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Richard Heathcote/Getty Images for BEGOC

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Telma Monteiro: "O mais importante é a coragem ter prevalecido sobre o receio"

Foi convencida a ir para o judo pela irmã, com quem andava à "porrada" por causa de Van Damme. Suspirava por Michael Jordan e aprendeu a não desistir. O Observador entrevistou Telma Monteiro.

Telma Monteiro ganhou a medalha de bronze no Rio de Janeiro e, por isso, promete mais uma tatuagem. Para ali chegar foram precisos outros três Jogos Olímpicos, muitos combates, aprendizagens a ver Van Damme e bulha com a irmã Ana. Viveu no bairro, aprendeu a não parar. Não vale desistir. Foi para o judo com 14 anos.

O Michael Jordan da sua infância — é assim que chama aos heróis do desporto no seu livro “Na vida com garra” — era precisamente Michael Jordan. Jogou futebol, mas nem se lembra bem da posição. Pendurou as botas cedo. É fascinada pelo Japão, onde já esteve mais de 15 vezes, e quer montar a sua escola de judo. A atleta pisca até o olho à carreira de treinadora. O Observador entrevistou a judoca lisboeta no Navio Escola Sagres, que está atracado no Rio de Janeiro, bem perto da Baía Mauá.

Para quem gritou o “eu vim para ficar”?
(Risos) Estava a gritar para os meus amigos que estão aqui, para a minha irmã, para o meu treinador, para os meus colegas de equipa que estavam lá a apoiar. E para todas as pessoas que estavam a ver. Era momento de dizer: “Ainda não acabou, estou aqui, ainda tenho hipóteses de ir buscar a medalha, não vou desistir”.

Escreveu no livro “Na vida com Garra” que o bairro é liberdade. O que deu o bairro à Telma?
Deu-me a capacidade de ser resiliente. Perseverante. De nunca desistir e enfrentar as dificuldades com algum humor. O humor é uma ferramenta importante, para sabermos rir de nós próprios e das situações. Principalmente isso, a capacidade de não desistir e lutar. De ter coragem acima do receio. Foi isso que aconteceu: passou-me pela cabeça que as coisas podiam não correr bem e acho que isso é ser humano. O mais importante é a coragem ter prevalecido sobre o receio.

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RIO DE JANEIRO, BRAZIL - AUGUST 08: Telma Monteiro of Portugal celebrates after defeating Automne Pavia of France in the Women's -57 kg Repechage contest on Day 3 of the Rio 2016 Olympic Games at Carioca Arena 2 on August 8, 2016 in Rio de Janeiro, Brazil. (Photo by David Ramos/Getty Images)

“Eu vim para ficar” (Photo by David Ramos/Getty Images)

Lutava com a sua irmã Ana por causa dos filmes do Van Damme. Quer explicar?
(Risos) Aquilo não corria muito bem. Nós víamos sempre os filmes do Van Damme. E lembro-me de estarmos muitas vezes sentadas no sofá e começava uma a empurrar um pé, a outra a empurrar outro pé… Depois levantávamo-nos e acabávamos sempre a andar à porrada (risos). Acho que queríamos ser um bocadinho o Jean-Claude Van Damme.

E quem ganhava?
Às vezes levei, outras vezes ganhei (sai mais uma risota)…

A sua irmã Ana levou-a para o judo. Que peso tem ela na sua vida?
A minha irmã é uma das minhas melhores amigas, tal como a minha irmã Rute. Somos três irmãs e um irmão, mas, como somos mais velhas, somos muito unidas. Não temos segredos, temos muito à vontade umas com as outras. Sempre partilhámos tudo. A minha irmã é a minha fã número 1.

"Nós víamos sempre os filmes do Van Damme. E lembro-me de eu e a minha irmã estarmos muitas vezes sentadas no sofá e começava uma a empurrar um pé, a outra a empurrar outro pé... Depois levantávamo-nos e acabávamos sempre a andar à porrada (risos). Acho que queríamos ser um bocadinho o Jean-Claude Van Damme"
Telma Monteiro

Quem era o Michael Jordan da infância da Telma?
Tinha vários. Na altura era mesmo o Michael Jordan, a Marion Jones, havia muitos atletas que eu gostava. Mas era o Michael Jordan, por isso é que ia para a rua imitar os afundanços dele. Ainda hoje tive a possibilidade de tirar uma fotografia com um atleta que eu gostava muito, o Maurice Green. Gostava da maneira como ele celebrava quando ganhava os 100 metros. O Luís Figo também, na altura em que jogava futebol. Hoje em dia as crianças têm o Ronaldo, que é outra dimensão. Mas tive muitas figuras para me inspirar.

Jogava em que posição no futebol?
Eu não sei bem, acho que jogava a ponta-de-lança…

“Não sei bem”…
(Gargalhada tímida) Mas não tinha muito sucesso. E depois punham-me a lateral. Mas quando jogava nos torneios da minha idade conseguia jogar bem e marcar golos, mas o facto é que, com 12, 13 anos, jogava com miúdas de 18, 19. E aí era impossível afirmar-me. E ainda bem!, senão não tinha vindo para o judo.

RIO DE JANEIRO, BRAZIL - AUGUST 08: Bronze medalist Telma Monteiro celebrates on the podium after the Women's -57 kg Judo Contest on Day 3 of the Rio 2016 Olympic Games at Carioca Arena 2 on August 8, 2016 in Rio de Janeiro, Brazil. (Photo by David Ramos/Getty Images)

(Photo by David Ramos/Getty Images)

No livro diz que quando diz nunca é nunca mesmo. Já houve algum “nunca” que deu em arrependimento?
(olha para cima, para o nada) Já me arrependi de alguns, mas foi quando era jovem. Agora, com mais maturidade, quando digo nunca, é por ser um nunca muito bem refletido. Por isso é que o meu nunca é nunca mais. É uma decisão bem pensada. Já me arrependi de alguns quando era adolescente…

Exemplo?
Como deixar de falar com algumas amigas minhas por coisas parvas (responde, entre risos desconfortáveis). Tinha 12, 13 anos. Agora é irrelevante.

Foi para o judo porque a Ana a convenceu, mas a história de poder viajar era a grande motivação. Como imaginava o estrangeiro, o que queria ver?
Não sei. Precisamente por não ter a capacidade de imaginar, queria saber como era. Agora temos grandes comunidades estrangeiras em Portugal, antes não havia assim tanto. Tinha curiosidade em saber como eram as outras pessoas, como viviam. E queria conhecer, queria saber como eram os outros países. Sempre fiquei muito fascinada por isso. Quando eu não ia com a seleção e ficava em casa, telefonávamos umas às outras e elas contavam-me tudo. Queria estar lá, não queria esperar que me contassem. Queria ver com os meus olhos.

Curiosidade por algum destino em especial?
A Ásia, especialmente Japão e China. Já tive essa oportunidade. O Japão, pronto, é o país que adoro, onde tenho muito boas recordações. Hei-de lá voltar sempre, mesmo quando deixar de fazer judo. Treinei lá muito, já fui lá mais de 15 vezes, talvez. Sempre que vou, vou sempre duas, três semanas. Já estive cinco semanas, por isso se fizermos as contas já dá uns bons meses. Tenho pessoas lá que gosto muito. É um país onde, a treinar, cresci muito. Lá também tinha adversários muito fortes, como a [Kaori] Matsumoto, que ficou aqui em terceiro e foi campeã olímpica em Londres. Acabei por crescer com as minhas adversárias.

"O que me desencanta são as pessoas e as atitudes delas. Às vezes fujo da realidade e tenho a mania de viver no mundo da fantasia, onde as pessoas fazem sempre as coisas com boas intenções. Às vezes não acontece"

Há cinco anos tatuou o braço depois de perder uma final contra Matsumoto. Haverá nova tatuagem?
Sim… (mostra tatuagem dos anéis olímpicos no antebraço) Esta fiz porque estava sempre a questionar o facto de nunca ter tirado a medalha nos Jogos e acabava por não valorizar tudo o que já tinha ganho. Os Mundiais, os Europeus, o facto de ser número 1 do mundo várias vezes. Chegou um dia que disse: eu tenho de valorizar tudo e já fui a três Jogos Olímpicos, por isso isto tem de representar tudo o que já conquistei. Em 2013 decidi fazer esta tatuagem, que servia para dizer do género “pára de pensar nisso, já ganhaste muito! Agora vamos ver o que está para a frente”. Fiz a tatuagem e aceitei tudo o que tinha ganho. Agora posso completá-la: vou meter a data por baixo — 08/08/2016

Quando se desencanta com a paixão — talvez não tenha acontecido com o judo –, como é que se recupera o feeling?
O judo nunca me desencantou. O que me desencanta são as pessoas e as atitudes delas. Às vezes fujo da realidade e tenho a mania de viver no mundo da fantasia, onde as pessoas fazem sempre as coisas com boas intenções. Às vezes não acontece. Quando as coisas não correm bem em competições, fico chateada. Mas o que me dá motivação é perceber que estamos cá para fazer a diferença, para mudar as coisas. Nem tudo está errado. O que me permite sair desse desalento é ter esperança naquilo que ainda se pode fazer e nas pessoas que querem fazer bem.

Rio2016: Judo: Telma Monteiro

Qual foi o último grande conselho que lhe deram?
Acho que, tendo em conta que estamos aqui nos Jogos Olímpicos, foi muita gente a dizer-me: “Luta por ti, não lutes por mais ninguém. As pessoas querem que tu ganhes, mas tens de ganhar primeiro por ti!”. Foi muito importante.

O que vai fazer a Telma Monteiro depois do judo?
Gostava de ficar ligada ao desporto, especialmente ao judo. Quero ter uma escola de judo. De certa forma, desafiar-me a mim própria a ter um papel em que posso contribuir para melhorar o desporto. É uma grande responsabilidade. Temos de procurar soluções. Se tiver ferramentas no futuro, às vezes não basta a notoriedade, gostava de fazer isso. Quero contribuir para que outros tenham a oportunidade que eu tive. Não quero que a minha medalha seja uma exceção ou que daqui a 16 anos estejamos a falar na medalha que a Telma Monteiro conquistou. Quero que voltemos a conquistar medalhas o mais rápido possível.

Vê-se como treinadora?
Também, porque não? Acho que tenho muito para ensinar…

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