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KIMMY SIMÕES/OBSERVADOR

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Tim Hilpert, CEO no OLX: "Os portugueses adaptam-se muito lentamente à tecnologia"

Gere 13 marcas do grupo OLX em 37 países a partir do hub tecnológico de Lisboa, onde emprega 250 pessoas. Para Tim Hilpert, o mais difícil é atrair seniores para cargos de liderança em Portugal.

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Concorda que Lisboa “está a evoluir bem” para se tornar num dos epicentros tecnológicos da Europa, mas não o faz sem lembrar o quão devagar os portugueses se adaptam à tecnologia. “É uma das razões pelas quais estou a desafiar a equipa a crescer e a visitar outros sítios. E é também por isso que quero mais talento internacional no escritório”, afirmou Tim Hilpert, CEO do OLX Markets em entrevista ao Observador. Do hub tecnológico onde emprega 250 pessoas — e que nasceu em 2015 –, no Saldanha, desde outubro de 2018 que Hilpert lidera a unidade de negócio dentro do grupo OLX que gere 13 das suas marcas em 37 países. Antes, liderou o negócio europeu, tendo sido responsável pelos negócios do grupo na Europa e na Ásia Central.

A morar em Lisboa há dois anos, Hilpert explica que este ano — à semelhança dos anos anteriores — quer contratar entre 30 a 50 pessoas para o escritório da empresa em Portugal, bem como para o hub tecnológico que lidera e onde são criados e desenvolvidos todos os portais verticais de imobiliário e do setor automóvel para a Europa. Presente em mais de 40 países com mais de 35 escritórios, 17 marcas, o grupo OLX emprega mais de 5.000 colaboradores. “O negócio português é muito lucrativo para nós”, disse. Mas a ligação internacional do grupo a Portugal não é de agora. Começou em 2012, com Miguel Mascarenhas, quando a multinacional Naspers comprou a startup portuguesa FixeAds, que detinha, entre outros, o negócio da OLX em Portugal bem como a marca Standvirtual e Imovirtual. Atualmente, Miguel Mascarenhas é responsável tecnológico pelo negócio de classificados do grupo Naspers.

Atento ao que se passa no ecossistema de startups português, Hilpert não nega que a história venha a repetir-se, antes pelo contrário: “O que fizemos no passado — pegar numa equipa portuguesa e levá-la ao resto do mundo — é algo que gostaria de fazer outra vez. Porque, por muito que adorasse investir no mercado português, seria ótimo se pudesse pegar nisso e levá-lo para o resto do mundo. Seria ainda mais atraente. Se houver uma empresa que tem uma solução tecnológica para um dos problemas dos nossos consumidores, como algo que ajude a criar um marketplace mais seguro, algo que os nossos consumidores valorizem… E se essa empresa por acaso estiver em Portugal, então acho que estou interessado. E se essa empresa tiver uma tecnologia que possa exportar para mais países, então onde é que passo o cheque?”.

KIMMY SIMÕES/OBSERVADOR

“Foi difícil encontrar seniores para cargos de liderança em Portugal”

Trabalham 250 pessoas aqui em Lisboa. Vão recrutar mais?
Sem dúvida. Tipicamente, contratamos entre 30 a 50 pessoas por ano para o hub e contratamos algumas para o negócio português. É muito difícil dizer qual será o plano para dois ou três anos, mas para este ano vamos continuar a recrutar entre 30 a 50 pessoas até ao final do ano.

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Para que cargos?
Temos por hábito organizarmo-nos por aquilo a que outras empresas chamam de pelotão, como acontece no Spotify, por exemplo. Procuramos ter uma combinação entre engenheiros, investigadores, analistas e tudo isso junto resulta numa equipa que é verdadeiramente independente, que consegue pegar numa ideia, lançá-la e melhorá-la ao longo do tempo, sem precisar da ajuda de outras equipas. É essa a nossa configuração, por isso, é essencial termos todos os tipos de funções de engenharia, gestores de produto, designers, investigadores, analistas e cientistas de dados, que é uma coisa que sempre que os encontramos…

… é muito difícil recrutar cientistas de dados, não é?
O número de pessoas qualificadas para esta função está a crescer, mas a procura global por este tipo de profissionais é gigantesca. E as grandes empresas, como a Amazon, Alibaba, Tencent ou Google, têm já estado a escolher uma grande fatia.

Como se combate este tipo de concorrência?
Em parte, é estando num sítio como Lisboa.

Estar em Lisboa faz parte da fórmula?
Acho que sim. A forma como o OLX funciona é esta: estamos globalmente em 40 mercados, o que se assemelha a muitas dessas grandes empresas, mas estamos espalhados de forma substancial por 20 escritórios pelo mundo, porque o nosso background não está todo nos EUA ou na China ou num desses grandes mercados. Vimos de sítios muito diferentes. Acho que isso nos dá uma vantagem e vemo-lo no interesse perante a empresa. Somos muitas vezes vistos como uma empresa local — não somos percecionados como esta casa global que poderiam muito bem pensar que somos — e acho que isso também é uma vantagem no mercado do talento. Estamos em sítios que também são outros mercados de talento. Olhamos para a nossa estratégia e vemos que estamos em hubs internacionais como Berlim, que na verdade atrai pessoas de diferentes países, e em sítios que são muito locais. Lisboa é um mix interessante. Já fomos uma empresa completamente portuguesa, mas agora temos 25 nacionalidades aqui neste escritório. Só aqui, entre gestores de produto, engenheiros e cientistas de dados temos um contexto muito, muito internacional. Recrutamos a partir do mundo todo e dispersamos [este talento] por Lisboa.

"O primeiro passo que decidimos dar foi: pegar nos verticais dos carros e imobiliário e pedir ao líder local de tecnologia para liderar uma mudança e construir a equipa de que precisávamos. Num passo mais à frente, levámos esta ideia a uma escala global. Com um passo vieram outros e, com isso, também vieram as mudanças que fizeram deste sítio uma localização muito mais internacional"

O que se faz neste hub?
Olhamos para isto de uma forma muito global, com equipas globais. Não pomos Lisboa a fazer uma coisa completamente diferente do resto, as equipas trabalham juntas. Temos aqui os nossos responsáveis globais de design e de investigação, bem como equipas muito fortes nesses departamentos. E o nosso líder global de design é um executivo português. Depois, também temos o nosso vertical de carros aqui, que é um dos nossos negócios mais fortes em Portugal, o Standvirtual, e temos outras marcas com outros nomes mas com o mesmo design noutros sítios. É isto que fazemos a partir daqui e que constitui uma grande parte do nosso negócio. A terceira coisa é o vertical de imobiliário, como o Imovirtual.

Isto é o que fazemos por cá em termos de grandes coisas. Mas também fazemos pequenas coisas: temos uma pequena equipa que dá apoio a todas as equipas de vendas que estão espalhadas pelo mundo, que reúne muitos dados, é uma equipa muito virada para os dados. E não estou a falar de 50 pessoas, talvez uma ou duas mãos cheias. É uma equipa muito eficiente. Estamos muito contentes com o que temos aqui e planeamos expandir.

A empresa tem vindo a investir cada vez mais em Portugal. Porquê?
É mais fácil de entender quando olhas para o contexto histórico. Tenho feito parte dele nos últimos cinco anos e acho que… No passado, a Naspers investiu numa empresa portuguesa local que se chamava FixeAds, fundada por Miguel Mascarenhas há 14 anos. E com esse investimento veio um grande passo na forma como a empresa poderia competir no mercado português. Mas tratava-se muito de uma empresa portuguesa, era uma jogada muito portuguesa. Juntei-me à equipa há cinco anos e muitas pessoas da equipa eram portuguesas e estava muito feliz. Na primeira vez que vim [em trabalho pela OLX] a Lisboa, no meu primeiro mês, percebi que a equipa lisboeta tinha uma energia muito positiva, era como se tivesse esta ideia de que podia conquistar o mundo e de que nada a ia parar. Era muito poderosa. Mas uma coisa que a travou um pouco foi o facto de Portugal não ser um mercado muito grande. Tivemos de pensar o que poderíamos fazer para que esta equipa tivesse um maior impacto no mundo OLX.

O primeiro passo que decidimos dar foi: pegar nos verticais dos carros e imobiliário e pedir ao líder local de tecnologia para liderar uma mudança e construir a equipa de que precisávamos. Num passo mais à frente, levámos esta ideia a uma escala global. Com um passo vieram outros e, com isso, também vieram as mudanças que fizeram deste sítio uma localização muito mais internacional, o que é verdade para Lisboa, no geral, mas de certeza que é verdade para nós, porque trouxemos muitas pessoas — de dentro da empresa — que gostavam de Lisboa e gostavam de trabalhar aqui. Como foi o meu caso.

Está em Lisboa há dois anos.
Sim, antes disso já tinha vindo várias vezes em negócios e outras tantas como turista. Acho que a primeira vez que vim a Portugal tinha uns quatro ou cinco anos. Por isso, claro que estava a par do que se passava em Portugal, vim quando decidimos investir mais num hub de desenvolvimento maior, mas também porque estava curioso. Lisboa é um sítio muito atraente para vivermos. Esses dois motivos aliaram-se há dois anos e acho que o que era especial aqui era esta atitude [dos portugueses] muito positiva perante a vida, que pessoalmente aprecio, mas também acho que é uma coisa que se sente no escritório.

"A falta de talento é um fenómeno com o qual temos de lidar em todo o lado. Estamos a contratar em tantos sítios, mas ainda não encontrámos nenhum sítio onde é fácil encontrar bons engenheiros, sentados nas ruas. Isso não está a acontecer. E acho que aqui não foi diferente. A parte que foi mesmo difícil para nós foi a de encontrar liderança sénior. Isso, sim, foi difícil"

Concorda que a cidade se vai tornar numa espécie de hotspot da tecnologia?
Acho com certeza que está a evoluir bem. Conseguimos ver que há alguns anos era muito difícil ter aqui pessoas com experiência, era difícil contratá-las, porque muitos dos portugueses que começaram a trabalhar em tecnologia iam para Londres, Berlim ou Amesterdão. E muitas das pessoas que contratávamos tinham acabado de sair das universidades, porque era muito difícil encontrar líderes. E agora suspeito que isso vá mudar. O facto de os nossos líderes de design e investigação a nível global serem portugueses pode ser uma coincidência, mas não acho que serão casos isolados nos próximos anos.

Acho que vamos ouvir muitas destas histórias e que o ecossistema está a crescer, no geral, em Portugal, não apenas em Lisboa — quando pensas sobre a Farfetch, a OutSystems ou nos investimentos que a Google e outros estão a fazer no país percebes que está a crescer uma base maior. Tal como vimos que aconteceu em Berlim. Nesse caso, podes dizer o que quiseres sobre o tipo de empresa que é a Rocket Internet, quer gostes quer não gostes, mas na verdade muito daquilo que é o ecossistema de Berlim nos dias de hoje se baseia nas pessoas que aprenderam a fazer o seu caminho na indústria da Internet através deles. Acho que isso pode continuar a acontecer.

Mas falta muito talento tecnológico um pouco por todo o mundo.
Sim, a falta de talento é um fenómeno com o qual temos de lidar em todo o lado. Estamos a contratar em tantos sítios, mas ainda não encontrámos nenhum sítio onde é fácil encontrar bons engenheiros, sentados nas ruas. Isso não está a acontecer. E acho que aqui não foi diferente. A parte que foi mesmo difícil para nós foi a de encontrar seniores para cargos de liderança. Isso, sim, foi difícil. E também vemos isso na nossa equipa hoje, que é uma mistura entre portugueses e não portugueses em cargos de liderança. Quando olhas para contribuições mais individuais, trabalhamos mais com uma base portuguesa em termos de talento. Acho que está é talvez a única coisa que temos visto com o tempo, mas também vejo isso a mudar e acho que é um reflexo do ecossistema.

Hoje, já não é difícil convencer alguém a trocar um emprego em Londres por um cargo mais sénior no OLX, em Lisboa?
Depende sempre da pessoa. Uma das coisas que os seniores perguntam quando tentamos recrutá-los é “que outras opções tenho [em Lisboa] se isto correr mal?”. E aí é difícil, porque não há assim tantas opções. Se fores um líder sénior, teres de deixar um bom emprego noutro sítio para vir para Lisboa pode ser um passo difícil de dar se souberes que não tens outras opções caso as coisas corram mal. Muitas das pessoas que contratámos para posições seniores vieram de dentro da OLX e, por isso, já conheciam a empresa, tinham confiança em nós e na liderança, confiavam que as coisas iam correr bem. Depois, Lisboa é muito atraente, tem uma qualidade de vida fantástica. Quando as pessoas me perguntam sobre o que gosto em Lisboa, falo do clima e elas perguntam se Lisboa é como Silicon Valley. E eu respondo “Exatamente, é como Silicon Valley”. É uma forma de viver. Contratámos um gestor de produto muito sénior que era americano, mas que chegou do Dubai para viver em Lisboa. É tudo possível. Mas, na minha opinião, o ecossistema precisa de crescer para que seja atraente para seniores, para que percebam que estão a expandir as suas oportunidades e não a encolhê-las.

Então, o ecossistema ainda precisa de crescer?
Sem dúvida.

"Para nós, Lisboa é um sítio interessante, porque temos negócios aqui e tornou-se num íman internacional para o talento. Mas Barcelona não é assim tão diferente, por exemplo, e o ecossistema é um pouco maior do que o de Lisboa. Há sempre competição... Berlim está a competir com Londres e a lutar e acho que se fosse a Lisboa olharia para Barcelona"

Mas o que é que está errado? O que devia estar a ser feito de forma diferente?
Não sou especialista nisto, mas posso dizer o que nos está a dificultar as coisas. Uma das coisas que é mais difícil quando queremos atrair talento vindo de fora é o sistema de impostos que é aplicado às contratações. Os impostos, em princípio, são muito atraentes para convencer talento de elevado calibre a juntar-se a nós e a mudar-se para Portugal, mas, em termos burocráticos, só sabes mesmo como as coisas vão funcionar uns nove meses depois de as pessoas cá chegarem. Quando as pessoas pensam em mudar-se para Lisboa uma das coisas que vão querer saber é quanto é que vão ganhar e se isso é atractivo ou não. Em Espanha, por exemplo, é muito mais fácil. A configuração é parecida, mas a forma como é executada cá dificulta mais.

A segunda coisa que acho que está errada tem a ver com os vistos de trabalho. Conseguimos chegar a muito talento que está no Brasil e noutros países da América Latina e há muito interesse em virem para Lisboa. Às vezes, este processo corre muito bem, noutras tornam-se processos muito longos e é difícil encontrar o talento certo. Quando o encontramos já vamos tarde e queremos que este processo seja o mais rápido possível. Há casos em que demora demasiado tempo. Noutros, são só umas semanas, não sabemos.

Em termos de localização, há alguns investimentos que são bons, como construir espaços nos quais as startups podem trabalhar em conjunto e perto das universidades, acho que tudo isso está no caminho certo mas é um jogo muito competitivo. Para nós é um sítio interessante, porque temos negócios aqui e tornou-se num íman internacional para o talento. Mas Barcelona não é assim tão diferente, por exemplo, e o ecossistema é um pouco maior do que o de Lisboa. Há sempre competição… Berlim está a competir com Londres e a lutar e acho que se fosse a Lisboa olharia para Barcelona.

Como um concorrente direto?
Sim. Mas também como sendo o ecossistema que é um pouco maior agora [do que Lisboa]. Londres está claramente à frente de Berlim e acho que Barcelona ainda é um pouco maior do que Lisboa, apesar de a proposta de talento ser bastante parecida.É uma ótima localização para se viver, tem uma grande qualidade de vida, especialmente se fores jovem, mas também se tiveres família. E tem bom tempo. Em Londres e em Berlim o que chateia as pessoas é o tempo.

“Os portugueses adaptam-se muito lentamente à tecnologia. É por isso que quero mais talento internacional no escritório”

Em termos de negócio, Portugal ainda é um dos maiores mercados da OLX?
É um grande mercado, está no top 10 global. É limitado no tamanho — mas isto tem a ver com o facto de o país ter 11 milhões de habitantes, há um limite –, mas nós temos 5 milhões de utilizadores ativos mensais no OLX, em Portugal, o que dá uma perspetiva das limitações reais que temos enquanto empresa. Acho que neste aspeto, em termos de potencial, há outros sítios maiores, mas no que diz respeito ao negócio existente estamos muito felizes. Achamos que ainda podemos crescer muito e temos oportunidade para criar mais categorias dentro do OLX e andamos atrás disso. O negócio português é muito lucrativo para nós.

Mas agora há muito mais competição, o mercado está diferente e até no Facebook se pode vender e comprar bens. Quais são os desafios agora?
Sim, sem dúvida, e isto é um fenómeno global com o qual temos de lidar. É a industria em que estamos. A diferença hoje é que isto é muito bom para os consumidores, que têm mais escolha e, regra geral, muito melhor serviço do que o que tinham há cinco ou dez anos. O que isto significa para nós é que, de facto, precisamos de ser uma empresa muito mais centrada no consumidor e muito fortes nas tecnologias modernas como o machine learning ou a inteligência artificial, que vai mudar as nossas vidas e não será de maneira diferente no negócio dos classificados. E é isso que estamos a fazer, é nisso que nos estamos a focar e é por isso que estamos a contratar tantos cientistas de dados.

Acho que temos uma grande vantagem [em relação à concorrência]: estamos presentes de forma muita próxima em cada país. O negócio dos classificados é muito local, de várias formas, e trata muito de perceber os consumidores. E é por isso que sou muito fã desta ideia de nos centrarmos muito no consumidor. É mais fácil compreender os nossos clientes quando estamos perto deles do que quando o que fazemos é apenas olhar para os dados. E nós temos ambos: temos os dados e informação de qualidade por termos equipas em todos os mercados que estão no top 20. Temos equipas fortes em todos os mercados.

Outra coisa que importa é que a marca é diferente tendo em conta o mercado em que está. Em Portugal, temos uma marca muito forte e quando ouço os nossos clientes, percebo que eles tentam usar [o marketplace] do Facebook, que é muito normal, mas também usam o OLX, porque sabem que funciona. E, por isso, usam ambos. Acho que tudo isto muda a forma como temos de servir os consumidores e o facto de os consumidores virem ter connosco hoje e nós [termos a oportunidade] de agradá-los, então temos de servi-los muito bem. E sempre a melhorar.

"Se me perguntar qual foi uma das observações mais surpreendentes que fiz quando me mudei para Lisboa, vou responder que foi a diferença na quantidade de carrinhas de entregas que via nas ruas. Quando vivia na Alemanha, via muitos carrinhas da transportadora DHL, por exemplo, a passar. Aqui, vejo algumas encomendas a chegar ao escritório, mas... O comércio eletrónico é a representação disto"

Então, ainda há espaço para crescer?
O que vejo pelo mundo é que quando há mais competição e tecnologia a entrar no mercado isso faz com que o bolo cresça muito. Uma das coisas que é difícil em Portugal é que os portugueses se adaptam muito lentamente à tecnologia. Passo algum tempo na Ásia e quando vou à Índia ou Indonésia, que têm populações muito jovens, percebo que estão a adaptar-se à tecnologia de uma forma muito diferente. Muitas vezes fazem-no de uma forma muito mais rápida e intensiva do que as sociedades europeias. Na minha perspetiva, Portugal, em específico, tem uma taxa muito baixa de utilizadores que consomem aplicações da Internet. O bolo está a crescer, os consumidores e os escritórios também, mas é um jogo diferente. O OLX não é a única opção disponível num mercado pequeno, mas sim uma das opções num mercado maior.

É interessante o que diz. Queremos ser um país que se destaca pela tecnologia, mas depois ainda demoramos muito tempo a adaptarmo-nos.
É uma das razões pelas quais estou a desafiar a equipa a crescer e a visitar outros sítios. E também é por isso que quero mais talento internacional no escritório, porque de muitas formas… Se me perguntar qual foi uma das observações mais surpreendentes que fiz quando me mudei para Lisboa, vou responder que foi a diferença na quantidade de carrinhas de entregas que via nas ruas.

Quando vivia na Alemanha, via muitos carrinhas da transportadora DHL, por exemplo, a passar. Aqui, vejo algumas encomendas a chegar ao escritório, mas… O comércio eletrónico é a representação disto. [Em Portugal], é muito mais pequeno em termos de utilizadores. É maravilhoso ver a forma como as pessoas usam a mobilidade no mundo, como recebem comida em casa, como pensam sobre cozinhar ou não cozinhar, como vivem de uma forma que se estende entre o online e o offline. Uma equipa como esta serve, na verdade, muito do mundo, não deve servir apenas Portugal. E é nesta parte que acho que esta equipa precisa de um extra, precisa de aprender mais sobre isto, porque não vê isto acontecer da mesma forma no seu dia a dia aqui.

Li que a Naspers quer fazer um IPO [admissão de uma empresa em bolsa, na sigla anglo-saxónica] dos negócios da Internet em breve. O que me pode dizer sobre isso?
Sobre essa matéria é melhor falar com a própria Naspers. Vai haver um IPO na bolsa de Amesterdão, mas não sou a pessoa indicada para falar sobre isso. É claramente um plano que foi anunciado e os próximos passos tratam de cumprir com todos os procedimentos regulatórios. Não é segredo.

Tendo em conta o ecossistema tecnológico e das empresas altamente valorizadas, concorda que estamos a viver numa bolha?
Em termos individuais é provavelmente verdade: há empresas que estão com uma valorização bastante elevada. Mas, em termos gerais, acho que a forma como a nossa vida mudou foi dramática e que ainda só arranhámos a superfície. Se olharmos para as tendências à nossa volta, quando olhas para a quantidade de dados que estão a ser criados e para o que as pessoas fazem com o machine learning, que se tornou, basicamente, numa matéria-prima, consegues imaginar quanta inovação vai aparecer nos próximos 5, 10 ou 20 anos. Acho que apenas tocámos na superfície de tudo isto e, nesse sentido, imagino que as grandes empresas que vão dominar o mundo durante algum tempo serão as tecnológicas, sem dúvida. Se vai ser esta empresa ou outra depende da gestão individual que se fizer de cada uma delas e da concorrência que existir. No geral, a tendência vai permanecer.

No outro dia, estava a ouvir um professor da Universidade de Oxford cuja principal tese é a de que estamos a viver um segundo Renascimento e ele tem um ponto de vista muito forte em relação a isto: quando pensas no Renascimento, pensas num altura de uma riqueza enorme, mas também de uma inovação e de uma mudança na qualidade de vida enormes. Acho que estamos a começar a ver isso agora e por isso acredito que ainda só estamos à superfície. Uma das áreas com a qual estou entusiasmado a curto prazo tem a ver com a forma como o online se vai estender ao offline e o inverso. Porque muito do consumo da Internet dos últimos 25 anos tem sido feito apenas online e já vês que há segmentos em que essa conversão está a crescer. E acho que pode crescer ainda mais.

KIMMY SIMÕES/OBSERVADOR

Também é interessante ver que o consumidor online de hoje é diferente do de há uns anos, não é?
O consumidor de hoje, antes de mais, está no telefone e é muito diferente do consumidor de há 20 anos. A internet é muito diferente hoje, em termos de consumo. Há 20 anos, quem comprava online era gente da classe média/alta de países ocidentais. Hoje, os consumidores são cada vez mais jovens e estão também nos mercados emergentes, muitos deles estão online pela primeira vez e o smartphone é o único aparelho que têm para se ligarem à rede. Então, não é um consumidor vindo tipicamente dos países ocidentais, mas dos mercados asiáticos, latino-americanos e africanos. Nesse sentido, é muito diferente.

Acho que o consumidor, por outro lado, tem muito mais escolhas e isso é muito claro. Acho que a aceitação da fricção foi por água abaixo e que é nisto que as grandes empresas da Internet se estão a focar — o padrão de qualidade dos produtos está a crescer e eles estão a usar o Google, Tencent, Amazon ou Facebook. Se reparares, vês que a qualidade da entrega destes produtos está a crescer e há outra coisa: os consumidores pura e simplesmente esperam que as empresas façam isto. Por último, querem que tudo isto seja individualizado. Há 20 anos, obviamente que eu e tu usávamos o mesmo produto da mesma forma, ninguém desafiava isso, mas hoje tu esperas que o feedback do teu feed seja diferente do meu. Isto tornou-se num padrão que temos de assumir e enfrentar.

Enquanto negócio, o que é que mais vos assusta? Quais são os grandes desafios?
Acho que enquanto empresa temos de mudar. O nosso ambiente muda, o que é entusiasmante, mas ao mesmo tempo também significa que temos de mudar. Óbvio que a pergunta é como é que mudamos suficientemente rápido, que é o que me mantém acordado à noite: como é que relacionamos as vantagens de conhecer os nossos consumidores locais, que acho que conhecemos, dada a força das nossas equipas, e transformamos isto em inovação que de facto ajude os nossos consumidores no mundo. E isto é uma coisa que não é fácil de fazer, mas que eu acho que devemos ser nós a fazer. E é isso que vai fazer de nós únicos e nos vai permitir construir um negócio para os nossos filhos e netos.

“Se essa empresa tiver uma tecnologia que possa exportar para mais países, então onde é que passo o cheque?”

Falou há pouco de tendências. Qual é que vai ser “a próxima grande coisa”, capaz de provocar uma revolução igual à que a internet provocou?
Acho que vai ser o machine learning e acho que já estamos a vê-lo. Acho que ainda só estamos no início daquilo que o machine learning pode fazer para mudar o mundo. Vamos ver mais coisas. E, claro, vamos ter de fazer todas estas perguntas interessantes sobre a regulamentação e privacidade.

Está no início, mas estamos a fazer isto da melhor maneira? Tudo isto levanta muitos problemas que não estão a ser supervisionados por ninguém. 
Tenho de ser humilde em relação às minhas opiniões, mas acho que é muito claro que este é um compromisso que a sociedade precisa. Acho que todos os países sentiram isto nos últimos 20 anos: se apertas em termos de segurança, retiras liberdade. Acho que nós, enquanto sociedade, vamos ter de encontrar uma forma de gerir os equilíbrios certos. Penso que a Europa é a região onde isto vai ficar mais pronunciado primeiro, visto que a União Europeia tem um papel de liderança global nestes tópicos e que há diferentes interesses em redor da privacidade, nos dias de hoje. Provavelmente, a curto prazo, é mais desafiante para a Europa operar, mas ao mesmo tempo vai fazer com que as empresas fiquem mais fortes e se tornem empresas de sucesso na Europa e em qualquer sítio em que operem.

"Não interessa se contratamos 30, 40 ou 60 pessoas, desde que estejamos a contratar o talento certo e desde que esse talento esteja de facto a contribuir para o sucesso junto dos consumidores. Temos estado algumas vezes certos sobre as nossas previsões, sobre como vão decorrer as coisas, mas também aprendemos muito quando a realidade revela ser uma coisa bastante diferente"

O regulamento para a proteção de dados europeus está em vigor há um ano. É suficiente para nos proteger?
Na minha opinião, é tudo ainda muito recente. Levantou uma série de questões sobre a forma como está a ser executado e, por isso, ainda temos de esperar para ver qual é o seu real impacto. Acho que muitas das suas ideias principais estão a liderar muitas das conversas que estão a decorrer atualmente pelo mundo. Nesse sentido, tem claramente um papel de liderança, mas do lado da execução ainda é um desafio. É um desafio para nós, enquanto empresa, acompanharmos as mudanças.

Estão a contratar cerca de 30 pessoas para este escritório. Têm mais algum plano para Lisboa ou outra cidade portuguesa?
Não temos mais planos para Portugal. Há uns dois anos abrimos uma série de espaços de apoio às vendas no norte, mas não há planos além disto. Os planos que temos têm a ver com o que ainda temos de fazer aqui. Não interessa se contratamos 30, 40 ou 60 pessoas, desde que estejamos a contratar o talento certo e desde que esse talento esteja de facto a contribuir para o sucesso junto dos consumidores. Temos estado algumas vezes certos sobre as nossas previsões, sobre como vão decorrer as coisas, mas também aprendemos muito quando a realidade revela ser uma coisa bastante diferente. E, por isso, estou curioso para ver onde vamos chegar. Temos lideranças muito fortes aqui, agora, e estou muito confiante com os nossos líderes de produto e tecnologia, que estão agora em Lisboa. E quando temos ótimas pessoas, então outras ótimas pessoas vão querer juntar-se a elas. Se virmos que há mais talento a vir em direção a nós, que não conseguimos antecipar, então vamos ter de contratar mais pessoas. E temos muito espaço aqui, não vai ser esse o problema.

A próxima grande inovação do grupo OLX pode nascer neste hub?
Claro que sim. Não interessa de onde vem a ideia certa ou onde é que está a ser executada. De facto, não interessa mesmo. Uma coisa única sobre nós enquanto empresa é que não temos uma sede, não temos um sítio de onde a empresa tenha emergido. A empresa nasceu em Lisboa quando Miguel Mascarenhas fundou o negócio português, mas também nasceu em Buenos Aires, quando Fabrice Grinda e Alec Oxenford lançaram a marca na Argentina. Mas também em Moscovo. É um negócio que emergiu de vários locais, o que nos torna muito únicos e que também permite não termos ideia de que o centro do universo está num local muito específico, o que é um desafio em termos de gestão, por um lado. Por outro, para as empresas de Silicon Valley também é desafiante ter de imaginar que a inovação pode acontecer em qualquer parte do mundo.

Têm estado atentos às startups portuguesas? Equacionam comprar alguma?
Não comentamos sobre o que estamos a equacionar. Enquanto empresa estamos sempre à procura de formas de expandir as nossas ofertas e temos sido muito ativos no último ano enquanto grupo. No ano passado, fizemos 10 aquisições. Estamos sempre abertos a isso mas tem de ser algo que melhor a experiência do consumidor e há muitas formas de isso acontecer, por isso, há todo o tipo de opções.

"Se houver uma empresa que tem uma solução tecnológica para um dos problemas dos nossos consumidores, como algo que ajude a criar um marketplace mais seguro, algo que os nossos consumidores valorizem... E se essa empresa por acaso estiver em Portugal, então acho que estou interessado"

Qual seria o pitch perfeito de uma startup portuguesa para vos convencer?
Para fazer parte do grupo? Acho que teria de resolver verdadeiramente o problema de um consumidor, algo relacionado com o que fazemos hoje. Muito provavelmente uma extensão da forma como as pessoas nos usam hoje. Para dar um exemplo, há mais de um ano investimos numa empresa que o que faz é oferecer um serviço que permite ao consumidor levar o seu carro a um centro, onde será inspecionado e pelo qual fazem uma oferta, o que foi uma reviravolta na forma como os comerciantes estão a negociar os seus carros. Muitos dos nossos consumidores no mundo estão a negociar carros usados e algumas pessoas podem não estar a precisar deste serviço, porque estão muito confiantes, percebem do assunto, sabem qual é o melhor preço e sentem-se confortáveis nesse papel. Mas também há um segmento de pessoas que se sente muito desconfortável na hora de atribuir um valor ao carro. E isto não é uma parte pequena do processo, há mercados em que é mesmo difícil vender um carro. Acho que este é um excelente serviço que providencia uma melhor experiência ao nosso utilizador e foi por isso que investimos. É uma extensão ao que fazemos.

Há uma longa lista de áreas potenciais onde isto pode ser feito e somos muito abertos, sobretudo se se tratar de uma solução que é um bom produto. O que fizemos no passado — pegar numa equipa portuguesa e levá-la ao resto do mundo — é algo que gostaria de fazer outra vez. Porque, por muito que adorasse investir no mercado português, seria ótimo se pudesse pegar nisso e levá-lo para o resto do mundo. Seria ainda mais atraente. Se houver uma empresa que tem uma solução tecnológica para um dos problemas dos nossos consumidores, como algo que ajude a criar um marketplace mais seguro, algo que os nossos consumidores valorizem… E se essa empresa por acaso estiver em Portugal, então acho que estou interessado. E se essa empresa tiver uma tecnologia que possa exportar para mais países, então onde é que passo o cheque?

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