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Mossul. Uma cidade estratégica

Mossul é a segunda maior cidade do Iraque, logo depois de Bagdade. Fica na margem oeste do rio Tigre, perto das fronteiras do Iraque com a Turquia e com a Síria. Até ser tomada pelo Estado Islâmico era um ponto estratégico para economia iraquiana: primeiro, pelos seus campos de petróleo — e pelo oleoduto que liga o país à Turquia; depois, por ser a maior cidade industrial do país; e, ainda, por ser uma passagem vital entre o Iraque e os países vizinhos. Tinha uma população estimada de mais de 1,5 milhões de pessoas.

 

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A capital do “califado”

10 de junho de 2014. A ascensão do Estado Islâmico na Síria e no Iraque conhece um ponto fulcral: as forças da organização terrorista conquistaram Mossul, sem grande resistência por parte do exército iraquiano. Os militares simplesmente fugiram, deixando para trás equipamento militar norte-americano e quase 500 milhões de dólares do Banco Central de Mossul.

Foi um ponto de viragem em todo o conflito. Na cidade, os que sobreviveram à chacina ou fugiram, adensando a vaga de refugiados já em crescendo, ou ficaram, sujeitando-se ao regime de terror do Estado Islâmico.

Foi em Mossul que nasceu o Estado Islâmico tal como o conhecemos hoje: foi lá, a 29 de junho de 2014, que o líder da organização terrorista, Abu Bakr al-Baghdadi, tido como sucessor do profeta, proclamou na grande mesquita de Mossul o Califado Islâmico entre o Iraque e Síria.

Com a cidade síria de Raqqa conquistada meses antes, o Estado Islâmico conseguia assim esbater as fronteiras entre os dois países e fechar um corredor absolutamente estratégico para os objetivos da organização terrorista.

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Por que é que é importante reconquistar a cidade?

Nos últimos meses, o Estado Islâmico sofreu derrotas sucessivas às mãos do exército iraquiano, das forças curdas e da coligação internacional liderada pelos Estados Unidos. Depois de perder as cidades iraquianas Falluja e Ramadi, Mossul é o último bastião estratégico dos radicais islâmicos no Iraque. Uma derrota naquela cidade será um golpe decisivo nas aspirações do grupo. E um passo decisivo para o Governo iraquiano, no sentido de recuperar o controlo do país.

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Quem participa na reconquista de Mossul?

O cenário de guerra está desenhado, como conta a CNN: o exército norte-americano estima que estejam entre 5 mil a 7 mil militantes do Estado Islâmico a defender a cidade de Mossul. Mas os números da organização terrorista são muito tímidos quando comparados aos da coligação — estão envolvidos mais de 100 mil militares na reconquista da cidade iraquiana.

As forças da coligação são uma mistura heterogénea de aliados contra um inimigo comum. Uma força composta por cerca de 54 mil membros das forças iraquianas, 40 mil combatentes curdos, 14 mil membros das forças paramilitares da região — onde estão cristãos, sunitas, xiitas, turcos, forças yazidi e míliicas turcomenas –, auxiliada por cerca de 500 operacionais das forças especiais norte-americanas e pela aviação ao serviço da coligação internacional.

No entanto, como salvaguarda a mesma CNN, apenas as forças iraquianas estão autorizadas a entrar na cidade para evitar que as rivalidades entre as diferentes fações coloquem em causa a operação.

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Qual é o ponto de situação?

A operação de libertação de Mossul começou oficialmente na segunda-feira, com o anúncio do primeiro-ministro iraquiano, Haider al-Abadi. “O tempo da vitória chegou e as operações para libertar Mossul começaram”, disse o líder iraquiano.

Em poucas horas, as forças da coligação já conseguiram derrubar a primeira linha de defesa do Estado Islâmico e aproximam-se decididamente dos subúrbios da cidade. As últimas informações dão conta de que uma larga coluna de forças militares iraquianas está a pouco mais de 10 quilómetros de Mossul, entrando pelo Sul.

A norte, os militares iraquianos, sempre auxiliados pela força aérea — estima-se que estejam envolvidos quase cem aviões da coligação — está a pressionar os terroristas. A estratégia passa por encurralar os radicais islâmicos no interior da cidade.

Apesar dos números favoráveis, todos os analistas parecem concordar num ponto: a batalha vai ser longa, travada centímetro a centímetro nas ruas da cidade.

Até porque os jihadistas não estão dispostos a abrir mão de um território que controlam há dois anos. Os militantes do Estado Islâmico construíram trincheiras ao longo das principais estradas, colocaram bombas nas ruas da cidade, em pontes e dentro de edifícios. Além disso, como explica a ABC, os extremistas podem incendiar alguns poços de petróleo para, assim, criarem nuvens de fumo negro, dificultando os ataques aéreos da coligação.

Um dado curioso e que não deixa de ser sinal dos tempos: depois de o mundo ter assistido praticamente em direto à tentativa de golpe de Estado na Turquia, o Channel 4 e a Al-Jazeera têm estado a transmitir em direto, através das suas páginas do Facebook, a ofensiva por Mossul.

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Quais são os riscos da operação para a região?

Vários. Esta terça-feira, Thomas Lothar Weiss, o diretor-geral da missão da Organização Internacional para as Migrações (OIM), sugeriu que o confronto em Mossul pode provocar uma “enorme crise humanitária em 2017”. O responsável admite a hipótese de uma vaga de refugiados quase sem precedentes: Weiss estima que quase 1 milhão de pessoas possam abandonar a cidade durante o conflito.

Além disso, não está excluída a hipótese de a organização terrorista vir a usar armas químicas contra os civis. O Estado Islâmico não só está em condições de produzir as suas próprias armas químicas, como já as usou contra civis.

Peter Hawkins, representante da UNICEF, também já veio lembrar que é importante manter as crianças a salvo durante a operação em Mossul. A UNICEF pré-posicionou de imediato água, duches, latrinas e kits de higiene suficientes para mais de 150.000 pessoas, e prevê chegar a mais de 350.000 durante as próximas semanas.

Entretanto, Julian King, comissário europeu para a Segurança deixou claro que a Europa tem de estar preparada para um novo fluxo de jihadistas na Europa, caso as forças iraquianas recuperem a cidade de Mossul.

A reconquista de Mossul, apesar de absolutamente estratégica para anular o Estado Islâmico, será quase como cutucar um ninho de vespas.

 

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A reconquista de Mossul significa o fim do Estado Islâmico?

Com a eventual perda do último bastião no Iraque, o Estado Islâmico ficaria territorialmente reduzido à Síria, onde está também sob grande pressão militar, graças aos esforços conjuntos das forças fiéis a Bashar al-Assad e a Moscovo.

A derrota no Iraque — e a mais do que provável derrota na Síria — reduziria de forma decisiva a capacidade estratégica do Estado Islâmico e hipotecaria as pretensões dos extremistas: edificar um grande califado.

Mas, como têm analisado vários especialistas e investigadores, o maior desafio que se coloca não é propriamente a conquista de Mossul, mas sim o dia seguinte. Isto é, garantir a estabilidade necessária na região para que esta ou outras forças radicais não voltem a ganhar poder.

Além disso, como explicava o comissário europeu Julian King, a reconquista de Mossul pode implicar a chegada de um pequeno número de jihadistas à Europa. “[É] uma séria ameaça para a qual temos de nos preparar”, afirmou o responsável. Os próximos tempos serão decisivos.