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Uma curiosidade: Há cada vez mais anúncios a vender espaços de restauração mas a procura também cresceu bastante nos últimos meses
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Uma curiosidade: Há cada vez mais anúncios a vender espaços de restauração mas a procura também cresceu bastante nos últimos meses

Uma curiosidade: Há cada vez mais anúncios a vender espaços de restauração mas a procura também cresceu bastante nos últimos meses

"Vende-se/trespassa-se". Crise no setor faz disparar o número de restaurantes na plataforma OLX

A área da restauração foi uma das mais afetadas pela Covid-19 e muitos proprietários procuram soluções rápidas na plataforma digital. Entretanto, a procura também aumentou.

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Peças para carros, bonecada de criança, roupa, eletrodomésticos, faqueiros, barcos… Por estranha que possa parecer esta seleção de artefactos, todos eles conseguem reunir-se debaixo de um teto virtual comum, a plataforma de compra e venda online OLX. Estes artigos e muitos outros são pão nosso de cada dia para quem já está habituado a fazer scroll na aplicação mas ultimamente começou a surgir um fenómeno que tem tanto de curioso como de preocupante: São cada vez mais os espaços de restauração que surgem com as palavras “vende-se” ou “trespassa-se” associados. Numa altura em que o setor da restauração atravessa uma crise complicada, plataformas deste género surgem como último recurso para empresários e cozinheiros que se vêm sem grandes chances de manterem abertas as suas casas.

Segundo dados cedidos por Andreia Pacheco, a brand manager da OLX Portugal, os números não enganam: No espaço de um mês, de abril para maio (picos da atividade pandémica), a plataforma registou um aumento de 15% no número de anúncios colocados com propostas de trespasse — de 2110 para 2416 anúncios –, realidade que surge em total contra-ciclo dado que nos meses anteriores (de janeiro a março), esse valor tinha vindo a descer sucessivamente. De notar ainda que esse aumento verificou-se essencialmente nos grandes polos do país, Lisboa (55,1% dos anúncios) e Porto (25,3%).

Mas há um dado curioso, no meio de tudo isto: Enquanto aumenta o número de pessoas a “desfazerem-se” dos seus espaços, há ainda mais interessados em querer aproveitar a situação. Veja-se: Segundo dados da OLX, o número de contactos feitos a anúncios identificados como “trespasse”, no mesmo espaço de tempo (de abril para maio), aumentou 66% — isto depois de ter estado em queda ao longo durante os quatro meses anteriores. Também o número de utilizadores que procuraram no motor de busca da plataforma pela palavra “trespasse” aumentou consideravelmente, cerca de 60% (de 1199 procuras para 1921), depois de nos meses anteriores o mesmo valor ter estado em queda constante.

Os dados cedidos pela OLX Portugal que mostram a evolução deste fenómeno.

Dados mais recentes obtidos pela Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) sobre o panorama da restauração dão conta que 33% dos espaços de restauração associados a este organismo admitem pedir insolvência (outros 18% admitem que esse cenário será possível em breve). Se dúvidas existissem de que o setor atravessa um momento preocupante — que piorará assim que as moratórias e as medidas de proteção do governo perderem a validade –, números como este reforçam a certeza dessa realidade. Cruzando essa informação com os dados da OLX vê-se concordância com o cenário menos positivo, tal o aumento de espaços que são “colocados no mercado”, mas chega-se também à conclusão de que parece haver quase mais gente a procurar oportunidades de negócio do que as que vêm a sua empresa chegar ao fim.

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“Não estamos com a pistola na cabeça”

A família de João Sousa vive da restauração há mais de 30 anos. Filho de José Manuel Varunca de Sousa, é um dos responsáveis pelo famoso Zé Varunca, embaixada da grande comida alentejana em Lisboa que veio de Estremoz para a capital em 2002 — na altura já tinha 21 anos de servir refeições no seu primeiro espaço ainda na cidade alentejana. Primeiro estabeleceram-se num espaço na zona da Parede, dois anos depois mudaram-se para Oeiras e volvidos outros dois anos juntaram a essa casa um outro espaço no Bairro-Alto — é este último que os enquadra neste artigo.

Clientes do espaço não conseguirão olhar para as fotografias do anúncio no OLX (que entretanto deixou de estar visível) e não reconhecer as cadeiras alentejanas e as mesas bem espalhadas do Zé Varunca do Bairro Alto. Ao Observador, João Sousa confirma que ele e a sua família decidiram colocar o espaço disponível para trespasse na plataforma de compra e venda online: “Tentámos reabrir no Bairro Alto no início de junho, estivemos lá uma semana e vimos que estava paradíssimo”, conta. Foi mais sensato voltar a encerrar e manter apenas em funcionamento a casa de Oeiras. Foi a crise que os fez querer  abrira mão do negócio? Mais ou menos.

"Não estamos com a pistola na cabeça mas é um cenário que se surgisse [trespasse via OLX], nós seguíamos com ele. Se acontecer, acontece. Se não, continuamos com objetivo e daqui a uns anos vemos como fica. Não estamos a querer despachar o sítio"
João Sousa do restaurante Zé Varunca

“A pandemia fez-nos repensar o negócio”, explica. “Pensámos que se conseguíssemos trespassar o espaço do Bairro Alto dava para comprar um restaurante maior”, conta João. Como se trata de um negócio 100% familiar — “trabalho aqui eu, a minha mãe, o meu pai, a minha cunhada, o meu irmão…” –, a mudança para um espaço maior faria com que todos passassem a trabalhar juntos, algo que, afirma, daria “mais qualidade de vida”.  “Como sabe, a restauração é uma prisão. Se conseguirmos estar todos juntos conseguimos mais tempo livre, mais férias. Até porque o meu irmão Rúben vai ser pai outra vez e isto faz-nos perceber que passamos pouco tempo com os miúdos”, explica.

A opção de pôr o espaço na plataforma online foi portanto “uma coisa à experiência”, como o próprio João explica. “Não estamos com a pistola na cabeça mas é um cenário que se surgisse [trespasse via OLX], nós seguíamos com ele. Se acontecer, acontece. Se não, continuamos com objetivo e daqui a uns anos vemos como fica. Não estamos a querer despachar o sítio”, remata. Porquê então utilizar esta plataforma e não apenas falar com uma agência de imobiliário, por exemplo? “É uma vertente que não exige grandes compromissos e por isso permite que fiquemos só ver no que dava”, conta. Ou seja, é uma forma mais simples e sem compromissos de explorar este cenário que, “muito importante”, permite que seja o vendedor a escolher “os valores que acha que vale a pena no negócio”, fugindo a taxas e comissões que uma agência, por exemplo, poderia exigir.

O anúncio do restaurante "Tapa Bucho Gastrobar", na data de publicação deste artigo, estava visível.

“Se o espaço fosse só meu mais valia ter fechado”

A história do Tapa Bucho Gastrobar também tem em comum esta plataforma de compra e venda de artigos. Frederico Brás é um dos sócios desta casa — curiosamente também ela no Bairro Alto — e ao Observador confirmou que o seu espaço está listado no OLX com a referência “Restaurante fantástico e super moderno no coração do Bairro Alto”, tendo associado o valor de 280 mil euros. Olhando melhor para a discrição do anúncio percebe-se que não está em questão apenas um trespasse ou venda. A realidade é mais variada: “Trata-se do trespasse do espaço [com arrendamento por mais 13 anos] com possibilidade de venda do negócio [marca com grande reputação] ou entrada de sócio”, lê-se. Frederico explica o contexto.

“Há dois anos decidimos abrir um espaço maior, o Tapa Bucho Gastrobar. Foi uma oportunidade com muito potencial, diferente daquilo que existia no bairro, com uma estrutura muito maior. Foi um investimento muito grande, o espaço tinha sido uma discoteca, antes, e estava praticamente devoluto”, conta. Depois de já ter feito algum sucesso com um outro espaço mais pequeno, também ele na mesma zona de Lisboa, Frederico e os sócios lançaram-se neste investimento que já tinha totalmente idealizado: “As rendas ultimamente tem sido absurdas mas isto seria uma máquina que funcionaria bem, com um volume de gente grande.” Tudo certo, pelo menos até chegar a pandemia e o setor parar. Frederico conta que um espaço de restauração, pelo menos naquela zona, assenta essencialmente no turismo e na noite, duas coisas que de repente desapareceram. “Temos os nossos pais como fiadores, foi um investimento grande, o senhorio também não mostrou abertura para negociar e por isso percebemos que não dava para manter.”

"Temos os nossos pais como fiadores, foi um investimento grande, o senhorio também não mostrou abertura para negociar e por isso percebemos que não dava para manter."
Frederico Brás, sócio do Tapa Bucho Gatrobar

Foi por causa disto que decidiram então arriscar no Olx, decisão que não deixam de ver como “um teste, uma coisa sem compromissos” que os permita ter alguma margem negocial, isto porque Frederico não recusa nenhum cenário: entrada de um investidor, venda ou trespasse. “Se o espaço fosse só meu mais valia ter fechado as portas, abrir insolvência e aguardar por uma altura melhor. O dinheiro não vem de lado nenhum por isso é insustentável”, diz. Como é uma decisão conjunta com os sócios estão a tentar esta via primeiro, ver se conseguem pelo menos “fazer o suficiente para pagar o empréstimo bancário” que contraíram no processo de compra e remodelação do Tapa Bucho Gastrobar.

“Temos várias coisas em aberto, até temos uma pessoa disposta a entrar na sociedade. Mesmo assim não estamos descansados, isto porque os próximos meses vão ser difíceis”, reforça. A escolha por esta plataforma digital surge de contornos semelhantes ao do Zé Varunca: simplicidade e negociação direta sem intermediários. Frederico explica que ele próprio, em tempos, já a usou para procurar espaços e habituou-se a isso, diz que é “uma plataforma principal de pesquisa”, seja “mais ativamente ou apenas na desportiva”. Apesar de assumir que também colocou o espaço na plataforma Casa Sapo — “eles têm uma ligação com imobiliárias e temos tido contactos quase todos os dias” –, diz que não acredita que “imobiliárias tenham carteiras de clientes que possam ficar com espaços mais facilmente”.

O que dizem as imobiliárias sobre o assunto?

Simplicidade, contacto direto e zero compromissos. De acordo com os proprietários que colocaram os seus espaços nesta plataforma, estas são as mais valias principais de escolher esta opção em vez das tradicionais agências imobiliárias. Isto mesmo tendo em conta que são vários os objetivos e motivações que os levaram a este recurso (problemas de sustentabilidade, mudanças de paradigma, alterações de sócios…).  É cedo para perceber se esta é uma tendência que está aí para ficar. Contudo, a época difícil que vive o setor da restauração, em que muitos proprietários e sócios se vêm desesperados por aligeirar encargos financeiros, parece estar a ajudar ao crescimento deste fenómeno. As agências imobiliárias mais “tradicionais” reconhecem o fenómeno como algo “natural” mas apresentam algumas reticências.

"Se o espaço fosse só meu mais valia ter fechado as portas, abrir insolvência e aguardar por uma altura melhor. O dinheiro não vem de lado nenhum por isso é insustentável"
Frederico Brás, sócio do Tapa Bucho Gatrobar

Luís Lima, o presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (a APEMIP), diz não haver dúvidas de que a crise trazida pelo novo coronavírus “veio apanhar de surpresa todos os sectores da economia” e que “diversos intervenientes do sector da restauração se têm vindo a manifestar publicamente sobre as dificuldades que têm vindo a enfrentar”, intervenientes que, afirma, “ainda se estariam a recompor da última crise” e que agora “não aguentaram mais este golpe e viram-se obrigados a encerrar portas.” Não parece haver dúvidas sobre este alarmante fenómeno e, consequentemente, que ele motive muitos proprietários deste tipo de espaço a “procurem vender ou trespassar os seus ativos, através dos meios que têm ao seu dispor.”

O presidente da APEMIP diz ainda que “enquanto representante da classe da mediação imobiliária e consciente de que vivemos num mercado em que os proprietários são livres de comercializar os seus ativos sem intervenção de mediador imobiliário”, não pode não alertar para “a desproteção que, por vezes, os potenciais clientes poderão enfrentar”, isto porque “são conhecidos diversos casos de burlas feitas por falsos proprietários que se apoiam nestes canais para enganar potenciais interessados.“É por isso que diz ser altamente recomendável que “todos os processos inerentes a qualquer transação imobiliária passem por empresas de mediação imobiliária devidamente licenciadas pelo órgão regulador”, isto de forma a garantir mais proteção para as partes envolvidas “e o cumprimento de todas as obrigações inerentes às comunicações obrigatórias das transações no âmbito do combate ao branqueamento de capitais.”

Sobre o panorama atual (e específico) do imobiliário dedicado a espaços de restauração, apesar de não ter dados que permitam quantificar a realidade, Luís Lima diz que “e expectável” que o mercado comece a ficar mais sobrecarregado em termos de oferta. O presidente da APEMIP reitera que a quebra de turismo causada pela pandemia — que foi fonte de crescimento nos últimos anos — fará com que vários proprietários não tenham “outra alternativa que não a venda dos seus ativos”. Mas e o aumento, também ele brutal, da procura por espaços que o mesmo OLX também registou?

Mas atenção: Luís Lima reforça que é preciso ter em conta "que este aumento da procura não deverá ser proporcional à realização de negócios"

“Justifica-se pela curiosidade por parte dos empresários destes sectores sobre eventuais oportunidades que possam surgir, decorrentes de um expectável aumento da oferta existente nestes segmentos, uma vez que deverão considerar que esta poderá ser uma boa altura para encontrar ‘bons negócios'”, explica o presidente. O reverso destas situações tem destas coisas e a velha máxima de que uma crise também traz novas oportunidades continua a fazer sentido. O facto de muitos proprietários poderem ter de libertar ativos com urgência e/ou desespero económico faz com que quem tenha um fundo de maneio para investir possa encontrar negócios mais em conta.

Mas atenção: Luís Lima reforça que é preciso ter em conta que “este aumento da procura não deverá ser proporcional à realização de negócios”. Na grande maioria dos casos acaba por ser um “apalpar terreno” que até é transversal a outros tipos de imobiliário:”No segmento habitacional não se registou um aumento de transações de vivendas, apesar de se ter verificado um aumento da procura por este tipo de imóvel durante o período de confinamento”, conta o responsável da APEMIP.

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