantes.

“O CDS é um partido fundador da democracia. Tem de se dar ao respeito. Quando André Ventura trata o líder do CDS por ‘Chiquinho’ ou ‘menino’ não está apenas a insultar uma pessoa. Está a insultar o partido”, repete, agora já voltado para os jornalistas.

Ora, e o que faria Melo perante os ataques constantes de André Ventura? “Reagiria. Como reagirei. Mas direi o que tenho a dizer não com a mesma bitola. Direi com educação e pedagogia, quem sabe o consiga levar para o caminho certo”, ironiza.

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“Militantes não são carneiros pastoreados”

Antes, Melo já tinha deixado a garantia da praxe de que com ele como líder do CDS a prioridade vai ser “agregar” e aproveitar os melhores quadros do partido, venham eles da sensibilidade que vierem, das “trincheiras” de uns e de outros.

“[O Francisco Rodrigues dos Santos] pode dizer muitas vezes que eu sou a televisão a preto e branco, o que eu quero é ser um rosto do partido que seja interclassista e intergeracional. Não sei se sou a preto e branco ou cores; é verdade que sou do tempo do analógico, mas felizmente adaptei-me ao digital. Quero ser a pessoa a meio do meu percurso de vida que consegue trazer os mais novos e agregar os mais velhos.”

Apesar de todos os apelos para que o próximo congresso não venha a ser uma “batalha campal”, Melo está consciente de que parte atrás na corrida e de que o duelo vai ser duro. De resto, não deixa de se queixar da estratégia de condicionamento da atual liderança e da falta de tempo que lhe foi dado para fazer campanha junto das estruturas do partido. Não será isso, garante, a desarmá-lo: nos próximos dias e semanas, até às eleições agendadas para 27 de novembro, Melo vai, mesmo assim, dar a volta (possível) ao país.

Até lá, e apesar do aparente favoritismo de Rodrigues dos Santos junto das estruturas, Melo não deixará de insistir na tecla: os militantes são os únicos verdadeiros donos do destino do CDS. “Não se devem levar congressistas para uma reunião magna como se fossem carneiros pastoreados com uma orientação que no final diz ‘É tudo para ali’. Isso é a perversão da democracia”, diz ao militantes algarvios. Ouve-se um tímido rugido de aprovação.

No final de tudo, se o partido decidir revalidar a liderança de Francisco Rodrigues dos Santos, a escolha será respeitada e cada um vai à sua vida. “Amigos como dantes”, despede-se Melo. Falta cerca de um mês para o duelo decisivo entre os dois.

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