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AFP/Getty Images

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Um guarda-redes de braço ao peito, um árbitro vindo da bancada, um brinco perdido: as versões insólitas do dérbi

Benfica e Sporting são protagonistas de um dérbi com mais de 110 anos de história. Com capítulos fantásticos, negros, bons e maus. Dez deles ficaram para a história pela sua singularidade.

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Esta é uma história com mais de 110 anos. Esta é a história do dérbi. Esta é uma história que já teve grandes e decisivos golos como os de Peyroteo em 1947 ou de o de Luisão em 2005. Esta é uma história que já teve reviravoltas sensacionais como a que deu a vitória ao Benfica na final da Taça de Portugal de 1952 (5-4) ou a que deu o triunfo ao Sporting na meia-final da Taça de Portugal de 2008 (5-3). Esta é uma história que já teve capítulos fantásticos, bons, maus e péssimos, incluindo um que tirou a vida de um adepto no Jamor em 1996. Mas esta é também a história de um jogo que é bem mais do que isso e que prende as atenções de um país por múltiplas razões.

Do jogo que foi interrompido pela queda de granizo ao jogo que parou por causa de um brinco perdido, do jogo arbitrado por um defesa do FC Porto ao jogo arbitrado por alguém que estava na bancada, do jogo que deu goleada com um poker ao jogo que deu um título com um hat-trick, do jogo que valeu um castigo de um ano ao jogo repetido e anulado em dois meses, do jogo decidido por um guarda-redes de braço ao peito ao jogo que acabou com a saída dos dois treinadores, já houve de tudo. E estes são dez exemplos que mostram que é mais do que um jogo.

Da paragem por causa do granizo ao autogolo de Cosme Damião

O primeiro dérbi entre Sporting e Benfica, que na altura ainda se chamava Sport Lisboa, data de 1 de dezembro de 1907, realizou-se no Campo da Quinta Nova e abriu o Campeonato de Lisboa de 1907/08. E entre tanta coisa que foi antecipadamente pensada (quem jogava em casa arranjava a bola, se fosse em campo neutro cada um trazia a sua e havia sorteio), houve uma que passou ao lado: e se começasse a chover tanto que até caísse granizo?

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Pode parecer apenas um pormenor, mas fez com que o jogo corresse o risco de ser interrompido: os leões, que tinham desviado no início da temporada oito jogadores dos encarnados – o guarda-redes Emílio de Carvalho; o defesa Queirós dos Santos; os médios António Couto e Albano dos Santos; e os avançados Henrique Costa, Cruz Viegas, António Rosa Rodrigues e Cândido Rosa Rodrigues – com a promessa de melhores condições (campo próprio e duches de água quente), quiseram abandonar o campo no início da segunda parte, quando havia um empate a uma bola com golos de Cândido Rosa Rodrigues e Eduardo Corga, devido à forte chuvada. Burtenshaw, um inglês que jogava no Carcavelos (a melhor equipa nessa altura) e que estava a arbitrar o jogo, não deixou que os jogadores saíssem e o Sporting viria mesmo a vencer esse primeiro dérbi, curiosamente com um golo na própria baliza de Cosme Damião, um dos fundadores do clube e que não quis “desertar” para os leões.

Um Benfica-Sporting arbitrado por um defesa… do FC Porto

O Campeonato de Lisboa de 1923/24, que contou com as participações de Benfica, Sporting, Casa Pia, Império e Belenenses, teve apenas oito encontros por equipa mas qual deles mais equilibrado e com o resultado mais imprevisível. Contas feitas, e à entrada para a última jornada, estava tudo em aberto na luta pelo título, com vantagem dos encarnados que somavam nove pontos em sete encontros, mais do que o resto da concorrência.

O dérbi, a 13 de abril de 1924, na Estância de Madeira (Campo Grande) seria a chave do Campeonato e teve representação à altura nas bancadas, com a presença do então Presidente, Manuel Teixeira Gomes. E quem foi o árbitro? Nada mais, nada menos do que um defesa do FC Porto, José Maria Tavares Bastos, que era natural de Vila Nova de Gaia mas representou os encarnados entre 1916 e 1922, antes de rumar à Invicta para conquistar um Campeonato de Portugal pelos azuis e brancos. O Sporting acabaria por vencer o jogo por 3-0, com golos de João Francisco (que bisou) e Jaime Gonçalves, entregando o primeiro lugar desse ano ao surpreendente Casa Pia.

Quando um Campeonato é decidido com o guarda-redes de braço ao peito

Em nove jogos no Campeonato de Lisboa de 1946, Benfica e Sporting tinham seis vitórias, dois empates e uma derrota à entrada para a última jornada da competição, mas com vantagem para os encarnados: por um lado, jogavam em casa (Campo Grande ou Estância de Madeira); por outro, e beneficiando da vantagem nos golos marcados e sofridos, só precisavam de uma igualdade. Uma vantagem que de nada lhes valeu.

A 17 de novembro, quando os leões ganhavam por 1-0, o guarda-redes Azevedo sofreu uma grave lesão na clavícula e teve mesmo de sair, deixando a equipa reduzida a dez unidades (ainda não havia substituições). Até ao intervalo, Jesus Correia calçou as luvas, depois essa função passou para Veríssimo. De fora, o guardião via a vantagem verde e branca cada vez mais ameaçada e, mesmo limitado, decidiu reentrar. Arsénio empatou, num remate para o lado que tinha o braço ao peito e que o deixou ainda com mais dores. Pouco depois, o momento “mágico”: estirada a um tiro forte de Espírito Santo num voo que manteve o 1-1. Foi esse o tónico para uma ponta final diabólica, com os golos de Albano e Peyroteo a darem o título ao Sporting. E Azevedo saiu em ombros do campo…

Da pega com o vendedor de gelados à invasão de campo

O Campeonato de 1959 é muitas vezes recordado pela figura de um árbitro, Inocêncio Calabote. E com uma outra curiosidade: para os adeptos do FC Porto, foi por ele que houve emoção até ao último minuto da prova por causa da atuação no Benfica-CUF (7-1), onde marcou três penáltis, expulsou três jogadores dos visitados e deu mais de dez minutos de descontos entre as duas partes; para os adeptos encarnados, as teorias de que estava a fazer tudo para dar o troféu às águias não fazem sentido porque tudo o que fez foi justificado e até podia ter marcado mais uma grande penalidade. Mas foram os dragões quem se sagraram campeões, por causa da vantagem de um golo. E isso aconteceu, sobretudo, porque o Benfica saiu derrotado de Alvalade na jornada anterior, de má memória para Ângelo.

A 15 de março de 1959, o defesa encarnado acabou por ser expulso depois de um lance com o fantasista leonino Travassos. Mas, na verdade, quem tinha feito falta fora Alfredo. Nada que levasse o árbitro a mudar de decisão e que desencadeou a ira do jogador, que já antes tinha galgado a zona da pista de tartan para empurrar um vendedor de gelados que era também apanha bolas, com a ânsia de retomar o encontro. A caminho da zona dos balneários, mais problemas, com adeptos do Sporting a saltarem para o campo e a polícia a tentar acalmar os ânimos. Ângelo acabaria mesmo por cumprir uma suspensão de um ano no rescaldo de todo o episódio.

O árbitro de bancada que queria expulsar mas não tinha cartões

Era sobretudo um dia de festa para o Benfica, que festejava o título após uma goleada na jornada anterior em Setúbal. No caso do Sporting, sobrava a honra e aquela vontade de travar o velho rival jogando em casa. Tudo pronto para o apito inicial menos um elemento sem o qual não havia jogo: o árbitro. E porque fez greve – Manuel Poeira, árbitro de Faro, não viajou para Lisboa por estar em choque com a Comissão Central de Árbitros. Avançou o “plano B”. Ou N.

Nemésio Castro, na altura um responsável pelo material dos Telefones na zona do Cais do Sodré, respondeu ao pedido que ecoou dos altifalantes do estádio José Alvalade a pedir um árbitro, apressou-se a vestir uma camisola branca emprestada pelos leões e chegou-se à frente a 23 de maio de 1976. Ainda a meio da primeira parte, Da Costa foi expulso mas, como o árbitro improvisado não tinha cartões, teve de assinalar a incidência através da sinalética com os braços. Os leões ainda foram conseguindo aguentar, até que os comandados de Mário Wilson fazem 3-0 nos últimos dez minutos, obras de Nené (que bisou) e Jordão, que se transferiria depois para o Sporting.

E sobre a atuação do árbitro improvisado? Nem uma palavra de contestação pela exibição ao longo dos 90 minutos…

Um grande golo e à caça ao brinco perdido pelo relvado da Luz

A temporada corria bem ao Benfica mas nem por isso ao Sporting, que tinha à 16.ª jornada na Luz, a 12 de fevereiro de 1978, a obrigatoriedade de vencer para reentrar na luta do título. Não ganhou, perdeu por 1-0 e acabaria a nove pontos do FC Porto e dos encarnados, numa luta até ao final do Campeonato. Herói desse encontro? Um génio irreverente acima da média que se descrevia como “O Maior”: Vítor Baptista.

Naquele que viria a ser o seu último golo de águia ao peito, o jogador marcou um grande golo que resolveu esse dérbi, recebendo no peito antes de disparar ao ângulo superior esquerdo da baliza de Botelho. Mas os festejos não correram bem: Vítor Batista acabou por perder o seu brinco de estimação e esteve mais de três minutos, com a ajuda de alguns companheiros, à procura do mesmo no relvado num momento que ficou para a história do futebol. Por fim, o encontro lá acabou por seguir, sem o tesouro encontrado, mas com todos cientes da preciosidade que estava ali em causa: o brinco tinha custado 12 contos e o prémio de vitória era de oito…

A maior goleada no Campeonato que teve a debandada geral com 5-1

Eis o jogo que ainda hoje é falado como se tivesse sido ontem mesmo pelos adeptos que ainda não tinham sequer nascido quando aconteceu: se por um lado, os sportinguistas recordam o 7-1 de 14 de dezembro de 1986 como o dia em que conseguiram “humilhar” os rivais; por outro, os benfiquistas contrapõem que se sagraram campeões com mais dois pontos do FC Porto e dez do que os rivais lisboetas.

A primeira parte não fazia adivinhar o desfecho final de uma partida para a qual o Benfica partia como favorito: Mário Jorge, numa jogada de insistência na área, fez o único golo nos 45 minutos iniciais. Aos 50′, Manuel Fernandes aumentou para 2-0, mas a meia hora do fim Wando deu uma nova esperança ao conjunto de John Mortimore, fazendo o 2-1. Só que os verde e brancos, orientados na altura por Manuel José, chegaram ao 5-1 em sete minutos (marcaram Meade, Mário Jorge e Manuel Fernandes). Nessa altura começaram a acender-se algumas fogueiras na bancada onde estavam os adeptos encarnados, que queimavam cachecóis e cartões de sócios entre a debandada geral. Mas a histórica goleada não ficaria por aí: Manuel Fernandes, que parecia até que ia ser substituído (afinal foram Fernando Mendes e Litos que deram lugar a Duílio e Silvinho) completaria ainda o seu poker no 7-1 final.

Festejos: Ferreira Canais, diretor do estádio, mandou comprar uma caixa de champanhe e “Manel” guardou a bola para dar à filha.

Depois do verão quente de Sousa e Pacheco, o maio a ferver de JVP

O verão de 1993 foi mexido, muito mexido no futebol nacional: numa “jogada” que envolveu mudanças durante a madrugada e jogadores escondidos durante dias, Paulo Sousa e Pacheco rescindiram com o Benfica e mudaram-se para o Sporting, que aproveitou um período mais conturbado do rival para desviar atletas. E podiam ter sido mais – Rui Costa (que terá recusado a oferta) ou Isaías foram outros nomes na altura falados como visados, a par de João Vieira Pinto, que andou mesmo numa casa por Espanha protegido e escondido pelo então presidente do Benfica Jorge de Brito, antes de ser “apresentado” (de novo) na Luz.

O Campeonato de 1993/94, que teve alteração no comando técnico verde e branco a meio (saiu Bobby Robson — e Mourinho, o seu adjunto-tradutor — após a eliminação na UEFA com o Casino Salzburgo, entrou Carlos Queiroz, responsável pela conquista do bicampeonato mundial Sub-20 de seleções), foi muito disputado e nivelado por cima, com os três “grandes” a apresentarem equipas e futebol de grande nível. Até que tudo foi decidido a 14 de maio de 1994, numa 30.ª jornada do “tudo ou nada”: aí, João Vieira Pinto, o tal que esteve com pé e meio em Alvalade, teve uma noite mágica com um hat-trick na primeira parte que contribuiu e muito para a goleada por 6-3. Isaías, outros dos cobiçados em Alvalade, bisou. Outro golo foi do central Hélder, que teve também tudo alinhavado para se transferir do Estoril para o Sporting com Mário Jorge…

Caniggia expulso, jogo repetido, resultado anulado (tudo em dois meses)

À 30.ª jornada do Campeonato de 1994/95, o Sporting tentava ainda recuperar terreno para o FC Porto mas tinha uma deslocação complicada à Luz. E foi um jogo eletrizante, com três golos (Balakov fez um fabuloso chapéu a Preud’Homme, Iordanov marcou de fora da área, Dimas reduziu para os encarnados) e uma lesão grave de João Vieira Pinto ainda nos 45 minutos iniciais. A dez minutos do final, ainda com 2-1, depois de muitos cartões amarelos e dois vermelhos por acumulação (Veloso e Naybet), deu-se o caso. E que caso.

No seguimento de uma confusão após falta de Sá Pinto sobre Tavares, os jogadores das duas equipas começaram a embrulhar-se naquelas confusões muito típicas dos anos 90 e Jorge Coroado, o árbitro do dérbi, foi distribuindo mais amarelos. Um deles foi para Caniggia, o internacional argentino dos cabelos grandes loiros que ainda não tinha sido admoestado. Seguiu-se o vermelho. Na altura, pensou-se que teria sido um erro do juiz, mas Coroado explicaria mais tarde que tinha expulsado de forma direta o jogador por insultos graves. A verdade é que, algumas semanas depois e por causa disso, o jogo foi repetido no Restelo, terminando com vitória por 2-0 para os encarnados. No entanto, esse seria um jogo… para nada: a FIFA anulou essa repetição e valeu o jogo em que os leões ganharam por 2-1.

Acabou o dérbi, Mourinho saiu mas não chegou a substituir Inácio

As equipas não andavam bem, mas o Sporting do campeão Augusto Inácio, ainda assim, estava na segunda posição. Já o Benfica, que começara a temporada com Jupp Heynckes (esse mesmo que voltou agora ao Bayern quatro anos depois de se ter reformado) mas já tinha no comando o ex-adjunto de Bobby Robson José Mourinho (depois de sair do cargo de adjunto no Barcelona), ocupava o sexto lugar, a dez pontos do líder FC Porto. Para aqueles que alinham naquela teoria que costuma ganhar a equipa que está teoricamente em pior posição, o jogo de 3 de dezembro de 2000 é exemplo paradigmático disso mesmo.

Num jogo atípico e com a expulsão de Pedro Barbosa a desequilibrar em definitivo a balança, os encarnados foram melhores e ganharam por 3-0 com um penálti de Van Hooijdonk e um bis de João Tomás, o “Acosta de Coimbra”. No dia seguinte, houve saídas. Em versão dupla: Inácio foi dispensado pelo Sporting, Mourinho bateu com a porta no Benfica. A sucessão estava preparada, o acordo entre o Sporting e aquele que viria a ser o Special One estava alcançado mas em duas horas tudo mudou: após uma invasão da conferência de imprensa onde ia ser comunicada a saída de Inácio, alguns associados entraram pela sala e gritaram que não queriam Mourinho. E aquele que depois viria a ser campeão europeu e/ou nacional por FC Porto, Chelsea, Inter, Real Madrid ou Manchester United acabou por nunca chegar a validar o contrato que estava alinhavado…

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