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Quais foram os resultados?

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O que é que os resultados querem dizer, para já?

Primeiro, que o bipartidarismo já teve dias (bem) melhores. Basta olhar para as últimas eleições legislativas, de 2011. Dessa vez, o PSOE e o PP (que venceu, dando início ao primeiro mandato de Mariano Rajoy) somaram 83,8% dos votos. Agora, ficaram-se pelos 50,7% — o suficiente para terem uma maioria (de governo ou de apoio parlamentar) caso o plano estivesse inclinado nesse sentido.

Mas não está — e daí surge o segundo ponto geral a retirar destas eleições: a necessidade de haver uma coligação ou um compromisso de qualquer espécie entre pelo menos três partidos. A matemática torna-se, pois, essencial para o futuro da política espanhola. E as contas são apertadas.

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Que coligações é que podem ser formadas?

Memorize este número: 176. É essa a chave para conquistar uma maioria no Congresso dos Deputados.

PSOE + Podemos: 159 deputados
PSOE + Podemos + Izquierda Unida: 161 deputados
PSOE + Ciudadanos: 130 deputados
PP + Ciudadanos: 163 deputados

Está bom de ver que nenhuma destas soluções atinge o número necessário para formar um governo de maioria. Porém, o próximo governo espanhol poderá passar por uma solução minoritária aprovada pelo parlamento — seja com votos a favor ou com a abstenção. Assim sendo, só à esquerda há uma hipótese de apoio (ou abstenção) parlamentar possível, com cinco forças políticas:

PSOE + Podemos + Izquierda Unida + Esquerda Republicana da Catalunha + Democracia e Liberdade: 178 deputados

Estes improváveis (porque juntam posições antagónicas no que concerne à independência da Catalunha) 178 podem ter um papel decisivo no chumbo de um governo de Rajoy — à semelhança do que aconteceu com o governo minoritário da coligação Portugal à Frente (PSD/CDS-PP). O que resta saber — e sobre isso ainda se escreverá muito — é se, à semelhança do que aconteceu em Portugal, a esquerda espanhola se consegue juntar em torno de uma qualquer solução para levar o PSOE (e talvez outras forças políticas) para a frente do poder espanhol.

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O que dizem os líderes dos partidos em relação a coligações?

Como seria de esperar, este foi o tema do rescaldo pós-eleitoral de segunda-feira. Assim foram as reações dos quatro partidos mais votados:

Partido Popular

Depois de ter estado reunido com a Comissão Executiva do Partido Popular, Mariano Rajoy garantiu que vai iniciar um “processo de diálogo”. “O Partido Popular crê que tem a responsabilidade e um mandato para iniciar um processo de diálogo e procurar a viabilização de um governo estável que possa oferecer as garantias necessárias tanto dentro como fora de Espanha”. Garantias aos espanhóis, “aos nossos aliados” e “também aos mercados”.

Como seria de esperar, não passa pela cabeça de Rajoy que o próximo governo de Espanha não seja o mais votado: “O Partido Popular ganha as eleições, é a primeira força política (…). Foi o partido mais votado em 13 das 17 comunidades (…). Foi o partido mais votado em 39 das 52 províncias”.

PSOE

O PSOE, pela voz do seu número dois, César Luena, deixou claro que não vai viabilizar um governo de Rajoy. “Os espanhóis votaram pela mudança à esquerda, e nós vamos traduzir essa mudança no [nosso] voto”, disse numa conferência de imprensa. “O PSOE agirá com prudência e responsabilidade e é o PP quem deve tentar formar um governo. Mas o PSOE vai votar ‘não’ ao governo de Mariano Rajoy.”

Podemos

Depois do PSOE, falou o Podemos, representado pelo seu secretário-geral, Pablo Iglesias, que abriu a porta a um entendimento com os socialistas — mas com a condição de estes permitirem a realização de um referendo à independência da Catalunha.

“O referendo [à independência da Catalunha] é imprescindível para construir um novo compromisso histórico. Vamos defender o ‘sim’ a um projeto comum para que a Catalunha continue como uma nação dentro de Espanha e o caminho para isso passa por haver um referendo”

“Qualquer força política que não entenda a plurinacionalidade do nosso país está disposto a entregar o Governo ao PP”, disse o líder do Podemos. “Parece que os senhores que mandam no PSOE não entendem que a Espanha é um país diverso e plurinacional.”

Ciudadanos

Por parte dos Ciudadanos, o líder Albert Rivera garantiu que o seu partido não será governo: “Não formaremos parte de nenhum governo, seremos oposição”. Mas, por outro lado, comprometeu-se a abster-se quando (e se) chegar a altura de votar um governo minoritário liderado por Rajoy. Além disso, convida Pedro Sánchez, o líder do PSOE, a fazer o mesmo. Essa solução passaria por viabilizar “um governo em minoria com Orçamentos do Estado previamente aprovados”.

“Tem de demonstrar se pensa mais em Espanha ou naquilo que lhe resta do partido”, disse Rivera sobre Sánchez.

 

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Quais são os próximos passos até haver um Governo?

Dia 13 de janeiro o Congresso dos Deputados e o Senado receberão os novos eleitos — e, assim, estará representada nas duas câmaras a nova realidade política espanhola, bem diferente da anterior.

De seguida, depois de já ter sido eleito o presidente do Congresso dos Deputados (cargo equivalente ao presidente da Assembleia da República em Portugal), o Rei Filipe VI propõe àquela câmara o nome daquele que entende que deverá ser o próximo Presidente do Governo de Espanha. Como é costume e tradição — e mesmo que não esteja na lei–, este nome deverá ser Mariano Rajoy, enquanto líder da força política mais votada.

A seguir, o candidato proposto pelo Rei apresentará o seu programa de Governo. Depois, é feita uma votação, da qual se espera uma maioria absoluta. Se esta não for atingida, há uma segunda votação dois dias depois, na qual bastará uma maioria simples para haver luz verde para ser formado um novo Governo.

Se essa votação não surtir efeito — e, à data de 21 de dezembro, tudo indica que assim será –, o processo volta a ser repetido. A lei é omissa, mas é possível que o Rei proponha outro nome para o cargo de Presidente de Governo — isto é, o líder do segundo partido mais votado, neste caso Pedro Sánchez, do PSOE.

É possível que, mesmo assim, o programa de Governo volte a ser chumbado. Se tal a acontecer, o processo torna a ser repetido. Parece interminável, mas não é: a Constituição de Espanha prevê que, se dois meses depois da tomada de posse do Congresso dos Deputados não houver Governo, o Rei terá de convocar novas eleições. Assim, Rajoy, Sánchez, Iglesias, Rivera e outros têm até 13 de março para chegarem a um acordo. Caso contrário, voltam às urnas.

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Como é eleito o Senado? E para que serve?

O sistema parlamentar espanhol está dividido em duas câmaras e o Senado é a mais alta, em oposição ao Congresso dos Deputados. Nestas eleições, o Senado voltou a ter uma maioria do PP, embora menos significativa do que a obtida em 2011.

O Senado é composto por 266 lugares e os seus membros podem ser eleitos por duas vias. 208 são eleitos através de sufrágio universal e os restantes 58 são nomeados pelos parlamentos das comunidades autónomas. Cada região nomeia um por defeito e, depois disso, um novo deputado por cada milhão de habitantes.

O Senado tem várias funções, entre as quais se destaca a função fiscalizadora do Congresso dos Deputados. Assim, todas as leis aprovadas pela câmara baixa (Congresso dos Deputados) têm se de ser ratificadas pela câmara alta (Senado).

Além disso, qualquer alteração à Constituição terá de passar pelo Senado. Segundo o artigo X da Constituição espanhola, é preciso haver uma maioria de três quintos nas duas câmaras para um proposta de alteração constitucional ser aprovada. Existe, porém, uma segunda hipótese caso não resulte à primeira. Esta prevê que é preciso uma maioria absoluta do Senado (desce), mas uma de dois terços no Congresso dos Deputados (sobe).

O facto de o PP continuar a ter maioria absoluta no Senado é, como já o era dantes, um travão a alterações constitucionais que vão no sentido da independência da Catalunha.

 

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E agora o que vai acontecer na Catalunha?

Como pode ser lido nas respostas anteriores, Espanha vive agora um impasse político. Se por um lado a direita não consegue (para já) reunir os apoios necessários para formar Governo; por outro a esquerda tem matematicamente hipóteses para fazê-lo, com o PSOE a liderar, pese embora o facto de não ter vencido as eleições.

Qualquer acordo à esquerda terá de passar pelo Podemos e por outros partidos independentistas e, claro, pelo PSOE. Ora, é na questão da independência da Catalunha que o PSOE mais difere dos anteriores.

Apesar disso (ou talvez até por causa disso), Pablo Iglesias fez questão de deixar claro na segunda-feira a sua primeira condição para abrir caminho a um governo à esquerda: a realização de um referendo à independência da Catalunha.

No pingue-pongue do rescaldo eleitoral e que é só o início das eleições, o número dois do PSOE garantiu que o seu partido tem “muito claro o artigo 2 da Constituição que defende a unidade de Espanha”, isto é, o artigo basilar onde é referida a “indissolúvel unidade da Nação espanhola, pátria comum e indivisível de todos os espanhóis”.

A questão aqui passará por perceber até que ponto é que a realização de um referendo na Catalunha é essencial para o Podemos apoiar ou não um governo do PSOE, caso este venha a ser votado no Congresso dos Deputados.

Existe, porém, um dado importante a reter, que é a votação de ontem na Catalunha. Entre os 47 deputados eleitos naquela região, 29 (do En Comú, da Esquerda Republicana da Catalunha e do Democràcia i Llibertat) são a favor da realização de um referendo à independência da Catalunha, contra 18 que são contra (o PSC, braço do PSOE na Catalunha, os Ciudadanos e o PP).

Curioso é também ver que o PP foi, entre os partidos que elegeram deputados, o menos votado em toda a Catalunha, com 11,2%. Daí até aos 28,7% obtidos a nível nacional vai uma distância enorme — e um debate que promete não se apagar tão cedo.